sexta-feira, 7 de novembro de 2014

" POR UM PRATO DE LENTILHAS "



Tudo ficou cinzento, circunspecto, fechado ...
Fechado o tempo lá fora, e fechadas as vidas das pessoas.

Li há dias, sei lá onde, que a crise sem fim que atravessamos, quase já perdemos o norte desde quando, teve o mérito de desenvolver criatividades, alternativas, desafiar coragens, espicaçar sonhos, despoletar o arrojo, varrer a preguiça e a acomodação ... e quiçá, desenvolver o que de melhor o ser humano guardava, até insuspeitamente, dentro de si.
A crise empurrou as pessoas, lançou-as no vórtice da incerteza, e como tal, fê-las abrir pára-quedas, esticar as asas, percebendo que teriam que voar.  Coisa que até desconheciam ser capazes de fazer, em alguns casos !!!

Tudo certo. Até aqui, acredito que sim.
Diz o povo que a "necessidade é mestra de engenho".  E o povo nunca erra, que eu sei !

Mas se estes aspectos representam a parte "boa" da crise, ou melhor, a parte menos "má", que dizer-se de todos aqueles que fizeram emergir no ser humano, tudo o que de pior o caracteriza, tudo o que de mais reprovável ele encerra ?

Neste momento, o oportunismo, a má formação, o mau caractismo, a indiferença perante  valores (que de repente sucumbiram ao "salve-se quem puder" ), o inescrupulismo , o trucidar do companheiro, o sacanear do próximo, a mentira, ou então a cómoda  ausência de verticalidade, se essa puder prejudicar e comprometer ... manifestam-se a cada esquina, em cada local de trabalho, em cada grupo social !!...

Que dizer do encolher de ombros, do assobiar p'ro lado ( muito conveniente quase sempre ), ou até mesmo da conivência com situações comprometedoras, pouco claras, ou mesmo reprováveis ... só porque há que garantir os magros níqueis ao fim do mês ... a qualquer preço ??!!

Que dizer-se quando percebemos que as pessoas que julgávamos mais impolutas, verticais e dignas, afinal traziam ao pescoço,  um preço na coleirinha?!!!

Que dizer-se quando percebemos que os reais valores que norteiam o ser humano, são os do oportunismo, os da defesa estrita dos seus interesses, os da sabujice miserável, os da subserviência descarada, o "ficar-se bem no boneco"  ... ainda que no aconchego da sua  consciência, haja um diabinho reprovador e  inclemente ??!!

Que dizer-se então das pessoas instaladas, em lugares de cúpula ( seja ela qual for, e tenham lá chegado sabe-se lá por que meios ), que em manobras kafkianas, prepotentes, sem ética ou rigor, usam e abusam dos privilégios discriminatórios que esses lugares lhes conferem, do seu poder decisório arbitrário, e da sua falta de critério e princípios ... e jogam com os "peõezitos" no xadrês, divertindo-se , mexendo-os a seu prazer, movendo-os e manipulando-os maquiavelicamente, de uma forma aleatória, sem isenção, distante e indiferente ... puxando os seus cordelinhos, retirando os tapetinhos, e abrindo alçapões e ratoeiras ??!!
Conhecem para isso claramente o processo da emboscada, imbuem-se do gozo que dá o jogo do gato e do rato, usam, brincam, sequestram, limitam, desarmam, e reduzem ao silêncio, as presas que lhes caíram na teia ...
E iniciam processos persecutórios, discriminatórios, que destroem a vida das pessoas ...
Processos suicidas, sem defesa, com meandros obscuros e controversos, altamente discutíveis, porque cautelosamente engendrados.

É mais ou menos este, o filme de terror que se vive em muitas empresas, e locais de trabalho, dos mais humildes, às mais renomadas multinacionais, neste momento, neste país, nesta Europa dita civilizada, onde os Direitos do Homem são lei ... dizem !.

Se se cai na graça dos chefes, dos tais deuses de pés de barro que ali estabeleceram o seu reino omnipotente, tudo bem. A paz existe, o convívio privilegia-se, a camaradagem e mesmo a amizade, instalam-se ... até ver.
Mas se por um qualquer infeliz desígnio do destino, o "peãozito" se põe em bicos de pés, discorda ou questiona regras, valores ou determinações  ( mesmo  numa perspectiva pedagógica ) ,  se ainda que com razão, põe em causa posturas, abana estruturas, denuncia irregularidades abafadas, se torna incómodo porque estende o dedo acusatório a interesses instalados, desmascara o que jamais poderia ser desmascarado, "cutuca" vespeiros não convenientes ... mexe na merda ... Ah, então, sem direito a demais explicações, análise ou defesa, é arbitrariamente banido do tabuleiro, e confrontado com a ameaça velada, de não conseguir fazer jogo, em nenhum outro xadrês ...
Ao alcance dum simples "pufftt"... o destino de uma pessoa,  é jogado na sarjeta !...

E assim vai a vida de muitos portugueses ... acreditem !
De facto, "o mar não está p'ra peixe" ... E como há que sobreviver, ou as pessoas emigram nas condições que lhes surgirem, ou se submetem, entram no esquema, engolem sapos, aceitam as descriminações sem levantar "ondas", e tornam-se cegos "yes man" ... aceitam submissamente toda a gama de chantagens ou manipulações, de cabeça baixa ... depõem armas, empacotam os sonhos, as veleidades de justeza, de seriedade, de verdade e de aposta ... de luta, de profissionalismo ... em suma, aceitam "vender" os seus ideais ... por um triste "prato de lentilhas" !!!...

Já o D. Quixote se não deu bem ... e a crise ainda não estava instalada !!!...



Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Estimada escritora, ao escrever este tipo de textos, se a Democracia sucumbir, provavelmente tera dores de cabeca, veja o que se passa na Catalunha. Por alguma razao,os valores inverteram-se e as pessoas estao a venda como.diz e bem para assegurarem algumas migalhas Fruto dacrise de valores,de estudo, de moral, do.consumismo, da falta de controle das ofertas excessivas e faceis de obter,.os maus.exemplos vem de toda.uma.sociedade sem rumo e valores.Privilegia-se o valor dinheiro.em detrimento de todo o resto.Os romantismos.vem.dos.videojogos E da vida facil e aventureira dos extremismos.islamicos, armas, dinheiro,faltade escrupulos,morte e destruicao, muitas mulheres e areia um vazio de valores humanitarios

anamar disse...

Caro "Anónimo"

Poderei bem com as minhas "dores de cabeça"...porque pior que colaborar, é não denunciar.
E por isso falarei, até que "a voz me doa", também eu, um pouco, qual D.Quixote, com os sonhos, a raiva, a ingenuidade talvez, dos vinte anos que não tenho.
Por isso também, pouco tenho a perder.
A idade confere-me um estatuto de intolerância, de insurreição, de independência, mas também de imunidade já, face às arbitrariedades da vida, que não engulo, não ignoro e contra as quais, enquanto tiver saúde e discernimento, me rebelarei, seguramente !

Obrigada por ter comentado

Anamar