quarta-feira, 26 de agosto de 2009

MEMÓRIAS DE STA LUCIA...























































Aqui deixo um repositório de memórias, um repositório do TUDO que foi Sta Lucia, neste Agosto de 2009.

Anamar

"UMA FESTA NO CORAÇÃO"...


Sobre o Atlântico, tendo por rumo Londres...Sta Lucia ficou irremediavelmente para trás.

Dizem que o passado não conta, o futuro é desconhecido e o que faz história é o presente. Sta Lucia já faz parte de um passado, mas ficará certamente na história da minha vida.

Sta Lucia é lugar predestinado...o Vale das Pitons mais ainda.
Tendo como guardiãs as Pitons, inexpugnáveis e silenciosas através dos séculos, a pequena enseada é em si um reduto de uma energia inexplicável mas sensível...

As cores, os sons, os cheiros, a luz...as sensações...tudo queremos ansiosamente guardar na "caixinha", para que perdure; naquela que temos nas mãos e que regista, e na outra que está cá dentro, não se vê, mas regista ainda com maior nitidez...

São as aves, é o colorido multicor das buganvíleas, o coral do "coralillo mexicano", o amarelo intenso da "mantequilla", o vermelho sangue dos hibiscos, o laranja-fogo das acácias...

É o cheiro doce que resulta da terra permanentemente húmida, com a vegetação cerrada da "rain forest"...terra parida, onde tudo nasce e tudo cresce...

É o resfolegar da brisa nas folhas do coqueiral, é a melopeia lenta e embaladora do mar a espreguiçar-se no areal...
São os trinados, os silvos, o grasnido, o pipilar da orquestra de aves e insectos que povoam o espaço...

É a luz que incendeia o céu dos mais variados cambiantes, conforme o sol domina, ou faz negaças por detrás das nuvens...é uma luz que vai do laranja-fogo aos roxos dos pôres de sol; é uma luz que se ofusca, quando plúmbeo, o céu desmorona em chuva copiosa, ou se deixa rasgar pelos raios de trovoada súbita...
É uma luz que tanto torna esmeralda a água transparente, como a leva a cinza-prata ou a turquesa intenso...
É uma luz que acorda os fundos marinhos, desvendando os seus mistérios, com as mais estonteantes espécies em cor e formas...peixes, corais, esponjas, anémonas, ouriços...

Hoje assomei à praia pelas seis da manhã...
Queria esgotar todo o meu tempo, queria "guardar" tudo o que pudesse, queria esbaldar-me de tudo, e ficar "prenhe" pela última vez, desta natureza que sempre me deixa boquiaberta, incrédula, esmagada...

O hibisco, frente à portada do meu quarto, presenteou-me com uma flor linda, a única que deu enquanto aqui estive. Flor de um dia...tenho para mim que foi uma despedida...

A garça que "passarinha" pela beira-mar na mira de peixe distraído, olhou-me de soslaio com o seu olhinho miúdo no alto do pescoço esguio...
O gato dengoso, que pelas refeições se roça ronronante em busca de algum mimo, também apareceu...
Os "blackbirds", a rôla, os pardais, em grupos descarados e provocantes, saltavam desenfreados de mesa em mesa, depenicando migalhas esquecidas, ou restos nos pratos já abandonados...
Por fim, o Julius veio mimar-me com um "mango" da sua colheita, em pedacinhos...
Foi a vez de me despedir também, e de lhe dizer como foi gratificante que ele tivesse cruzado a sua vida com a minha, aqui, neste cantinho do Mundo.
Foi a vez de lhe dizer, que certamente, ao longo de muitos e muitos anos, ele continuará a ser o "cocconut man"...pois pessoas como ele, jamais morrerão!...

Ele não sabe nem sonha, como a sua lição de vida me mexeu, como eu lhe fiquei grata, como dificilmente esquecerei a sua figura, acocorado debaixo do primeiro coqueiro da praia...como, afinal tê-lo conhecido, foi "uma festa no meu coração"!!!...

Anamar

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

"JULIUS...THE COCCONUT MAN"



- "Hello my people...My name is Julius; I'm the cocconut man! If you give me one or two dollars, I'll give you a nice gelly-cocconut!!"

É assim que Julius aborda todos os turistas que se fazem à praia.

Julius é um homem de sessenta e cinco anos, segundo ele. Eu diria ao olhá-lo...um ancião.
Seco de carnes, uma pele escura de nativo, onde luzem uns olhos azuis sempre a sorrir.
Julius tem o cabelo e a barba esparsa, já grisalhos, e na boca, que conta prontas histórias, só dois dentes.

Nunca saíu de Sta. Lucia, não sabe o que é o Mundo, o que são viagens...sequer que há outra terra para lá desta. Vive por detrás da "Gros Piton", com um cão malhado branco e preto, o "Blacky"...
Julius come peixe acabado de apanhar e frutas que esta terra generosa dá...
Não tem dinheiro para mais.
Tem o seu "office" na praia, na base do primeiro coqueiro, provisionado com dois ou três "mangos", quatro ou cinco cocos, que apanha, como conta, subindo ao alto dos coqueiros, e com que percorre a pequena enseada de cá para lá, de lá para cá, as vezes que lhe apetece.
Na mão, sempre um coco...e a abordagem sempre a mesma: "Hello my people..."

 
Posted by Picasa

Tem um rosto de criança e um riso franco e ingénuo, curtido por este sol, este mar, esta natureza...

Vive só..."I live with myself"...e é um "happy man"...
Não busca, não lamenta, não anseia...; aceita cada dia com o que a vida lhe dá, sorri sempre, está em paz...
Julius é um pássaro livre nesta floresta das Pitons...não tem peias nem amarras; tem a sua pobreza ou riqueza, tem todo este céu, todo este mar, toda esta natureza excessiva...
Só queria ter dinheiro para extrair os últimos dois dentes, que o incomodam e o fazem sofrer...
Há-de ser quando for...quando conseguir vender na praia os cocos suficientes para ter quarenta dólares...

até lá...

Julius é sem dúvida a mais genuína, a mais autêntica e mais lógica "dádiva" deste canto ainda puro e virgem...virado ao Mar das Caraíbas...

Anamar