sexta-feira, 2 de setembro de 2022

" UMA IMENSA MANTA DE RETALHOS "




O tempo muda e muda-nos.  
Não há um dia igual ao outro, um momento que se repita.
E quando olhamos para trás, nunca encontramos absoluto rasto do que fomos.   
Física e inevitavelmente, a que acordámos hoje pouco tem a ver com a que adormeceu há algumas horas.  Emocionalmente ocorre algo muito próximo ... e quando queremos descortinar onde encalhámos no percurso, nem sempre vislumbramos uma conclusão aceitável.  Por isso, "nunca" e "sempre" deveriam ser vocábulos a banir no nosso linguajar, simplesmente porque são conceitos inexistentes, apesar de quase sempre neles acreditarmos.

É com convicção, não tenho dúvidas, que num determinado momento garantimos que isto ou aquilo será impossível de se repetir, ou que isto ou aquilo que agora experimentamos, é matriz definitiva da nossa personalidade pelos tempos fora ...
E por tudo isso, por essa incoerência, quando nunca o sempre que julgamos óbvio, se repete, ficamos surpresos e incrédulos.  Afinal parecia que seria exactamente assim ... Impossível ser diferente ... achávamos !

A vida faz-se precisamente de mudança, de mudanças imprevisíveis.  O crescimento passa pelas dores dessas mudanças e pela sua aceitação, e é na gestão lúcida e assertiva das mesmas, que ele se processa saudavelmente.
De que servem saudosismos, rejeições, inaceitações, de que serve guerrearmo-nos em permanência se o que é inevitável não é passível de caminhar sob o nosso critério ?!
A inteligência está pois, em gerir pacificamente os diferentes estadios da existência, sem conflitualidade ou confronto, tirando de cada momento, de cada situação ou acontecimento, tudo aquilo que, até ao tutano, eles nos possam proporcionar.
O que verdadeiramente importa é ter capacidade de equilíbrio esclarecido e perceber as melhores formas de desenhar cada dia coerentemente, sem atropelarmos ou nos atropelarmos, sem nos violentarmos ou quiçá nos vilipendiarmos ... sem nos desrespeitarmos ou desrespeitarmos aqueles que connosco convivem.

Nada disto é simples, menos ainda fácil.
A vida equaciona-se diariamente como resultante de muitos vectores, fruto ou consequência das circunstâncias, quantas vezes perfeitamente imprevisíveis.  Ela é sempre uma resultante do que experienciamos, do tapete que se estende em cada momento aos nossos pés, de todo o background que nos enforma, das emoções, dos medos e das angústias, da coragem e da determinação ... mas também da esperança, do sonho e da força do acreditar em cada momento !
Porque a grande premissa que norteia a existência é exactamente a impermanência !  Essa é a maior verdade e a maior certeza !
Há que assumir a nossa história pacificamente, com a convicção de termos feito, em cada circunstância, as escolhas que com verdade, seriedade e autenticidade tomámos como as certas e as que não feriram ou violentaram aquilo que em consciência tivemos como correcto.
Dessa forma, pelo menos, teremos paz, alienaremos culpas ou penalizações desnecessárias, aliviaremos o julgamento inútil com que com frequência nos martirizamos, reduziremos insatisfações e conviveremos mais pacificamente com o nosso coração e o nosso espírito.
Se o conseguirmos, já terá sido um ganho !...

... porque afinal a Vida não é mais do que uma sequência interminável de pedaços costurados, todos eles tecendo uma imensa e imperfeita manta de retalhos !...

Anamar

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