terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

" SONHAR AINDA É POSSÍVEL ?... "



Na passada quarta-feira, dia 14, viveu-se mais um dia de hipocrisia social, criado pela exploração da hipocrisia comercial.

Já escrevi várias vezes sobre o dia de S.Valentim, dos namorados e quejandos, importação trazida de outras latitudes, aliás como outras semelhantes que me irritam e arrepiam ... a do Halloween, por exemplo.
Importada, assimilada, encaixada.
Nada de novo que não conheçamos, peritos que somos nas importações fáceis, sem critério e sem demais juízos de valor, de quase tudo o que nada tem a ver connosco, nossas raízes e cultura
.
E aí temos nós, jovens e menos jovens, milagrosamente derretidos como picolé em dia de calorina !
O comércio acena-nos com o êxtase da felicidade afectiva, ao alcance de uma comprazinha ainda que por vezes à última hora, de uma rosinha vermelha, de um qualquer presentinho inevitavelmente decorado com os corações "ensarampados"  (que estampam toda a profusão de cartões e cartõezinhos para qualquer  gosto ),  da caixa de chocolates em coração, do peluche com coração, da caneca com corações ... enfim ...

Cumprido qualquer um desses desideratos, tranquilizam-se os espíritos, porque o alvo a atingir perceberá como o amor é tão importante para nós !...
Os cartões até já trazem as dedicatórias escritas, o que simplifica a coisa ...

Depois ... bom, depois, temos 364 dias para recarregar baterias e  tomar fôlego para a próxima jornada valentinesca ...
As rosas entretanto secam ao ritmo do esquecimento das juras de amor seladas.  Os bombons comem-se e recheiam-nos com mais umas quantas indesejáveis calorias. O resto, repousa por uns tempos nas prateleiras ou desce directo às gavetas.
O amor ... o amor de valer a pena ... o amor espécie em vias de extinção ... esse, o amor a vivenciar, a adubar, a regar ... a valorizar  em suma, confina-se muitas vezes a um processo de intenções, e pouco mais.
Cada vez mais os sentimentos são plastificados, descartáveis, inconsistentes ... recicláveis.  Troca-se de amor com a facilidade com que se troca de projectos, de sonhos, de opiniões.
Estamos no tempo da volatilidade de sentimentos e emoções.  Estamos no tempo da desaposta, às vezes por bem pouco.  Estamos no tempo da desvalorização dos reais valores, em benefício de uma liquidez escorregadia, ajustável, cómoda, de relações de fácil consumo e afectos precários ...
Estamos na época em que parece não haver vagar para partilhar, dividir, saborear a beleza de um pôr de sol a dois, escutar os sons da terra a dois, ouvir o mar ... perdidamente ... dançar um "slow" na cumplicidade dos corpos colados, das mãos entrelaçadas, dos olhos enternecidos ...
Até porque penso que também já parece não haver "slows" ... desgraçadamente !

Bom, este meu texto foi meramente uma sinalização da data.
Nada traz de novo.  Constata, não questiona, não discute.
São meras convicções minhas.  Já as expus em anos anteriores.  A idade só mas reforça e alicerça.  Não mais !
É o que vejo e analiso à minha volta.

Gostaria de auspiciar futuros diferentes para as gerações que aí temos.
Gostaria de poder acreditar que as vidas teriam outros rumos, mais consistentes e de sorrisos simples.
Gostaria !...

O sonho ainda não nos está vedado ... não é ???...

Anamar

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