sábado, 17 de maio de 2014

"ESTE MAIO É P'RA ESQUECER ..."



O tempo estivou de vez.
Já não se vislumbram nem ao longe, os dias desabridos, cinzentos e chuvosos, que este ano nos acompanharam até há bem pouco atrás.  Quase os esquecemos.  O Homem esquece depressa !
Agora, o calorzinho  com a doçura do édredon no pino do Inverno, envolve-nos, qualquer brisa já nos é abençoada, o céu mantem-se uniformemente azul transparente, e sobretudo, os cheiros das espécies florais em explosão, fazem um cocktail de perfumes, que nenhuma essência, por muito requintada e trabalhada, alcança ...

A vida, não a vivo ... vou-a vivendo ...
E como numa espécie de passeio no parque, sem destino ou horas, sem finalidade ou determinação, progrido, avanço alameda fora, sentindo o areão estalar sob os pés, usufruindo as sombras, desfrutando das luzernas de sol em meio da copa das árvores, deixando o olhar perseguir, preguiçoso, o volteio dos pássaros, e escutando  a melodia dos seus trinados, numa pauta musical de maestria !


Sinto-me adormecida, sonolenta, amodorrada ... dormente.
Dormente traduz melhor a sensação analgesizante com que plano por aqui, numa viagem ao Deus dará, sem lógica ou meta.
Quando questiono a insatisfação que experimento pela vida que detenho, este perfeito fazer de conta não gratificante, desespero-me, entristeço-me, enfureço-me às vezes,  porque tenho a sensação que isto é uma brincadeira de crianças, de mau gosto, é uma provocação gratuita, um jogo viciado que não quero, mas sou obrigada a ir jogando ...

Gostaria que alguém me convecesse do interesse disto por aqui ;  deste acordar, deitar, desta inutilidade arrastada, desta fotocópia de dia após dia, num cinzento atroz, desta falta de ar de respiração que não se tira até ao fundo, desta sufocação de um coração espremidinho no meio do peito, desta torrente tolhida em cada olho, que se degladia p'ra correr ...

Bom, eu sei que faço inveja a muitos, cujo desiderato seria terem para viver, por cada vinte e quatro horas, este meu figurino de vida.
No entanto asseguro-vos que ele me destrói.  E destrói, porque, dando-me um crédito de tempos mortos de análises e reflexões, em que a mente não se compadece, atola-me num lameiro de que não consigo emergir.  É impiedoso, massacrador e não dá descanso.
É um tempo exaustivo de balanço de tudo, de retrospectiva e de análise.
E na minha vida actual, as análises não têm resultados positivos em quase nenhuma vertente.

Mas afinal, o ser humano deveria beneficiar, com a liberdade de gerir a sua existência, sem horas, sem espartilhos temporais ou outros.
Pareceria que, ultrapassado um dos graves problemas da sociedade actual, que advem da correria louca em que o Homem entra de manhã e termina quando se deita, p'ra dormir também a correr ( o que lhe tira qualidade de vida ), pareceria, digo, que metade dos seus problemas de equilíbrio, bem-estar, realização e satisfação pessoais, estariam sanados, na exacta proporção da sua disponibilidade.
E eventualmente esses estadios serão alcançados pela maioria dos mortais, que acreditam que após a retirada da vida activa, possam ter um esquema mais a contento

Eu, contudo, de uma forma irremediavelmente incoerente, funciono ao contrário !

Por um lado, sozinha, tenho cada vez menos paciência para programar o que quer que seja.  Consequentemente, os meus períodos de introspecção e clausura entre as quatro paredes a que me confino, aumentam exponencialmente, e com eles, o amorfismo, a indiferença, o desinteresse e o cansaço, também.
Há alguns anos atrás, ainda achava o máximo, a experiência da autonomia e da liberdade que vivia entusiasticamente, ao viajar só !
A mim, bastava eu.  Via pelos meus olhos, pensava pela minha cabeça, sentia pelo meu coração !
Os silêncios não me atormentavam, a solidão também não !

Por outrolado, a crise económica que atravessamos, sem fim à vista, é absolutamente limitadora de projectos, castradora de iniciativas e realizações.
Tudo implica existir folga económica, desde os programas mais simples, aos mais exigentes.
Até para se ver o mar, a montanha, respirar ar puro, ou usufruir de um sol franco, que não limitado pelos contornos do betão ... se precisa gastar dinheiro !...

E por tudo isso, ou porque envelheço a passos largos, ou porque estou psicologicamente doente, ou porque estou cansada, exaurida, desmotivada ... ou porque não acredito já  em nada que valha a pena, ou porque deixei de sonhar e o meu eu interior desiste a cada momento, fenece e estiola ... não vivo, vou vivendo ... adormecida, sonolenta, amodorrada ... dormente ...

... até quando ??!!...

Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Ola voltou a publicar, ainda bem.
Rita

anamar disse...

Como pode constatar, Rita, nada que valha a pena!
A vontade, a disposição, a inspiração ... o estado de espírito, andam falhos !
Um abraço

Anamar