Ao longo do ano passo por elas dia sim dia não, nos dias da caminhada.
Assim, insuspeita, vou-as namorando da Primavera ao Outono, acompanhando os seus ciclos biológicos, observando o despontar dos primeiros figos, o seu crescimento, a sua promessa generosa de produção abundante, ganhando a expectativa de algum dia ser dia de "colheita" ... 😁😁
Só que, os figos da mata, por direito, deverão ser pertença dos pássaros da mata !
E é exactamente isso que acontece. Os "malvados" sempre me tomam a dianteira, e os figos, coitados, nem tempo têm de chegar à idade adulta !
Menos mal, que dessa forma, a consciência sempre me fica mais leve !...
Hoje lá passei de novo, e de novo verifiquei a "rapinagem" que por ali vai ... Com silvas à volta, e figos visíveis já só nas ramagens fora de mão, "corta-se um dobrado" para os alcançar ...
E porque as ideias nos ultrapassam e os pensamentos voam mais longe e mais soltos que a passarada das ramagens, lembrei a já só saudosa e úbere figueira pingo mel daquela casa que me ficou longe, na Beira das minhas memórias, onde os frutos eram tantos e tão bons, que não havia refeição que os não integrasse na sobremesa ...
E lembrei o ritual da chegada, em fim de férias de Verão, quando, antes mesmo de criada a logística da família para a estadia de alguns dias antecedentes à época escolar que se anunciava, entrando no jardim, sorríamos agradados e lançávamo-nos todos, adultos e crianças, saudosos e sequiosos, sobre os figos maduros, verde esmeralda, que se ofereciam dos ramos engalanados...
E era comê-los "à fartazana" !
A avó, sem qualquer sucesso, bem avisava : "meninas, os figos quentes vão dar uma dor de barriga !..."
Uma vez, a gulodice era tal que nem percebemos que o Óscar, o gato da família que por direito também ia de férias, se escapulira da transportadora e, também ele se interessara vivamente pela figueira.
Não que quisesse os figos ( gato que se preza não come fruta, que eu saiba ), mas porque a figueira com todo aquele manancial generoso, era poleiro de infinita passarada e local de dormitório dos ladrõezitos de meia tigela, que dessa forma, tinham o pequeno almoço sempre servido à cabeceira da cama !...
Foi um "Deus nos acuda" no resgate do Óscar, que amarinhara aos galhos mais improváveis da árvore, e jurava que de lá não sairia.
Desde os apelos mais ou menos pacíficos (com toda a família de nariz no ar ao redor da figueira ) ... ao aliciamento da "fera" com comida no prato, de tudo se fez, e em limite, lá tive que trepar eu própria, a uma escada buscada em improviso.
E periclitantemente, e em vias de despencar a qualquer momento, enfrentei o esgar de assanhamento da criatura e arranquei finalmente os oito quilos de gato a um dos ramos mais inacessíveis !...
Lembro como se fosse hoje !... 😍😍😍
As saudades apertam mais ainda, nestes tempos de aflição que nos atormentam, e por isso, o pensamento parece buscar refúgio no que foi, nas histórias que vivemos, nas memórias que guardamos carinhosamente ... E tudo parece, contudo, tão longe, e ao mesmo tempo tão perto dos nossos corações !
Hoje, neste pesadelo que nos atormenta, as notícias que nos vão chegando ainda nos confundem mais as mentes, toldadas outra vez por um medo latente a instalar-se.
Os números da pandemia, alastram por essa Europa fora num descomando sem tréguas.
A tal segunda vaga ameaçadoramente prevista desde o início ... a tal segunda onda, que feita um tsunami mortal, varreria sem piedade e mais destrutivamente ainda, de uma forma cirúrgica, país a país, nos trilhos já martirizados e por ela percorridos, parece estar aí !!!
O Outono a chegar à nossa terra, o desbloqueio inevitável e urgente do imobilismo e confinamento a que fomos votados no início do flagelo, o retomar da tentativa de alguma normalidade, com o recomeço escolar e com a reactivação de serviços e actividades, muitas delas passando outra vez de tele trabalho a prestação presencial ... uma necessária e expectável maior utilização dos transportes públicos em inerência, entre outros aspectos, tornam preocupante, a evolução do contágio em todo o país.
Os números actuais já deixam apreensivos todos os cidadãos, e colocam o Governo e as autoridades de saúde, num espartilho sem tamanho, entre a responsabilidade sanitária sobre toda a população e a gravidade da situação de um país cuja economia em ruptura não pode de nenhuma forma, voltar a fechar.
A situação brutalmente adversa do turismo, da restauração, das empresas sem capacidade de garantirem já os postos de trabalho, com o consequente aumento do índice de desemprego ... as exportações que caíram a pique e demoram para se reerguer ... estão a lançar para a miséria, muitos e muitos agregados familiares !
Ou seja, vive-se neste momento uma verdadeira prova de fogo, a que o Governo respondeu, em tentativa de embolizar a situação, com o decreto de um novo Estado de Contingência, já a partir do próximo dia 15 !
As restrições acentuar-se-ão, as medidas impostas à protecção individual e colectiva serão mais rigorosas e apertadas, os cuidados a observar ainda mais exaustivos.
Em suma, voltaremos a sentir o peso de um novo isolamento mais exigente, de um maior afastamento e solidão outra vez ... de uma vivência excepcional e mais desgastante ainda ... nós, os que já nos sentimos tão fragilizados e cansados e que psicologicamente ( sobretudo as pessoas de faixas etárias mais avançadas ) percebemos claramente, uma resiliência a esfrangalhar-se dia após dia !...
Bom ... aonde os figos me trouxeram !!! 😄😄😄
Até amanhã ! Fiquem bem, por favor !
Anamar
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