Será um blogue escrito com a aleatoriedade da aleatoriedade das emoções de cada momento... É de mim, para todos, mas também para ninguém... É feito de amor, com o amor que nutro pela escrita...

sexta-feira, 20 de setembro de 2013
" HISTÓRIAS DESTE MUNDO E DO OUTRO " ( a propósito da primeira cremação a que assisti )
Ali logo à passagem, estavam dois anjos.
Não daqueles anjos das igrejas. Esses, tínhamos dispensado de virem !
Mas ainda assim, eram dois querubins de caracóis louros, bochechas rosadas e asinhas nas costas.
Nisso, eles eram anjos normais, iguais aos outros todos, embora se pudesse pensar, serem de contrafacção ...
Mas não !...
Um, estava ali para lhe dar a mão. O outro, para lhe carregar a rima pesada dos livros.
Eram duas crianças, que vieram receber aquele menino que se vestia de ancião !
Mas eu sei que ele era um menino ... Senão, por que leria ele tantas histórias ? Senão, por que faria questão de se fazer acompanhar de uma pasta tão pesada de livros ?!...
Percebi que aquilo ali, era um palco, porque de repente, houve uma cortina pesada que tombou, à passagem do menino.
Obviamente estávamos numa peça teatral. Do lado de cá, estavam os espectadores, que eram muitos e continuavam sem arredar pé.
Não percebi por que tinham rostos tão fechados, mesmo estando uma linda tarde de sol ...
Do outro lado, eram os bastidores. Lá, ninguém podia aceder, depois do pano corrido, depois da peça terminada ...
E na verdade, quando o menino cruzou aquela passagem, a dramatização acabou, porque o pano fechou-se !
Nós bem espreitávamos ... Bem esgueirámos os pescoços, a tentar perceber, onde é que ficava a cancela do jardim. Porque eu sei que para lá, ia haver relva, flores, aromas, montanhas, pássaros sem pressa, água corrente a cantar ...
E borboletas, muitas borboletas que eu sei ... andavam por lá, também ...
E havia de haver sol, outra vez ... por que não ??
E eu sei ainda, que o menino ia ser feliz de novo.
Com o vento que ele amava, com todos os amiguinhos que o esperavam, e que já brincavam no jardim, fazia tempo, a dançar de roda, e com as histórias sem fim, dos livros sem fim, que levou consigo ... aquele menino não precisava de nada mais ...
Era um sortudo !!!...
Apenas, aquele jardim, no alto daquela colina, deixava que ele olhasse, com a curiosidade da criança que espreita pelo buraco da fechadura. E essa era a única coisa triste, que amargurava o menino.
Na paz e na alegria das brincadeiras intermináveis e soltas, podia ver a angústia, o cansaço, o sonho perdido, e a escuridão, de tudo o que ficara antes da cortina que atravessara ... e tinha pena !...
E o tempo foi passando, e não havia dias, nem horas, nem noites ... nem mesmo tempo, do lado de lá ...
Por isso, o menino-ancião, que agora também tinha caracóis louros, bochechas rosadas e asinhas nas costas, carregado de livros e histórias no coração, passou a ter uma tarefa destinada : ia sempre àquela passagem, buscar, também ele, pela mão, todos os que iam chegando.
E para os tranquilizar, logo ali lhes contava uma das suas lindas histórias de ninar !...
Daquelas histórias que contou e recontou, quando ainda não era um menino de caracóis louros, bochechas rosadas e asinhas nas costas ... histórias essas, que já então, ele amava de paixão !!!...
Anamar
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