sábado, 6 de dezembro de 2008

"O QUE NÃO SE EXPLICA..."



Voltei àquela cidade...
Voltei em busca "daquela cidade"...Sempre assim volto.
Busco um espaço que não foi meu berço, simplesmente porque lá não nasci. Mas foi berço dos meus sonhos de menina-adolescente, meu repositório de memórias, minha primeira noção de me sentir pessoa, meu primeiro local de alegrias e tristezas, talvez sem o saber...

Vivencio por antecipação o que vou encontrar, degusto de véspera o que vou vivenciar, "remexo" na mente tudo o que irei rever...

E depois, chego, olho aquele céu, olho aquele sol...e pergunto-me: "onde está tudo"?...

Ausculto as pedras da calçada, das calçadas que foram por mim pisadas há mais de quarenta anos...e elas estão silenciosas, já não ecoam os meus passos...
Olho as árvores...e aquelas folhas, também não estão lá...
Busco o casario...e "naqueles sítios" estão outros sítios que eu já não sei...
A chaminé do Fomento, bem frente à minha janela de tardes de sol, foi embora...e levou com ela as cegonhas que todos os anos, mal a Primavera aportava, me vinham visitar...

As pessoas...as pessoas que povoaram os meus anos de então...que é delas???!!!
Bem lhes balbucio os nomes...os nomes que me saltam da "arca" da memória...mas ainda assim, não me respondem.

Parece um sacrilégio...parece que saquearam a minha cidade!...

Onde foi o leiteiro que nos vinha à porta, com bilhas de folha, vender o leite à medida??!!...
Para onde se escapuliu a sra. Mariana que já não me põe ameixas, cenouras, ou um feijão verde na alcofinha de compras do meu mercado de menina??!!...
E o liceu, que me traíu e virou Universidade, não sabia que tinha que ser "o meu liceu" toda a vida??!!...
As vitrinas das notas afixadas, a Sala dos Actos (de sessão solene de início de anos lectivos)...de certeza não tem lá já nada meu...Parece mentira!!...

Bom...e que direi das arcadas, da Praça do Giraldo que o não é...do café Arcada, da Papelaria Nazareth dos livros de quatro tostões, da Bijou com os rins de chocolate de prémio por uma boa nota escolar?!...
Que direi da Fonte Nova, esconderijo dos primeiros amores clandestinos, ou da Fonte das Portas de Moura, em vizinhança com a Igreja do Carmo de missas de domingo, de Crisma e Comunhões?!...

E procuro, e procuro e sempre procuro...

Os meus passos estão lá, os meus sonhos estão lá, os meus creres infantis também...As pessoas que eu amei, as pessoas por quem então me partilhei, as pessoas com quem me dividi...por que não me esperam??!!...

A minha casa, de portas e janelas hoje cerradas, com a caliça da parede a esboroar-se, sem a chaminé a fumegar, sem os vasos das flores que a minha mãe punha nas sacadas...ainda assim por lá ficou, naquela avenida que também já não o é...

Só não percebo por que sinto este "desconforto", só não entendo por que sinto este peso no coração, só não sei explicar por que esta tristeza me devassa...e ainda menos por que o meu pai, não há meio de chegar à nossa porta vindo da viagem, para eu o abraçar e beijar outra vez!!!...

Anamar


1 comentário:

Anónimo disse...

Olá Anamar
Aqui estou. Vinda de não sei onde, mas de mansinho. Seguramente, de longe. Que os meus caminhos cada vez mais me custam a percorrer neste nosso país tão tristonho.
Pois é. Também eu sinto estas percas (e que bem que as descreves!). Que ninguém ainda soube substituír com outras doces, antes pelo contrário.
E, pergunto-me se somos nós que andamos demasiado devagarinho ou se é esta vida que só sabe andar depressa e aos tropeções.
Este nosso país está propício a todas as nostalgias!
Um grande beijinho
Lenaspace