Não gosto de me reler. Não tenho paciência e quase sempre acabo não me encontrando muito, naquilo que nesta ou naquela ocasião, então escrevi.
Mas ... o dia subitamente ficou igual a mim própria. Amanheceu azulado, com algumas nuvens esparsas pouco preocupantes, e veio acinzentando gradualmente. Agora fechou por completo e a chuva meio miúda começou a cair.
Honrou no seu melhor, um típico dia outonal.
Breve será Novembro, breve completarei mais um ano de vida, breve será Natal e o calendário dobrará de novo. Enfim ... o ritmo imparável da vida !
Hoje caíu-me à frente um texto escrito há cerca de um ano e meio. Por curiosidade reli-o. "Deixa-me ver como iam as coisas então" ... pensei.
Pois bem, é impressionante como decorrido esse tempo, nada tenha acontecido nem dentro nem fora de mim, que inviabilizasse que aquelas linhas pudessem ter sido escritas hoje. O mesmo cansaço, a mesma impotência, o mesmo imobilismo, o mesmo desconcerto atravessam cada frase, percorrem cada linha. A mesma inexistência esperançosa em outros dias, em dias mais coloridos e auspiciosos, em novos projectos ou sonhos, percorre cada parágrafo, que transpira uma desaposta sensível, uma falta de "gás" ... um desânimo que dói.
Há um estar rançoso e uma falta de norte ou horizonte, uma solidão e um desconforto, como um fim de festa não vivida.
Sinto-me como barco largado ao sabor das marés, subindo ou descendo ondas, arrastado sem azimute, na ausência de leme, sem esperança de âncora ou porto de abrigo.
Sinto-me com a indiferença da folha que o Outono jogou no chão, levada pelo vento, sem lógica ou coordenada. Simplesmente arremessada ...
Sinto-me tão irremissivelmente perdida como se estivesse num deserto de areias sem princípio ou fim ... como se estivesse frente a um emaranhado de trilhos alucinados, sem destino ou rumo.
E parece ser recorrente esta leitura míope e deficitária da vida, que quase sempre me toma.
Serei incoerente, imatura, exigente ... ou simplesmente utópica, desadequadamente insatisfeita, tontamente sonhadora ... infantil, puerilmente desajustada ... ou simplesmente IDIOTA ?
Seja o que for ... Cá para mim, não sei se algum dia terá remédio ou solução ...
O dia de um claro Outono fechou de chuva, por aqui. O silêncio embalado por Énya ao meu lado, aconchega as paredes deste quarto. Só ela me restitui o sonho.
Chegam-me notícias preocupantes da saúde de amigos. A pequena capa de malha que a minha mãe colocava nas costas, aquece-me sobretudo o coração.
Transporta o seu afago. Desperta-me a saudade infinita.
Afinal, vou estando viva por aqui. E talvez valha a pena viver. Se hoje a chuva cai, amanhã o céu azul voltará ... as castanhas vão regressar ... o caminho dos castanheiros deixará os ouriços pendentes, soltarem os frutos maduros ...
E o Inverno levar-nos-à a uma segura Primavera, que será verde ... outra vez ...
E continuaremos a "pintar o céu com estrelas" ... E continuaremos a escutar o gorgolejo das águas lá na serra, e a batida do mar impiedoso, nas praias do silêncio, onde as gaivotas mandam ... Só elas mandam !
... Porque estamos vivos ... E talvez, afinal, valha a pena viver !...
Anamar
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