quarta-feira, 31 de agosto de 2011

EU, IGUAL A MIM PRÓPRIA ! ....


Agosto despediu-se com um dia típico de Outono, encerrando um Verão que não tivemos, afinal.
Chuva torrencial, céu cinza, apenas frio é que não está.
Lá estou eu a meter compulsivamente o tempo atmosférico no meio da minha escrita, quando afinal frente aos meus olhos desfila aquela frase de Pessoa, do restaurante de Geia, de outras eras... "Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol... ambos existem, cada um como é."
Também "oiço" o Fernando que foi mais um desertor da minha vida, a dizer que as cores com que me escrevo, sempre são as que a janela me deixa espreitar lá de fora, e que objectividade é coisa que por aqui não passa...

Que hei-de fazer? Disso já desisti!

É neste princípio de Setembro que sinto com clareza uma paragem de vida.
Estranhamente ao que muita gente pensa e até ao que eu própria pensava, o mês de Agosto é-me indiferente. Apesar de sentir a ausência da maior parte das pessoas, em férias por excelência, é uma ausência que no entanto promete, como vem a acontecer, um recomeço, um buliço, que irá iniciar-se, uma retoma de alguma coisa.
Mas chega Setembro ou melhor, entreabrem-se as "portas" de Setembro, e eu fico "pendurada", é essa a sensação exacta. Fico como uma fruta já mal presa no ramo, mas que não despenca definitivamente, e se calhar, devia, porque cá em baixo adquiriria um novo estatuto, que não aquele "chove não molha"...

Nestes dias, eu revivo o interiorizado anos e anos ( uma vida), do reinício, do despertar, de um misto de sol ainda que fraco,  com dias uns mais cinzentos que outros nas vidas.
No tempo das minhas filhas em idade escolar, eram os dias do reboliço de compra dos livros e restante material, do papel para os forrar (sim, porque então, os livros não eram usados sem estarem devidamente forrados), eram os dias de saber e fazer os horários para mais um ano... era uma movimentação acrescida.

Agora não.... Fica aquela coisa vazia e despida, desconfortável, fica o que foi e não é mais.
É muito estranho, é uma espécie de fato que ainda não está à minha medida!

Reparei agora que falei do Fernando, o Fernando que nunca conheci, mas que me era uma figura quase familiar através da minha filha, para quem ele foi sempre um amigão, e que deambulou por algumas páginas por mim escritas, e sumiu.
Eu sei que a vida dele é como a da maioria das pessoas... correm de manhã à noite, têm as suas  obrigações pessoais, familiares, profissionais... têm aquela vida corrida, dia após dia, e pronto... a vida vai seguindo a sua marcha!

O Fernando é só mais um. Aliás, ando numa fase extremamente sensível aos afastamentos que me acontecem pelo caminho.
Não se podem prender as pessoas, não se podem atar a nenhuma estaca de árvore, para as termos ali, e como os laços que as uniam a nós, eram provavelmente débeis e precários, elas seguiram, como aqueles conhecimentos sazonais, em que se trocam e-mails, telefones e se fazem catadupas de promessas e intenções para depois, daí a uns tempos, olharmos para aqueles números na agenda do telemóvel, associados a um nome que já não divisamos na neblina lá atrás... o destino é obviamente serem apagados...

Resta-nos quem, nesta "puta desta vida" (como diria o Ilesh quando também ele se sente desiludido e desencantado)???...
Resta-nos realmente a família mais longínqua, se não desertora já, por força das circunstâncias, os mais directos que estão sempre lá ... estar, estão, e sabemo-los, mas também só têm o tempo que o ganha-pão lhes deixa, e aqueles amigos (tão poucos, meu Deus!...) que podemos chamar assim,  que angariámos na "travessia", e que talvez por também já terem tempo sobrante, também o têm para nós ... às vezes! Mas quando o têm, pelo menos falam a nossa "língua", porque vêm lá muito de trás, caminhando ao nosso lado...

A Larissa, que mais que uma empregada é uma grande amiga, dizia-me ontem (nos muitos desabafos que trocamos, mercê dos anos que já nos "pertencemos," e de tudo quanto ela já viveu connosco na nossa família ), dizia-me, como pessoa culta, muito sensível e só que é, sentir-se cada vez mais desenraizada em Portugal, mais desenraizada por onde tem andado; mas acrescentava... "se eu regressar à Ucrânia, que é o seu ar, o seu chão, o seu útero... não tenho ninguém para me abrir aquela porta ... ninguém me espera já, afinal!"...

O Mundo é demasiado grande para a Larissa, o seu sofrimento fá-la sentir-se pertença de lugar nenhum... tantas estradas e encruzilhadas à sua frente, e o olhar da Larissa perde-se, se calhar, nas brumas daquela Ucrânia, quando a avó ainda a vestia de lacinhos, e a mimava...

Eu costumo dizer que há um sonho que tenho que tenho que realizar.
Quando a minha mãe já por cá não estiver, e eu portanto fizer muito pouca falta a quem quer que seja, vou por aí... vou procurar um poiso, vou procurar outro mundo, outras gentes, outro ar e outro céu ... Fundamentalmente, vou procurar...
Este projecto tem-me empolgado longamente, e como sabem, eu preciso  ter metas para que viva e sorria todos os dias. Criei-o portanto, e quase já o passava e repassava ao pormenor, como seria, como faria, como me sentiria, nesta aventura adolescente, descomprometida e solta.
Sem dúvida interessante, enriquecedora, gratificante...

De há uns dias a esta parte, não me perguntem porquê, pareço ter poisado duma viagem de balão, numa qualquer planície, donde toda a perspectiva do mundo se anulou.
Cheguei de um céu azul e lindo, dum céu que me dava lá do alto todo o mundo aos meus pés... e poisei...
E parece que o balão esvaziou e o céu escureceu, como este Agosto de hoje.... O  meu projecto fechou.
Não percebo porquê, mas de repente comecei a perceber que se calhar, eu apenas busco, faço tentativas desesperadas de encontrar talvez nem eu saiba o quê!
Sempre remendos de fora para dentro, para me coser os rasgões da alma, sempre na esperança de que talvez, esteja aqui, ou ali, ou além, a minha realização, a minha "cura"... e depois tudo é, provavelmente, infantil, imaturo, utópico...inconsistente...
E lá se foi o meu balão.... O pior é que não sei se terei força para voltar a pô-lo no ar ...

Eu, sempre igual a mim própria ....

Anamar

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