domingo, 16 de agosto de 2020

" SENSAÇÕES, EMOÇÕES E REFLEXÕES ... "


 

Estive frente ao mar.  Aquele mar imenso, limite da costa ocidental da Europa, aquela imensidão de água que vai e que vem, numa melopeia dormente e doce, que nos lembra que adiante, sempre adiante, algures muito muito longe, tropeçaríamos num novo continente ... do outro lado ... a América !
O Atlântico com toda a sua magnificente autoridade, banha, beija ou açoita as rochas imemorialmente esquecidas nas areias sonolentas ... Nós, que vivemos paredes meias com ele e dividimos a nossa vida a cada esquina, com aquele misterioso e infindável azul !...

As falésias da Aguda são para mim, por todas as razões, quase um local de culto !
De meditação, de introspecção e reflexão ... são-no seguramente, há demasiado tempo na minha vida. 
Há um promontório erguido, desenhando uma costa recortada estendido desde o Cabo da Roca em direcção a norte, tendo aos seus pés, algumas das mais belas praias portuguesas - as praias sintrenses da Ursa, a Adraga, a Grande, a Pequena, as Maçãs, a Aguda, o Magoito, a Samarra, dando continuidade às praias ditas do Oeste.
Frente ao Santuário do Sol e da Lua que encabeça o areal das Maçãs,  a encosta norte da Aguda trepa em direcção aos céus e queda-se na interioridade e no intimismo dos silêncios, onde só o marulhar cá em baixo, o sopro ora ameno ora agreste da brisa ou da ventania, ou o grasnido largado pelas gaivotas e outras aves marinhas que se espraiam nos céus ... se atrevem  a deixar-se escutar !
O resto é aquela ausência de ruído.  O resto é aquela paz que se contagia.  O resto é a presença clara da imortalidade, reinante !
Os zimbros, o cravo romano, as camarinhas, o canavial, os carrasquinhos e toda a vegetação endémica desta orla marítima trepa com ela, bravia e indomada, ornando-se de flores no auge da primavera, ou amodorrando quando o sol impiedoso do Verão e o vento das arribas, assim o determina !

A espiritualidade que se sente, se respira e nos invade o peito, que nos toma conta das veias e nos sobe ao coração, coloca-nos a nu perante os desígnios da existência, perante a justificação do ser, perante o princípio e o fim ... perante a vida e a morte ...
Despoja-nos e desarma-nos face à pequenez das coisas terrenas, face às razões que nos impulsionam por cada dia de vida, face à real importância do que nos move, nos toca e nos motiva ... face ao que nos indiferentiza, face ao capaz de nos acelerar o coração ... face ao que nos sufoca em cada minuto, ao capaz de nos envolver e mobilizar ... ao que nos abre os olhos e ao que nos cega a alma !... 
Remete-nos para a aleatoriedade do viver, para a puerilidade das urgências do ser humano, para o tudo e para o nada ... para o efémero da nossa passagem por aqui, nós que somos não mais que um grão de poeira neste Universo onde chegámos, onde estamos apenas de passagem, onde nunca nos perguntaram nem perguntarão o porquê de termos vindo ... qual o momento de partirmos ...
Neste lugar esquecido de um planeta ... afinal apenas um "pálido ponto azul" perdido no Cosmos, empoleirado num raio de sol ...

Nas arribas da Aguda, deitei os meus pais em repouso, na sombra de uma camarinha  protectora, junto àquele pórtico rochoso que me simboliza o antes e o depois ... que me desvenda a eternidade ... que me fala da passagem ...
frente àquele mar sem horizontes, sem princípio ou fim, sem limites que o detenham, onde cada onda jamais se repete, onde cada momento é único  e singular ... onde o céu parece tocar as águas profundas bem longe, lá ... onde o sol adormece, por cada dia que finda ... 
Aquele mar que é berço de embalo, e que pelas eras jamais silenciará a sua canção de "ninar" !...

Ali  estarei eu também, um dia ... quando tiver que ser !...

Anamar

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