quarta-feira, 26 de agosto de 2020

" DESTINO ... "







" O  HOMEM  DOS  OLHOS  LINDOS "

O homem dos olhos lindos
é lindo por dentro e fora
porque não há fora sem dentro
e não há dentro sem fora ...
O homem dos olhos lindos
tem doçura no olhar
tem um coração imenso
tão profundo quanto o mar ...
Tão imenso quanto o céu
sem horizonte a fechar ...
pois não há dentro sem fora
nem fora sem adentrar ...
O homem dos olhos lindos
é uma criança a sorrir ...
Tem ternura no olhar
e um coração a partir
com vontade de ficar ...
Tem uma alma gigante
e uns braços de albergar
os amigos e os amores ,
os afectos e o sonhar
Um ninho dentro do peito
que é berço-maré de jeito,
sempre embala em qualquer hora ...
É lindo por fora e dentro ...
Pois não há fora sem dentro
e não há dentro sem fora !...


E o Pedro partiu ...

O Pedro, a quem dediquei este escrito em Março de 2017, era, como na dedicatória lhe disse, "amigão de tertúlias vadias" !
Era Março do ano em que, menos de dois meses depois, eu publicaria o meu único livro ... de poesia.  Comigo, desde a primeira hora, estiveram o Pedro e a Lena, num trio apostado na entreajuda, na dialéctica, na partilha de ideias, no incentivo, no entusiasmo e na aposta, e que foi vital para o não esmorecimento ou desistência que, de quando em vez me assaltavam ...
A sua alegria era a minha alegria, a sua confiança era a minha confiança !
Conversámos muito, rimos muito, cumpliciámos também, entre meio a algumas confidencialidades trocadas.
O " Leão da Gago Coutinho"  ( a rua onde nascera e vivera desde sempre, aqui na cidade da Amadora ) torcia pelo seu Sporting até debaixo de água !
Era um desportista nato.  Foi um praticante de várias modalidades, e um orientador de camadas jovens.  Foi seguramente um apaixonado pela vida, que viveu intensamente, numa espiral de emoções e de experiências, nas múltiplas histórias que "escreveu" ...

Agora, o Pedro cansou.  Cansou desta vida que na verdade não era mais vida.  Cansou de uma realidade da qual já se excluíra faz tempo.  Cansou do cinzentismo de dias que o jogaram entre quatro paredes, na solidão mais absoluta e no silêncio mais devastador.  A sua realidade nada já tinha  que ver com a realidade que o confrontava no mundo cá fora !

A sua mente apagou-se.  O seu caminho tornou-se num túnel sem saída  e sem luz... a sua estrada, numa estrada sem rumo ou escapatória. O destino traçado, demasiado duro e pedregoso !

O Pedro não quis mais !

E foi embora, de mansinho, sorrateiramente, sem avisos ou sinais ...
Ou não lhos souberam ler ... não sei !

Estará noutra dimensão, olhando de lá a pequenez do ser humano que lhe negou um espaço de vida e de afecto, um espaço de amor, de conforto e de carinho ! Um espaço na família que o ignorou e não teve capacidade para o acolher, sobretudo quando a demência que o tomou, lhe retirou todas as capacidades de autonomia e defesa.
O Pedro morreu só e anónimo, como sós e anónimos foram os últimos tempos da sua conturbada existência !

Que possa agora ter paz !!!

Anamar

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - não faço ideia ...

 


Subi agora da rua.
Levei tempo a decidir se sim se não, num dia que, mesmo que quisesse, não o conseguiria já contabilizar neste labirinto interminável de horas, de caminhos, de sensações, de emoções, de indecisões, pensamentos positivos e outros atrozmente destruidores, num faz de conta de vida real que o não é ...

Amanheci com uma angústia mais cerrada e pesada que o nevoeiro com que o dia de ontem nos brindou.  Uma angústia sem brecha ou horizonte, de que não se entende, se justifica ou descortina o porquê de vir, hoje mais que ontem, talvez menos que amanhã, atazanar-me a alma ...
Não a compreendo, ou se calhar compreendo bem de mais ...  
Sei apenas da sua esfinge tão assustadora, sei apenas do seu peso tão avassalador, sei apenas da dor corrosiva com que me ataca o coração, a mente e as forças e de como avança desrespeitosa, feito um tractor atropelando, trucidando, destruindo ...

Aliviei um pouco quando as lágrimas descomandadas desceram.
Aliviei como uma panela de pressão em fervura-limite alivia, se a válvula lhe dá fuga ao vapor acumulado internamente.
E comecei a fazer coisas por aqui.  A  justificar talvez o facto de estar viva, simplesmente.  Intentando inventar, neste cansaço sem tamanho, neste desinteresse sem mitigação, nesta apatia doentia e cansada.
O ar parecia ser pouco para respirar, aqui em casa.  
As janelas apenas me mostram casas empoleiradas e constrangidas, umas sobre as outras.  Nas ruas, o movimento é o de sempre, nem menos nem mais ... as compras, as filas para os locais habituais, a corrida para os comboios aqui por trás, o despejo de autocarros onde gente e gente se apinha e acotovela, com máscaras que rapidamente retiram, ainda nas plataformas ... o deambular de grupos de jovens em desocupação escolar, a esplanada no meio de uma praceta incaracterística e desconvidativa ...

E a inércia, a indiferença e uma incapacidade reactiva sem tamanho, conferiam-me uma ausência de força anímica, paralisante.  "Vou à rua, não vou à rua ?  Vou à rua onde ?  Fazer o quê ?  Sentar-me  numa esplanada sozinha frente a um café ... e cumprido o ritual voltar para casa ?  Fazer de conta que me sinto bem e que era isso que eu buscava ?...  Mas continuar neste "gheto" não é suportável ... "

E desci. Vesti a primeira roupa que vai jazendo sobre a cama dia após dia, deitei mão a qualquer coisa para calçar, colocar adereços não vale a pena ... retocar o rosto ainda menos, pois afinal, metade dele se esconde atrás da máscara ... e inventei de ir fazer uma compra ... para nada ... só porque sim ...
E regressei.  
Não é a Covid que me adoece.  Não é o medo que me paralisa.  Não é o risco que me desmobiliza.
É o sentir-me perdida no encontro de um mundo que não é mais o meu.  É o perceber que, como numa hecatombe, as referências que tínhamos, não existem mais, os lugares como eram também não ... as pessoas deixaram de os frequentar ... as nossas rotinas foram totalmente descontinuadas,  o desábito tomou totalmente conta das nossas vidas !  
Cada um está nas suas casas, vendo o mundo desde as janelas, com vidas totalmente individualizadas, em que ninguém sabe de ninguém, em que apenas a comunicação virtual finge aproximar e unir as pessoas ... em que o silêncio impera e a solidão dita as regras !
Um mundo triste, cinzento, apático e total e indiferentemente absurdo !!!

O tempo passa.  Dentro de um mês é Outono outra vez.  As notícias que trago não melhoram, a realidade não se altera favoravelmente ... continuamos suspensos de uma esperança a consumir-se, de uma força a delapidar-se e de um ânimo em regressão !!!
Até quando ???!!!

Até amanhã !  Fiquem bem, por favor !

Anamar

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

" PORQUE É DIA DE FESTEJAR ... "

 


O Kiko faz hoje anos.  13 ... ele que parece ter nascido ontem !
Já foi o benjamim da  família, quando se pensava que o iria ser para sempre.  Aí, surgiu a prima, a Teresa agora com três anos, que na altura não estava verdadeiramente programada.
É o terceiro de uma "escadinha" de três, espaçados também de três anos e é também o mais "meloso" dos irmãos !
É ele que me espera na porta, é ele que me dá daqueles abracinhos de encher a alma, ou que me diz "olá avó", quando a mãe me fala do carro e mais ninguém dá um "ai" do outro lado ...

Já contei algumas vezes, em anos transactos, quanto o auto-denominado  Kiko ( ele, que sendo Frederico de nome, sugeria vir a ser p'ra todo o sempre, Fred ), tem sido um puto quase autónomo desde que nasceu.  Sempre a rir, sempre descontraído e bem disposto, não é uma criança de stresses, angústias ou preocupações.
É, como já lhe chamei, verdadeiramente um "menino light ", fácil de criar, um facilitador das relações, extrovertido e amado por todos.  Desde os adultos, aos miúdos da sua faixa etária, o Kiko semeou um verdadeiro clube de fãs, no colégio, no desporto ou nas relações sociais.
Desde sempre de bem com a vida, tudo se simplifica na sua óptica.  Ele não pára, ele inventa, ele resolve, ele sempre faz parte da solução e nunca do problema.

Inaugurou a senda dos "teen" ... e isso poderia conferir-lhe um estatuto de maior seriedade e circunspeção ... 😄😄 Isso pensamos nós, porque o Kiko com a sua bonomia de encarar o mundo, por nada nesta vida fecha o sorriso que sempre lhe emoldura o rosto, ou apaga a luz dos seus dias que sempre são uma festa  !!!

Embora longe, estou junto de ti em coração, Kiko,  e auguro-te um dia supimpa, cheio de boa disposição, brincadeiras  e muita alegria, esperando que a vida, que muitas vezes é mais madrasta que mãe, te poupe e te providencie uma estrada atapetada e mansa, por onde persigas os teus sonhos e aspirações e possas alcançar a sua realização !!

PARABÉNS  meu amor !!!

Anamar

terça-feira, 18 de agosto de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - tempo sem fim ...

 


Retomo hoje, algo que a bem dizer, nunca findou ... esta saga que são as nossas vidas, neste cinzentismo rotineiro e saturante de dias sem definição.

Nada de novo, de especial ou de interessante tenho para contar.  O tempo flui aparentemente igual, sem que o seja, esgotando-nos descaradamente a ampulheta que carregamos desde que aqui pisámos.   

A vida busca uma tentativa de normalização, com os números da pandemia rodando com uma certa generosidade, no nosso torrão.  Pingam alguns / poucos óbitos ; os infectados, embora sempre em crescendo, não têm comparação com os valores que países vizinhos  novamente apresentam ... A coisa parece ter abrandado !

Entretanto Agosto já vai a meio e Setembro já se colora com tons de um Outono ao virar da esquina.

O tempo passou ... aliás, o tempo está a passar num ano de total desperdício, num mundo artificial e compulsivamente parado, em vidas suspensas de um amanhã que se desconhece, que não se visualiza e que se receia, globalmente. 

Faz-se de conta que já se respira, que já se vive de novo ( a inventarem-se simulacros de férias, acreditando viver a felicidade e o bem estar que normalmente elas transportam ), faz-se de conta que o pior já passou.  As pessoas já se frequentam com uma maior descontracção, é verdade, apenas com os cuidados inerentes ... distanciamento e nada de exuberância nos afectos !  Vai-se comer fora se for o caso, sem reticências ... faz-se a vida social de compromissos diários, beirando o trivial.      Retomam-se as actividades profissionais, os lay-off  decretados pelo estado no apoio económico às empresas, estão cessantes ;  com todas as violentíssimas dificuldades e restrições, os sectores da sociedade que podem, repegam, a ver se ainda se salva alguma coisa nesta hecatombe económica sem tamanho ... A vida escolar  das nossas crianças também regularizará dentro de sensivelmente um mês, o que fará disparar em sobressalto de novo, o coração dos pais ... 
Enfim ... será que a pandemia, assimilada por rotina, cansaço, ou porque a vida é assim mesmo ... está a começar a fazer parte de uma "normalidade anormal" ( como diz um amigo meu ) do nosso dia a dia, convivendo e coabitando connosco no nosso quotidiano, já por alguma inércia ?!

A máscara faz parte da indumentária diária, e é raro esquecermo-la em casa.  O frasquinho do álcool-gel, quase garanto sem erro, habitar todas as carteiras das senhoras.  A exigência das marcações prévias necessárias para todos os serviços que necessitamos, está-nos interiorizada nos hábitos.  Não se entra no supermercardo sem automaticamente percebermos a aquiescência do segurança, que dantes nem parecia estar por ali ... O desvio de percursos é vulgar se se nos avizinha gente demais.   Na praia estima-se um perímetro considerado seguro, em relação a vizinhos de chapéu ... Normal, naturalmente ... pacificamente !  
Cumprimentamo-nos de cotovelo, e ainda esboçamos um sorriso amarelo ... Qualquer dia, já nem isso !  Evitamo-nos, isolamo-nos, assumimos comportamentos anti-sociais  com a maior normalidade possível ... quase indiferentes !  Como se tivesse sido sempre assim ...                                                  
Estranhamente estamos vestidos de uma camuflagem pandémica própria.  Estranhamente estamos imbuídos de uma sensibilidade em adequação perfeita ao "modus vivendi" que nos é exigido.  Estranhamente estamos a assimilar hábitos, a interiorizar costumes e posturas que já nem questionamos,  o que significa que a "doença" se está a tornar crónica ...

O rosto da nossa sociedade hoje, já é totalmente distinto do que era.  E o desespero, a raiva e a fúria contra a violência de todo este desajuste a que fomos sujeitos, da noite para o dia, e que nos torturavam inicialmente, parecem ter-se desvanecido, diluído ... estarem a sumir-se por detrás da conformação, da angústia, e da mágoa da impotência de alterarmos o que quer que seja ...

Entretanto, lá fora, mesmo na Europa ( não falo do terror de países como os Estados Unidos ou o Brasil ), os números da pandemia parecem recrudescer, e fala-se na "bendita" nova onda ... 
Aqui mesmo, olha-se o Outono e o Inverno com desconfiança, temor e ansiedade.

Entretanto li que o Atlântico pode, neste momento, ser receptáculo de mais de dez vezes a quantidade de resíduo plástico que se supunha nele existir.  Há micro e nano-resíduos plásticos nos tecidos humanos, cujas consequências invasivas se desconhecem, em termos de saúde pública ...

Em Portugal, a crise social inevitavelmente se acentua.  Os sinais estão aí. Milhões de apólices de seguros obrigatórios por pagar, a busca de ajudas sociais em instituições que apoiam a comunidade no fornecimento de géneros básicos, aumentou significativamente ... Acredito que já haja fome entre os portugueses !...
Continua o flagelo dos focos infecciosos nos lares e um fim ainda mais injusto e aterrador a espreitar os mais fracos, impotentes e ... silenciosos !!!

Só "boas" notícias !!!

Até amanhã !  Fiquem bem, por favor !


Anamar                                                                                                             

domingo, 16 de agosto de 2020

" SENSAÇÕES, EMOÇÕES E REFLEXÕES ... "


 

Estive frente ao mar.  Aquele mar imenso, limite da costa ocidental da Europa, aquela imensidão de água que vai e que vem, numa melopeia dormente e doce, que nos lembra que adiante, sempre adiante, algures muito muito longe, tropeçaríamos num novo continente ... do outro lado ... a América !
O Atlântico com toda a sua magnificente autoridade, banha, beija ou açoita as rochas imemorialmente esquecidas nas areias sonolentas ... Nós, que vivemos paredes meias com ele e dividimos a nossa vida a cada esquina, com aquele misterioso e infindável azul !...

As falésias da Aguda são para mim, por todas as razões, quase um local de culto !
De meditação, de introspecção e reflexão ... são-no seguramente, há demasiado tempo na minha vida. 
Há um promontório erguido, desenhando uma costa recortada estendido desde o Cabo da Roca em direcção a norte, tendo aos seus pés, algumas das mais belas praias portuguesas - as praias sintrenses da Ursa, a Adraga, a Grande, a Pequena, as Maçãs, a Aguda, o Magoito, a Samarra, dando continuidade às praias ditas do Oeste.
Frente ao Santuário do Sol e da Lua que encabeça o areal das Maçãs,  a encosta norte da Aguda trepa em direcção aos céus e queda-se na interioridade e no intimismo dos silêncios, onde só o marulhar cá em baixo, o sopro ora ameno ora agreste da brisa ou da ventania, ou o grasnido largado pelas gaivotas e outras aves marinhas que se espraiam nos céus ... se atrevem  a deixar-se escutar !
O resto é aquela ausência de ruído.  O resto é aquela paz que se contagia.  O resto é a presença clara da imortalidade, reinante !
Os zimbros, o cravo romano, as camarinhas, o canavial, os carrasquinhos e toda a vegetação endémica desta orla marítima trepa com ela, bravia e indomada, ornando-se de flores no auge da primavera, ou amodorrando quando o sol impiedoso do Verão e o vento das arribas, assim o determina !

A espiritualidade que se sente, se respira e nos invade o peito, que nos toma conta das veias e nos sobe ao coração, coloca-nos a nu perante os desígnios da existência, perante a justificação do ser, perante o princípio e o fim ... perante a vida e a morte ...
Despoja-nos e desarma-nos face à pequenez das coisas terrenas, face às razões que nos impulsionam por cada dia de vida, face à real importância do que nos move, nos toca e nos motiva ... face ao que nos indiferentiza, face ao capaz de nos acelerar o coração ... face ao que nos sufoca em cada minuto, ao capaz de nos envolver e mobilizar ... ao que nos abre os olhos e ao que nos cega a alma !... 
Remete-nos para a aleatoriedade do viver, para a puerilidade das urgências do ser humano, para o tudo e para o nada ... para o efémero da nossa passagem por aqui, nós que somos não mais que um grão de poeira neste Universo onde chegámos, onde estamos apenas de passagem, onde nunca nos perguntaram nem perguntarão o porquê de termos vindo ... qual o momento de partirmos ...
Neste lugar esquecido de um planeta ... afinal apenas um "pálido ponto azul" perdido no Cosmos, empoleirado num raio de sol ...

Nas arribas da Aguda, deitei os meus pais em repouso, na sombra de uma camarinha  protectora, junto àquele pórtico rochoso que me simboliza o antes e o depois ... que me desvenda a eternidade ... que me fala da passagem ...
frente àquele mar sem horizontes, sem princípio ou fim, sem limites que o detenham, onde cada onda jamais se repete, onde cada momento é único  e singular ... onde o céu parece tocar as águas profundas bem longe, lá ... onde o sol adormece, por cada dia que finda ... 
Aquele mar que é berço de embalo, e que pelas eras jamais silenciará a sua canção de "ninar" !...

Ali  estarei eu também, um dia ... quando tiver que ser !...

Anamar

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

" HOJE É DIA "...

 



NÃO  PODIA  DEIXAR  DE  VOS  DIZER ...


Já escrevi um livro, já plantei uma árvore ... já fiz um filho !...

Posso então morrer - diz a frase sábia !

Há 47 anos, num 13 de Agosto ensolarado e quente, pus uma filha no mundo.

28 anos depois, num 13 de Agosto igualmente ensolarado e quente, ela pôs um filho no mundo.  Ou seja, há 19 anos, eu tornei-me mãe duas vezes !

Quando alguém nasce de nós, fica-nos assim no peito, um misto de sentimentos e emoções, que não entendemos direito, que não sabemos direito, que nem imaginamos sequer ...

Quando uma extensão de nós desponta, é um deslumbramento ímpar que nos adoça a alma, como um milagre a operar-se nos nossos braços ...   É um enlevo que nem acreditamos merecido.                                Mas é também um susto e uma ânsia, porque sabemos que nunca as nossas asas serão suficientemente grandes, para lhe dar a protecção, o amparo e o ninho, que a vida tantas vezes experimentará roubar-lhe ...

Quando alguém nos procede, é a reinvenção de nós mesmos, que a existência nos deita no cólo.  É o garante de estrada continuada.  E sempre esperamos que ela seja mais luminosa, generosa e feliz, que a nossa própria ...  São os nossos valores, as nossas convicções, aquilo em que acreditamos e por que lutámos, que caminham ... que queremos passar adiante !...Mas são também os nossos sonhos, as nossas esperanças e as nossas apostas, reeditados nesse filho ...

Por isso hoje, noutro 13 de Agosto ainda ensolarado e quente, eu deixo aqui o meu beijo do tamanho do mundo, à Cláudia e ao António, grata que sou, por eles serem quem são, na minha vida !...

PARABÉNS  Cláudia !!!   PARABÉNS António !!!




As mais recentes que consegui !  ( cerca de um ano atrás )

Anamar

domingo, 9 de agosto de 2020

" QUANDO O SONO NÃO NOS ACOLHE ..."

 

Pouco passa das 6 horas de mais uma madrugada de domingo, de um Agosto quente e pardacento.

Desde as quatro que rebolo na cama, desde as quatro que vagueio pelo Google em busca de informação.  Talvez compreenda melhor agora, quem, perante uma situação concreta, uma dúvida ou muitas dúvidas importantes, angústias instaladas, busca de respostas para miríades de perguntas que nos assaltam, tenta, com os meios de que felizmente dispomos, obter explicações, informações ... orientações objectivas que possam trazer tranquilidade ao espírito, algum sossego ao coração.

Lá fora começa a clarear. Não é bem azul, não é bem laranja, não é bem neblina, a faixa que se desenha lá ao fundo, para os lados de Sintra ... para os lados do mar ... tão longe daqui !  O sol ainda não acordou !...

Sempre condenei quem procura caminhos ou soluções nos artigos avulsos, descontextualizados, que proliferam naquele poço sem fundo que é a internet.  Sempre me insurgi e entendi ser absurdo, disparatado e asnático fazê-lo.  E é-o de facto, primordialmente se se buscam esclarecimentos, caminhos, respostas, soluções para problemas relacionados com a nossa saúde, leigos que somos no que a ela concerne.   E ainda que não sejamos iletrados ou totalmente desconhecedores até mesmo de alguma linguagem e terminologia científica ... não queira "o sapateiro tocar rabecão!"...

A paz não nos chega por ali.  O coração não se aquieta por lá.  A cabeça não pára, nem o sufoco nos afoga menos depois disso !

A pequenez humana, a desprotecção, a vulnerabilidade em que nos sentimos largados ( quando objectivamente consciencializamos que a única coisa que realmente importa é a saúde, nossa e dos nossos ), tornam-se claras, e reduzem a poeira insignificante todos os tormentos existenciais, todos os "imensos" problemas de ordem prática "insuperáveis", "insanáveis" e "inultrapassáveis" que nos massacravam, todas as dúvidas sem cujas respostas não sabíamos aparentemente viver, todos os medos e fantasmas imaginários que nos assaltavam e todas as insatisfações "dramáticas" que nos consumiam ... Tudo isso fica, de facto, incrivelmente ridículo !

E tudo isso parece ficar infinitamente pequeno, face ao infinitamente grande que é o ter que enfrentar o balanço de maré batida repentino nas nossas vidas, que vogavam em águas conhecidas,  que se faziam  entre parâmetros expectáveis, com variáveis controladas ... e ter que encarar de repente, inesperadamente, do nada e na tocaia da emboscada, a dúvida, a angústia do desconhecido que espreita e ameaça, a ansiedade que a escuridão da noite avoluma em travesseiros que não se tornam os melhores conselheiros ... o medo do que virá, do que nos espera na próxima esquina ... o medo real ... muito além de nós.  Pelos nossos !

De facto, quando o chão nos foge debaixo dos pés, quando não depende do nosso querer, do nosso empenho ou esforço a resolução das questões que oscilam entre a saúde e a doença, entre a vida e a morte ... quando de gigantes nos tornamos pigmeus na aleatoriedade da existência, é que percebemos como não passamos de meros peões neste jogo de xadrês que é a Vida !

Faz-me tanta falta aqui a força da minha mãe, a coragem face à adversidade, aquela sensação de asa protectora que aninhava, que cobria, que defendia ... aquela sabedoria de mulher simples, mas velha, experiente e doce !...

E depois há o silêncio ... a força torturante do silêncio ...

Há quantos meses eu vivo em silêncio ?  Há quantos dias eu falo comigo mesma, olho os gatos que, esses sim, apreciam pairar quase só ... e não desmancho de nenhuma forma o nó sufocante que me aperta por dentro ?!

E depois o silêncio que gera silêncios, no desábito de falarmos ... na habituação à ausência de sons e de sinais de vida entre estas quatro paredes ... Solidão ...

Estou totalmente desestruturada, desmantelada emocionalmente.  Estou sem armas, sem resistências, sem nós e sem âncoras ... e isso assusta-me, isso inquieta-me, isso tira-me o equilíbrio que me importa para continuar à tona ... isso, apavora-me ... Esse auto-controle que me escapou por entre os dedos, gera-me exactamente esse sentimento inquietante ... pavor !

Cansaço ... um cansaço atroz que já só desperta lágrimas desobedientes e inoportunas, por tudo e por nada.  Um sentimento assumido de nada valer a pena.  Uma inércia que me tolhe, me paralisa e não me deixa dar um passo ... nem que seja em busca de ajuda ... nem que seja em busca de palavras ... nem que seja em busca de gente ...

Não sei.  Não sei mais nada ! Só sei que estou morta por dentro ... isso sim !


Anamar

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - e hoje foi assim ...






Setenta e cinco anos se cumprem hoje sobre o pesadelo de Hiroshima !  Setenta e cinco anos sobre uma das maiores máculas e das maiores vergonhas com que se escreve a História da humanidade !

O amanhecer  daquele dia mostrou do pior que o ser humano é capaz.  O vivido naquele e em todos os outros dias com que o Homem teve de confrontar-se daí para a frente, retratou também, a sua capacidade resiliente, a sua capacidade regenerativa, de coragem, sobrevivência, superação e solidariedade ... face à estupefacção, à revolta e ao ódio perante a ignomínia ali acontecida ...

Porque, espantosamente, a raça humana tem uma capacidade de se reerguer,  de se amparar e de se reinventar, absolutamente incomparáveis !
Depois do choque, do abalo, da dor e da angústia pela incompreensão, pelo absurdo das coisas ... quando pode pensar-se que o estado cataléptico subsequente, inviabiliza a capacidade de raciocínio, de resposta, de coragem e abnegação ... quando pode pensar-se que o golpe sofrido tem uma dimensão inenarrável e sem tamanho, que sucumbe e narcotiza mortalmente todos, pelo facto de serem gente ... o Homem pára por instantes, chora os mortos, trata os feridos, coloca pedra sobre pedra outra vez, apaga as marcas e encara, de peito feito, um futuro que lhe fora interrompido, arbitrária e brutalmente, pelo destino !
E cambaleante primeiro, reforçado depois ... titubeantemente repega a estrada e recomeça a caminhar !

É sempre assim !
Nos piores momentos, nas piores catástrofes, nas maiores desgraças, venham elas de onde vierem, o Homem agarra de novo o amanhã !!!...

Neste momento, como sabemos, atravessamos mais uma catástrofe mundial.  A pandemia devastadora varre o planeta sem dó nem piedade, zurzindo, destruindo, aniquilando vidas aos montes, rápida ou paulatinamente, de uma forma avassaladora e sem tréguas.
Amputam-se vidas, mas também se amputam sonhos, projectos, famílias, afectos ... como um vendaval que sopra sem rumo ou direcção, sadicamente, enrolando-nos em redemoinhos vorazes, em espirais mortíferas ... num atentado à resistência e ao equilíbrio dos que por aqui vamos estando a enfrentar a borrasca.
Ora num pé, ora noutro ... porque já não dá muito bem para ter os dois no chão ... vamos lutando por um equilíbrio precário, esgaravatando no fundo do nosso reservatório emocional, um resquiciozinho sobrante, de esperança, de confiança e de coragem ...  Até que der ... enquanto der !...

Beirute sangra mortalmente a céu aberto, sem contenção, estancamento, ou garrote que lhe valha.
Um tsunami de pedras, de vidros, de fogo, de dor, de carne dilacerada, de sangue bordejando as ruas ... uma onda nascida sem quê nem para quê, fez sucumbir no estrépito de duas explosões incompreensíveis e injustas, o que antes já fora uma cidade e um país flagelado pela guerra e pela incompreensão do Homem.
Uma devastação e uma razia que nos trazem de novo à mente as imagens de Hiroshima e Nagasáqui, chegaram-nos pelas câmaras dos foto-jornalistas, pelas descrições dilaceradas e realistas dos repórteres, pelo cansaço e desmantelo dos corações de quem, coberto de sangue, aguarda socorro ou vagueia apático pelas ruas, buscando qualquer coisa, ou alguém ... Talvez simplesmente uma explicação para o que a não tem !...
Valha-nos uma outra vez a resposta humana solidária, do ser que tantas vezes parece não sê-lo.  A mobilização pronta e rápida em meios, em recursos materiais e humanitários, com amparo imediato vindo mesmo de povos cuja ajuda política seria menos provável ... mostra que afinal, talvez nem tudo esteja perdido nesta raça a que pertencemos !...

Entretanto, por aqui, nestes dias de temperaturas passando em muito os trinta graus, as notícias remetem-nos uma outra vez para as brutais, visíveis e sentidas alterações climáticas a nível planetário, para nos dizerem que os pólos estão a sucumbir ... também eles.
Os termómetros sobem a valores nunca antes registados, a fauna e a flora, sofrem impiedosamente.
Os ursos brancos, perdidos do seu habitat natural, vagueiam em busca de alimentos.  
Os gelos e as neves que eram perpétuos, fundindo, descobrem vestígios geológicos de eras insuspeitas.  Cadáveres de espécies não decompostas que haviam ficado soterrados sob o manto branco teoricamente eterno, contêm em si micro-organismos, vírus e bactérias, constituindo-se potenciadores de novas transmissões epidemiológicas futuras ...

E por cá, ainda, a crise sanitária abrandou.  Ou dormiu p'ra sesta ... pelo menos por ora.
A crise económica recrudesce, contudo.  As notícias do desemprego, as notícias calamitosas que nos deixam destruídos e impotentes, veiculadas pelas vozes de desânimo e cansaço, pelo olhar meio perdido dos que lutam para se manterem à tona, contudo com a onda  a  galgar-lhes  a  garganta ... são devastadoras,  aflitivas  e  profundamente  angustiantes !!!
A subsistência é cada vez mais uma luta sem tréguas.  Apenas, milagres não existem !...

Bom ... e este é o balanço do dia de hoje.  O que me ocorreu sobre o tanto que nos atormenta ...

Até amanhã !  Fiquem bem por favor !

Anamar