sexta-feira, 11 de setembro de 2015

" ADIANTE ... SEMPRE ADIANTE !... "


Liga-se a televisão, e é inevitável.  Lêem-se os jornais e é inevitável.  Entra-se na Internet e é inevitável !

Não há como fugir às notícias, como ignorar a realidade, como esquecer o terror, como encolher os ombros à angústia.
A sangria rumo à Europa, de fluxos intermináveis de gente em fuga, de continentes em dor e sofrimento, lembra a escorrência incontrolável das avalanches monstruosas encosta abaixo, nas derrocadas e deslizamentos das altas montanhas.
Também aí o processo não se trava.  Também aí, o caminho é imparável ... e há uma inevitabilidade de morte e destruição, que não se detém.
O Homem não tem capacidade de freiar essa catástrofe.

O êxodo dos refugiados, a migração desesperada de milhares e milhares de seres humanos, em fuga da guerra, da miséria e da morte, configuram talvez já, o maior flagelo do século XXI, e reportam-nos de novo, aos tempos escuros e doídos, da Segunda Guerra Mundial.
As imagens eram então a preto e branco ... agora são bem coloridas. Mas os rostos de famílias inteiras em desespero, transportam em si, o mesmo tipo de sentimentos : horror, cansaço, medo, dor, angústia ... dúvida, incerteza ...
Mas também esperança, determinação e fé.
No limbo, entre o nada ter e o poder assegurar pelo menos a vida ... na divisória que separa o risco do que virá, e o nada ter já quase para  arriscar, há uma força interior que impulsiona  aquelas torrentes humanas,  que sem rumo ou norte definido, assumem que é proibido olhar para trás ...

Impressiona-me particularmente, o rosto dos milhares de crianças arrastadas no caudal, pelas mãos ( num esforço exigido, seguramente acima das suas reais capacidades ), aos ombros, em carrinhos, nos braços de mães e pais que tentam desesperadamente  aninhá-las, protegê-las, subtraí-las, se isso fosse possível, às agruras de toda a ordem a que são submetidas.

E seguem, em rios de gente ... seguem sempre ...

Que se passará nas suas cabecinhas infantis ?...
Que será feito dos amiguinhos de rua, da escola onde deveriam estar, da casa que habitavam, das bonecas e das bolas com que deveriam jogar ?...
Que lhes será dito, sobre a insanidade que vivem ?...
Que lhes será explicado, sobre os afectos que lhes ficaram pelo caminho ?...
Que lhes será exigido, para também elas não desistirem, não adoecerem ... não morrerem antes de tempo ?!...

E não há parança.  Não há remédio.  Não há solução.
A chaga social há muito aberta em África e Oriente Médio, continua a purgar.  O exsudado fétido corre inevitavelmente, como se os diques precários tivessem cedido ... como se fosse impossível estancá-los !

E nós por aqui, numa Europa humana, política e socialmente incapaz, sentimo-nos agoniadamente mal ... muito mal !
Os homens não se concertam nas políticas a tomar, nas acções a desenvolver, nos rumos a dar a esta gente.
Os esforços dos organismos de apoio humanitário são curtos, são gotas de água, são pequenos curativos, visando minorar apenas temporariamente, a dor e o sofrimento pungentes.

Erguem-se fronteiras, arames farpados,  constroem-se "campos de concentração", levantam-se muros ... outra vez !...
Engendram-se combóios, cheios ao milímetro, no transporte, por vezes enganador e desumano, dos migrantes. Lembram Auschwitz, Birkenau ... o caminho  para o horror !...
A Europa barrica-se de novo.  E barrica-se também em si mesma, porque os medos e os terrores, também lhe minam as entranhas !...

As sociedades e os países vivem crises inomináveis.  Sobre o nosso chão mesmo, também os nossos "refugiados" e "migrantes" se avolumam, com a ausência de recursos, a precariedade das condições de vida e oportunidades.
Também aqui, a maioria sobrevive ... Pouco se vive !
Os nossos velhos estão desprotegidos, e arrastam fins de vida indescritíveis.  Os jovens vêem horizontes limitados à sua frente, e confrontam-se com uma desvalorização e desaproveitamento das suas valias e capacidades ...  E partem, também eles !
A geração charneira, aqueles que estão etariamente pelo meio, vão percorrendo o trilho destinado ... um dia de cada vez, em cinzento e pardo ... de sol manso e enevoado ... esperando apenas, que nenhum maior sobressalto  lhes assombre a marcha, ou que de repente, lhes tire ainda o curto e incerto chão, que têm debaixo dos pés ...

Como se pode então pedir, que estas sociedades doentes, de doença crónica  contudo com dor controlada, se abram a amanhãs desconhecidos, imprevisíveis, com consequências inimagináveis, mas que se adivinham gravosas ?

Porque a chegada desta leva incontrolável de pessoas, é como o assalto de mais ocupantes, a um bote precário, de lotação há muito esgotada ... É como a chegada de um salvador,  junto de quem está na iminência de afogamento ...
São questões de sobrevivência ... e o desespero da sobrevivência, tudo permite, como sabemos.

Em sociedades com sérias precariedades, com desequilíbrios e assimetrias profundas sem resolução visível ... como assimilar uma sobrelotação que implica a todos os níveis, um agravamento do peso social, que não conseguimos carregar nas costas  ?!...
Como aceitar a entrada de povos, cujas raízes culturais e religiosas pouco conhecemos e nada têm a ver com as nossas, acarretando o risco inerente de maiores  clivagens e fracturas sociais ?!...
Como não recear, que estando conotados com fundamentalismos religiosos e políticos extremistas, estes povos ( que talvez  injusta e levianamente reconhecemos por norma, associados a actos bárbaros e de vandalismo absoluto ) ... não aproveitem esta infiltração encapotada, subscrita e aceite pelos países hospedeiros, para  aí  alcançarem os seus desígnios criminosos ?!...
E como tal, o racismo e a xenofobia recrudescem, como defesa, eventualmente  legítima !

E depois, há todo um aproveitamento político, que se joga nos bastidores e que o comum dos mortais não alcança, e que advém duma engenharia ardilosa, dos lobbies de que infelizmente tanto ouvimos falar ...
Passam-me pela cabeça infindáveis interrogações, cujas respostas não descortino com clareza :
porquê a Alemanha, super potência do velho continente, sempre tão rigorosa, pouco maleável e radical nas exigências aos seus parceiros europeus, encabeça agora uma posição de tanta tolerância, colaboração e disponibilidade ?!
De tanta filantropia e redenção?!...
Será mesmo e apenas, isto ?
Que interesses e manipulações menos louváveis, se escamotearão e presidirão por detrás de um "rosto" aberto e generoso ... franco e fraterno ?
Quem se "serve" também, de toda esta situação ? Porque será indubitável, que também se jogam economicamente interesses fortíssimos, em todo este xadrês ...

Depois, porquê os irmãos de "sangue" e de convicções religiosas, os parentes ricos do Médio Oriente, os que falam a mesma linguagem de coração ... não se chegam agora à frente, e não assumem a postura humana e religiosa expectável e propagandeada nos seus dogmas ?!
O que ditariam os seus Profetas ?
O que ordena o Alcorão, na questão em apreço ?!...

Enfim ... demasiado complexo para mim !
Demasiado obscuro para todos nós, acredito  !
Intencionalmente demasiado confuso, para o entendimento do maioritariamente desinformado e ingénuo cidadão ... ( com quem também se joga em chantagem emocional ) ... quer-me parecer !
Nada linear !  Nada exactamente o que parece !  Nada exactamente o que na verdade será ... seguramente !...

Enquanto isso, as hordas de gente perdida, atravessam mares, calcorreiam caminhos, engolem pó, engolem a fome, a dignidade e o desespero que os corrói ...
Enquanto isso, secam as lágrimas, carregam os filhos ... calam os gritos de aflição ... silenciam a revolta dentro do peito ...
Enquanto isso, enterram os mortos, pelo caminho ...
Enquanto isso, as crianças não mais adormecem as bonecas, na beira das estradas, não mais carregam os livros nas mochilas da escola ... não mais pontapeiam bolas, em campos passados e felizes ...
Enquanto isso, não mais escutam canções de ninar, em sonos que não são de paz e tranquilidade ...
Enquanto isso, os seus olhos incrédulos e sem luz, opacizam de cansaço e doença, os corações esvaziam de sonhos nunca vividos, e as suas almas desesperançadas e sem futuros, sufocam o medo ... e continuam em frente, sempre em frente ... ao ritmo do que as suas pernas pequeninas, as levam...

... adiante ... sempre adiante ...
Num suplício e num pesadelo, que nós, os que por aqui estamos, não sonharíamos ainda, ter que assistir, impotentes, nesta nossa existência !!!...





Anamar

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