quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

"OS DRAMAS DOS SERES HUMANOS..."



No contexto daquele enquadramento em que quase me "expulsam" da minha própria casa, porque as pessoas devem aliciar-se com gente, com conversa, com cinemas, com amigos...devem "entupir-se" de coisas "tão giras" que há p'ra fazer...projectos, rumos de vida, ver televisão....e outros quantos "tormentos" embrulhados em Panasorbes espirituais....esta tarde fui ao Colombo.

Sempre o castigo é menor que Colombo em fim de semana, e menor ainda que Colombo em fim de semana, com jogo do Benfica em casa...

Fui lá buscar umas calças que tinham ficado para fazer bainha, e para eu me "fazer feliz" por ter umas calcinhas novas. Era dia de empregada em casa, e essa é outra razão para patroa fora, porque....apenas, não tenho paciência...

Tratei rápido das calças, e apesar do carro estar a pagar parque, dizia eu p'ra mim própria : "que se lixe o parque"....e resolvi sentar-me numa das poltronas que decoram comodamente, aquela praça da cúpula enorme em vidro.
Não havia um só lugar vago, e isso imediatamente me recordou a minha praceta com toda a terceira idade ao frio, enquanto que ali, teríamos a bem dizer, toda a terceira idade "quentinha"...
É impressionante, mas os utentes das poltronas não descansam propriamente; do que vi, estou em crer que aquilo é um filme em permanente reprise...Conversa-se sobre episódios da terrinha lá tão longe, lê-se a "Dica", o "Metro" e outros que tais, sem escesso de atenção...dorme-se e acorda-se, lamentam-se as artroses, as colunas com os respectivos bicos de papagaio...e é mais ou menos tudo!...

Quem circula, normalmente fá-lo mais apressadamente, vê-se que não equaciona prolongar a estadia, atravessa a praça para encurtar caminhos.
Digamos, que eu seria se calhar a única que encaixava num perfil diferente...Eu era a "voyeurista" que ali aterrou...

E ia pensando sobre o que via: casais equilibrados etariamente - casamentos de vida - isso estampava-se no ar negligé, apático, de desamor e frio, com que cada um, desapoiado do outro, mancava;
pares de teenagers, sempre incontidos, atrevidotes e noutra galáxia... (para comentários acirrados dos "comentadores de serviço");
pares desequilibrados na faixa etária, e aí tínhamos duas versões possíveis, cujo idioma era normalmente o português do Brasil: aquela em que o senhor idoso, de ar responsável, desfilava uma brasuca cheia de dengue e outros "atributos", sem perceber, porque também as dioptrias o não permitiam já, que embora seja o caso socialmente menos inaceitável, sempre havia chistes, sorrisos ou "bocas" foleiras bem maliciosas....ou invejosas (sobretudo para a "loja" em peso, em sacos, que ela transportava)...e a alternativa para a qual a sociedade é bem mais acutilante:  mulher mais velha, que se faz acompanhar de um homem mais novo...
Isto exige em primeiro lugar que o homem tenha uma cabeça feita, e não o provincianismo da santa terrinha, e depois que "os" tenha no sítio, e que não se deixe molestar por olhares ou comentários...
Acontece que a mulher hoje em dia, tem uma aparência muito mais jovem, pela forma como se apresenta e pelo cuidado que tem consigo própria, e aí temos nós, mulheres de cinquenta e tais que se relacionam com homens, seguramente mais de dez anos mais novos.

Aí chegará aquele dia, em que aquelas avós, que durante alguns anos viveram e foram felizes com homens bem mais novos, e que de repente se consciencializaram, quase, quase, a vestir a farda de enfermeiros..."agarrados" que ficaram naquela situação, a romper relações que até eram felizes, por cobardia ou interesse....e lá vão eles com uma de trinta que já vai no segundo ou terceiro "round"....

E aí teremos nós mulheres sozinhas, amargas, que depois de vidas com emoção e pseudo-juventude, não se vão ligar a homens muito mais velhos, barrigudos, desinteressantes, cansativos....homens "a mijar p'ras botas," diria um amigo meu se aqui estivesse. Desculpem a deselegância da frase, mas ela é perfeita, no caso!

E aí temos as poltronas do Colombo, em dia de semana, com mulheres de olhar distante, doído, desesperançoso, cansado e descrente, a pensarem : "que se lixe a portagem do carro"!!...

Anamar

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

"UMA MÃO CHEIA DE NADA, OUTRA DE COISA NENHUMA..."


Hoje acho que regredi no meu estado psicológico.....
Se avaliarmos pelo número de vezes com que fui ao frigorífico buscar fatias de bolo de chocolate....
Digam-me lá  quem é que depois de uma lasanha bolonhesa, encontraria zonas devolutas no estômago, para enfiar bolo de chocolate sucessivamente??!!

Nem um por de sol que caíu em laranja e arroxeados, tomando tudo o resto, aspecto de fotografia em contra
luz, ou seja, de um sombreado indefinido e fantasmagórico, me animou...

Desde as cinco e meia talvez, estou de pijama, robe e pantufas....está um frio gélido da serra, e já olhei para a cama, eu e a Rita, com ar guloso, cem vezes.
Estou "desconchavada",  inquieta, não consigo falar telefonicamente com os amigos, e por isso não atendo o telefone, estou doída cá pelos interiores, talvez saiba porquê, embora não seja cabível neste espaço, por me ser estritamente particular.
Penso que sofro daquela "síndrome", que calculo que os bébés tenham, que os leva a escancarar as goelas, a fim de que, alguém lhes mude a fralda, alguém lhes dê a chupeta que caíu, alguém lhes dê o leite que a sua fome acusa....ou simplesmente, alguém lhes dê o cólinho de que precisam para que lhes passem as energias em forma de afecto, que os acalme, lhes tire o receio, os faça confiar de novo, lhes diga ao ouvido, aninhando-os : "estou aqui....estou aqui e amo-te"....

Ou então, imagino eu, aquela outra síndrome de sofrimento de gente graúda , na ressaca, na carência duma outra droga...Esta, não o afecto para consigo mesmos....ou talvez o único"afecto" que consigo mesmos possam dividir....rejeitados que estão por todos e até por si próprios.....

Eu hoje estou exactamente assim...estou de ressaca, de ansiedade pungente, tenho um buraco tipo cratera em  carne viva no local daquela droga a que chamam coração....eu hoje rejeitei convites de amigos que sabem quanto eu adoro o mar e ele me tranquiliza, a minha ingratidão é tal que nem o telefone atendo de quem está objectivamente gravemente doente...Mas a solidão deste fim de tarde, com o casario a escurecer-se e a "empirilampar-se" todo, (desculpem o neologismo ; de vez em quando dá-me p'ra isto), a minha gaivota de asas bem esticadas, aproveitando as últimas aragens que ainda não são tempestuosas, deixou-me uma nostalgia que me está a sufocar progressivamente, e que não há drogas de espécie nenhuma, nem placebos com que tente tornar real o ilusório, que me assistam....

Desculpem, eu hoje tinha que vir aqui escrever alguma coisa, porque senão, o nó da gravata psicológica que me está a estrangular há que séculos, ia apertar até ao último sopro que eu conseguisse inspirar...

Anamar

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

"NUM DIA DE SOL, CHOVE NO MEU CORAÇÃO"





Hoje houve de facto, sol!...
Sol lá fora, sol fora de mim....
Pela minha mão, hoje escreve a musa, a Mulher que é um paradigma para mim.
Uma papoila a florir na charneca alentejana.....
                                                                      
MISTÉRIO




Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,
Dizendo coisas que ninguém entende!
Da tua cantilena se desprende
Um sonho de magia e de pecados.




Dos teus pálidos dedos delicados
Uma alada canção palpita e ascende,
Frases que a nossa boca não aprende,
Murmúrios por caminhos desolados.




Pelo meu rosto branco, sempre frio,
Fazes passar o lúgubre arrepio
Das sensações estranhas, dolorosas...




Talvez um dia entenda o teu mistério...
Quando, inerte, na paz do cemitério,
O meu corpo matar a fome às rosas!

     Florbela Espanca

  Anamar

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

"UM DIA DE CADA VEZ..."





Tudo me acontece nestes benditos dias que não são carne nem peixe....Passo a explicar : aí pelo meio dia, o céu carregava de cinza e chovia...
Pensei : mais um dia com a mesma "cara" dos que temos tido ultimamente, em que após o almoço, a borrasca só nos permite ficar em casa. Como diria a minha mãe "ao meio dia ou carrega ou alivia..." não havia grande margem de erro.

Pois bem, o dia hoje aliviou...e o sol deitou a cabecinha de fora, no meio de um engrinaldado de nuvens, mais para o branco.
Foi aí que eu pensei que já agora, por necessidade, mas porque também a médica está sempre a "enxotar-me" para a rua, mesmo quando eu sei que me sentiria muito melhor em casa...resolvi que iria ao Colombo tratar de um assunto.

Ora no Colombo há um "mimo," que procuro ter tempo para não desprezar, que é simplesmente sentar-me numa daquelas praças, cujo nome jamais aprenderei...e ficar apenas a ver, a olhar, a analisar, a ouvir, a deleitar-me com os passantes...enfim, como se estivesse incógnita, numa balaustrada e ninguém desse por mim.

Essa sensação de ser invisível ou ignorada, é-me muito reconfortante; depois, estou bem instalada nos sofás, não pergunto nada, ninguém me pergunta nada, e dou-me ao luxo de apenas "ver" passar o tempo...

Não foi exactamente assim, hoje...Longe estava eu de supor que o meu remanso ia ser prejudicado...

Os sofás são individuais, e como tal, não ficam exactamente agarradinhos uns aos outros, ou seja, há um espaço suficiente que obriga a quem quer dialogar, ter de subir os decibéis da voz.
No entanto isto não constituiu problema para duas mulheres, julgo que amigas, aí da casa dos trinta e muitos, penso (porque limitei -me a ser caracol dentro da concha, e não tive muita lata para os pormenores)

A conversa, pelo que percebi, rondava à volta das redes sociais da NET, em que os cibernautas, de repente ficaram todos esgazeados para frequentar.

Então uma delas dizia à amiga que, sic: "tinha conhecido um gajo da Nazaré ou coisa que o valha, que vinha a Lisboa já na próxima semana, para curtirem uma"....e acrescentou : "já nos vimos, posso dizer, integralmente...as webcams são um espectáculo"...
E respondeu-lhe a amiga : "Então mas depois dessa noite o tipo volta para a Nazaré...e tu como é que ficas? Até porque nem conheces a vida real do homem...apenas o que ele entendeu contar-te...."

E eu, cada vez mais caracoleta...nem tugia nem mugia, tinha óculos escuros que sempre tapam tudo, e por isso, também tapavam os "olhões" que nessa altura do campeonato, já deviam estar em tamanho de berlinde...

E desinibida, diz a primeira :"Estás parva? Mas eu quero lá saber se o gajo tem lá mais meia dúzia!...Se ele for bom de cama, como parece....isto é assim, minha filha...um dia de cada vez! Eu sei lá se chego a amanhã!!!!"

E continuou: "Há alguns que até parece prometerem; é questão de uns diazinhos de conversa...e estão no papo! É uma curtição que dura uns dias, podes dizer, mas para que vou eu fazer planos a longo prazo?? É usufruir-se o que se pode....No dia a seguir, com um bocadinho de jeito, a malta já nem lembra a cara um do outro!!" - e gargalhava...

De caracoleta, acho que passei a pulga, tanto me enfiava pelo sofá adentro....e dei como terminado o meu repouso, tão atarantado, hoje...
Levantei-me, peguei no saco e desandei...sem que sequer nenhuma delas estivesse preocupada com quem estava, com quem esteve, se teriam falado demasiado alto etc , etc....

Vim a cinco à hora, meio absorta pelos corredores...e a bendita frase "um dia de cada vez", martelava-me os neurónios.
 De facto, se repararem a postura muito comum do ser humano hoje em dia, desde crianças já, até adultos nas mais variadas faixas etárias, é uma justificativa para tudo o que se faz ou não, com a ameaça da precaridade do tempo certo. Assim não só há justificação e contemporização para tudo, como uma desresponsabilização também de tudo. Tudo vale, "porque eu só tenho uma vida"....tudo é legítimo, "porque eu sei lá se ali ao atravessar, não morro debaixo de um carro"...tudo é aceitável, porque a extensão temporal da vida não se compadece de serem tolhidas as vontades, os desejos, as loucuras, certos ou não, racionais ou selváticos....
Há é que aproveitar o momento, há é que tirar partido da coisa, moral ou imoralmente certo, porque nunca ninguém veio cá contar como é...lá do outro lado!!!

E eu fiquei a pensar onde é que isto nos leva, sem bitolas, sem pesos, sem medidas, o que se faz ao que nos ensinaram serem "valores respeitáveis" do ser humano, com balizas e sinais de stop de quando em quando, se a loucura parece benquista, grassa livremente e é "inocentemente" contemporizada pelos demais?....

Juro que se me embrulhou o estômago e os restantes neurónios saudáveis...somos animais ou seres humanos? Estou passada, ultrapassada, demodée, gravemente desajustada ou que gaita se passa comigo???
É que a minha mãezinha ensinou-me, que este tipo de vivências e posturas, pelo menos na sociedade machista em que ainda estamos, chamava-se outra coisa....mas eu juro, do que olhei para elas, que não vi escrita nas testas a tal palavra de quatro letras....

Anamar

sábado, 16 de janeiro de 2010

"PARA ONDE CAMINHAMOS?....."



O  efémero "mata-me"....

Não ignoro que vivemos na era do descartável. Ainda bem não tem saído para o mercado um modelo de qualquer dispositivo, e praticamente já é descartável, porque já o apearam do lugar que ocupava, porque outro o substitui, sempre com vantagem....
Os carros saem dos stands e já desvalorizaram....só porque atravessaram aquela porta....
A informática e o virtual obrigam a reciclagens sobre reciclagens, porque o que se detém , está permanentemente a ser ultrapassado.
Quem se lembra de na geração dos seus pais (já não recuo mais no tempo), se trocar de móveis, por exemplo, não porque os que se têm já estão estragados, mas porque os "media" exibem aos quatro ventos, com a sua brutal agressividade, outros com um design intencionalmente diferente...
As pessoas medem-se pela capacidade de terem uma mente que deslize à velocidade duma montanha russa....por isso alguém, eu diria, dos quarenta para cima já é "cota"....já sofreu desvalorização...
As pessoas trocam-se quase pela cor dos olhos, do cabelo, das medidas modelares...

Os nomes que se impõem, não se impõem muitas vezes pelo valor, conhecimentos, provas seguras dadas ao longo da vida, trabalho feito, experiência assumida....
Não, são antes olhados como figuras quase dinossáuricas,  incómodas!....
Quem respeita Agostinho da Silva, quem se interessa por Pessoa, quem conhece Machado de Assis,  quem se lembra duma Natália Correia, duma Ivone Silva, António Aleixo, Variações, David Mourão Ferreira....Eça de Queirós....cada qual tendo o seu lugar "histórico"?...

Falo do português medianamente culto, se mais não fosse, por viver longe do Portugal profundo.

Essas figuras, uma gota de água num mar, "merecem" quase genericamente epítetos pouco abonatórios...ou simplesmente estão relegados ao esquecimento, para não falar de ignorância....

Tudo figuras descartáveis, com prazos de validade vencidos...
A sociedade só preza o jovem, o belo, o saudável.....todos os outros, podem de facto ir para o "velhão"!!...
E isto está tão interiorizado até determinadas faixas etárias, que os valores de conhecimento, de experiência, de persistência, associados aos mais velhos, em vez de uma mais valia social, é algo que cansa, chateia, desinteressa...é uma "seca"!....

O valor é o que advém do superficial, do imediatismo, do facilitismo.

Ouve-se dizer: nada é permanente, nada é certo, nada é p'ra valer....
O princípio da impermanência defendido pelos budistas, quanto a mim não deve ser interpretado como o está a ser.
O ser humano não deve ser preterido por não ter os dotes ou aptidões relacionáveis com uma faixa etária baixa, mas deve sim, ser valorizado, por tudo a que pode dar continuidade para as gerações futuras, pelas experiências e aprendizado que a vida já lhe proporcionou, pela persistência que mostra, ao continuar a achar que tem ainda direito a um lugar neste Mundo...

Há dias li uma crónica de Mega Ferreira que colocava duma forma interessante, a incompatibilidade do avanço das tecnologias em todas as vertentes, (o que permitiria alongar o tempo de vida dos mortais,  pelo garante dos seus desempenhos biológicos básicos),  numa sociedade, por seu lado, morta para varrê-los p'ra baixo do tapete....pelos "inconvenientes" que acarretariam às gerações produtivas, que essas sim, "merecem" viver....

Claro que o artigo é provocatório e ironizante....
Uma coisa é verdade, já hoje, o tratamento proporcionado a determinadas pessoas já pouco contributivas para o funcionamento social, chega a ser mais agressivo e discriminatório, do que o proporcionado a certos animais...

E assim se caminha para a preservação do nada, a troca é fácil e não deixa muitas "mossas", o esquecimento e a dor do não desejado, facilmente transposta...
A sociedade desumanizada em que se aposta, terá seguramente um preço exorbitante a pagar....
O materialismo, o interesse pessoal, o "dar-se bem" a qualquer custo, é meramente o que fica...Os valores, os afectos, os laços, serão "qualquer coisa", que qualquer dia as pessoas nem sabem que existiu....

Eu "luto" todos os dias pela dignidade do meu "espaço"...
Eu "sacralizo" pequenas coisas que tiveram na minha vida, o seu valor...
Eu quando abandono um local, mesmo de curta permanência, olho-o, recanto a recanto, acreditando na força da memória e do coração, para que o seu registo não perca uma gota do valor que lhe atribuí...
Eu quando amo alguém, a redoma onde arquivo, se for o caso, a força e a pureza desse amor, terá para todo o sempre, o seu lugar reservado no cantinho mais inacessível das minhas recordações....o jardim dos meus tesouros, esse sim, com valor incalculável !...

Quem me ler, pode conotar-me com o "velho do Restelo".......Longe disso!

Defendo a evolução, o avanço, defendo a competitividade saudável, anseio pelo mais e melhor, valorizo muito o esforço....mas que tudo isto tenha como pedra basilar, o respeito pela dignidade, pelos sentimentos, pelo valor que cada um empresta a uma melhoria alargada do ser humano, e o discernimento para ter capacidade de análises sérias e profundas, enjeitando o fácil e superficial !...



Anamar

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

"CONTO TRISTE DE NATAL..."

Sinto-me triste pela forma magoadamente alvoroçada que tenho por dentro ...
É um pouco parecido ao estado de espírito dos miúdos, em noite de Natal, quando esperam com alguma impaciência recolhida, a hora da distribuição das prendas, sabendo de antemão que qualquer um dos embrulhos lindos, que estão junto da árvore, contem um presente, seja o seu ou não....

No meu caso, o cenário é igual, o alvoroço de alma, o mesmo...
Existe naquela árvore da VIDA, um presente para mim, um presente sem o qual eu não vivo...um presente, que dei anos da minha vida, para  alcançar...
Só que um lapso na distribuição das prendas, fez com que aquele brinquedo sem o qual eu "morria", não era afinal para mim, e o  equívoco foi corrigido...
Aquele brinquedo, que eu já sentia meu por direito, foi parar às mãos de outra menina..
Eu é que acreditara poder merecer aquele presente!...

Deixaram que eu o usufruísse por breves instantes, e quando convictamente brincava em paz com ele....arrancaram-mo das mãos...
Eu era feliz, ou julgava que o era, na posse daquele presente, que eu escolhera e me escolhera...
Mas essa felicidade foi ilusória, efémera...e fiquei a vê-lo ir noutros braços que não os meus, para outro mundo, que não o meu...E vi-me sozinha, junto a uma árvore de promessas, no meio da vida, e eu, magoadamente alvoroçada, percebendo que a festa acabara, e as minhas mãos ficaram vazias...

Este é um conto de Natal, triste, com uma árvore já de luzes apagadas, uma sala já vazia, repleta dos papéis rasgados que enfeitaram  mistérios e  ilusões, as fitas e os laços já sem brilho...e comigo, apenas uma lágrima teimosa, de uma dor  indisfarçável, de uma ilusão perdida... de um desgosto que nunca se perderá...

Anamar

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

"SAUDADE..."



Sei que hoje preciso escrever...
Só sei isso; sobre o quê, não sei ; porquê...talvez saiba! Aliás, há na minha vida neste momento, tantas coisas por que devia escrever!...
O dia pôs-se a contento. Um céu uniformemente plúmbeo, uma chuva fraca mas constante e gélida, criam de facto um cenário de desalento, que, para quem está desalentada até às entranhas, reforça a necessidade de o fazer.

Penso que vou escrever sobre a saudade, porque a saudade é aquilo que estou de facto a sentir a tomar-me por inteiro....
Saudade de tudo...de pessoas, de animais, de tempos, de épocas e de episódios na minha vida...
A saudade é realmente algo que corrói, silenciosamente, com técnica adequada. Começa desesperante, anuncia-se esfarrapando-nos o coração...impera, e parece dizer-nos que tomou tanto conta de nós, que não há lugar para mais nada....
Depois de se ter instalado e grudado  mesmo bem no nosso coração, amansa, fica dócil., doída, com uma dor que embora já não corte como punhal, é uma dor paleativa que nos deixa inertes, sentida constante e persistentemente, que dilacera na mesma, corta, rasga, como um vidro...

Ampulhetas esvaziam umas a seguir às outras e com elas, o cubo de gelo em que a saudade se foi transformando, vai originando bem cá dentro, uma água tão gelada, mas tão gelada, que tudo à sua volta morre, estiola, perde a vida...

A minha gaivota rasou agora a minha janela. De asas estendidas, recorta-se esfingicamente no cinzento do céu, e aproveita  a aragem que corre e deixa-se ir, aleatoriamente, sem norte destinado,
neste fim de dia anunciado...
Invejo a liberdade com que me acena, a altivez com que exibe o seu voo...Nem ela pode supor quanto!...

A minha vida pautou-se efectivamente por muitas perdas (possivelmente a vida dos outros também...). Logicamente, muitas saudades acumuladas. Foi uma vida romanceada, onde felizmente não houve lugar para cinzentismos ou indiferentismos.
Dirão : "e não teve ganhos também? "
Claro que sim, mas como felizmente ela foi generosamente pintada com todas as cores da paleta do Mestre...quando a saudade, a tal saudade indistinta me amarfanha, me mata, me tolhe as capacidades até de auto-defesa, eu contabilizo, e creio não errar, neste cômputo do deve e do haver, que as cicatrizes das mazelas deixadas, e das que sangram ainda...estão bem à frente, ou seja, as minhas perdas e os meus ganhos estarão profundamente desequilibrados...

E assim se vai indo, umas vezes aceitando, outras, infelizmente, sossobrando...
A VIDA é assim, dizem as pessoas......talvez afinal, eu seja só uma aluna relapsa ou excessivamente exigente!...

Anamar

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

"OUTRO AMIGO NOS DEIXOU..."


Em criança, o único animal permitido em casa, foi um canário, que por ser um cantor exímio, amoleceu o coração da minha mãe...
Vivia ao tempo em Évora, e o canário passava os dias usufruindo ar livre, sol e boa vista, porque tínhamos uma varanda enorme, onde a minha mãe se rodeou...do canário, claro, e de tudo quanto era sardinheira (tenho que esclarecer que até aos dias de hoje, a minha mãe tem fixação por sardinheiras)...
Lembro que adorava as férias e o tempo passado em casa dos meus avós maternos, numa pequena vila perto de Évora, onde, desde o burro, à galinha e pintainhos, patos, ovelhas, lógico que também cães e gatos... havia de tudo...
Adorava ir com a minha avó ao galinheiro recolher os ovos num cestinho....e por isso nunca corri o risco de achar que um frango é aquela coisa que se vende nos super-mercados....

Casei e casei com um homem, que apesar de oriundo do meio rural (os meus sogros sendo modestos agricultores da Beira Alta, detinham a tradicional panóplia de bicharada, ou seja, da galinha às vacas, passando por cães, gatos, coelhos, etc...tudo existia naquela casa de lavoura), detestava a ideia de ter animais em apartamentos.
Defendeu sempre que, numa vivenda, tudo bem...num andar, nem pensar. Não era portanto como aquela rábula do Raul Solnado, como por certo se lembram, que punha a vaca Matilde na varanda para dar leite fresco!!!!.....
Bom, e por isso foi passando o tempo, e o máximo permitido, eram aqueles horrorosos bichos da seda, quando as crianças, na primária (é o destino!...),têm que aprender as metamorfoses do bicharoco. Devo dizer que sempre me fez "frenicoques" aquela criação!

Tenho duas filhas, completamente antagónicas nesta matéria; enquanto que a mais velha segue em opinião o pai, a mais nova, se pudesse vivia rodeada de bicharada.
Nunca esqueço que quando estávamos na Beira e a vida corria solta, desde ouriços, grilos, toupeiras...toda a sorte de animais domésticos, eu sei lá...em tudo ela mexia e com tudo ela brincava. Lembro-me pelo menos de dois episódios que a retratam aí pelos seus 5 ou 6 anos.
Um belo dia resolveu oferecer-me um presente. Numa daquelas caixas de ourivesaria colocou algodão, e 2 ou 3 ratos acabados de nascer. Fez o presente com papel e laço e veio contentíssima oferecer-mo...Como imaginam, "adorei"!...
Numa outra vez, andava com muito cuidado com uma caixa daqueles fósforos grandes, julgava eu que vazia....mas não. Explicou-me então que lá dentro estava um grilo que tinha apanhado, e um pirilampo que era para dar luz ao grilo...
Cursou um ano de Veterinária, embora tenha derivado para outro ramo.

Com a vida a avançar, começou a "cegada" das incursões junto do pai, para ter autorização para : primeiro ter peixes (em aquário de água fria)...depois, peixes em aquário de água quente, com maternidade, termómetro e todos os precisos, tartarugas e hamsters com as respectivas instalações, periquitos e canários de várias raças e cores (cheguei a ter vinte e tal ou mais, canários e periquitos, com os ninhos as criações sucessivas, etc).

Chegado que foi o topo possível da pirâmide (em termos de complexidade) de bichos permitidos...iniciou-se o "ataque" à existência de gato.
Um rotundo "não" manteve-se, até que o meu pai faleceu e eu entrei em depressão profunda. Eis que, nada melhor para me ajudar a sair do "buraco", do que um animal carinhoso que me ocupasse os momentos de maior tristeza ......e patati e patata!....
"Caio" em fazer anos, e eis que surge a bela da Catarina com um cestinho acolchoado, um enorme laço de fitas, e para completar os parabéns, lá dentro, uma coisa aí de vinte centímetros, tipo bola de pêlo, com uns olhões azuis que nem um céu ensolarado,  que não descansou enquanto não saltou da "prenda", não foi bisbilhotar tudo, trepar ao que já conseguia (o que denotaria mau "presságio")....acompanhado sempre duns ruídos, tipo um rapaz na mudança da voz...
Aquilo não era miado, não era grunhido....era assim uma coisa à sua imagem e semelhança....
Vinte centímetros de gato, que é como quem diz, vinte centímetros de "Óscar"....que adoptei, como me competia, até ao dia 30 de Julho do decorrido ano, em que nos deixou, pelas razões que aqui contei na altura.

O Óscar entrou à revelia do "dono", o "dono" saíu amuado. Foi para a outra casa da família, na espectativa de que entre gato e marido, eu escolhesse, obviamente marido.
Eu escolhi gato!!...
Ao fim dum mês, desamarrado o "burro", o dono regressou....mas ficou para todo o sempre na lista negra do Óscar!...

Algum, não muito tempo depois, cursava a Catarina o primeiro ano da Faculdade de Veterinária, enamorou-se de um coleguinha que era alentejano.  Estudava como ela, Veterinária, e dividia com mais uns quantos colegas rapazes, um apartamento ali para as Olaias.
Coincidiu que o Jaime fez anos  quando a Catarina ouviu uns ruídos aflitos e continuados, vindos do motor de um carro.
Encontrado atempadamente o dono do carro, e eis que de lá saíram outros quinze centímetros, mais coisa menos coisa, de gato.
Carecia ser-lhe dado um destino, dada a desprotecção do animal. Estudadas as hipóteses, ouvidas as negações, falhadas as tentativas de acordos, restava o quê? A residência universitária do Jaime!
E pronto, a Rita (nome que lhe foi posto quando todos pensavam ser uma "menina"), seguiu para Lisboa.

Mas o Jaime ia frequentemente, de fim de semana à terra, e a Rita vinha para onde???
Bingo!....para casa da "sogra" pois então!!!! (também, quem tem um, tem dois, não há nenhum problema!!....)

Os "fins de semana" foram-se tornando cada vez mais compridos, as "judiações" que a maltinha lá de casa fazia ao pobre do bicho, cada vez maiores.....Meses depois os amores Jaime-Catarina, como os amores de Verão, terminaram....."separação de bens".........com quem fica a Rita, com quem?????
Com a "sogra" pois então!!!! (também, quem tem um tem dois.........)!

Desta vez, o "dono" já nem se mexeu....claro!!

Por escala hierárquica.....chegou a vez de se "lutar" pela posse de um cão!

Aí o "dono" amarinhou pelas paredes e disse: "só por cima do meu cadáver!"....

A casa passou a ser então, apenas apeadeiro ou como direi, local de estágio de cães, cadelas, grandes, pequenos, abandonados, até terem donos definitivos, mas ficar mesmo...não!

Até que, na praceta ajardinada que fica nas traseiras da casa da avó, apareceu um rafeirote branco (os veterinários pomposamente chamam-lhe cor "pêssego" - nunca percebi tal nomenclatura), perna curta, ou seja, baixote, com uns olhos negros lindos.
Era refilão, porque se armou em "dono" da praceta, mas corria dócil e afectuoso para os ossinhos de galinha, ou restinhos de carne, que a avó que já tinha sido sensibilizada para a questão, lhe dava, à janela do seu rés-do-chão.

A avó, que quando só era mãe, não tinha o coração de manteiga das avós....começou a ver o Gaspar dormir à chuva, encobrindo-se como podia debaixo da copa precária das árvores da praceta, começou a ver maltratarem o Gaspar, quando ele, "arruaceiro" que sempre foi, fazia "voz" grossa a quem atravessava a praceta....
Dizia "que lhe doía a alma" ver ali o animal!!!!

Ora, "dor de alma" é coisa que a Catarina não suporta, se se relacionar com algum animal....
Por isso, depois de umas férias da Páscoa na Beira, com a avó bem "cozinhada em banho Maria", ao regressarmos, e porque o Gaspar estava saudoso dos ossinhos de galinha, daquela benfeitora do rés-do-chão, nada como evitar-lhe possíveis doenças de má nutrição ou frio....e o Gaspar passou a ser o novo hóspede daquela senhora, que quando era só mãe e ainda não tinha o mel das avós, só tolerara um canário....

Isto já lá vão talvez treze, catorze anos!!...

O Gaspar foi tratado como um príncipe nos treze, catorze anos, que viveu na nossa família...
Era extremamente meigo, obediente, inteligente ("só lhe falta falar" - dizia sempre a minha mãe...).
Tinha um tratamento VIP... acendia-se o irradiador para o Gaspar não ter frio, tinha ração de primeira...e não descolava daquela que efectivamente ele elegeu  (e com toda a justiça) como dona, a minha mãe, sendo uma sombra dela por todo o lado onde ela andava....
A paixão foi recíproca, ao ponto de eu ouvir da boca da minha mãe ( que não quer morrer por nada ): "Eu só pedia a Deus que me levasse no mesmo dia que ele"!!!.....

Há cerca de um ano, o Gaspar contraíu um problema respiratório complicado. Apesar de medicado pelos melhores veterinários, estava em risco de fazer um edema pulmonar, a qualquer momento.

A minha mãe não conseguia dormir calmamente, há largos e largos meses, porque a tosse do cão e a prostração em que ficava por cansaço, a impediam de dormir...
Então, sentava-se na cama e mimava o Gaspar, como se faz a um bébé, até que de novo ele adormecesse...e isto repetia-se noite após noite, várias vezes por noite...

A minha mãe vive sozinha, não muito perto de mim. Tem quase oitenta e nove anos.... diz que a vida tudo lhe tem levado....
Ontem levou-lhe mais "um pedaço de si....o seu companheiro Gaspar..."

Anamar

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

"NEM PENSAR!!....."


"FUCK 2009" foi o nome com que postei um texto um destes dias.
Como na altura disse, escarrapachei-o no placard de fotos avulsas e outros pequenos nadas, que tem existência no quarto que ocupo, espécie de quarto entre estudante e ....o quê??? Que droga de nome vou pôr àquilo que serei breve, cujo nome adequado me arrepia os cabelos, tantos quantos tenho, me lembra coisas devastadoras, que me deprimem ainda mais, que nem os ansiolíticos e antidepressivos todos que "decoram" a bancada da cozinha, chegariam para me reequilibrarem....
"Aquilo"...tem dois nomes possíveis, qual deles pior que o anterior....e "aquilo" era aquilo que eu queria, e para o que fui dar entrada com os papéis na CGA (ponho assim, porque quem não topar, até pensa  que é o "Clube dos Génios e Aprendizes).

Desculpem...isto não é nenhuma descriminação....mas lembra-me logo, férias no INATEL....excursões às amendoeiras em flor, "autocarro de idosos que vinham dum fim de semana na Serra da Estrela......e patati e patata".....

Ai que já se me está a dar as angústias!!!!.....
Bom, mas já volto!

Eu pus no placard do quarto, o dito  postalfree, assim meio encolhidinha (sim, que eu sou uma "lady" e uma "lady" tem princípios...), e porque a minha mãezinha não sabe inglês...
Fica junto  à mesa onde trabalho e durante o dia "encho" a boca e a alma a lê-lo....como quem diz: "Ganda filho da p...." que foste fresquinho....mas já foste!!!!"....
Então não é que toda a gente que aqui tem entrado no quarto, logo dá de caras com o postal e é ouvi-la dizer: " Oh que giro.....onde arranjaste??? Também queria um! O ano merece bem!"....
E disse a Catarina, e disse a Bia, e disse a Lena e a outra Lena, e o Zé, a Fátinha....ou seja é como a "farinha predilecta que é p'ro avô e p'ra neta"....quer dizer dos 10 aos 80....
Até já me sinto redimida desta minha maldade!!! E é bem feita porque 2009 foi o ano em que, parece, tudo aconteceu a toda a gente!....

Bom, mas vamos lá para o "Clube dos Génios e Aprendizes"....
Lá fui levar a papelada necessária, dia 31 de Dezembro ( droga é que ainda foi em 2009! Vamos ver o que vai dar.....), e o coração batia, batia,  não pelo que estava a fazer, mas com receio que alguma coisa não estivesse bem, ou faltasse algum documento, e eu não pudesse entregar ainda nesse dia o raio dos papéis, que parece me queimavam as mãos....
Saíram-me quilos de cima, quando atravessei de novo a porta de vidro de ligação à rua, agora em sentido contrário.
Um dos "presentes" de 2009, que me foram acabando com os neurónios, deixando-me como estou psicologicamente neste momento....está resolvido.  E diria a minha mãe : "...e agora seja o que Deus quiser!..."

Vim ligeirinha para o comboio, com um sol fraquinho a entrar pela janela, quase ninguém àquela hora (pouco antes do almoço), e então dei-me ao luxo de abrir a cancela aos neurónios e deixei-os em liberdade fora da cerca....(estão a ver o estado a que me refiro?)....e saltitei de galho em galho, quer dizer de pensamento em pensamento...em total liberdade!....

E pensei : "agora que a primeira parte da pendência está resolvida, e quando me autorizarem a fazer parte dos "aprendizes" e não dos "génios"....qual o ramo a que me dedicarei??? De ensinar meninos, tenho que chegue, então não se admirem se qualquer dia me virem orgulhosamente a vender umas roupinhas num desses balcões da vida, a receber e encaminhar os utentes de algum consultório médico ou advogado,ou quem sabe...a ser caixa dum Continente, Modelo ou Carrefour!!...
Em última análise....arrumadora de carros, nalguma praceta inóspita!!...

E então??!! É desprestigiante, é??....
Em casa, de carrapito e óculos na ponta do nariz, tricotando ou "arraiolando", soprando o pó ou lavando os vidros....é que não me verão de certeza....a minha mãezinha não me fez para isto!!!!!....


PS: AH, É VERDADE, SE SOUBEREM DUM "PARTIMEZITO" SIMPÁTICO, LEMBREM-SE DE MIM, OK? apesar dos pesares eu ainda não estou nada de deitar fora...modéstia à parte.......rsrsrs!!!!

Anamar

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

"AS CONVERSAS SÃO COMO AS CEREJAS!...."


"Linhas paralelas são aquelas que por mais que se prolonguem, nunca se encontram"  (ensinaram-me p'raí na segunda classe, no tempo das reguadas e das "orelhas de burro"...) exactamente o que pensei ao ver esta foto deslumbrante.

É evidente que hoje, um bocadinho mais crescidinha, sabendo mais qualquer coisita de Matemática, sei o que estou a ver na imagem e a interpretá-la.
E também os nossos putos de hoje em dia, os putos dos game boys, das "consolas", das playstations, dos iPods, dos Nintendos, não se deixariam baralhar das ideias, se os quiséssemos confundir com a foto e a definição de "linhas paralelas"...

Bom, mas eu juro que esta associação de ideias está perfeitamente anárquica...porque, imaginem (eu não sei porquê), e não tem rigorosamente nada a ver, olhei para a quietude que esta foto inspira, de um caminho em paz, num itinerário tranquilo, rumo a um local que certamente será de serenidade...e fui lembrar exactamente, uma viagem que fiz em 2005, aos "Picos da Europa"...
A única similitude, que direi, atravessa as duas situações, só poderá mesmo ser, essa paz, essa natureza pródiga e bela que não regateia soberania pelo agreste impetuoso das suas montanhas, com picos ainda pintalgados de neves perpétuas, com as pradarias verdes dos vales a perder de vista, junto aos lagos Ercina e Enol, planuras de pastoreio de vacas sonolentas, cabras saltitantes, sobrevoadas pela  rainha da montanha, a águia real, ou outras "rapaces", como os asturianos dizem.

O Santuário de Covadonga, talhado no rochedo, a pique, impõe-se grandioso aos nossos olhos, por razões religiosas ou outras...
Cangas de Oniz, com a sua ponte romana erigida em honra a D. Pelayo que viria a ser rei dos asturianos, tendo conquistado Espanha aos muçulmanos, tem dependurada  uma cruz, relíquia do Santo Cruxifixo .

Perto, fica Fuente Dé  e o seu teleférico, que nos transporta a 2000 m de altitude, donde a abrangência da vista é esmagadora.
O rei Pelayo está, aliás, enterrado na chamada "cova", que faz parte do Santuário de Nossa Senhora de Covadonga, padroeira das Astúrias.


Essa minha viagem, pela qual deambulei espiritualmente enquanto escrevia, culminou num local de que já vos falei num outro post anterior - Puebla de Sanábria. Muito perto já de Portugal,é uma vila que pertence ao município espanhol de Zamora.
Já é referenciada desde o Século VII, linda de calcorrear...com os seus balcões e telheiros em madeira,  repletos de flores, muitas flores!...
    Alberga o maior lago de água doce da Europa, visto que, estando no sopé dos Picos, recolhe a água do degelo dos glaciares das montanhas.
Esta viagem começou, se bem me lembro, por causa das "linhas paralelas" ou não....Quanta loucura!!!

Sim, porque ela termina exactamente num ponto de encontro, em que segundo a lenda medieval, convergiam todos os caminhos, as estradas, que de qualquer ponto do Mundo, levavam os "caminheiros de Santiago", até à Basílica para orar.
Munidos exclusivamente de um bordão,  de uma concha para beberem água das nascentes e de uma cabaça,  em sinal de pobreza e despojamento, calcorreiam a pé todos os caminhos que os separam da Basílica.

São por isso chamados os "caminheiros de Santiago"...

É NESTE ESPÍRITO QUE O CAMINHO NÃO É UMA PROVA DE VELOCIDADE,  OU DE DESTREZA FÍSICA...MAS ANTES, A PROPOSTA DE UMA CAMINHADA INTERIOR, COM ESPAÇO PARA O CONVÍVIO, DIVERSÃO E LAZER!...

E AFINAL EM QUE É QUE FICAMOS QUANTO AO PARALELISMO  DAS LINHAS??!!.....RSRSRS

Anamar 
 

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

"ÍCONES DOS LOCAIS..."

















AS GENTES FAZEM OS LOCAIS, COMO OS LOCAIS FAZEM AS GENTES....

ESTE ESPÓLIO FOTOGRÁFICO QUE AQUI DEIXO, PERTENCE A "BOCADINHOS" DE MUNDO, POR ONDE JÁ ANDEI...

CADA UM TEM UMA "ESTÓRIA", UM SOM, UM CHEIRO...

DE PORTUGAL A PAÍSES COMO A TAILÂNDIA, AS MALDIVAS,  A JAMAICA, STA. LUCIA, TURQUIA,  CADA PEDAÇO DE CHÃO ME MARCOU A SEU MODO...O DELES...

MAS TODOS, SEM EXCEPÇÃO,  ME DEIXARAM MUITAS,MUITAS SAUDADES...

HOJE, QUE A INSPIRAÇÃO É PARCA, RESOLVI DAR A "MINHA" VOLTA AO MUNDO!...

ANAMAR

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

"FUCK 2009..."


Fui ao Saldanha ver um filme, para queimar horas em que não estou a dormir.
Nós pensamos que mudando os locais, os hábitos...mudamos tudo...mas não é verdade; tudo está grudado em nós, que nem pastilha elástica em assento de cadeira, e tudo vai sempre de "mochila", para onde quer se acredite que fujamos...
Como sabem, os cinemas têm normalmente expositores com a mais diversa propaganda, na forma de "postaisfree". Às vezes acho-os giros e tiro dois ou três, pensando dar-lhes um grande destino...Normalmente acabam no lixo. Mas desta vez, não pude deixar de trazer um, que em letras garrafais tem apenas "FUCK 2009".

Eu tenho no meu quarto, que aliás era um quarto  ocupado pela minha filha mais nova, um placard com fotos e outras pequenas coisas que têm história...
Desta feita, o postalfree, está lá bem pregado, evidenciando para a minha memória futura, um ano a não esquecer, um ano em que tudo me aconteceu...um ano, que em vez de ser de "arrumação" mental, foi-o de anarquia total (receio que irreversivelmente...) !

Os anos sempre pagam a factura com que as pessoas, de acordo com as suas histórias de vida, os apelidam.
Há anos bons e há anos terríficos, e obviamente que os que são bons para uns, não têm que ser bons para outros. Mas, efectivamente (claro que tudo é relativo), como é de mim que eu sei, poderei dizer com algum gozo: "FUCK 2009"!!...

Terminou a 31 de Dezembro para todos, mas para mim terminou com um 31  de Dezembro especial.
Dei entrada na CGA,  com o requerimento para a aposentação antecipada, que é algo que me apavora...
Dirão: "então se a apavora por que a pediu? Parece um grosseiro contrasenso", não é verdade?
Mas infelizmente não é...É que os "estragos" feitos, já eram de tal monta, que não me deixaram escapatória possível!...

Tenho falado com colegas (imensas) que também a pediram, e outras que até já deixaram a escola, pelos motivos exógenos, criados, como sabemos, pela gestão demolidora que foi feita à história da Educação, neste país.
Algumas diziam-me ter sido um dia "estranho", terem sentido uma sensação esquisita, aquilo que vivenciaram no dia em que deram entrada com a petição, no Ministério...
Eu, esperava qualquer coisa desse género da minha parte, juro, ainda por cima, da forma como eu me ligo e prendo afectivamente e emocionalmente, a tudo o que constituíu a minha vida.
Mas não...estranhamente, ou não, fiquei e estou perfeitamente amorfa, de um indiferentismo que me preocupa.
Parece que fui requerer tudo, menos o que conduzirá a uma viragem tão importante e determinante, na minha vida...

Há anos atrás, uma médica e amiga, com quem fiz psicoterapia uns três ou quatro anos, dizia-me com frequência: "Prepare a sua aposentação! Não deixe isso ao acaso, porque não lhe será benéfico!..."
Talvez eu quisesse negar a aproximação de algo, conotado com tantas outras coisas que me magoam, mas eu sei do que ela falava, e neste momento particular da vida, em que por razões de saúde psicológica, me isolo em casa, e a tendência é esticar mais e mais o período em que estou na cama, em que a vontade é não me arranjar...é deixar correr...(a tal política da "terra queimada", de que falava no último post), lembro com toda a acuidade as palavras dela...

Interessante   eu   abordar exactamente este aspecto, e   aqui no café onde estou a tomar o pequeno almoço ( 4,40 h da tarde) , veio cumprimentar-me uma ex-colega (porque essa já saíu da escola há alguns anos), e que me falou do tempo que tem agora para fazer as coisas que queria. Gosta das coisas que inventa; passear a pé nesta terra desinteressante (se calhar a páginas tantas só eu é que a vejo desinteressante mesmo!...), serve-lhe de distracção;  faz ginástica quatro vezes por semana às 9 h da manhã, para "despertar", como ela diz, lê muito, e arranja sempre o que fazer...
Está, portanto, em paz e muito feliz por esta sua nova vida.
É uma mulher dos tempos actuais, tem uma postura de vida e uma imagem rigorosamente nada "demodées",
pelos poros expira determinação, equilíbrio, realização pessoal...
Como a admirei e a invejei...no bom sentido, óbvio!...

De facto, por todos os motivos e mais alguns, eu não posso, não devo ficar em casa...só que não tenho e nem sei o que fazer, para alterar a situação.
E por tudo isso, também  de dia para dia, a deterioração pessoal, vai aumentando. Sinto-o perfeitamente e continuo sem capacidade de reacção...

2009 terminou, 2010 está aí......e eu, não sei bem onde estou.........

"FUCK 2009".........ou será mais correcto......."FUCK ME" ?......

Anamar

sábado, 2 de janeiro de 2010

"A GARE DAQUELE COMBOIO..."





Tenho duas hipóteses para resolver a minha vida...ou fico louca de vez ou me suicido...
O "eu" que eu sou, de há alguns anos para cá, sente cada vez maior resistência para se enquadrar. Por exemplo, neste momento, oito e treze da noite, vou almoçar....E porque não hei-de fazê-lo, só porque as pessoas normais almoçam à uma, por exemplo?
Cada vez acho menos interessantes as conversas que se trocam, no balcão do café, no cabeleireiro, as pessoas umas com as outras, sobre coisas que me parecem frívolas e vazias......o mal só pode ser meu!

Provavelmente e sem dar por isso, mercê do estatuto da idade, da solidão, da auto-gestão total, livre arbítrio completo e ausência de dependente e/ou dependências, fui anarquizando, quase sem dar por isso, a minha vida e os meus dias....

A verdadeira "política da terra queimada", é o que estou a implementar dia a dia à minha vida, exactamente de acordo com o grau de importância que lhe atribuo. Não consigo reverter nada, simplesmente porque não sinto que me valha a pena....porque não tenho metas ou objectivos reais!
É semelhante àquele indivíduo a quem foi diagnosticado um cancro de pulmão e continua a fumar, num encolher de ombros de quem sente que...agora...já tanto faz!...

De fora, as pessoas chamam a isto de egoísmo, loucura, imbecilidade...
Eu já não me preocupo nem com as conotações que lhe atribuam ou atribuam a mim mesma...estou-me "nas tintas"...
Às vezes receio que o crescendo deste estado objectivo de vida, seja absolutamente deslizante...e quando der por mim, já passei a fronteira ténue que todo o ser humano comporta, entre o considerado "normal", e o que pode atingir consequências graves, prioritariamente para a minha pessoa...
Por vezes interpreto tudo isto como uma intencionalidade subconsciente, de auto-agressão ou auto-punição, tão pouco eu gosto de mim mesma...

Talvez tudo isto esteja já na esfera da patologia...provavelmente!

Tenho a sensação que estou numa gare de comboio, apenas à espera que o comboio passe e nada mais....
No fundo, se calhar, sem dar por isso, tornei-me semelhante aos utentes dos bancos da minha praceta, que sem o saberem (e ainda bem para eles), estão simplesmente numa sala de espera da vida!...

De qualquer modo, e os vectores e as vertentes são de tantas ordens (logicamente só eu as conheço todas),
que, de alguma forma, talvez não seja totalmente insana, esta minha forma de sentir as coisas!...

Anamar