domingo, 5 de maio de 2019

" UMAS E OUTRAS ... "





É ... é mesmo verdade !  As nossas cegonhas já não vão embora .

Fiz-me ao sul, numa de aproveitar alguns / poucos dias estivais que assomaram por aqui, neste Verão ainda longe de o ser.  Atravessei o Alentejo, que nesta altura do ano consegue estar ainda mais belo.
Os matizes de verdes, misturados com uma paleta que esgota todos os tons, das flores em explosão pelos campos, pintam uma aguarela assombrosa !
Os animais pastoreiam.  Na hora da sossega, as sombras dos sobreiros, das azinheiras ou das oliveiras, fazem do montado um céu pintalgado de pequenos pontos imóveis, adormecidos.  De quando em vez, pachorrentamente, deixam-se  ouvir os chocalhos ecoando na planície que se perde ...
Lá, as cegonhas ocupam os lugares altos. Os postes de alta tensão albergam ninhos e ninhos, numa convivência pacífica de condomínio.  As crias, de tamanho menor, habitam tribunas de privilégio, enquanto os pais catam pelos campos, o sustento necessário.
E rasam as copas das árvores, de asas esticadas, num voo soberano, aragem fora, garbosas, altivas, senhoras e donas da charneca.  É um enlevo olharem-se ...

E já não vão, de facto, embora.  As alterações climatéricas notoriamente mais favoráveis, neste nosso torrão abençoado, de pés de molho no Atlântico, já não lhes justifica a longa viagem em demanda do calor do norte de África.
Ficam ... Casa já têm ... pequenos arranjos de obras básicas, garantem-lhes de novo a estadia com qualidade ...

Por pássaros, incoerências e afins, lembrei dos passarinhos que vi em Myanmar, à porta de um Templo Budista.  Eram muitos, miudinhos, talvez menores que os nossos pardais dos telhados.  
Esvoaçavam, em espaço reduzido, numa gaiola quadrada, ao lado da qual uma mulher birmanesa se acocorava no chão.
O calor era violento, o sol era carrasco e a precária sombra que os protegia, não seria suficiente para os aliviar daquele sofrimento visível.  Água e comida, penso que não tinham.
Inocentemente, e com o conhecimento ocidental, indaguei dos seus destinos.  Se terminariam em iguaria culinária ...
Que não.  A sua liberdade, "comprada" por um euro, garantiria "pontos" no karma de cada um, que a essa boa acção se propusesse ...
Formas enviesadas de angariar o sustento, subterfúgios ardilosos de subsistência ... ou uma simples "transacção" com o além, num país de preceitos teoricamente rigorosos e condutas impolutas sob orientações e valores inquestionáveis ?!
Ou ... ( pensava eu ) apenas imperfeições, adulterações e incoerências humanas ???!!!...

Eu, ter-lhes-ia aberto simplesmente a gaiola, olhando-lhes a liberdade alcançada de um céu imenso, inteiro, sem limites,  para desfrutarem, seres vivos que são, numa terra por onde Buda apregoa uma lição de amor ...

Hoje, primeiro domingo de Maio, institucionalizado "Dia da Mãe", põe uma outra vez o consumidor, na senda exacta do consumismo, em mais um dia do calendário destinado a isso mesmo.
Sou dos tempos em que o Dia se assinalava tão só com o beijinho especial, carinhosamente trocado logo pela manhã, e a oferta de um cartãozinho feito pelas nossas mãos infantis.  Despretensioso, naïf, simples ... escrito com as letras pequeninas, cuidadosamente desenhadas ... traduzia na sua singeleza a autenticidade das coisas raras, realmente sentidas.
Após a partida da minha mãe, no desfazer da sua casa, encontrei alguns, religiosamente preservados entre os seus guardados.  Uma das netas quis manter a sua posse.
Afinal, como qualquer mãe sabe claramente ... e ninguém como ela consegue perceber com justeza e atestar com veracidade ... mãe  é  coisa de sempre, de todos os dias, de todas as horas ... de toda a vida ! Mãe é incondicional, é irrestringível, é perene !   É coisa de plantão ... tempo integral ... Porque é sangue e é carne, é amor e é dor !...  E o cordão que nos garantiu a vida durante nove meses, nunca nos é realmente cortado !
Quando já não está entre nós ... mãe, está dentro de nós !  Presente, "ad eternum" !...

Bom, hoje foi assim.  Divagações ao sabor das histórias, conforme me chegaram, umas e outras, à memória e ao coração ...



Anamar

Sem comentários: