quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

" IRRESOLÚVEL ... SERÁ ? "



Referi aqui vezes sem conta, como me isolo gradualmente mais e mais, numa indisponibilidade emocional para conviver, sair de casa, cumprir programas, espairecer ...
Argumentando uma real falta de paciência, uma intolerância óbvia para as trivialidades diárias, um cansaço para as minudências do dia a dia, afasto-me, silencio-me, remeto-me ao espaço confinante da minha casa, e consequentemente adio ou remeto para melhores ocasiões, encontrar pessoas, partilhar momentos, dividir conversas nem que seja simplesmente em frente a uma chávena de café.

Telefonar, só em "desespero de causa", ou seja, quando as escapatórias já não existem.
Não recuso nada, digo sempre sim a tudo, ou melhor, não me inibo de prometer qualquer coisa, só que ... sempre sem data marcada.
"Ah sim, claro, temos que tomar um café ..." , "vamos, afinal já passou tanto tempo ... ", "havemos de almoçar ... quando agora o tempo melhorar" ... etc, etc.  Tudo com a mais séria intencionalidade.  Quando prometo e me comprometo com a disposição, até tenho intenção de cumprir, e até pareço já saborear a pequena felicidade dessa promessa.  Só que, depois, desinvisto totalmente, e o passo seguinte é ou fazer-me de desentendida ou inventar uma súbita impossibilidade para me fazer presente.

Sinal de envelhecimento, disse-me assim de caras, frontalmente, uma conhecida que já não via há algum tempo e que é, ao contrário de mim, toda gaiteira.  Eu ri-me, achando que ela estava inteiramente certa.
Acho que o imobilismo que me domina, a inércia que me envolve e esta espécie de "paralisia" onírica, conduz-me a um estado de letargia muito pouco saudável.  Pareço atascada num lamaçal que me está a limitar na vida diária.
Deixei de me entusiasmar, deixei de me empolgar com o que quer que seja, estou remetida a um "silêncio" interior, a um torpor desmotivador, em relação ao mundo.  É como se estivesse numa hibernação emocional doentia, como se estivesse por aqui esperando apenas que o tempo passe.  E isso em termos de saúde física e mental não é positivo.
Faço esforço para interagir, à conta de não ter paciência.  Fico indiferente e pouco disponível face a quase tudo, num abandono patológico.  A verdade é que a realidade pouco me motiva ou entusiasma.  Notícias terríveis pelo planeta, que já não sei se é melhor conhecê-las, se não.  Que me martirizam e penalizam profundamente, sem remédio à vista, deixando-me com o peso da impotência ainda maior sobre o coração.
Até as viagens que não há muito tempo atrás sempre eram motor de arranque para eu ficar feliz, não conseguem alavancar-me para novos sonhos, desejos ou vontades.  Nada. Vibro, mas não como dantes me acontecia.
"Velhice" ... martela-me os ouvidos ...

Esta terra que habito está descaracterizada.  A Covid deu conta do convívio, da partilha, dos encontros entre as pessoas.  Deixámos de sair tempo demais, confinámo-nos em períodos demasiado longos, os espaços nossos conhecidos alteraram-se fisicamente, uns fecharam, outros vocacionaram-se de outra forma.  As pessoas, afastadas umas das outras não conseguiram reabilitar os hábitos, os laços, os interesses.  Morreu muita gente, outros saíram das grandes cidades e rumaram à terra, onde por vezes possuíam casa, deixámos de saber dos destinos de muitos ... e fomos ficando mais sozinhos.  Nós e os nossos novos esquemas de vida, numa readaptação às exigências dos tempos.  
Em suma, tudo mudou, muita coisa, irreversivelmente !
Eu entristeci ...

Não consigo engendrar uma estratégia remediadora que me impelisse para diante, que me iluminasse de novo os olhos, que me acelerasse as batidas do coração, que me tirasse desta podre zona de conforto e me restituísse o sorriso ao rosto.  Nada que me fizesse acreditar que a minha alma afinal ainda é jovem, ainda arrisca, que ainda ousa, como dantes... que ainda tem rasgos de loucura ... Uma estratégia que me faça de novo pular as baias, mergulhar no impossível sentindo-o possível ... que "me livre da morte em doses suaves" ...

O cansaço é progressivo, e vou ficando por aqui ...
Talvez, como diz Pablo Neruda ... irresoluvelmente, a "morrer devagarinho ..."

Anamar

1 comentário:

Anónimo disse...

Extraordinário, quem diria ?
Não te reconheço Margarida, mas quem sou eu afinal ?
Escolheste caminhos que te levaram a esse estado de espírito.
Portanto na qualidade de velho amigo, só te posso dizer que existem muitos outros caminhos e ainda muito mundo para descobrir, mesmo perto de ti.
Sei que tens uma capacidade regenerativa fantástica.
Faz o que sempre fizeste, dar a volta.
Jonas