segunda-feira, 7 de março de 2022

" E O FRIO POR TODO O LADO ..."

 


E no entretanto só penso no frio ... 
Este frio gélido que se abateu, que se nos entranha nos ossos, que nos cerca o coração !  É um frio por fora, mas sobretudo por dentro, nos meandros da nossa alma !

Também lá ... sobretudo lá, no cenário da guerra, o frio ainda é mais frio, mais impiedoso e indiferente.  Lá, onde há homens a lutar em condições inenarráveis, onde há famílias confinadas a abrigos também eles gelados, caves onde a escuridão procura esconder todos os sinais de vida, o frio torna-se ainda mais carrasco. 
Lá, onde as crianças que já não têm tecto, que já não têm chão, que já não têm respostas porque também parece não terem amanhã, esperam o que ninguém sabe, para quando ninguém sabe ... o gelo invade, maltrata, aniquila ...
A energia eléctrica providenciadora do aquecimento vital à sobrevivência das populações, cortada em muitos locais, é mais um dos crimes desta guerra maquiavelicamente concebida.
Como se sobrevive em temperaturas negativas, no meio duma precariedade total?
Como sobrevivem os idosos ?  Como sobrevivem os recém-nascidos nas maternidades também elas, bombardeadas?  Como sobrevivem os animais e as crianças que com eles dividem o infortúnio ?

Nas bermas das estradas, caminhando a um ritmo muito acima do que as suas pequenas pernas lhes permitem, transportadas aos ombros, em carrinhos, ou nos braços cansados de quem as carrega horas intermináveis, envoltas em cobertores, embrulhadas nas mantas que a solidariedade lhes dispensou, vão indo, pressurosamente, sempre em frente, num êxodo que não se compadece da urgência da chegada ... para um qualquer sítio onde as bombas não caiam, onde as sirenes não ecoem, onde os mísseis não atinjam ... a um horizonte onde haja um novo arco-íris à sua espera !
A neve continua a cair.  Também ela, leve, sussurrante, indiferente ... gelada !
Os rostos são fustigados, o cansaço apela à paragem.  Mas o tempo urge.  Amanhã poderá não haver escapatória, amanhã a lei marcial poderá ser imposta, amanhã as fronteiras podem cerrar-se ... amanhã pode ser tarde de mais para estarmos vivos !...
E não sei como, reúnem as forças que pareciam inexistentes já, e continuam em frente.  Muitos sem sequer terem destino, lugar ou alguém à sua espera ... movidos apenas pelo instinto da sobrevivência, pela esperança num amanhã mais justo e pela fé de que aquele chão, de novo, um dia os voltará a acolher !

Não importa que a neve, na paisagem branca, esteja agora tingida do sangue de tantos que já tombaram, não importa que o amarelo dos campos de trigo continue envolvido na esperança do azul de um céu límpido, em dias sonhados outra vez ... não importa que desígnios obscuros a crueldade dos Homens pareça ter-lhes desenhado ...a terra dos girassóis sempre será o seu berço !!!...

Anamar

1 comentário:

Anibal disse...

Muito bem, preocupante a inércia do Mundo Ocidental.
Entendo a tua preocupação que é sem dúvida a de todas as pessoas com sentimentos de humanidade.