domingo, 1 de outubro de 2023

" O CORDÃO UMBILICAL "

 




Não se pode viver a vida dos filhos ... não se pode viver a vida pelos filhos. 
O bendito cordão que cortamos à nascença, sempre vai marcando presença ao longo da vida, estou convicta que, verdadeiramente, na figura materna apenas.
Ouve-se dizer a propósito da relação entre pais e filhos, "mãe é mãe e pai é pai", exactamente reiterando essa ligação simbiótica e inapagável, tatuada pela biologia humana ao longo dos nove meses de gestação.
E tudo aquilo que partilhámos, essa chama vital que assegura a vida da criança até que fisicamente se separa da mãe, vai coexistir a vida toda transmitida por tantos outros cordões, tantas outros laços, tantas outras formas quase irracionalmente inexplicáveis.
A necessidade quase absurda de uma protecção constante que uma mãe sente em relação ao seu filho, o imperativo da sua presença cujas "asas" o defenderiam de todos os riscos, a ânsia de o poupar a todas as adversidades possíveis, chegam, em casos extremos roçando o patológico, a serem doentios.
Na natureza, as mães são defensoras e protectoras inabaláveis das suas crias.  
Assisti há poucos dias na minha viagem ao Quénia, à fúria de um bando de elefantes, encabeçado pela progenitora, na protecção de uma cria que estava ferida.
Racional ou apenas por razões biológicas, contra tudo e contra todos, viramos feras na protecção das nossas ... 

Hoje em dia, a desejada e desejável autonomia dos jovens em relação à casa paterna está objectivamente comprometida, consequência, além de outros factores sociais vividos neste momento, da crise que sobre todos se abate ... na qual ressalta a incapacidade material de se alcançar o legitimo direito à habitação.
É insustentável conseguir-se por aluguer ou compra, um espaço minimamente digno, ao alcance da maioria.  Se se faz face às despesas alimentares e outras do quotidiano, não se consegue de nenhuma forma ter acesso a uma renda especulativa ou à prestação bancária de um empréstimo, ainda que o mesmo tivesse sido alcançado.
Assim, é absolutamente dramático o que muitas e muitas pessoas singulares, ou famílias constituídas, estão a sentir, com o estrangulamento dos seus futuros.
As manifestações sociais multiplicam-se, as vidas hipotecam-se, não se seguem estudos superiores porque não há alojamentos compatíveis para os estudantes que da província acedem às Faculdades ... da noite para o dia, encurraladas e sufocadas, as pessoas caem na rua ...
Há dias, subindo a Av. Almirante Reis em Lisboa, deparei-me, para angústia minha, com sete ou oito tendas, só no espaço de um quarteirão, sob as arcadas de um prédio. Um verdadeiro acampamento em plena capital !... 
A tal, nunca ao longo das minhas já consideráveis décadas de vida, tinha assistido !
As televisões reportam situações idênticas, de pessoas que embora com empregos e respectivas remunerações, não conseguem suportar minimamente as responsabilidades diárias, e por isso dividem com outras em iguais condições, tendas aninhadas em parques ou espaços sem condições dignas de vida ... até que as deixem e não as escorracem para outros poisos. 
É o fim da linha pra muitos nossos concidadãos, é o que lhes sobrou num Estado e numa estrutura social que os marginaliza, os exclui ... porque simplesmente parece não haver mais caminho para andar.
Mães que acabam por entregar os filhos à guarda de instituições, porque o lugar de uma criança não pode ser uma tenda no meio duma rua ...

E depois há também os outros ... os que são despejados do caudal inestancável dos canais de emigração desde os países mais sofridos, e que buscam, numa Europa promissora, o sonho de um futuro, uma vida, subsistência, alguma dignidade e alguma paz ...
Vertidos das guerras, da violência, do vazio de horizontes, do abandono, da fome e da miséria, mais sós do que nunca, entregues à sua sorte, à exploração, às máfias e ao sofrimento, empilham-se às dezenas enlatados numa precariedade inimaginável, em quartos miseráveis, imundos, onde o sistema da "cama quente" é frequentemente o que têm ...
E são de facto uma fauna que pulula nas nossas cidades, bem aqui ao nosso lado, em olhares que a esperança há muito abandonou ...

Também  eles  têm  ou  tiveram  mães ... lá  longe,  numa  terra  que  já  só  deve  ser  uma  memória ...

Como aquele rapaz de vinte e oito anos, silencioso, de olhos tristes e vazios, que pediu para comer mas que teve vergonha de entrar no supermercado comigo, e preferiu esperar na rua.  O seu país, a família, a dor e a guerra, lá ... A dignidade também ...  
Cá, até o trabalho que tinha lhe falhou há um mês ... Tinha fome ...

A angústia é avassaladora.  Sabemos o hoje, nunca o amanhã foi tão incerto ! O viver tornou-se um pesadelo, e mesmo investidas do "super poder" milagroso das mães ... não podemos viver a vida dos filhos ... nem viver a dureza da existência pelos filhos !!...

Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem Margarida,
Ninguém deve ficar insensível ás tragédias humanas que referes.
Quanto aos migrantes, a obrigação de todos nós é exigir aos Estados Europeus para isso existem eleições europeias, questionar os candidatos para que sejam criadas as condições de vida necessárias nos países de origem para não morrerem no Mediterrâneo por procurarem uma vida melhor.
Quanto aos nossos é todos participarem activamente no cumprimento do que está estipulado na Constituição e não votarem por simpatias tipo clubistas nos Partidos existentes, vergonha sinto que todos aqueles que juraram cumprir a dita, são os que mais a violam.
As situações na Justiça, Habitação, Saúde e muitas outras são insustentáveis.
Portanto terão que mudar em breve. Sob pena das revoltas populares que estão cobertas no Direito á revolta consignado na Constituição
Jonas

Anónimo disse...

“ Está na hora, esta na hora deste governo embora.”
Ao abrigo da constituição da República Portuguesa, exerço o meu direito á revolta.
Sou de Direita ou mais propriamente da tolerância.
Mas aqui emprego os slogans gritados por milhares de vozes durante o PREC pelas esquerdas que arruinaram este país com a geringonça.
Com Allende em 1973 nós jovens militares viramos á esquerda e a “merda” instalou-se.
Não quisemos isto.
Mas não queremos fuzilamentos nem extremistas sejam de esquerda ou de direita.
Queremos bom senso na governação.
O que retrata é um nojo.
Obrigado pela denúncia.
Jonas 🐈‍⬛