sábado, 6 de setembro de 2008

"OH DEUS!...NO TEMPO DA MINHA AVÓ..."





No tempo da minha avó e antes da minha avó, ser mulher devia ser uma enormíssima "chatice"...

Nascidas para dar continuidade à espécie, ou seja, para procriar assegurando que a família instituída passasse adiante, as mulheres não tinham qualquer "espaço" social, teriam algum protagonismo familiar e nenhum papel individual, isto é, enquanto pessoas.

Tendo origem em famílias economicamente privilegiadas, as meninas dos espartilhos, culottes sob saias avantajadas, cabelos em papelotes, seios generosos (através dos decotes) e rostos de porcelana nacarada, "perdiam-se" pelos salões, ociosamente, rodeadas de aias que as cuidavam a tempo inteiro.
Abrilhantavam as festas, tocavam piano ou harpa, bordavam, recitavam poemas, falavam francês, não tinham vontade própria...e bocejavam muito, por certo...Eram "coquettes", falsamente púdicas, com sorrisos tímidos. Tinham "cheliques" e enrubesciam com um roçagar de hálito quente no pescoço, ou voz sussurrante ao ouvido...



Era frequente viverem romances tórridos clandestinos (normalmente tendo como alvo "alguém desaconselhado" pela família), carregados de "picante e adrenalina", com trocas de bilhetinhos à sucapa, com a conivência das camareiras de confiança. Tinham encontros fugidios pelo recôndito dos jardins, ou com a palha dos estábulos a servir de alcova. Sempre chegavam correndo em bicos de pés, ofegantes e afogueadas em ânsias de entrega e lascívia...
Morria-se de paixão olhando a lua cheia, ao trocarem-se juras eternas...e suspirava-se muito...languidamente!
Ou então, se se achavam desinteressantes a ponto de não cometerem loucuras, entregavam-se aos desgostos de amor. Os seus semblantes tornavam-se ausentes, carregados de uma tristeza pungente e queriam morrer tísicas, rostos de papel secos, recusando alimentos na busca de morte "libertadora"...



Mas, normalmente acabavam num casamento não escolhido, com maridos que pouco conheciam, envelhecendo azedas e desencantadas!

Era mais ou menos assim...

Sendo oriundas de famílias débeis economicamente, então nasciam para o trabalho de sol a sol, para criarem "pencas" de filhos (o planeamento familiar não existia, como sabemos), para "servir" o marido que seguramente as escolhera, para passarem privações e sofrerem a violência familiar, arrastada por uma vida triste, desinteressante e cheia de dificuldades.
Não se cuidavam nem eram cuidadas...Não apresentavam certamente rostos diáfanos, mas, curtidos pela dureza do sol e da vida, envelheciam prematuramente. Não tinham corpinhos esculpidos pelas cintas e espartilhos. Tinham por certo pernas com pêlos e "buços" generosos...
Lavavam-se em alguidares, porque as banheiras de "pezinhos" da época, não integravam o recheio das casas. Também não tinham banhos com sais nem espuma...mas deviam estar disponíveis sempre que o "senhor" se quisesse "servir" delas.

Era também mais ou menos assim...Contudo, mulheres!...




E a História foi-se fazendo...

A minha mãe, apesar de não ter sido senhora de salões e mordomias (antes uma mulher de trabalho), usou chapéu, estolas de "raposinhas", sapatos de tacão com presilha e botãozinho, a condizer com a mala respectiva, luvas, os seus "tailleurs"de fino talhe, as primeiras "permanentes" ou "mises en plis", os "plissados", os "chiffons"...as pregadeiras ou raminhos de flores nas golas dos casacos e ainda, já um perfuminho de qualidade.
Familiarmente, ao casar, ocupou o lugar central na família, como condutora e responsável máxima pela minha orientação e educação.

A mulher era então a "matrix"; estava em casa (poucas eram aquelas que começavam a esboçar "atrevimentos" profissionais), era detentora de "prendas domésticas", vivia em função da família, em prol da qual se anulava e fazia todos os sacrifícios.
Em sociedade, a proeminência feminina era escassa e resumia-se a alguns poucos casos isolados, de mulheres "estudadas", com cultura e consciência de direitos. O "feminismo", como movimento social de cariz político, intelectual e sexual iniciava os primeiros passos.



E a História continuou a fazer-se...

E para que não me torne excessivamente exaustiva, refiro apenas a sensação de "conforto" e felicidade que experimento quando, como mulher de hoje, transversal aos séculos XX e XXI, me sei objectivamente, como uma mescla de todas as mulheres que o foram, ou o foram sendo ao longo dos tempos.

Sou a que se cuida por gosto... a que exige ser cuidada porque acha que o merece; sou a "coquette" quando me dá gozo...a que escolhe o parceiro, porque o não concebe de outra forma; sou a frágil que morre de amor olhando a lua, mas também a que se impõe no local de trabalho; sou a que se arroga direitos de respeito, consideração e reconhecimento de méritos e profissionalismo...mas também a que chora de emoção ao escutar uma melodia, ou ao ver o sol a sumir no horizonte; sou a que escolheu ter os filhos que teve, quando os quis ter...a que escolhe vestir clássico ou "descascar-se" na praia; sou a que bebe um copo com um amigo, entre conversas e gargalhadas, sem horas, pela noite...e sou a que se "bate" contra as injustiças e descriminações de toda a ordem; sei bordar e falar francês, mas só o faço se me apetece...uso espartilhos e ligueiros, mas não porque tenha que ser assim...apenas porque gosto de lingerie...
Em suma...sou a que traça a vida que se vai fazendo HOJE...sou a que diz não ou sim, a que escolhe, no pleno uso do livre arbítrio da sua existência...



E posso dizer que ao contrário do "tempo da minha avó" e antes da minha avó...ser mulher é um espectáculo!!...





Anamar

"EU FUI AO PANTANAL..."



Hoje, um pouco mais cedo, vou falar-vos dos sonhos...

Dos sonhos?...perguntarão...Quais??
Aqueles que se têm em plena luz do sol, legitimamente, por cada dia que começa?!...
Aqueles que se comem no Natal e até contribuem tristemente para o despautério da nossa "silhueta"?!...
Ou aqueles que por vezes nos "atarantam" as noites, porque, ou o não são e são pesadelos tramados, ou acabam desgraçando o nosso humor, quando escancaramos os olhos e constatamos que "tudo aquilo" era mesmo só sonho...e afinal já estamos "noutra"?!...


Pois, se calhar poderia falar um pouco de todos, mas o que me trouxe de facto à escrita, foi o inusitado da minha "viagem" na noite passada, ao Pantanal...e que não resisto a descrever-vos, tão fielmente quanto a "vivi"...

Exactamente...imaginem que a minha noite, mais não foi do que uma viagem inacabada até ao Pantanal, onde afinal não cheguei a acostar...e digo acostar...porque a minha viagem era de barco.

Aliás, essa também é uma característica dos sonhos...nunca chegarmos à realização do "bom da coisa"...ou seja, levamos o sonho a saborear por antecipação o seu anunciado "happy-end" e depois...nunca o alcançamos.
Eu tenho p'ra mim, que é da emoção que acumulamos, na expectativa de um desfecho desejado. O coração bate mais forte, a respiração fica descompassada e...catrapumba...acordamos!

Acordamos com uma raiva danada e quantas vezes ficamos bem quietinhos, para ver se com um bocado de sorte "repegamos" o fio à meada e conseguindo "driblar" o inevitável, "reembarcamos" no mesmo sonho...
Mas nada!...Pufftt!...O sonho escapuliu-se da nossa mente com "bilhete de ida" e aquelas imagens que ainda há minutos atrás eram tão reais, tão verosímeis, tão consistentes (de som, de cor, de cheiros), desfazem-se que nem espuma de claras, em farófias mal batidas!...



Bom, mas eu ia ao Pantanal...Eu, a minha mãe de oitenta e sete anos e o António de sete...um "pé de trempe", como vêem, com toda a lógica!...
Ora então embarquem comigo no sonho...



Navegávamos lentamente numa lancha aberta, certamente uma "chalana" (lembram-se?), ao longo de um rio cujo nome retive durante algumas horas e claro, como "convém" a qualquer sonho que se preze, já se me varreu, a esta distância...
Mas também, não interessa muito, porque o rio cujo nome eu sabia, só deve ter existido no meu sonho mesmo.

As águas batiam mansas o casco do barco, numa melopeia doce e embaladora, abrindo uma estrada de ondulação; o sol quente e forte de um Brasil em pleno, envolvia-nos e acariciava-nos; o céu, de um azul esmagador e iluminado, lembro-me que nos feria os olhos...

As margens desenrolavam-se com os verdes profusos e as ramagens em espreguiçamento lascivo, mergulhavam luxuriantes na correnteza; os cheiros adocicados do trópico por vizinho, inundavam-nos as narinas e os sons da mata ou do manguezal (gritos estridentes, cacarejos desgarrados, trinados a descompasso), ecoavam no silêncio quente e húmido da floresta pantaneira.
O olhar percorria, adormentado, a imensidão exuberante, onde as aves rasgavam o espaço em bandos compactos de cores intraduzíveis, ou se dependuravam das ramagens, feitas adornos esquecidos em árvore de Natal...

Não lembro vozes humanas, não lembro movimento de gentes...
Lembro apenas sensações inundantes, emoções incontidas e uma esmagadora mensagem de paz, harmonia, bem estar, equilíbrio, plenitude...um forte sentimento de "miscigenação" e entrosamento quase irreal, com aquela natureza primária, pujante, com aquele santuário em comunhão com a nossa alma...

E pronto...Numa espécie de "vingançazinha" do além, acordei, claro...

Apesar disso, a tela tão eloquentemente pintada pôde transportar-se para o meu dia e acicatou uma vontade/desejo/sonho antigo : poder transformar rapidamente este sonho de noite num sonho de dia...poder deixar-me levar pelo ritmo lento das águas, sem estações, sem relógio, sem tempo...simplesmente ao sabor do marulhar da corrente, ao correr do despenteado do bafo quente e generoso... tal como o é a natureza do Pantanal!...







Anamar

terça-feira, 2 de setembro de 2008

"O QUE FIZERAM COMIGO??!!..."




Dia estranho o de hoje...

Começou já ontem esta sensação indefinida bem aqui dentro, assim como uma espécie de desânimo instalado, misturado com uma pitada de tristeza e um "qb" de "stress" esquisito.
Qualquer coisa como uma "receita" algo "explosiva"...

Começou logo ontem a seguir ao almoço, aquela "síndrome" de ter de encarar algo que procurei afastar do pensamento há mais de um mês, como um remédio amargo que guardamos para tomar depois, como uma tarefa cáustica, pesada, incómoda...que deixámos por tempos "pendurada" no cabide, como se ali a pudéssemos ignorar, descartar, esquecer, até melhores dias, como tudo o que é penoso e nos infunde desagradável mal-estar.

Poderá pensar-se que essa sensação sempre surgirá normalmente, quando o ritmo de vida é alterado, no bom ou mau sentido, quando se nos impõe a necessidade de vencer uma inércia instalada...
Disso sei eu...
Sei que envolve custos, esforços acrescidos...mentalização imposta!

Mas afinal, o que demais aconteceu desta feita, para lá de um normal e natural fim de férias, uma "rentrée" esperada, como terá acontecido à grande maioria dos cidadãos deste país, em idade produtiva...que é como quem diz, aos trabalhadores que "intervalaram" para usufruir (os privilegiados que puderam), de um maior ou menor, melhor ou pior, período de descanso??!!

Dei comigo a reequacionar-me, a analisar-me e a tentar achar-me o menos "anormal" possível, na procura de justificação para esta angústia atrevida, para esta teimosa negação interior, associada a um desejo de fuga para lado nenhum em particular...para esta raiva, que "desgramada" me amarinhava e me deixava de mal comigo própria (com a consciência, em boa verdade, a pesar, a pesar que nem chumbo, à medida que um rubor na alma se acentuava), fazendo-me sentir mais e mais "pobrezinha e mal agradecida"!!...
Pois se até há quarenta mil professores no desemprego, caraças...neste início de ano escolar (que eu vou começar com o meu "lugarzinho" garantido e sem sobressaltos, professora que sou do quadro há mais de uma "encarnação"!!!....)
Só posso estar totalmente "abilolada", ser uma "lunática" metida a dondoca, com frescuras inaceitavelmente existenciais...Só pode ser isso!!







Aí, lembrei com toda a nitidez, os dias de outros Setembros, de outros anos lectivos...
Os entusiasmos frenéticos com que nesta altura já "fossava" livros, apontamentos...com que já organizava as listas das turmas, olhando as fotos de quem deixara há pouco tempo, mas que, de repente já parecia ser há uma eternidade...

Lembrei como perscrutava curiosa as "caras" deixadas nas cadernetas dos Junhos anteriores e que agora, com nova "roupagem", pareciam de gente que crescera, tomara ares responsáveis e sérios...(porque era espantoso como os "putos" sempre nos "driblavam" nas férias do Verão, crescendo sem pedir licença, ganhando borbulhas espremíveis ou pêlos de barba semeados em dia de vento...)

Lembrei como me afobava em "gatafunhar" pela enésima vez na minha vida (como se fosse a do ano de "estreia", ainda assim não esquecesse alguma coisa), as informações a veicular na primeira aula, sobre todos nós que iríamos ao longo de um ano constituir uma "família" para o bem e para o mal... todas as regras do "jogo" e de uma feliz e tranquila convivência... todas as respostas possíveis, para as possíveis perguntas sobre as matérias, as rubricas programáticas, os ritmos e a importância a dar a cada momento escolar... sempre com um sorriso no rosto, para afastar "nuvens" que pudessem instalar-se naquelas cabecinhas...

Lembrei como, meio a brincar meio a sério, procurava fazer da Física e Química (na grande generalidade terrificamente receada), uma "estória" acessível, "gira", interessante, fundamental, simples e mesclada com a nossa existência no dia a dia...quase uma "cena que se curtia" com gosto!!...

Lembrei...lembrei...lembrei...

E sabem o que tenho feito ontem, hoje e talvez amanhã??!!

Contas, simulações, previsões, cálculos de penalizações, percentagens dedutíveis...naquilo em que se tornará a minha pensão de aposentação ANTECIPADA, naquilo que será a "retribuição" que me cabe (do estado e da comunidade), para o tal "pacote" de muitas vidas numa vida só...a de pai, mãe, conselheira, psicóloga, mediadora de conflitos, formadora, educadora, amiga, confidente, "bombeira", "socorrista"...etc, etc, etc...que se resume afinal a uma só palavra...PROFESSORA!!

Bom...eu já nem gosto de falar deste "funeral" de sonhos...
Desculpem...isto foi simplesmente um desabafo que me escapou!!

Garanto-vos que até o sol hoje recolheu mais cedo...
Eu bem o vi, com um ar melancólico de Outono que parece ter chegado "às pressas", ir recostar-se prematuramente!...

Já agora..."o que foi que fizeram comigo"??!!...


Anamar

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

"PROVOCADORAMENTE SÓ"





Olá, bom dia... ou boa tarde, se quiserem.

Parece que os meus hábitos de escrita estão a mudar um pouco...ou talvez não...Apenas fruto de outra gestão dos dias, nestas férias em contagem decrescente. Afinal, segunda feira, tudo começa de novo...

Hoje amanheci, ou "entardeci", com uma gaivota no meu céu.

Vivo longe do mar e na minha praceta há pombos, muitos pombos...já vos contei. Mas gaivotas...só mesmo as "tresloucadas", as que se perderam de rota...ou as que são "provocadoras" mesmo. E esta "minha" gaivota hoje, é dessas, tenho a certeza.

Levantei-me tarde e a más horas, reclamando com a precipitação vertiginosa do tempo, com a despedida precoce de um Verão, neste dia meio pardo de sol já envergonhado (de uma cor que não é carne nem peixe), que se instalara.

Fui à janela, por detrás dos vidros, espreitar...

E ela lá estava...pousada bem pertinho, tão pertinho que a pude olhar olhos nos olhos, de mulher para mulher, presumo... E aquele seu jeito altivo de "bico" empinado, parecia querer dizer-me qualquer coisa...
Era uma gaivota cinzenta como todas, recortada num céu igualmente indefinido. Era uma só gaivota...e eu tenho a certeza de que também, uma gaivota só!...

Mirou-me, sempre imponente, com ar "desenchovalhado", com peito erguido ao vento, coisa que só as gaivotas, habituadas às borrascas de mares encapelados, conseguem ostentar...
Tinha um ar desafiador, posso jurar...um ar de quem quer dizer mas não diz : "Hei...tu aí ! Sai desse "rochedo" onde te escondeste cobardemente e vem ver o mar"!..."O mar hoje, não está lá "essas coisas"...mas é o mar na mesma, verde-azul dos sonhos e esperança, o mar do coração dos búzios que nos embalam ao ouvido, o mar que vai e que vem, com onda alta, com onda rasa...o mar da espuma, feita renda tecida por mãos de fadas... mas o mar!"...

É uma gaivota teimosa, esta minha...

Levantou voo, com as asas bem esticadas, planando na aragem que corre. E a sua silhueta foi-se desenhando por aí fora, como quem faz um passeio pelo infinito finito, dos prédios da cidade, desenhada num céu vazio, com os pombos desaparecidos pelo calor abafado da tarde que se inicia...
Ela foi, mas voltou, com o mesmo ar desassombrado curtido pelo sal dos mares da sua vida. Voltou, corajosamente, porque é preciso muito para "derrubar" uma gaivota...estou certa...

Tenho para mim, que a sua postura de "senhora provocadora" e se calhar "orgulhosamente só"...foi um recado...Ou então, é esta minha mania de sempre "ler", mesmo quando talvez não haja leitura a fazer-se...
Talvez um desafio do mar que eu adoro... que não tem princípio nem fim, que é berço do sol em hora de cama, que é cama de sereias que nele sonham sonhos acreditados...que embala o coração, quando os olhos nele se deixam embalar...que acalenta e fortalece a alma, na fortaleza que só ele sabe ser...

Tenho para mim, que as voltas e mais voltas que ela, a gaivota, persiste em dar bem junto à minha janela, (quase me tocando com as asas)...tenho para mim que os seus olhos pequeninos e o grasnar da sua voz, que parece chamar alguém...(alguém que ela veio por aqui tentar reencontrar)...são um sinal de uma esperança um pouco perdida, são uma mensagem de fé em alguma coisa, são "palavras" ao vento (que diz sem saber dizer), ao meu ouvido e ao meu coração...São uma espécie de grito de liberdade, de corte de amarras, de quebra de grilhetas ou algemas, com a vida...
Parece que ela, no seu grito estridente que todos conhecemos, me está a fazer não sei que chamada, me está a "empurrar" rumo não sei a que horizonte...
Mas juro que o seu "bailado" que parece não terminar, me desafia, me fortalece...me "abana"...

Senão... o que faria uma gaivota perdida, balançando-se para cá e para lá na correnteza do ar...logo HOJE, neste meu céu?!...





Anamar

"...VOCÊ APRENDE..."




Hoje não vos vou dizer nada...
Vou antes, deixar-vos com um pequeno vídeo, que não é mais do que uma "carta de navegação", um itinerário, um roteiro, um mapa de viagem...Da minha...da vossa...da "viagem" de todos nós...
Palavras de reflexão, momentos de pausa, farol na escuridão, bússola ou estrela polar para encruzilhadas sem norte...Vou dar voz aos pensamentos sábios de um "mestre"...Shakespeare..."Você aprende"...
Simplesmente lindo!!!!!!!!!!


Anamar

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

"THE LAST PARADISE"

GALERIA DE FOTOS





































Optei por oferecer-vos algo que fala por si só...a visualização destas imagens, que dispensaria demais comentários.
Chamei-lhe ou chamam-lhe, "the last paradise", porque efectivamente de um paraíso se trata, um dos últimos a existirem ainda, precariamente, neste nosso planeta.

As Maldivas, pois das Maldivas se trata, é um fim de mundo, como se sabe, lá pelo Oceano Índico, mar de águas quentes, zona tropical, abençoada por uma natureza exuberante de cheiros, cores, sons...a dia e meio de aviões, escalas, transferes, aeroportos... e muito cansaço a fustigar-nos...
Mas de facto, não há cansaço que perdure quando se chega, quando se fecha a porta a este mundo que por cá deixámos e quando se abre "às escâncaras", aquela janela sem horizonte que a limite, e o mar, o céu, o sol, a cor mescla dos verdes com os ouros, com os azuis, com os violetas, com os laranjas de fogo ou a prata espelhada nas águas generosas, nos inundam, nos extasiam, nos tolhem em palavras e gestos, que não sejam de contemplação, de êxtase, de paz...

Lá, Deus, ou o "arquitecto", como lhe chamo, gastou todas as nuances, todos os tons, todas as tintas da palete, e pintou, desenhou e bordou até ao infinito, o alcançável pelos nossos incrédulos olhos.
Lá, eu vi os mais extraordinários quanto indescritíveis, nasceres e pôres de sol...
Lá, eu tive de um lado o sol a espreguiçar-se p'ra dormir...e do outro, uma lua imponente de cheia, a subir no rosa-arroxeado de mais um fim de dia...
Lá, eu vi os céus jorrarem torrentes de água generosamente abençoada, a mitigar as temperaturas da fogueira solar...
E vi depois, em minutos posteriores, tudo regressar ao braseiro inicial...com os cheiros mais apurados, mais adocicados, mais intensos ainda...

E sob as águas de turqueza translúcido, vi o multicolor que não se traduz, de corais, de peixes que nadam connosco, de tubarões bébés ou raias que roçam os nossos pés. Vi o colorido das anémonas, dos roxos aos vermelhos, vi as grutas talhadas pelas marés nos recifes, guarida de espécies pertencentes a um outro mundo de paz e silêncios, de sol coado que penetra, porque as águas são baixas...
Um mundo enigmático, fascinante, misterioso, que nos deixa horas esquecidas por ali mesmo... E nessas horas, o real desaparece milagrosamente e não há mais nada...somos só nós, outros filhos da natureza, procurando miscigenar-nos com aquele milagre...

As Maldivas têm uma "presunção de vida" apenas de cerca de cinquenta anos.
Os ecologistas, os cientistas, todos os homens de ciência sabem, que confluem factores aceleradamente, potenciadores do desaparecimento das ilhas.
O aquecimento global no planeta, a fusão dos gelos das calotes polares, trará uma subida do nível das águas que submergirá este paraíso.

(O crime ecológico não tem de facto, parança. Recordemos a propósito, o último drama ocorrido há escassos dias, com os alpinistas do Mont Blanc (Alpes Franceses) apanhados numa violentíssima inesperada derrocada...)

Aliás, a este propósito, está celebrado já um acordo tácito com o governo do Sri Lanka, para a deslocação e realojamento das populações.
Os maldivianos sabem do seu destino, e como se de um determinismo de vida se tratasse, aceitam a ideia com alguma naturalidade, como uma inevitabilidade já em curso e impossível de estancar...
Um povo, que o foi e muito, massacrado pelo tsunami de que todos guardamos triste memória, tem agora pela frente o agonizar do seu próprio destino, sem revolta, sem desespero, com aquela mornidão de águas calmas e vida mansa, sem exigências, sem raivas, como se não percebesse que é o próprio Mundo de que faz parte, que está dia após dia a ler-lhe a sua terrífica, injusta e desumana sentença...

Anamar

sábado, 23 de agosto de 2008

"FUGIR DE MIM..."







Acho que ainda não é hoje que vos falo dos meus dias de lazer, passados longe daqui. Ou talvez eles, de algum modo, estejam a motivar este meu post de hoje, embora inconscientemente.

Levantei-me tarde, demasiado tarde talvez (acho que este "jet leg" ainda mexe)...
Levantei-me com uma angústia estranha de estranha saturação de tudo, até de mim própria.
Nunca vos aconteceu pensarem: "hoje ninguém me atura, nem eu mesma..."?
Pois bem, estou tal e qual assim.

Fui ao pequeno almoço/almoço desregrado, do que é e não é, ao Escudeiro, claro, e sentia em mim, crescente, uma "fúria" de "fugir", até de mim própria. Constatei que os meus "interiores" estão fartos dos sítios, das pessoas, do "ar"...

Constatei que precisava urgentemente, como um elástico gasto que está à beira do "esfiapar" final, revolucionar a minha vida, de qualquer jeito.
Queria conhecer terras, mundos, gentes. Queria voltar costas, partir, rumar sem destino por aí. Queria iniciar qualquer coisa de novo, não mofada, com o crer e o querer dos vinte anos...
Mas, dos vinte anos que não tive; porque esses que eu tive, cortaram-me as asas de passarinho que nem chegou a sair do ninho, castradores e acomodados aos injustos padrões familiares e sociais de então.
Aos vinte anos eu estava casada, não fazendo mais que cumprir uma trilha que alguém tinha delineado para mim: estudar, casar, ser mãe...ficar no casulo protector de uma vida certinha e prevista...logo eu, uma "rebelde", sonhadora, insatisfeita, "outsider" de alma, nata...

Hoje, numa idade em que parece nada já poder ser feito, quase nem sonhar (o sr. Gonçalves dizia-me há pouco: "a partir dos trinta e cinco não se pode mais nada"), sinto-me como numa cela de penitenciária a cumprir pena de um crime que não fiz.
Sinto demasiado limitado o meu horizonte, sinto o sol que me aquece, pouco demais para o sol que eu preciso...sinto curta e insignificante a estrada que vislumbro à minha frente, face ao percurso que a minha alma sonha...sinto a claustrofobia das paredes de um quarto, face ao Mundo que eu queria para quarto...sinto penalizante e angustiante o cordel que me amarraram às pernas, face ao impulso com que esbracejo p'ra frente...tal e qual como quando damos braçadas num mar, cuja corrente adversa não nos deixa sair do sítio...

Conheço alguém, ou se calhar muita gente que diria, ao ler-me: "infantilidade, utopia, imaturidade, falta de crescimento, perda da noção das realidades, "filosofices" baratas...enfim...pura "palermada"...
É possível, é mesmo possível...se calhar, é mesmo certo.
Apenas, eu estou "morta de sede" à "porta" de um deserto de que já vejo o início mas nunca o fim e cujas areias me não apetece percorrer...

E faço o quê?

Sento-me e espero que me passe esta "doença" de luta com o sonho?
Sento-me e espero que a "biologia da vida" se encarregue de me tirar a frescura da clarividência de desejos, que por mais loucos, são legítimos?
Sento-me e procuro reenquadrar-me no "figurino" de senhora consentânea com a vida "politicamente correcta" que a sociedade tradicional me destina?
Espero ficar "caquética", tontinha, adormecida, face a uma parede branca onde desfilem as imagens do arquivo dos sonhos e memórias?
Espero pacificamente aquela "casa aconchegante" de repouso abençoado, "merecido e generoso", que um dia, por aí, já está algures a aguardar-me e onde me "espreita" um Alzheimer (esse sim generoso, se conseguir "sacar-me" da memória tudo o que me faça sofrer, se conseguir "deletar" e transformar em écran branco o que a alma e o coração teimarem ir buscar à tal arca das recordações??...

Bom...não vos maço mais com tanto negativismo (ou realismo?) hoje.
Não quero azedar espíritos com a acidez do meu...agora.
Não quero "apertar" a alma de quem consiga rever-se por estas linhas...apertadinha que está a minha, nesta vontade louca com que acordei, tarde e más horas, de "fugir até de mim"...

Anamar