domingo, 23 de setembro de 2018

" OUTONO "



E eis que chegou !
À 1,54 h desta madrugada, o equinócio de Outono cumpriu calendário.  E como um recém-nascido, veio sem mostrar ainda, o que expectavelmente o caracterizará : dias coloridos a cinza, Natureza colorida a tons doces e quentes, amaciando a estação seguinte ( que sempre se espera mais agreste e implacável ), temperaturas amenas, pingos de chuva regeneradora e saborosa ...

O Verão, este ano,  parece querer tornar-se inesquecível, nesta imposição de temperaturas absurdas, rasando os trinta graus ou mais.
Começamos a sentir alguma saturação, uma necessidade de mudança, uma renovação e um "arrumar" da alma, que este tempo introspectivo, sereno e silencioso, propicia.
Simultaneamente a nostalgia desce ... inevitavelmente, já que esta mudança de estação, nos reporta às etapas das nossa vidas físicas.
É o tempo da queda das folhas.  O tempo da interioridade e do intimismo.  É tempo de balanço, de pacificação do corpo e do espírito, e de conciliação com nós mesmos.
É paleta de Van Gogh, oferecida aos nossos olhos.  É  uma sonata ou partitura ... É uma difusa melancolia, um estado de alma ... um tempo em declive suave ... cálido e saboroso ...
O ritmo abranda, a energia trepidante da estação cessante carregada de força, adrenalina e vontades, cede lugar a uma hibernação e adormecimento interiores.
Deverão ser saboreados, como o é a doçura das compotas, que saltam das matas para as mãos sabedoras de quem lhes conhece os segredos .
É quase sempre o tempo de mães, avós, de tias velhas, de doceiras insubstituíveis, que sempre pontuarão as nossas memórias, mesmo quando já tiverem partido, ou nós esquecido os sabores irrepetíveis ... porque a criança que fomos, também não existe mais ...

Mas sempre vamos lembrar as prateleiras da despensa, sempre vamos lembrar o rapar lambareiro dos tachos e o sabor reconfortante e apetecido do pão barrado ... nas merendas das nossas vidas !
Sempre vamos recordar saudosamente os cheiros lá de casa, o fervilhar da marmelada em confecção, os bagos das romãs pacientemente preparados, as cores flamejantes dos diospiros maduros ... o insubstituível cheirinho espalhado pelo ar, das castanhas assadas que não tardam aí ...
As folhas amarelecidas tombam pelos caminhos e atapetam os lugares de passagem.  As aves migratórias já foram, e esperamos voltar a ver as andorinhas na próxima Primavera ...
A mansidão dos dias convida aos percursos cúmplices e sem pressas, pelos bosques, pelo arvoredo, pelo topo das arribas, donde se divisa um mar que promete tornar-se alteroso e imperativo, não demora ...

E percebemos que  já passou mais um ano, outra vez ...

E deixo-me inundar por uma paz silente e aconchegante.  Por todas as razões.  Pela lembrança, pela saudade, pela felicidade também ... pela cumplicidade vivida, quando as famílias ainda eram o que eram e quando ainda o eram ... sem ausências ou desistências ...
Nada esquece nas nossas vidas.  As memórias, boas e más, são o repositório feliz, o património indelével das nossas histórias.

Mas o Outono, estação em que nasci, não é o fim da história ...
Terá sempre, de facto, muito a ver comigo ... talvez demasiado !
É sonhador como eu, silencioso como eu, intimista como eu ... com uma magia particular, embaladora e doce, apenas sua,  e que mais nenhuma estação ao longo do ano é capaz de nos oferecer !...



Anamar

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