segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

"QUEREM VER QUE A CULPA FOI DAS PASSAS ?..."





Querem ver que a culpa foi das passas?

2013 a ir-se, 2014 a chegar ... 

Aquele, cansado, decepcionado, desgastado, velho ...  
E pior, bode expiatório de tudo quanto foi desgraça acontecida.
Este, fresco como uma alface, com a pujança, a fé, a ingenuidade e também a inconsciência dos jovens, prometendo  isto e aquilo, acena garbosamente com outras intenções, outros dias menos enevoados, outras realidades que jura irão cumprir-se, o que dará lugar a festejos ...

Do velhinho eu despeço-me, sem já lhe guardar raivas ou rancores, com aquela complacência com a vetustez, dos nossos, chegados ...
Já lhe perdoei as indelicadezas, os sofrimentos, as angústias, e mesmo as raivas que me fez sentir, e que de mim fizeram, uma pessoa pior ...
Enfim, resignei-me a esquecer a intolerância, e a deixá-lo partir, com a certeza que ele não ficará no meu álbum de memórias !...

Deixou-me acreditar em muita coisa, p'ra me defraudar a seguir. E isso, com o meu mau feitio, de flor que não se deva cheirar ... não perdoo. Reservo, guardo, e às vezes, as marinadas acabam azedando, como se sabe, e fica tudo estragado !...


Na passagem do testemunho ... obviamente a meia noite de 2013, manda a tradição que nos despeçamos,  prometendo esquecer, e que recepcionemos com pompa e circunstância, esperança e fé !
O novo ano fica assim, de imediato, completamente sufocado  com uma enxurrada de pedidos, de desejos formulados, por cada mês, por cada uma das doze badaladas da meia noite, por cada passa que se vai comendo, ao soar dessas badaladas.

Obviamente que não há viandante que se preze, que, acabado de chegar, possa ter de imediato um bom desempenho, se lhe cai tudo em cima ! Só pode mesmo sufocar, ou fazer "orelhas moucas" !!!
Por isso, o ano, à medida que se desenrola, vai sempre "dando bota"... digo eu !...

Nos tempos em que eu ainda fazia passagens de ano, mais ou menos felizes, as passas eram previamente contabilizadas, reservadas, e aguardavam que chegasse a hora adequada..
Depois, era aquela afobação, em que o ritmo das badaladas não dá, nem de perto nem de longe, para que se  mastiguem  as  passas,  se  façam  os  pedidos, e  se  felicitem  os  amigos ( tudo ao mesmo tempo ), a menos que as ditas, sejam simplesmente deglutidas, o que não me parece de bom tom ...
Passei então a fazer uma falcatrua, para simplficar a coisa : comia e mastigava as passas todas de uma vez só, e reduzia os pedidos, àqueles, sem os quais, isto ainda se torna uma desgraça maior.
A saúde, à cabeça, o amor em segunda preferência, e algum dinheiro, constituíam o meu cabaz, creio que pouco exigente, de desejos e anseios ...

E depois, é como uma chave fixa do euromilhões ...nuns anos somos mais premiados, noutros nem tanto ...

De  facto,  o  tempo,  tem  vezes  que  nos  magoa, e  outras  que  nos  cura ...
Tem vezes que nos afasta, e outras, que nos aproxima ...
Leva-nos a ignorar algumas coisas, mas a importarmo-nos com tantas mais ...
O tempo decepciona-nos impiedosamente , e leva-nos a perdoar essas decepções, miríades de vezes ..,.
E por isso lembramos as coisas, ou esquecemo-las, conforme o caminho ...
Tem dias  em  que  nos  mata, e faz desistir de  tudo...para  no seguinte, nos levar a uma persuasão sem limites, a não abdicar da luta ...
Faz-nos julgadores de gentes, momentos e  afectos ... ou inversamente, aceitadores incondicionais do que os mesmos têm para nos oferecer ...

Este ano, não tive "passagem", recusei réveillons, fiquei só, comigo mesma e com as minhas estórias ... as recentes, e as que já têm barbas ...
Constatei em desespero, que ao contrário do que supunha, não existiam passas, nesta casa ... Vinho, ainda se arranjava, passas é que não.
Conjecturei descer, para as comprar ... Mas para quê, se eu  não tinha amigos com quem as dividir, não tinha memórias a festejar, os únicos seres viventes ( os meus gatos ) já dormiam há muito ... e não me fazia nenhum sentido,  fazer os tais pedidos ??!!

E lembrei uma vez mais, o que para mim, é uma máxima : na verdade, o tempo tira-te hoje, o que te deu ontem  ... Sempre !

E é por isso que eu corro em contra-ciclo.  Para ter tempo ainda, de protelar para depois e depois, tudo o que eu sei que ele me vai tirar !
Queria  ser,  por  instantes  Alguém,  alguma  Coisa, Ninguém, sei  lá ... ( olhem que pretensão !!! ), uma peça do mecanismo do relógio ou da ampulheta que o regula, para brincar com ele.
Pará-lo, atrasá-lo, acelerá-lo, espreitá-lo à frente, re-olhá-lo atrás, apagá-lo, re-escrevê-lo ... saborear de novo o que me deixou  memória indelével no coração, cuspir para longe, o fel que me amargou tantos momentos ...

Reconheço agora, que afinal, esse poderia ser o único desejo a formular, na décima segunda badalada da meia noite, ano após ano, tempo após tempo ...

Só que, de facto ... eu não tinha passas, eu não tive passas !
  
Eu desconsiderei  intencionalmente, aquele momento místico, desvalorizei os segundos que leva a descolar o envelope da carta, cujo conteúdo não conhecemos, e que mesmo que nos armemos em fortes, sempre nos cola, por momentos, o estômago às costas, nos dá um nó no respirar, e nos acelera o ritmo do peito ... o reinício de  outra fatia desconhecida, do caminho que nos foi destinado ! 

Atrevi-me a medir forças com o tempo, como David contra Golias, desmistificando, indiferentizando, tentando insensibilizar e racionalizar, o que afinal talvez deva mesmo ser racionalizado, de facto :  o  romancear daquele lapso de tempo, em que as doze passas encerram um Mundo de sonhos, como se ele não fosse apenas e só, um lapso do tempo imparável, igual ao antes, ao depois, ao ontem, ao hoje, e certamente ao amanhã ...

Nada mais que Tempo !!!...

Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

As passas, sim as passas....todos sabemos que precisamos de encontrar desculpas, pois é....as passas e os rituais que existem sim são os culpados dos desejos não concretizados. Mas todos sabemos que são necessários os rituais para esconjurar, existe quem faça muito barulho, outros rezam....e recolhem-se em meditação,não vá o Diabo escutá-los. Regista-se que existem gostos para todos.
Cara Anamar, só lhe posso desejar que os seus desejos se venham a concretizar em 2014 e por favor....esqueça as passas.
PS:Mas pelo sim pelo não, vá já a correr comprar as passas.

anamar disse...

Por acaso, não tinha ideia de esconjurar nada nem ninguém, embora houvesse quem seja certamente meritório de tal esconjuro ... Há sempre !...

As passas .... um ritual que atravessa os tempos, e que tal como a história da carochinha do nosso imaginário infantil, não nos faz nenhum mal, mantê-lo !...

Excelente 2014 também para si, "anónimo" ;
Espero que o novo ano lhe designe um nome !

Obrigada e um abraço

Anamar