quarta-feira, 29 de maio de 2013

" OS SILÊNCIOS "



O silêncio deste café, tem dias ...
Como todos os silêncios têm provavelmente dias, horas, anos ...
Há anos de muito silêncio, na vida das pessoas.  São aqueles em que o hoje é demasiado igual ao ontem, e o ontem, uma cópia do que fora há um mês atrás.
Quando a mansidão, a excessiva mansidão se instala, fica aquela coisa igual a um rio em tempo de seca, que mal corre, seca os charcos, apodrece, gera solidão ... mata a vida !
Aí, o silêncio instala-se.  O gorgolejo da água, que é sempre fresco quando ela corre, dança e serpenteia por entre pedras, deixa de se ouvir.  Tudo adormece.  E a Vida afasta-se ...

Eu não sei viver  "em silêncio".  Tenho a sensação de que ele sempre me encurta a vida.
Há gentes que vivem amodorradamente, sem turbulência.  Aliás, acredito que cada vez mais pessoas anseiam viver dessa forma, anestesiadas do percurso.
Eu sou demasiado inquieta e desinquieta, para ficar na beira do caminho, a sentir apenas o vento ... O vento e o silêncio que ele carrega.
Eu, sou da terra onde ele mais existe. Onde o espaço é longo e a vida é curta !

E por isso, silencio para dentro, quase sempre.
Embora o não deseje, há momentos que o decreto na minha existência .  É quando percebo então, que ela se escoa aceleradamente, e quando penso como o seu avanço nos remete mais e mais, inapelavelmente, para o tal silêncio ... o definitivo, o que ficará um dia ...

Neste momento da minha vida, ando um pouco assim .  Ensimesmada, cinzenta, meio morta ...

À minha volta, coisas que me mexem, me mexeram, reduziram-lhe a "velocidade" da marcha.
A morte de mais uma colega de trabalho, uma passagem pela escola, para confraternizar num aniversário de uma outra que ainda está no activo ... deixaram-me sensações estranhas, na alma e no coração !

Constato, sem surpresa, contudo, que a  "segunda casa" da  minha vida, se transformou num local penoso, neste momento, apesar  de, dele estar afastada, há três anos.
E isto deixa-me estupefacta e reflexiva, pois não seria espectável ... é logicamente inexplicável ...
Por outro lado, continuo a emocionar-me, numa emoção doce e terna, como se me me deixasse envolver numa espécie de útero de afectos, ao rever os colegas e amigos que ainda por lá estão.
É como se tivesse voltado ao encontro de um "chão", de uma "língua", de um coração gigante e colectivo, recheado de sentires, preocupações e partilhas, que foram nossos ...
É uma mescla de sentimentos, todos a atropelarem-se ao mesmo tempo, todos a quererem subir à garganta em uníssono, todos a levarem-me lá atrás, a um tempo que foi uma vida também ...

E de repente, outra vez  linguagens iguais, gargalhadas comuns, beijos, abraços e promessas,  que nem o tempo, com a sua capacidade injusta de esquecimento, conseguirá adormecer para sempre ...

E tudo isso me deixou com a  melancolia que se experimenta, quando numa boa história, vamos voltando uma após uma, as páginas do livro, em direcção ao seu epílogo ... sem remédio ...

Hoje  precisava que um qualquer tsunami agitasse a minha "praia", precisava que me despejassem a "caixa de aguarelas" em cima, precisava de um software topo de gama, que me acelerasse os batimentos cardíacos ... porque, não "me gosto", como ando ...
Eu sou uma pessoa de exageros e de excessos.  Essa, a minha "marca" ...
Para me sentir viva, preciso de estar, ou muito bem, ou muito mal, de estar no auge da felicidade, ou na mais completa e inenarrável desgraça.
No fundo, preciso de um motivo para "me sentir" ... para "me valer a pena" saber-me viva ...
Quando deixo de o ter, quando fico invisível perante mim mesma, quando o indiferentismo me toma conta, quando o tal "silêncio" se me instala, alguma coisa não está correcta comigo ...
De alguma coisa eu estou a desistir.  A Vida ficou-me demasiado vulgar, parda e quieta, e começou a tornar a minha vida, numa "não vida" , como a que se respira todos os dias, à mesma hora, nos silêncios deste café que adormece ...
... Dia, após dia ... após dia !...

Anamar

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