segunda-feira, 7 de novembro de 2022

" O VERÃO DOS MARMELOS "


Novembro chegou.  O característico tempo cinzento instalou-se, como seria de esperar.  Ainda não está frio, mas também já não temos o aconchego das temperaturas da estação anterior.  
O S.Martinho parece fazer cara feia contra aquilo a que sempre nos habituou, e o "Verão dos marmelos" que coincide segundo a minha mãe dizia, com o S.Mateus cuja comemoração em Viseu implica a realização da grande feira anual, já terá terminado.  

Quando o tempo azulava de novo e o sol persistia em brilhar brincando connosco de um Verão de fazer de conta, numa aparição fora de época, todos nos preparávamos para o S.Martinho que ainda haveria de nos ensolarar a vida, antes do escuro e do desconforto que aí vinha.  
Tempo de magustos, castanhas e água-pé, pretexto enviesado para algumas paródias, sobretudo se estivéssemos na aldeia, eram momentos sempre inesquecíveis ...
Afinal é uma época de doçura nas despensas e no tempo.  Àquelas, descem as compotas, os doces, as marmeladas ... a este, descem as tardes alaranjadas de sol manso, descem as cores duma natureza que se embrulha  num manto com restos de folhagem nas árvores e nos arbustos, e tapetes fofos a restolhar pelo chão à frente da aragem quando sopra ...

Mas antes, como disse, a minha mãe afirmava . "Ainda aí vem o Verão dos marmelos" !   
Comprados na Feira de Outubro no Redondo, os marmelos, amarelos, cheiinhos, com ar promissor, eram comprados aos quilos ... muitos ... para a desejada marmelada, feita em casa dos meus avós e que tinha à sua espera, as prateleiras da despensa, na nossa casa de Évora.
Colocada em travessas fundas adquiridas para o efeito na Feira do S.João, e cobertas com papel vegetal, iria durar o ano inteiro até que nova "safra" se anunciasse.
"Bem docinha", exigia o meu pai, sempre guloso além da conta ... 😆😆
E assim era !...

Hoje, resta-me a memória desses dias idos.  
Os marmelos continuam nos mercadinhos, ou nas grandes superfícies, amarelos e cheiinhos. As travessas fundas ainda existem na minha casa ... o doce que barrava o pão está-me ainda na boca ... Tudo o mais se esfumou no tempo ...
O cheiro das castanhas assadas sobe da rua, se a vendedeira escolher o recanto do meu largo pra fazer negócio ... Marmelada, às vezes oferecem-me uma ou outra tacinha, p'ra matar saudades ...
O meu pai não poderá já opinar sobre a medida do açúcar a usar, a minha mãe também já não anuncia mais o "Verão dos marmelos", e as prateleiras daquela despensa permanecem vazias da remessa que todos os anos as haveria de adoçar !...

Anamar

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