domingo, 29 de janeiro de 2012

" O UIVO DO LOBO "


O céu estava escuro ... não se via uma só estrela.
Podia dizer-se que era uma noite de breu, não fora aquela imensa bola, prenhe de luz, que iluminasse o recorte da mata, junto à casa.

Cá dentro, era apenas a luz da lareira ainda acesa que iluminava a penumbra da sala.

Íngride "cutucava" as últimas brasas do lume, para as "espertar".
Adorava aquele pedaço de dia / noite, em que naquela cabana da montanha, feita totalmente da madeira dos pinheiros, abetos e faias que a rodeavam, se fazia finalmente silêncio, e a paz reinava.
Todos já haviam ido dormir.
Ali, estava só ela, a luz difusa das últimas chamas bruxuleantes, um CD a tocar como que "ao longe", os seus pensamentos, as suas reflexões.
Normalmente, nessas noites de silêncio e paz, de ausência de "vida", a sua, costumava desfilar-lhe, feito um filme que deslizasse lentamente frente aos seus olhos.

Era uma noite de lua cheia, daquelas em que, sendo noite cá dentro, reinava uma poalha clara, que inundava toda a floresta, e a montanha por detrás da cabana.

Íngride sabia de cór aqueles sítios.
Poderia caminhar lá fora agora mesmo, que traria no cesto as mesmas braçadas de flores silvestres que colhia durante o dia.
As bétulas, os mirtilos, azevinhos, amoras silvestres ... os musgos, os líquenes, sabia-os à volta da casa, ladeando os caminhos da mata.

A montanha ainda guardava os gelos perpétuos, do Inverno rigoroso da Noruega, que cobre tudo com as neves que sempre lá ficam, ano após ano, mesmo sendo já Março, e os dias amanhecendo claros e luminosos.
As sombras dos abetos, dos pinheiros , das faias e dos carvalhos, adensavam-se à medida que a montanha subia.

Íngride sempre os ouvia nestas noites.

O seu uivo territorial, ecoava no silêncio da madrugada.
Os lobos sempre uivam à lua cheia.  É um cântico ou um choro ... é algo mítico, com uma magia própria ... uma canção inacabada ... uma dor não descrita.

Desde criança, quando subia à cabana para passar algum tempo, que "convivia"  inevitavelmente com a sua presença .
Ela não os via, mas sentia-os claramente . Havia uma "cumplicidade" entre ela e eles, uma conivência, uma familiaridade.
Eram presenças mágicas na sua cabeça, desde as histórias infantis , e habituara-se a amá-los e a respeitá-los ...
Março era época de acasalamento. Os machos alfa delimitam território e escolhem fêmea.
Os lobos acasalam para toda a vida . Têm um sentido gregário e familiar poderosíssimo, e isso também a fascinava . Os lobos, também nisso ensinam os humanos ...

Colocou um xaile de lã sobre as costas, abriu mansamente a porta da cabana para que não rangesse nas dobradiças, e esgueirou-se pela noite gélida, lá para fora .
As sombras envolviam tudo e envolviam-na também, e a luz daquele imenso luar, projectava-lhe uma sombra agigantada e fantasmagórica, no caminho.

Íngride teve sempre, sem o perceber, uma relação estranha com a lua cheia. Eram duas "mulheres" que se "entendiam", que se "desafiavam", que se "provocavam".
Vieram-lhe à memória as histórias contadas entre dentes pelo povo, dos homens que nas encruzilhadas, viravam lobos, em noites de lua cheia, para só voltarem à condição de humanos quando o dia raiasse ...
O "lobisomem" é uma figura da mitologia, que atravessou gerações ...

Apoiou-se displicentemente na cancela, e ficou simplesmente ali, estática, a "escutar" o silêncio, a ver o fumo que ainda saía da chaminé da sala, a deixar-se inundar por aquele clarão, que tornava a noite em dia, e "sentir" no cimo do monte, a presença deles ... os reis da floresta ... e o seu "choro" ou o seu "grito", lançado lugubremente à lua ...

Em criança, a sua avó, também à lareira, também numa noite como essa, também naquela cabana de gerações, contou-lhe a lenda do "uivo do lobo", em noites de lua cheia.
Era uma história tão linda, tão comovente e tão enternecedora, que jamais a esquecera ...

Segundo a lenda, em tempos remotos, um lenhador e sua mulher viviam junto a uma floresta.
Haviam tido uma filha linda, tão linda, que decidiram preservá-la de qualquer contacto humano, por receio que pudesse ser raptada, coisa que os senhores poderosos costumavam fazer nessa época.
Assim, a jovem cresceu no estrito convívio de seus pais e dos animais da floresta, que amava por demais.
Sempre que alguém se aproximava da casa, corriam a trancar a filha numa cave, que haviam construído para esse fim.
Inevitavelmente nestas coisas, há um dia em que elas falham ...
E um dia, com os pais atarefados e distraídos, um jovem pastor aproximou-se da casa deles, e encontrou a menina no quintal.
Por seu lado, pela primeira vez, ela viu um rapaz da sua idade.
O espectável aconteceu, e apaixonaram-se um pelo outro.

A moça, cheia de avisos e reprimendas dos pais, sobre o deixar-se ver por alguém, correu a esconder-se, não sem que antes, os olhares trocados entre eles, deixassem uma promessa muda.
O tempo foi passando, e sempre arranjavam oportunidades para se verem e falarem, sem que os pais dela se apercebessem.
Como a situação se tornava cada vez mais insustentável, o pastor encheu-se de coragem, e foi falar com os pais da menina, pedindo-a em casamento.

Irritados e desgostosos pela desautorização havida, reagiram muito mal,  e resolveram castigar os dois namorados.
Disseram ao pastor que voltasse à noite, para ter a resposta, e como a mãe da menina era conhecedora dos poderes e segredos de todas as plantas da floresta, preparou uma infusão com poderes de encantamento.
Bebendo-a, o rapaz transformar-se-ia num animal da floresta, e dessa forma separavam-no da sua filha.

Assim foi.

À noite, quando o pastor voltou, ofereceram-lhe a bebida, dizendo ser um licor caseiro por eles preparado, e logo ali ele se transformou num lindíssimo lobo, que desesperado, fugiu.
A menina, contudo, da sua cave vira pelas frinchas das tábuas o que acontecera ao seu amado, e mal os pais a libertaram, sem que tivessem tempo para a impedir, bebeu o resto da poção mágica, na esperança de se juntar ao seu amor.

Apenas o feitiço produzido no rapaz não foi igual para a menina, e esta transformou-se ali, numa imagem fugaz, semelhante a um raio de luar.
Brilhou por momentos, e logo que algumas nuvens cobriram a lua, desapareceu.
Entretanto o lobo encantado que voltara para perto da casa,  soube o que havia acontecido à sua amada, lançando então um atormentado grito de dor, desespero, saudade e tristeza ... um uivo doloroso que ecoou por toda a floresta.

E é por isso que, desde então, os lobos uivam ao luar.
Julga-se que o encantamento nunca foi desfeito, pelo que, cada vez que um lobo uiva à lua, há um raio de luar em forma de mulher, que o vem banhar de luz ...
E os amantes, acabam assim, por se reunirem de novo, em cada noite de lua cheia, e por toda a eternidade ...

Íngride não deu pelo correr do tempo, mergulhada que estava no seu pensamento.
Também não deu pelo entorpecimento álgido que lhe tomara o corpo, pelo frio atroz da noite ...
Igualmente não se apercebeu, que também nessa noite as nuvens subiram no céu e cobriram a lua ...

Apenas despertou do "torpor" mágico que a dominava, quando bem à sua frente, na clareira do bosque junto à cabana, um lobo, um imenso lobo cinzento de olhos doces e tristes, a olhou longamente ...
Era uma figura imponente, era um ser superior ... parecia um ser de solidão e sofrimento ...

Ergueu a cabeça em direcção aos pálidos raios de luar que ainda atravessavam o firmamento escurecido, e de uma forma doída, sentida, desesperada e saudosa, lançou um uivo doloroso e profundo que ecoou por toda a montanha ...

Nessa noite, Íngride não teve mais dúvidas ...

                               
Anamar

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

"O TEMPO PASSOU E ME FORMEI EM SOLIDÃO"

Tentava redigir um post.
Um post com os meus desassossegos, as minhas frustrações, as minhas inquietudes ...
Tentava organizar ideias, encarrilar raciocínios, afivelar conclusões !...
Exactamente em mais um dos exercícios que sistematicamente faço, que sistematicamente cultivo, cultivando exactamente, sem pensar muito, a minha "formação em solidão"!

Mas fui à caixa de correio, deste correio imaginário, sem rosto, sem pena, sem envelope ou selo.
E fui brindada, pela bondade de uma amiga, com este "estrondoso" texto, que de imediato me "obrigou" a parar a pequenez do meu relambório, para partilhar convosco a grandiosidade de todo o realismo, ternura, saudade mesmo ... porque de facto, era exactamente assim ... e de repente me vi naquela sala, na soleira daquela porta !

E de repente também, me senti velha, gasta, desiludida, saudosa, melancólica mesmo ... e pensei como foi possível ter deixado passar por cima de mim, tanto do tanto que ficou lá atrás, e já quase esquecemos por desábito ?!...

No tempo em que ainda, de facto, não nos "formávamos em solidão" !!!...

-" Vamos marcar uma saída.... -Ninguém quer entrar mais."

"O TEMPO PASSOU E ME FORMEI EM SOLIDÃO" 

José Antônio Oliveira de Resende - ( Professor de Prática de Ensino de Língua Portuguesa, do Departamento de Letras, Artes e Cultura, da Universidade Federal de São João Del-Rei/MG ).

Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. 
Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite. 
Ninguém avisava nada, o costume era chegar de páraquedas mesmo. E os donos da casa recebiam alegres a visita. Aos poucos, os moradores iam se apresentando, um por um. 

- Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre. 

E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão dos meus irmãos. Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia. 

- Mas vamos nos assentar, gente. Que surpresa agradável! 

A conversa rolava solta na sala. Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre. Eu e meus irmãos ficávamos assentados todos num mesmo sofá, entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. Retratos na parede, duas imagens de santos numa cantoneira, flores na mesinha de centro... casa singela e acolhedora. 
A nossa também era assim. Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes. 
Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha - geralmente uma das filhas - e dizia:

- Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa. 

Tratava-se de uma metonímia gastronômica. O café era apenas uma parte: pães, bolo, broas, queijo fresco, manteiga, biscoitos, leite... tudo sobre a mesa. 
Juntava todo mundo e as piadas pipocavam. As gargalhadas também. 

Pra quê televisão? Pra quê rua? Pra quê droga? A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança... Era a vida respingando eternidade nos momentos que acabam.... era a vida transbordando simplicidade alegria e amizade...
Quando saíamos, os donos da casa ficavam à porta até que virássemos a esquina. Ainda nos acenávamos. E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. 
Era assim também lá em casa. Recebíamos as visitas com o coração em festa... A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, também ficávamos, a família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos... até que sumissem no horizonte da noite. 

O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão, vídeo, DVD, e-mail... Cada um na sua e ninguém na de ninguém. Não se recebe mais em casa. Agora a gente combina encontros com os amigos fora de casa: 

- Vamos marcar uma saída!... - ninguém quer entrar mais. 

Assim, as casas vão se transformando em túmulos sem epitáfios, que escondem mortos anônimos e ossibilidades enterradas. Cemitério urbano, onde perambulam zumbis e fantasmas mais assustados que assustadores. 
Casas trancadas.. Pra quê abrir? O ladrão pode entrar e roubar a lembrança do café, dos pães, do bolo, das broas, do queijo fresco, da manteiga, dos biscoitos do leite... 

Que saudade do compadre e da comadre!

Anamar

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

" ELES NÃO SABEM NEM SONHAM ".....


Hoje acordei meio "desconchavada" ...

Sabem quando se acorda com uma sensação incómoda de uma tristeza que vem não se sabe bem de onde, vem lá do fundo dos sonhos, daqueles que nos fizeram companhia de noite??!!...

São meio "safados" esses sonhos !

A gente deita-se, "programa-se" para sonhar com isto ou aquilo, que seria "baril", e pimba ... trocam-nos as voltas, azaram-nos a noite, com "filmes" completamente diferentes.
Personagens que não chamámos, cenários que inventámos e se calhar nunca vimos ... deixam-nos uma sensação estranha de insatisfação e  desconforto.
E ainda por cima, deixam a sensação, e põem-se "a milhas" !
Queremos fazer reprises, tentar perceber aquela "gaita", e eles já foram ...

Porquê acordar assim??

Não sei, não faz sentido, é bizarro e não temos com quem refilar !
"Pufft" ... evaporaram-se no espaço, e a gente que se amanhe com a tal sensação de coisa não resolvida, mal resolvida, que a noite não nos conseguiu resolver ...

Os  "sonhos de dia", são mais fiáveis, mais compinchas !!!
A esses, só vamos se nos deixarmos ... ir ... claro !
Esses, às vezes são um pouco controláveis, mesmo para os mais inveterados que nem eu, que estou sempre muito mais no mundo deles, que no nosso, tão insatisfatório !

Mas a esses conseguimos apresentar-lhes o sinal de stop, o cartão vermelho, se não nos agradam, se tentam driblar-nos ou manipular-nos a vida, feitos "filhos da mãe" !
A esses só aderimos se formos "crentes", ingénuos ou teimosos !

Às vezes, com muita sorte, conseguimos convencer um  "sonho de dia" a passar a ser um  "sonho de noite" ... e aí, é um paraíso, porque pelo menos acreditamos estar a vivê-lo, durante as horas do aconchego ...
A "droga" depois, é o acordar !!!

Revemos quem partiu, quem está longe, quem queremos abraçar, quem queremos que nos estreite ao coração ...
revemo-nos a brincar outra vez no pátio da escola, a namorar com todos os amores que afinal ainda não estavam no "banco dos suplentes" ...
podemos nascer outra vez, ser o espanto da nossa "paróquia" ... sermos o máximo, a viver o que nunca julgámos possível ...
tudo à séria ... tudo de carne e osso ... tudo ao vivo e a cores ...
Entramos no país das maravilhas, pela mão de fadas e duendes !
Invertemos a marcha do tempo, a nosso belo prazer, e de repente ... passamos a acreditar, que a noite se fez dia, num passe de mágica !!!...

Mas também podemos fazer o inverso ;  brincar com um  "sonho de noite", arrastá-lo até de madrugada, de mansinho, para não o espantar, e tentar convencê-lo que de dia é que é bestial !! E que de dia é que ele nos daria um jeitão ...

É mais difícil ... mas não impossível ... e se o enganarmos, excelente !! ...

Eu, que não sou totalmente "aparafusada", acontece-me  ter que saltar da cama a meio da noite,  para por no papel, aquela composição que "escrevi", arrumadinha, no sonho com que estava ...
escrever aquele poema ou aquela dedicatória do livro, que estava a sair tão bem rimada ou tão eloquente ...
ir a correr resolver um exercício de matemática (quando era estudante), só porque em sonhos, aquele "estrupício" que me queimara ingloriamente os neurónios, de repente teve um final feliz, bem simples, mesmo ali debaixo do meu nariz ... em sonhos ...
E também , encontrar saída, para tanta estrada, "sem" ...
E encontrar soluções para objectivos apenas esboçados ...
E sufocar-me de energia e entusiasmo, só porque era exactamente aquele o rumo que teria que ter dado já à minha vida, e ainda não o havia divisado !!...

Esses são os  "sonhos de noite", que ainda têm algum préstimo ; porque na verdade, normalmente brincam connosco de gato e rato, e  "defraudam-nos"  noite após noite, porque são apenas isso ... sonhos de  " não valer a pena", "sonhos de enganar" !!!...

E depois ... também há a ausência de sonhos !!!

Esse, é o "buraco negro" da nossa existência, seja de dia, ou seja de noite !... Aí , é uma desgraceira só !!!...
Porque, como sabem, "o sonho comanda a vida", e um Homem sem eles, não sabe nem imagina, a pobreza do seu existir, a aridez dos seus dias, o imobilismo a que condena o Mundo, que deixará de "pular e avançar", segundo o nosso imortal Gedeão !!!

Mas, sejam  "sonhos de dia" ou  "sonhos de noite", não devemos esquecer de facto, o sentido da charada ...
  
     ..."FÁCIL É TER UM SONHO !...  DIFÍCIL É SONHAR" !!!...


Anamar                   

domingo, 22 de janeiro de 2012

"E A MINHA TERRA LÁ TÃO LONGE !"...

"Em Janeiro, vai e sobe àquele outeiro ... Se vires verdejar, põe-te a chorar ... Se vires terrejar põe-te a cantar"!

No meu Alentejo, e com este Janeiro pródigo em dias claros de céu limpo e sol brilhante, de certeza já "verdeja" !

Desafio-vos a interpretar mais um dos ditados, dos noventa anos da minha mãe .
Às vezes penso que devia escrevê-los ... Qualquer dia acaba-se!

Bom, eu por aqui e na minha vida, vejo muito mais "terrejar" que outra coisa.
Cá estou, na janela onde o sol ainda bate, cá estou a fumar outro cigarro ( devo estar a candidatar-me a mais uma dor de cabeça ), cá estou com o meu "farrusco" reguila lá em baixo, de olhões virados cá para cima ( estou a achar que ele já me adoptou companheira de solidão ), o plátano e as "minorcas" vizinhas, continuam desoladamente despidas ... e no céu provocantemente azul, a minha gaivota "baldou-se" !
Afinal, para gaivota, isto ainda é tempo de época balnear ... na boa!

O meu Alentejo deve estar lindo !
Os verdes que despontam, os ocres e os castanhos da terra ainda sem frutos, as oliveiras, sobreiros, azinheiras, do meu imaginário, por lá continuam ... Breve, breve ...o dourado das mimosas engrinaldará a paisagem.
Nunca me "deixaram" ter uma mimosa, quando podia !  E eu adoro a cor, a singeleza e o aroma das suas flores !
De certeza, mais dia menos dia,  as cegonhas estarão  a regressar. Os postes eléctricos, o cimo da copa das árvores ... alguma chaminé de um monte perdido, as aguarda !

                                                                                                  

Agora, os campos enchem-se de azedas, murtas, giestas, rosmaninhos e alecrins a anteciparem a Páscoa ... mas ainda de boninas, dentes de leão, chupas-mel, dedaleiras, lírios, boquinhas de lobo, urze ...talvez papoilas ...
Tudo grátis, tudo extraordiariamente oferecido, por uma Natureza esbanjadora e generosa !

Que saudade, de quando, de braçada as trazia p'ra dentro de casa ... de quando o cheiro das "maias" inebriava o ar, e nos fazia crer que a Vida era assim, exactamente assim ... simples, fácil, leve !

Ou será mais saudade da que eu era ?? ...
Ou melhor, saudade mesmo, acho que era dos sonhos que eu tinha, isso sim  !...

Hoje, o betão sufoca-me ...
Hoje, a ausência de horizontes lá longe, onde até a construção me escondeu a Pena, impedindo-me de sonhar ... deixa-me mais desfalcada, mais vazia ...
Hoje, com este sol que mendiguei aqui de cima  ( e já está a querer desaparecer por detrás das barreiras em que o Homem o confina ), com um vazio estranho a tolher-me, e uma solidão a amarinhar-me ... fui inevitavelmente lembrar o meu Alentejo,  o "útero" com que a Vida me presenteou, a "casa" onde sempre gosto de chegar, o "ninho" onde me enrosco, em dias assim, como o de hoje, em que só verdejou e floriu na minha imaginação !!!...


                               
                                                                            
                                           
Anamar

sábado, 21 de janeiro de 2012

A CULPA É DA " FUNDIÇA " !...


Obviamente que estou de "fundiça" !

E obviamente que estou de "fundiça", porque é sábado, e mais ... é sábado com sol !
Passo a explicar :  já adorei os sábados, adoro o sol ; hoje odeio os sábados, e muito mais sábado ensolarado !
Neste momento, para mim, sábado que se preze tem que estar de chuva !

"Fundiça" ... mais uma "herança" familiar, para me fornicar os miolos ;  já a procurei exaustivamente, em tudo que foi sítio. "Ninguém" me disse do que se tratava ...
" Quando chove ao domingo em hora de missa, temos toda a semana de fundiça"...
" Não há sábado sem sol, nem domingo sem missa, nem segunda sem fundiça"... Bolas, toda a vida ouvi, e só pode ser ... "alentejanês" !!!...

Resolvi que isto estava a ser demais, e portanto tinha era que ir apanhar os últimos raios do dito ( nem que me banhassem só até à cintura ), na minha janela das traseiras.
As minhas traseiras dão, como sobejamente já aqui referi  ( em visão que se estende no espaço ), para o casario insípido e incaracterístico de uma terra que também o é !!  Em visão próxima e imediata, para os terraços dos prédios, meu e vizinhos.

Esses terraços, em tempos, eram habitados por gatos vadios, daqueles gatos à séria, não os "gatos de plástico" que criamos nos nossos apartamentos.  Havia dezenas de exemplares.
Eu, do meu sétimo andar, perdia-me a segui-los com o olhar, nas suas rotinas de companheirismo, familiares e de clã.
Deitava-lhes pedacinhos de comida, à "surrelfa" da vizinhança, claro ... ( "Não se deve alimentar animais da rua" !!! ...  Azar!! ).
Janeiro era o mês deles, como se sabe ...
Pelas madrugadas não havia paz, nem aqui no sétimo, porque os rituais de acasalamento eram de tal forma pornográficos, que assombravam o sono de qualquer um ...

Sumiram, de repente.  Ainda gostava de saber porquê.

Hoje, constatei que existia um "filho pródigo", um único, prevaricador, todo preto, placidamente sentado lá em baixo.
Não sei porquê, olhava cá para cima, e eu só divisava naquela mancha negra, dois "berlindes" claros e espertos !

Nos terraços havia e há pombos ... muitos pombos ! ( também ... onde é que não há pombos neste momento ??!! )
Pois bem, também os gatos já não são o que eram, pensava eu ...
Afinal, gato vadio, presumivelmente é gato esfomeado e a viver de caça ... suponho.
Pois bem, estes pombos dançavam um sapateado desafiador, a um metro dos bigodes do meu "reguila" farrusco, e apesar de eu o "animar" cá de cima, entre dentes ... "Vai ... vai-te a eles ... é agora !!..."  o "esparvoado" nem se mexia ...
Tudo absolutamente em paz ! Decididamente ele não era gato para grandes "stresses"...

Nas minhas traseiras também há um plátano idoso, e mais duas árvores minorcas.
Como consequência, na Primavera, montes de passarada !  Pois agora, Janeiro a decorrer, o plátano sem folhas nas ramagens, e as outras duas completamente despidas, não albergam "vivalma".  Uma desolação !!!

Resolvi fumar um cigarro, talvez dois ...
Como estava de "fundiça", tinha que me compensar de alguma maneira.
E fumar era assim uma espécie de "partida", que eu pregava não sei bem a quem ... uma provocaçãozita ao que deveria logicamente fazer, que era não fumar ... óbvio !
Mas sossobrei e consumi efectivamente um cigarro, e com isso, ganhei por desígnios do "Arquitecto" ... uma dor de cabeça que me dissuadiu do segundo.

Por "Arquitecto", continuei eu a pensar ... Sim, porque de vez em quando eu penso ... (rsrsrs)

A actualidade informativa neste momento, virou os "holofotes" para o grande "assunto" nacional - a Maçonaria!
Escalpelizam-na, acusam-na, defendem-na ... levam até os mais desatentos, a informar-se sobre ...

Pois bem ... Há amores que correspondem a verdadeiros acordos maçónicos entre as pessoas.
Maçonaria temos muitas vezes em círculos mais particulares e restritos, em micro-universos, sem que nos apercebamos, ou o analisemos por essa óptica.
Repare-se :  há amores secretos, sigilosos, vividos entre quatro paredes, em verdadeiros "Templos", sem fuga de informação ... sem conhecimento exterior ...
Há amores vividos em rituais distintos ... os rituais desses amores !
Não têm compasso nem esquadro, como simbologia própria ... mas podem ter por exemplo rosas e cruzes ... Rosas ... o "Homem das rosas" ( lembram-se ? ), teve como ritual oferecê-la no fim da história, como símbolo de alguma coisa, à Maribel ... a tal menina sortuda, do portão !!
Cruzes ... é o que não falta por aí, mesmo nos amores !  Eu própria carrego várias, algumas bem pesadas !

Depois, amor é solidariedade, cumplicidade, entreajuda incondicional ... Maçonaria, também ... dever de fraternidade, liberdade e igualdade entre os "irmãos" ... tal como nos grandes amores ...
O aperfeiçoamento, a melhoria pessoal e do par ... o comportamento impoluto e irrepreensível ... também valores comuns.
Devem limar-se arestas todos os dias, tal como na Maçonaria se "parte pedra" ...
O triângulo representando o passado, o presente e o futuro ... são também óbvios.  Todos os amores têm passados e presentes ... e um futuro, é desejável ... 
É o símbolo da tripla Força indivisível e divina que se manifesta como Vontade, Amar e Inteligência cósmicos.

E poderia continuar por aqui abaixo a encontrar semelhanças entre os "assuntos" que desencantei ...

Mas não traria nada de novo, se pensarmos que afinal ambas as situações, correspondem a acordos, tratados, aproximações e encontros de pessoas com ideias próximas, ideais comuns, vontades em consonância ...
se pensarmos que ambas as situações, são associações de indivíduos, que em última análise, perfilham a melhoria, tendem a expurgar as "nódoas" sociais, lutam por aperfeiçoamentos do Homem como pessoa inteira e livre, para com os seus semelhantes, em sociedade ... pugnam por princípios colectivos louváveis e defensáveis, independentemente de quaisquer outros vectores exógenos, sejam eles ideológicos, religiosos, políticos ou de descriminação económica ...

Enfim ... e agora que o sol já foi embora, concluo que os pensamentos também são como as "cerejas" ...

E por tudo isto, a culpa é, como já perceberam, exclusivamente ... da "Fundiça" !!!...
                            

  Anamar

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

" COMO É QUE SE FAZ ? "


Ontem Ary dos Santos fez parte do meu espaço.

Nem sempre este lugar é apenas um lugar exclusivamente pessoal, de reflexões e sentires meus.
Sempre este lugar é um lugar de divulgação e partilha de tudo que considero válido, seja meu, seja de outrem, desde que importante, desde que me faça sentido.

Hoje trago outra figura nacional, da nossa literatura, sobejamente conhecida e referenciada, creio que por todos : Miguel Esteves Cardoso, vulgo MEC.

Não conheço cabalmente a sua obra publicada ; conheço-o por me "cruzar" com ele, em crónicas avulsas, que publica em colaboração noutros espaços.
De qualquer forma, a ideia que tenho formada sobre a sua escrita, é de que é sempre uma escrita "aberta", clara, picaresca, algo controversa, desassombrada, quase sempre provocatória ... aquela pedrinha que jogamos à água para ver as ondinhas que se formam, ou aquele elemento que numa reunião levanta intencionalmente uma questão polémica, para que os espíritos se agitem.

A sua postura na vida, em sociedade, creio também corresponder a este registo.
É uma figura não acomodada, tem uma visão curiosa e segura do que expõe ...a sua ironia inteligente, sempre cirúrgica ...

O texto que aponho neste meu post, impressionou-me particularmente.
Ao lê-lo, a minha identificação com o escrito foi de tal ordem, que quase existiu uma "promiscuidade" de sentires, entre mim e ele.
Dei por mim, linha por linha, a dizer em surdina : "eu teria escrito isto" !...  "bolas ... exactamente a expressão do meu pensamento" !...

Parecia tão simplesmente, que eu era ele e que ele era eu !

Para lá dessa razão, e àparte este aspecto particular que refiro, considero o artigo digno de uma leitura atenta, isenta ... digno de uma apreciação ponderada ...

Leiam com os olhos, mas sintam com o coração !!!...


"Como é que se Esquece Alguém que se Ama?  

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.
É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.
Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.
Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.
O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.
"

Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'


Anamar

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

"SÓ PARA QUE NÃO ESQUEÇAMOS"....


Teoricamente hoje não postaria nada.

Ainda se "digere" o post de ontem ...
Contudo talvez por ele, também por ele, trago-vos este espectacular, quanto sentido, poema do Ary,

Ary dos Santos não poderá  nunca ser  esquecido no coração dos portugueses, independentemente de se identificarem ou não, com o seu "sentir" político.

Antes de tudo, foi um extraordinário poeta ... depois, alguém para quem o sofrimento humano fazia sentido de luta!...


Convosco, e sem demais dispensáveis palavras ... "KYRIE"

Anamar

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

" O PIOR É O SILÊNCIO ..."


" A todos, os pequenos e os grandes, os ricos e os pobres, os livres e os escravos, faz que lhes seja dada certa marca sobre a mão direita, ou sobre a fronte. P'ra que ninguém possa comprar ou vender, senão aquele que tem a marca, o nome da besta, ou o número do seu nome " [ ... ]
        Texto do Apocalipse  13:11 - 18..


O Controle Global, na chamada Nova Ordem Mundial ( nwo ), era, ao que parece, algo premonitório,  já  no conteúdo da Bíblia.
Chamava-se-lhe aí, a "marca da besta".

Neste momento, vários são os países que pretendem estabelecer este novo sistema de identificação e controle dos cidadãos ( entre eles está Portugal, já existe na nossa vizinha Espanha ... )
O "biochip" aguardou clandestina e silenciosamente, nas mentes governativas, a melhor altura de deitar a cabeça de fora, de se impor.
O 11 de Setembro de 2001 deu-lhe visibilidade e total legitimidade, porque se poderia, com o seu implante, combater o terrorismo global, pelo rastreio, controle e catalogação de todos os cidadãos.

Numa abordagem superficial e "soft", a sua aplicação traria vantagens do ponto de vista prático ; pela simples passagem do dedo num scanner, teríamos acesso imediato a entrar em casa sem chave, a não precisar usar dinheiro ( não se correndo o risco de assalto ), não se precisaria usar vários cartões, por nele se concentrar toda a informação ...
Seríamos portanto, totalmente monitorizados por satélite.

Mas ... a que preço ???

A que preço trocamos a nossa privacidade, liberdade e consequente dignidade, por uma marca, um "ferrete", como no gado ou nos animais domésticos ??!!
Os animais são catalogados com o biochip ... e nós ... seremos os próximos a ser catalogados, como animais ??!!

Para quê?

Para sermos controlados totalmente 24 sobre 24 horas, via satélite, localizados, visionados e devassados até na nossa própria mente ??!!...
Ser escutado o nosso pensamento ??!!... ( Um Instituto de Pesquisas, concluiu que palavras subvocalizadas, formam padrões reconhecíveis ao EEG, passíveis de serem lidos por um computador ).
Com que direito ele pode ser obrigatório, sendo, quem o recusar, socialmente excluído??!!...
Que legitimidade têm os governos, por nós eleitos, para no-lo impor ??!!...

Aligeirando a questão, pegando-a numa vertente humorística, podemos sempre pensar que a sociedade de consumo em que vivemos, de tudo fará, de todo o tipo de artimanhas e aliciamentos deitará mão, para "formatar" os espíritos ...
Assim, as mulheres poderão preferir colocá-lo na testa, na zona do chacra frontal ( o terceiro olho ), bem ao estilo das jóias semi-preciosas exibidas pelas indianas ...
Os homens, como tatuagens ou piercings ...
Os jovens, sempre pioneiros e adeptos das revoluções e inovações, achá-lo-ão suficientemente "fixe" e "cool" ...
Os ladrões, em vez de dizerem : "Dê-me a carteira ou as jóias, que isto é um assalto !!"... dirão : "Dê-me o chip ... isto é um assalto !!"...
Vai ser preferível, consequentemente, assaltar o "chip" dos magnatas ... óbvio !
Estamos com o namorado ... o satélite mostra ...
Estamos na casa de banho ... que chatice !!!...         
As "puladinhas de cerca" dos mais ousados ... vão p'ro "galheiro"... ou aumentam ainda mais os divórcios ...
Os filmes pornográficos deixam de ter audiências ! ... Pois se o "satélite" está no quarto de toda a gente, cada 24 horas !!!  :)
Os profs não podem mais fazer manifestações, porque o satélite mostra ao Crato, quem é quem ...
As reuniões maçónicas só podem ocorrer sob coberturas "anti-satélite", e deve falar-se muito baixinho, p'ra que não haja fuga de informação, e também, já agora, p'ra que não se saiba quem as frequenta !!!...
É provável que vá haver chips de cores, tamanhos e formas diversas ... Armani, Gucci, Dolce e Gabana, Louis Vuiton ... mas também, da feira do relógio ou de Carcavelos, claro !!!
Chips com direito a captação de rádio (para os que curtem um som "nice" ), chips com captação dos berros da criança no infantário (para mães mais ansiosas ) ... ou dos concertos do Tony Carreira no Pavilhão Atlântico (p'ra quem curte essa "onda"....ahahah ) !!!...

Enfim, triste vai este Mundo ...

Mas, parando de brincar, e em resumo :

Os chips humanos, encapotados como convém, em obediência a lógicas importantes, princípios louváveis, pseudo-protecção pessoal e social ... a "bem" do indivíduo, da sociedade, do Mundo ...
As liberdades individuais a serem cerceadas, ali, bem debaixo do nosso nariz ...
Um atentado à dignidade, à privacidade, à independência do ser humano ... e nós a encolhermos os ombros...
Tudo a passar-nos à frente, em surdina, mansamente ... para não despertar atenções, reacções, tomadas de consciência ... para não fazer "ondas" ...
tudo a desfilar e a "mexer",  por baixo do pano, atrás da cortina, ao sabor como sempre, dos interesses gigantescos, dos "lobbies" económicos e inalcançáveis que movem o Mundo, em nome de intencionalidades absolutamente suspeitas e duvidosas ...
O "Lobo" mascarado de "Capuchinho" !

Povos sem cultura, desinformados, gente tradicionalmente amorfa, não politizada, analfabeta em esmagadora maioria.
Gente não interventiva, por ignorância, comodismo, incapacidade organizativa e de militância ... por medo !
Um universo ideal para se implementarem medidas que seriam escandalosamente polémicas, ripostadas, inaceitadas ... se delas se tivesse tomado consciência atempadamente, se sobre elas se tivesse reflectido seriamente, se tivessem suscitado análise e consequente debate de "portas abertas", com transparência e clareza.

Isto, se considerarmos o mundo "dito" civilizado ; porque se pensarmos então numa África, na maior parte das vezes submetida a ditadores "sem prazo de validade", submetida a prepotências intoleráveis, utilizada chocantemente como marioneta num xadrês absurdo e desumano ...

se pensarmos numa Ásia, em que os indivíduos há muito deixaram de ser "pessoas" inteiras e plenas de deveres mas também de direitos, e portanto totalmente fragilizados e sem qualquer capacidade reivindicativa ...

se pensarmos então em zonas do planeta, flageladas por guerras sem sentido, manipuladas como sempre pelos interesses do "Grande Mundo",  destruídas por conflitos que visam a sua "submersão" como nações e estados independentes, em prole novamente dos interesses das grandes potências ... verifica-se que afinal ...

tudo são estratégias concertadas de extermínio colectivo de povos, para supremacia de outros, e busca de hegemonia dos seus potentados, a qualquer preço, com qualquer custo, sejam quais forem o dano e o sofrimento infligidos !

Isto leva-nos a recuos memoráveis na nossa História recente, isto lembra acontecimentos, absoluta e intencionalmente programados, de genocídios em massa, isto exibe o lado mais escabroso, obscuro e selvático do Homem ... isto traz à luz do dia, o MONSTRO que o ser humano encerra em si !!!...

Convem a propósito, que lembremos MAIAKOVSKI ... BERTOLD  BRECHT ... MARTIN NIEMÖLLER  , CLÁUDIO HUMBERTO ...

Porque então, talvez se agitem consciências ... talvez se interiorize finalmente, que o pior de tudo ... é o SILÊNCIO !!!...


                                       

Anamar

domingo, 15 de janeiro de 2012

".... só porque eu sou IMPERFEITAMENTE HUMANA !..."

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Finalmente a chuva !...

Dia cinzento, pardacento, "regado" cá e lá com chuva não muito copiosa, a acompanhar algum frio que desta vez não foi embora.
Como conviria, e porque a tradição ainda é o que era no "reino das gaivotas"... a minha, veio visitar-me, bem roçagante à minha janela ... de asas bem esticadas, deixando-se ir, sem nenhum pejo perante a chuva que caía !

Há três dias que não escrevo. A inspiração tem estado falha.
Eu sou assim mesmo ... os "picos", em tudo na minha vida !

Ontem, numa daquelas noites sem sono, sem vontade de televisão, sem concentração para leituras, deu-me para cometer mais uma incoerência , porque, apesar de me "policiar" efectivamente, de procurar linhas de conduta com princípio, meio e fim, de tentar um logicismo de actuações e posturas, de vez em quando "desvio" a agulha, humana que sou ...

Bolas ... até parece que confesso aqui um crime, que o não foi !...

Defendi, ainda há bem pouco tempo neste espaço, defendo e defenderei  a minha "incompatibilidade" formal com as redes sociais, aqui na Net.
Conheço mais ou menos bem o espírito de algumas, mas acho que de uma forma geral, não são muito diversas umas das outras.  O "princípio" é o mesmo, o "leit motiv" também, a frequência das mesmas pelos utentes, também "grosso modo", por iguais razões.
Não tiro, de facto, uma vírgula a isto !...

Mas não me tentem "engrupir" com argumentos de "pílula dourada",  porque não "descem" ...
Tenho um amigo que participava numa, para "conhecer por dentro o universo feminino" ...
"Comovente" e muito louvável, o princípio em si ... a "eficácia" ... outra, claro!
Tive que me rir, porque eu sou a tal, que há muito já não acredita no Pai Natal ...

Que as redes sociais são um espelho espantoso de realidades sociais e humanas, sem qualquer dúvida !...  Que delas se pode em rigor e seriedade, fazer um brilhante estudo antropológico, quiçá uma "brilhante" tese ... é verdade !...
Só que "isso" é uma desculpa de "mau pagador" para quem as quer frequentar e não o quer assumir, porque objectivamente tecem-se opiniões, tiram-se conclusões, fazem-se conjecturas, mas penso que a opinião geral, resulta simplesmente, de uma mera sensibilidade sobre a realidade efectiva, e que não haverá ( pelo menos que eu conheça ), nenhum estudo sério sobre o "poder milagreiro" das novas tecnologias, nessa matéria.

Pois bem, dissertei, dissertei, andei aqui à roda, à roda, para dizer o quê??...

Tão simples quanto isto : voltei a reinscrever-me no Facebook, este sim um espaço absolutamente inexplicável, um fenómeno social de dimensão e alcance esmagadores ( ilógico, diria ), com uma abrangência incontrolável, com um poder insuspeito ...
Já foi alvo de argumento de pelo menos um filme ( que eu saiba ), origem de debates acalorados que movimentam multidões, suscita estudos sérios sobre as suas consequências, efeitos e distorções nas mentes humanas, nas famílias, nas sociedades.

Pelo Facebook têm passado notícias antecipadas, anúncios de acontecimentos tremendos para a humanidade, promoções pessoais, informações das mais variadas e suspeitas origens (de instituições reconhecidas, a grupos anónimos, a seitas ...), incitações a actividades legais mas também ilegais, divulgação de produtos, ideias, pessoas, movimentos ideológicos, conspirações políticas ... denúncia de temas, ainda que sigilosos ( que fogem às malhas de qualquer rede de controle ) ...  verdadeira modelagem de personalidades ( acredito ), veiculação séria ou não, de informação de uma forma geral ( neste momento, até a calendarização das actividades das instituições, se faz, surpreendentemente, pelo Facebook !!! )

Já estivera no FB e já saíra, há mais de um ano atrás.
Não lhe achei particular piada, apesar de para além de colegas, amigos e familiares, espantosamente de tudo lá haver encontrado em profusão.
Tem uma interactividade meio estranha e algo confusa, parece-me.
Às vezes lembra-me as "conversas de aldeia", das comadres no mercado !
É a rede social com a mais genuína tipologia do "diz que diz", que conheço, da mais abismal "trica-larica" !!

Na altura, frequentava pouco. Era a altura do apogeu da "farmville", em que toda a gente andava louca, a plantar hortaliças, criar gado, transaccionar frutas, comprar "terrenos" para ampliar ... adubar, regar, colher ..
Depois, o restaurante ou o café, com a comida a esfriar, a esturrar, a gelar, a apodrecer ... Oh meu Deus ... pareciam os tempos alucinados do "Tamagoshi" ... e eu não era criança nem nada, nessa "afortunada" época !!! ( "Ganda" lacuna na minha formação !!!  :)  )


Encontrei falta de senso em algumas pessoas, encontrei falta de "saber estar" de outras, falta de "desconfiómetro" (como eloquentemente dizem os brasucas ) ... e mandei aquilo "às favas" ... bati a porta e saí !...

Ontem reabri-a.  Não sei se às escâncaras, se a "meia-haste", se para voltar a fechá-la... Ver-se-á !

Foi mais para "ver", que outra coisa ... mais para brincar ( até o António por lá anda, nos seus dez aninhos, com a mãe a controlar-lhe a senha, claro ), mais para ocupar às vezes, horas de "pasmanço" no PC (que raio de vício esta máquina é !!!.... )... mais ... olhem ... mais por incoerência, afinal, porque "bem prega Frei Tomás ...",  porque não consigo ser "direitinha" sempre, apesar de "partir muita pedra" todos os dias, como diz o Jonas ... e no lavar dos cestos ... não sou mais do que simples e IMPERFEITAMENTE HUMANA !!!...

Anamar

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

"OS PRATOS DA BALANÇA ..."


Este início de 2012 trouxe-me aos miolos e à ponta do lápis, temas polémicos, controversos, quentes, que por tudo isso, têm suscitado "discussões" apaixonadas.

Comecei portanto o ano, não sei se mais para filosofices ... se mais para diatribes, sendo que ambas sempre estão interligadas na minha análise de qualquer assunto, na minha escrita.

Mais uma vez, no post de hoje, me vou focalizar nas relações humanas, relações casal, relações homem-mulher.

Constatamos, e é do domínio comum, o aumento de separações, divórcios, rompimentos, quebra de ligações.
Todos sabemos também, que para isso convergem inúmeros e variados vectores, e sabemos ainda que a "aposta", não é hoje o forte do Homem, no seio de uma relação ...
Já abordei esse aspecto, aqui mesmo neste espaço, lá para trás ... Referi a precariedade dos afectos, a fragilidade dos "fios" emocionais que unem as pessoas.
Correndo o risco de proferir uma enormidade, ou estar a ser demasiado simplista, diria que de duas vertentes depende primariamente a relação humana : o acerto no campo afectivo e o acerto no campo sexual.

No verdor dos anos, na idade pujante ( fisicamente falando ), na idade fértil e biologicamente preparada para o acasalamento, eu diria que o que aproxima dois seres, passa muito prioritariamente pela vertente física.
Assim é no ser humano, assim é no reino animal.
Falam muito alto as pulsões sexuais, são determinantes os estímulos visuais, olfactivos, auditivos, globalmente prima o conteúdo físico, destinado pela Natureza, exactamente para atrair o parceiro.

No reino animal, assistimos privilegiadamente, em programas e séries extraordinárias do National Geographic, a alterações, mutações, alindamentos de ambos os sexos, nas espécies, para os rituais de emparelhamento.
Estamos no domínio do irracional, mas no reino racional, no domínio dos humanos, tudo acontece de uma forma paralela.
Ambos os sexos estão no seu expoente máximo de beleza física, força, capacidades ... são possuidores de todos os dons propiciadores da atracção, são dotados dos "truques" naturais, necessários para garantir a aproximação ao sexo oposto.

Óbvio que este será o registo mais comum, penso. Aquele mais primariamente determinado, por desígnios biológicos.
Porque depois, se agora nos reportarmos apenas à espécie humana, cumprido este primeiro "requisito", e tão importante quanto, ou mais, virá a exigência e a satisfação ou não, do acerto afectivo.

O acerto afectivo entre dois seres, passa evidentemente por um acerto intelectual, cultural, social, ético, a que o ser humano é obviamente sensível.
Da conjunção desse conjunto de requisitos, nasce / nascerá a formação de um casal ou par, teoricamente perfeitos ... Idealisticamente sim, do equilíbrio dessas duas componentes.
Tal desiderato, é contudo, mais teórico que prático.
De facto, é extremamente difícil ou improvável, o alcance dessa referida equidade.
Sabemos que há relações  fundamentadas, alicerçadas e sustentadas, mais por uma, ou mais por outra, dessas componentes.

E as pessoas mais ou menos ajustadas ou felizes, caminham nesse equilíbrio algo instável, e com ele se fazem as Vidas !...

Com o avanço dos anos, e com toda a alteração natural e biológica a que o ser humano é sujeito, atravessados diferentes tipos de estádios físicos, emocionais, intelectuais, culturais, familiares, sociais até ... cada indivíduo começa a "centrar-se" ou a exigir para o seu bem estar físico e emocional, que prevaleça uma das componentes em apreço.

A fase do fulgor físico começa a abandonar-nos, começa a não ser tão determinante a uma realização pessoal e particular, começa a valer mais a pena equacionar o viver dentro de outros parâmetros, aqueles que apresentaram afinal a solidez necessária à manutenção do casal , na travessia das tempestades e terramotos impostos pelos anos.

É a altura em que o "casal" enquanto casal, é reflectido, é reavaliado, é posto à prova ... É sopesado ou devê-lo-á ser, o que realmente terá de prevalecer, o que realmente é na verdade importante e definitivo, para a sua manutenção ... o que é genuíno, quais os valores que o são ( enquanto valores ), o que deverá ser colocado nos pratos da balança ...

Espantosamente ou talvez não, a balança irá pender para o lado do bom senso, do amor calmo e firme  ( substituindo a paixão louca, tormentosa e efémera dos primeiros tempos ), para o lado da cumplicidade, das linguagens comuns, dos interesses comuns, dos afectos reais .
Os corações sobressaltam-se menos, a confiança mútua ( determinada pela ternura, pelo afecto e pelo amor ) traz paz aos espíritos ... O "saber" da partilha segura, traz "calor" à alma !...

Privilegia-se portanto, aquilo que eu chamo de consolidação do essencial .

Nesse estádio, pesem embora muitas e possíveis "solicitações" exteriores, as pessoas dão-se conta de que estão mais selectivas,  dão-se conta de que pôr em risco uma relação duradoura, em favor de algumas "emoções" pontuais, não compensa, e de que magoar ou ferir irreversivelmente o seu par, em função talvez de nada ou de muito pouco, se calhar não valerá a pena ...

Atingiu-se portanto, uma maturidade existencial ...

Será esse reforço de laços, essa partilha séria de afectos, essa cumplicidade entre as duas pessoas, essa proximidade cada vez mais aglutinada num só ser ... que, sendo escolhida, tornará o casal, numa simbiose tão perfeita quanto possível, e fará com que trilhem o caminho sobrante, em aconchego de vida ...

Deixado para trás o supérfluo emocional, foram e vão ser companheiros de jornada, para o bem e para o mal, quando os olhos já não enxergarem direito, quando os ouvidos já tiverem endurecido, quando as pernas já claudicarem ... quando já quase só, forem a sombra um do outro, em que se tornaram ...

Anamar                                

sábado, 7 de janeiro de 2012

"BARALHAR ... E VOLTAR A DAR !"...


"Eu não falhei milhares de vezes. Apenas descobri milhares de métodos que não funcionam "! - Thomas Edison

Esta afirmação, proferida pelo genial criador da lâmpada eléctrica, entre mais de duas mil patentes registadas, de inventos por si criados ... chegou-me às mãos.

O artigo que a continha, reflectia sobre  a  necessidade da estimulação da criatividade no Homem, como base do seu  desenvolvimento  integral . Era ainda afirmado pelo autor do artigo que ... (sic) "A criatividade está ao alcance de qualquer ser humano, quando alguém se predispõe a sair da mesmice mental ".

Concordo formalmente com a frase supra-citada, não é sobre ela que pretendo pronunciar-me, mas vou sim pegar na afirmação de Edison, para, "jogando" com ela, a aproveitar para o  espírito do que aqui desejo transmitir ...
Ou seja, vou "desmontar" o edifício mental, no senso em que aqui é utilizado,  recreá-lo e adaptá-lo às minhas "filosofices" ...
Que me perdoe Edison !...

Muitas vezes ao longo da vida, talvez mais ao longo dos últimos anos ( em que mercê do meu percurso, das circunstâncias, da minha forma de estar e sentir ) ... me flagrei  aplicando exactamente o pensamento  de Edison, a mim própria.
Quem falha, não irá falhar sempre ... Se calhar, as falhas não foram mais do que tentativas frustradas de outros tantos acertos ...

A vida evolui, faz-se todos os dias, o ser humano erra e acerta, erra e acerta ...
Dos erros deviam ser tiradas ilações ..... por vezes ocorrem repetições !
Dos erros deviam ser colhidas aprendizagens ... muitas vezes não o são !

Uma coisa é certa ... Que as falhas e os erros deixam marcas, gravam cicatrizes ... indubitavelmente !!!...
Que os insucessos acontecidos, mais derrubam do que erguem, dependerá de cada indivíduo, mas penso que globalmente é verdadeiro !
Que nunca se fica o mesmo depois de cada dita "falha" ( ainda que tenhamos consciência, que ela foi apenas um ensaio de proveta não conclusivo ), também é verdade !

A "droga", é quando as dúvidas inculcadas dentro de nós por cada objectivo não atingido, nos tornam mais defendidos, tão defendidos que nos cerram os portões da alma, nos tornam mais "feios" como seres humanos, porque inevitavelmente inseguros, desconfiados, por medo do sofrimento de reincidências ...
A nossa "disponibilidade" como pessoas, face ao mundo e aos que nos rodeiam, fica diminuída, a nossa capacidade reactiva, fragilizada, ou então  potencialmente agressiva, de uma forma irracional, por vezes mal direccionada ... como um animal acossado !!!
A vulnerabilidade aumenta, o "medo" instala-se, e com "medo", o indivíduo não é isento nas apreciações, nas análises, nas conclusões ...
A liberdade, como consequência, restringe-se ... é cerceada !

E aí temos nós, uma pessoa "amputada" do que de melhor teria   em si , para se dar e dar aos outros.

Depois, desponta sempre um certo sentido de injustiça, uma certa vitimização ... "porquê eu ?!" ... "era necessário ?!"... "não podia !!"...
E esse sentimento incontrolável, muito acima do razoável, do que o bom senso determinaria, do que os outros talvez mereçam, torna-nos intolerantes, insuportáveis ... cansativos ...

Só que a "semente", boa ou má, uma vez caída na terra, germina, pode tornar-se erva daninha, pode proliferar feito "praga", pode secar ... matar tudo à sua volta !
Nessa altura, como sabemos, não há volta a dar ... e o único remédio eficaz, é arrancá-la pela raiz, para que dela nunca mais brote uma só folha verde!!!

E dessa forma radical, esse indivíduo definitivamente ficará fechado a novos horizontes, a novas esperanças, a novas tentativas ... tal como essa planta que morreu no pé !!!

Anamar

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

"ANJO E DEMÓNIO ..."

"Anjo e demónio e ... que culpa tenho eu disso??!!

Ora bem, o meu último post tocou um assunto assaz sensível e polémico, pareceu-me, que levou às mais variadas e interessantes tomadas de posição.
Vieram, de várias procedências, algumas pessoas à liça, defendendo convictamente a "sua dama" ;  o blogue animou-se, ganhou vida, agitou-se, sinal de que as pessoas não estão mortas desse lado !

E se assim o foi, imagino a repercussão que terá nos espíritos, a inquietude do tema que hoje lanço.
É por demais controverso, actual, inesgotável, provocador, lato, demasiado abrangente, e por tudo, despoletará amores e ódios, estou certa.

Venho aqui falar-vos hoje da Internet, vulgo Net entre os utilizadores.

Estamos num tempo de "explosão" diária das grandes mudanças, do avanço inimaginável e imprevisível das tecnologias ...
Pertencemos a uma geração, em que num curto espaço de tempo, vivenciou de tudo, e mais o que nunca imaginaria vivenciar.  De facto, os nossos anos "valem" por séculos e séculos de História lá para trás, e operaram "revoluções" incomparáveis, às por direito chamadas de "revoluções", que conhecemos.

A abordagem do fenómeno Net, querida por uns, desejada por outros, necessária a todos, odiada, útil, espantosamente contundente e questionável, doce e perigosa ( muito perigosa mesmo ), inalcançável e até imperceptível, cuja existência é mesmo de cepticismo total para as gerações mais idosas, é um tema de que apenas aflorarei a "rama", alguns pequenos aspectos, pois não tenho a veleidade de escrever aqui nenhum artigo de fundo, exaustivo e se calhar maçante, sobre o mesmo.
Até porque não teria capacidade para o fazer.

Então, a Net, anjo "e" demónio ( não anjo "ou" demónio, reparem ... ), dirá ela própria ... "e que culpa tenho eu disso"???!!!

Como com tudo o que nos rodeia, sempre desembocamos no mesmo sítio ... Quem consegue estragar, adulterar obviamente tudo, é o Homem, o ser mais aberrante e ignóbil que existe.
O Homem tem tudo nas mãos, e invariavelmente, numa maldição estranha, sempre consegue transformar o ouro em pó !
Começa por ser assim com a "casinha" que habita, pondo-a sistematicamente em risco, e com ela, estupidamente, a sua própria existência, e no caso em apreço, funciona exactamente da mesma forma.
A Net é pois uma "droga", que pode ser bem ou mal administrada ... a maior parte das vezes, mal ... inquinando as mentes e os espíritos, finando até os mais saudáveis !...

Ferramenta absolutamente incrível, espantosa, fabulosa, é ela o sustentáculo indispensável para o desenvolvimento da ciência, com todas as inerências potencialmente positivas para o ser humano.
É uma fonte inesgotável de informação, de cultura, de trocas, de partilhas ...
Ela "passeia-nos" mesmo que não possamos viajar, ela cultiva-nos mesmo que não possamos frequentar museus, assistir a espectáculos, ver exposições, ler bons livros e mesmo jornais ...
Ela recua-nos no tempo e mostra-nos tudo o que vivemos e os que viveram bem antes de nós, com uma riqueza informativa que nos pasma ...
Ela brinda-nos com música ou cinema, sempre que, quando, e com a escolha que desejarmos, ao ritmo de um clique ...
Ela transporta-nos a pedaços do Mundo, a locais infindáveis do planeta, e fora dele também ...
Conduz o nosso sonho, sem sairmos de uma cadeira ...
Actualiza-nos a informação de todo o Globo, em tempo real ... e estimula, e esclarece  a curiosidade de crianças e jovens, sobre temas, assuntos, causas, dúvidas ...
Cria a tal teia de afectos ... os tais "amigos" que não conhecemos, que talvez nunca venhamos a conhecer, numa rede de solidariedade, cumplicidade ... "amizade" ( ? ) !!!...
Ela alicia espantosamente ... ela insinua-se ... ela envolve ... cria dependências, altera ritmos de vida.
Ela faz companhia nas solidões, ela cria "sonhos", enquanto cria pessoas ... gente, do outro lado ...

É o maior "supermercado" que existe !
Nela se divulga e transacciona tudo ... de bens materiais, ideias, conhecimentos ... a seres humanos !
Oferece-se, mostra-se, propõe-se, dá-se, troca-se ... impinge-se e agarra-nos inevitavelmente.
Damos por nós, a cada dia ( chegando a casa ), a correr para o computador, num afã inexplicável e quiçá ridículo, para abrir a "janela ao Mundo" ... e a sentirmo-nos muito mais "confortáveis", porque do outro lado estão pessoas como nós ... com quem empatizamos, de quem divergimos, com quem trocamos ideias, sentimentos, experiências, inquietações, angústias ... com quem, estranha, espantosamente e sem pudor, nos abrimos, abrimos o melhor e também o pior, o mais obscuro, o mais"bas-fond" que nos pertence ; os delírios, as fantasias, as ilusões, mostramos  "um rosto" ... o que queremos ... simplesmente porque do outro lado há gente, exactamente  "sem rosto"...

É extraordinariamente fácil, criarem-se afinidades virtuais, porque no fundo, logo à partida, há afinidades de Vidas ...
Andamos todos por ali, vagueamos todos por ali, provavelmente na busca de algo indefinido, que se calhar é lacuna das nossas vidas ... calor humano, compreensão, alguma identidade, afecto, "presença" ... tudo bem virtual, tudo bem "inexistente",  para preencher o vazio da maior parte de nós mesmos, das vidas impessoais, insatisfatórias, vazias, sós, que as sociedades actuais conseguiram criar .

Manipulam-se espíritos, despertam-se emoções ( e como !... ), provocam-se reacções, lançam-se desafios ... encena-se a peça ... lança-se  "o osso" ... com a sensação de uma absurda "segurança" ...
Entre  nós e as personagens que nos acolhem, há todo um mundo virtual, inultrapassável, se o não quisermos.
Como a mulher que dança no varão ... os espectadores vêem, sentem, ouvem, desejam, alienam-se ( é essa a ideia ) ... mas não tocam, não mexem, não devassam !
Como as sombras chinesas, dançarinas atrás de um pano, assim são as "sombras" que povoam muitas e muitas vezes as nossas madrugadas ...  Elas são difusas, indefinidas, mexem e com isso mexem-nos, não se mostram, e com isso despertam-nos o desejo de que se mostrem na realidade ...

Assim são as redes sociais, as mais variadas que proliferam.
Gente só, à procura de gente só !  Gente com dúvidas e sofrimentos, na ânsia de que alguém lhos resolva !  Gente com carências que vai ao "mercado", como quem escolhe uma couve ou uma alface ... há sempre muitas nas bancas ... das mais diversas qualidades e custos ...
Tudo ali, bem à mão, com uma facilidade estrondosa. Sem responsabilidades, sem restrições, sem compromissos ...
Criam-se relações fáceis, porque não estratificadas em valores ( não é esse o espírito ), embarca-se na aventura com uma ligeireza absurda, coloca-se o estatuto real tantas e tantas vezes em risco, em prol daquela "viagem" doce, prometedora, ilusória, falsa, desejada ( porque "proibida e promíscua" ... mesmo para os espíritos mais liberais ) e aliciante, por isso mesmo !...
Afinal ... aparentemente, nada, ou muito pouco temos a perder !!!...

A "resistência" em certos domínios, não é das principais qualidades do Homem, todos sabemos.  "O fruto proibido, o mais desejado", diz o povo, e como tal, o puritanismo, nesta altura do campeonato, sempre uma falsa questão !
Por isso, concomitantemente, a Net é "anjo" e é "demónio",  fonte  do que de pior o Homem possui em carácter, em desígnio, em mente !
Através dela, solta-se e explora-se o ser vil, ignóbil, abjecto ... o lado selvagem e inescrupuloso, num aproveitamento forçosa e negativamente direccionado!
Ela não contempla idades, estatutos, formações ... Usa e abusa dos mais incautos, dos menos defendidos, dos mais ingénuos ...
De crianças e jovens ... a velhos !!!...

Bom, espero não ter sido excessivamente fastidiosa na abordagem deste tema.
Está lançada a discussão, as cartas estão na mesa ....  Esta, a minha análise ... esta, a minha forma de pensar !!!...

Anamar

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

"QUEM DIRIA ??!!...


O mais surpreendente que a Vida tem, é ser surpreendente !...

Colhe-nos desprevenidos, quando distraídos pensamos ter o mar encapelado bem à nossa frente, ou o deserto de areias paradas a perder de vista.
Estamos  sentados num rochedo a olhar, displicentemente, como quem não quer nada ... e de repente, somos "obrigados" a "ver" ...
Estamos adormentados, acreditando estar a viver ... e de repente, uma aragem fresca varre-nos a alma e desperta-nos ...
Julgamos que a estrada a percorrer não tem mais curvas ou lombas a perturbá-la ... e de repente, temos uma "montanha russa" no nosso percurso, que nem imaginávamos estar ali.
Pensamos e acreditamos que nada já nos pode "apanhar de jeito", e eis-nos caídinhos no maior e mais intrincado "puzzle", difícil e desafiador como são todos os "puzzles" ... E gostamos de o estar !

Uma manhã acordamos, e de repente verificamos que a máquina do tempo operou milagres connosco ... porque nos sentimos adolescentes outra vez ... adolescentes em corpos de adultos ... adolescentes com corações cansados, mas desejosos de renovação ... jovens inconsequentes, de repente, com todas as energias inerentes, reforçadas ...

E sonhos outra vez, e desejos outra vez, e fé outra vez !!!
Mas tudo muito mais saboroso, porque tudo embalado agora, numa "prenda" particular, conferida pela maturidade, pela sabedoria, pela experiência, pela ausência de pressa ...
Também pelas cicatrizes, claro, que estão lá para lembrar, acautelar, fazer a diferença ... mas ainda assim, uma "prenda" ... uma "iguaria", que como todas as iguarias, deverá ser usufruída calmamente, degustada lentamente, sorvida em paz ... com requinte e saber !

A idade madura tira, mas também dá !...

Tira-nos a ligeireza da corrida ... passamos a caminhar devagar, e por isso, temos tempo de olhar as azedas que despertam no pino do Inverno ...
Tira-nos a acuidade auditiva ... mas passamos a saber apreciar sapientemente, música doce e embaladora, o canto dos pássaros, o marulhar das ondas nos rochedos ... o sussurrar da brisa pela serra ...
Diminui-nos a capacidade de ver ...  Não importa ... vemos pior ao longe, à distância ... e passamos a ver muito melhor quem temos ao lado, quem nos abraça ... quem nos beija ...
E muito melhor ainda, a doçura, o carácter, os corações, o interior das almas ! ...
Os horizontes longínquos já os sabemos de cor ...  Estarão lá, no mesmo sítio ...
Basta-nos o nosso horizonte próximo ... o nosso lar, os nossos sonhos, os nossos afectos, amigos e amores ...
Reaprendemos a andar de mãos dadas, sem pressa.
Reaprendemos a falar baixinho, ternamente ao ouvido ...
Aprendemos de novo,  porque havíamos já esquecido, como se olha a mesma paisagem com dois pares de olhos, como se escuta o mesmo silêncio com dois pares de ouvidos ... como nos perdemos e nos achamos, só porque estamos lado a lado ...

E tudo nos é devido, porque já não temos muito tempo ...
E tudo nos é permitido, porque ainda é possível sonhar e acreditar !
O estatuto cómodo que adquirimos, permite-nos rir em gargalhadas, sem sequer nos preocuparmos se é consentâneo, se é lógico, se faz sentido ... Faz seguramente o "nosso sentido" ... e isso é que importa !
Aprendemos finalmente o significado da "cumplicidade" que por toda a vida ouvimos, e com que às vezes acreditávamos ter "topado" já ...   Mentira !... a verdadeira cumplicidade é a que a paz dos anos nos traz ... é a que advém da ausência de sobressaltos, é a que queremos partilhar, voluntariamente com o coração, em verdade ... em autenticidade !
Não somos obrigados a partilhar desafectos ... só porque é necessário ...

E também somos surpreendidos quando choramos, julgando-nos sós ...  E bem ao nosso lado, alguém nos enxuga as lágrimas ...
Achamos que a solidão vai doer, por ser a nossa "bengala" definitiva, a única bengala que a Vida nos facultará já ...  Mas não !  A nossa solidão povoa-se de impaciências de "esperas", de plenitudes de encontros, de pequenas / grandes partilhas doces ... de certezas de linguagens e sentires tão próximos, que se confundem ... numa identidade quase única!!!

Porque na verdade ... o mais surpreendente que a Vida tem, é ser mais e mais surpreendente em cada dia das nossas existências !!!

Anamar                                             

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

"PROVA SUPERADA !... "


2012 estreou-se com um dia cinzento e pardacento, ao contrário dos últimos dias do velhinho 2011, que resolveu despedir-se com sol claro e brilhante.

O dia de hoje traz-me uma sensação de alívio ...
Engraçado que as pessoas dizem ( já o ouvi pelo menos a três pessoas, aqui no café onde, "para variar", tomo o pequeno / grande almoço à hora habitual ) ... "Este já passou" ! - como se se tivesse tratado de uma prova de alto grau de dificuldade, finalmente superada.

É que, queiramos ou não, aqueles momentos que antecedem a meia-noite e a "passagem" em si, são angustiantes, são "apertados", para mim, pelo menos.
É incoerente o que digo, o que racionalmente penso a respeito, o que defendo, e o que na realidade sinto.
Mas sempre é assim ... ano após ano, esteja só ou acompanhada ... o raio do nó sufocante, espeta-se-me aqui dentro, e pronto, as lágrimas vencem comportas e vêm por aí abaixo ...

Neste momento, na vertente familiar, felizmente não tenho razão para muitas angústias. A minha mãe atravessa por ora, um período invejável para os seus quase 91 anos, as minhas filhas, sem outras oscilações ou "sobressaltos", além dos inerentes à vida normal do dia a dia, os pequenitos a crescerem saudáveis e de uma forma feliz.
Mais família próxima, não tenho. É pequeno e curto o meu núcleo "de sangue"...

Eu, bom, eu por aqui vou estando ...

Se quisesse definir o meu estado de espírito neste momento, acho que o não saberia fazer de uma forma objectiva e clara.
Tenho o coração em águas paradas ... como que adormecidas. Estou "acinzentada" de alma, e detesto estar acinzentada de alma .
Por natureza sou uma pessoa de remoinho, de turbilhão, de convulsão . Vivo na intensidade do que me rodeia, e o que me rodeia tem que ser pintado com as cores todas, as primárias e as intermédias.
Não sou acomodada nunca, sempre necessito de renovação, de luta, de dialéctica, de disputa, de metas e objectivos diferentes e variáveis ... mas intensos !

Começo o ano a falar de mim ... "Tudo como dantes, no quartel de Abrantes" ... dirão vocês !

Ontem, meia-noite, uma meia-noite, para mim, absolutamente surreal !
Havia previsto passá-la a dormir, na ausência de gente, de afectos, na opção feita por mim, da presença de amigos ... Não me sentia companhia à altura, na noite.
No meu quarto e no escuro da minha casa, os fantasmas perambulavam, atazanavam-me ;  saltaram das "caves" da minha alma, os "safados", para me darem conta do juízo e da paz ... se é que a havia !

Esgotavam-se os minutos para a meia-noite, e a tal sufocação aumentava-me a olhos vistos, dando-me uma sensação de incomodidade, desconforto e infelicidade atroz.
Decidi que não me tomaria de jeito ...
E, para grandes males, grandes remédios !
Não iria sossobrar à "desgramada" da noite, à solidão e à tristeza que teimava ( Não era bem esta a palavra que quereria usar ... mas aí, teria que apor um "ozinho" no canto da página, e amanhã iria ter a "censura" impiedosa, em cima de mim !... rsrsrs ).

Lembrei então, ter meia garrafa de um "tinto" remanescente do Natal, absolutamente divinal ... tinha passas também do Natal ... tinha bolo-rei que ainda o será até 6 de Janeiro ... tinha o estupor das lágrimas que teimavam em me fazer sentir a "desgraçadinha" da "paróquia" ( e eu não queria ) ... tinha um buraco no meio do peito ... tinha um "negrume" na alma, bem mais intenso que o da noite lá fora ... tinha a Rita no sofá ( para quem inteligentemente nunca há passagem de ano, e a quem eu disse a meia voz : "Rita ... isto está mesmo mau ... estás a ver??!!"   Ela não via, claro, estava no melhor dos seus sonos !!! ) ...

Fui buscar um copo de pé alto, do meu serviço de cristal usado em ocasiões merecedoras, porque um bom vinho não dispensa um cálice ( alguém, entendedor, me ensinou a degustar assim ) ... coloquei Énya em fundo e aguardei no relógio, que os minutos se exaurissem.

E exauriram ... como sempre ... inevitável ... obviamente !!!

A um minuto da meia-noite comecei a comer as doze passas, ao ritmo dos segundos, esboçando mentalmente, o "pacote" dos desejos ... deixando que o nariz e os olhos, pingassem tudo o que tinham direito ( p'ra quê impedi-los ??!! ), comecei a saborear o "entorpecedor de serviço" ( acho que nunca um vinho me soube tão bem ... porque era bom e terapêutico ao mesmo tempo, curativo, se calhar ) ... e assim prossegui ...

Interessante, que o nó da garganta, do peito e da alma, foi aligeirando, a sufocação foi diminuindo.
Sentia-me saída de uma passagem estreita que tivesse desembocado numa estrada larga e franca ... sentia-me como tendo atingido a outra margem de um desfiladeiro, depois de o ter atravessado, periclitantemente, por sobre um tronco ... ou depois de ter ultrapassado um arame sem rede por baixo, em equilíbrio instável !!!  Sentia-me um pouco "renascida", das cinzas que haviam restado de mim !!!...

A mente humana é efectivamente complexa, intrincada, incompreensível muitas vezes ... O "bicho papão" havia-se desvanecido ... o "medo" da alma, que me dominava, abateu-se ... E Énya continuou docemente a embalar-me!...

Acho que depois deste 31 de Dezembro ... nenhum outro poderá "ultrapassá-lo" ou "superá-lo"!...
O "espectro" assustador da minha solidão, foi vencido ( convivi com ela "olhos nos olhos", aceitando-a talvez, como inevitável companheira do resto dos meus dias ), a dor da minha tristeza, dominada ...

Mordi os lábios, enxuguei o rosto, e dei uma "ordem" peremptória para que os "fantasminhas" regressassem, em carácter de urgência, às "caves" de onde haviam saltado horas antes, para dançarem no meu quarto ... E intimei-os a que de lá não saíssem ... NUNCA MAIS !!!

Anamar