sexta-feira, 24 de julho de 2015

" NÃO HÁ VOLTA A DAR ... "




A gente não gosta de confessar que vive em solidão.  E não gosta, por muitas razões.

A solidão pode ser uma mera circunstância do destino, mas admiti-lo, pode também ser o reconhecimento de uma incapacidade pessoal : a inabilidade para "reter" junto de si, laços afectivos, empatias ou afinidades, ao longo da vida.

De alguma forma, quem se ama nunca se separa verdadeiramente, quem tem empatia ou reconhece afinidade com alguém, normalmente não se afasta desse alguém, porque com linguagens próximas, interesses similares ou gostos idênticos, o eco emocional que retorna da partilha, é gratificante e ajuda a viver.

Poder reflectir junto, sonhar junto, olhar na mesma direcção com alguém ... fazer planos, arquitectar futuros, ou simplesmente não dizer nada e apenas "sentir-se" ... aliviam a carga que nos é destinada diariamente, atapetam caminhos difíceis, amaciam veredas sinuosas, dão-nos vitaminas para a alma ... devolvem-nos a esperança !
 A divisão do fardo, alivia esse mesmo fardo, enquanto que a partilha de uma emoção cúmplice, potencia essa mesma emoção !...

E por isso, o aceitar-se que não se alcançou esse desiderato, o colocarmo-nos alvo de alguma comiseração ou "simpatia solidária", de alguma forma inibe e fragiliza, porque estigmatiza socialmente.
E o Homem silencia em si, a mágoa dessa incapacidade !

Neste momento, calculo que a solidão seja uma das maiores "pragas" à superfície da Terra.
Nos grandes centros populacionais, é mesmo gritante.
A grande metrópole cria muros, nunca pontes, entre os indivíduos.  As pessoas cada vez vivem mais sós, em verdadeiros guetos, entrincheiradas nas suas colmeias, reduzidas à célula quase anónima das suas casas.
O ser humano vive embiocado em "construções de lego", impessoais e descaracterizadas, e com um bocadinho de jeito, não conhece sequer os que partilham consigo o seu espaço próximo.
Pode estar feliz, pode sorrir, pode chorar, pode desabar entre as suas quatro paredes ... pode sofrer ... pode morrer ...
Dificilmente alguém o pressentirá ... dificilmente alguém o saberá.  Pelo menos, atempadamente ...

Na generalidade, o mundo é de indisponibilidades.
O Homem, nesta época de tecnocracia exacerbada, da sociedade massificada, da competição desenfreada, da formação para o sucesso fácil, da ascensão a qualquer preço, da valorização do supérfluo em detrimento do essencial ... o "salve-se quem puder", num egocentrismo sem tamanho, a ausência de escrúpulos e de solidariedade  ... isolam as pessoas, centram as pessoas em si mesmas  e nos seus interesses, e privilegiam a solidão.
A correria da vida actual, as necessidades prementes, impostas por uma estrutura social excessivamente musculada, que não se condói, promovem o afastamento progressivo, por reais incompatibilidades de figurinos ajustáveis, semeando uma solidão muitas vezes acompanhada, mas real !

Por outro lado, também o avanço da faixa etária tende obviamente a instalá-la.
Numa fase da vida em que muito do melhor que possuíamos nos vai sendo sonegado, em que já perdemos fisicamente muitos dos nossos afectos, em que a pujança, a robustez e a frescura nos falham, em que os sonhos começam a assombrar-se com a realidade objectiva, em que o crer e o querer também claudicam face às naturais e irreversíveis leis biológicas, a solidão será então a mais devastadora, injusta e dolorosa pena, que algum ser humano poderá em cúmulo, sofrer !!!...

A gente não gosta de confessar que vive em solidão, por muitas razões ...
Mas na verdade, se mais não for, como seres gregários que somos, jamais nos habituaremos a conviver com ela !!!...

Anamar

Sem comentários: