sexta-feira, 29 de maio de 2015

" ELUCUBRAÇÕES"




Maio, florido Maio ... não renega o epíteto ... "mês das flores" !

E é verdade que elas espreitam em cada canto, fazendo olhinhos ao sol que também já vai alto e quente.
Dei-me hoje conta que os céus estão mais azuis, pejados de "gotas" orvalhadas de jacarandás ...

O ar de Maio fica mais leve.  O cheiro floral parece chegar-me às narinas.  Ou então, sou eu que o imagino, simplesmente !
Sempre lembro com uma nitidez absoluta, o perfume intenso dos trópicos, na leveza das alvoradas.
São cheiros peculiares, únicos .  É o cheiro de terra parideira, úbere, pródiga, generosa.
São odores adocicados que se levantam da miríade de plantas, uma vegetação luxuriante por todo o lado.

Aliás, as cores, os cheios e os sons, são as pegadas indestrutíveis que retenho das minhas viagens.
Poderei esquecer tudo.  Já baralho com frequência, locais, espaços ... sítios atípicos, ou mais atípicos ( porque nada é atípico quando o mundo é nosso ...).
Mas essas três manifestações da Natureza, que me extasiam e sempre me transportam a um qualquer paraíso ... nunca esquecerei até morrer.
Dou por mim, mergulhada nesse universo, a dizer a meia voz : " que privilégio ... que felicidade poder viver tudo isto !... "

E esses cheiros, transportados pela aragem branda, são os mesmos, de ocidente a oriente.
E essas cores, intensas, feito seiva de vida, são iguais, de Bali a Samaná ...
E esses sons, assobios, apitos, chilreios ... o pipilar, o trinar das aves em desvario, também o são, da Amazónia ao Pantanal, de Zanzibar às Maldivas ...
A melopeia das ondas que o não são, mansinhas, desmanchando-se na orla das areias brancas ... é uma lenga-lenga, é uma canção de ninar, é um embalo entorpecente,  para a alma e para o coração ... P'ra cá ... p'ra lá ... p'ra lá ... p'ra cá ...
Oiço-a, oiço-a tão clara nos meus ouvidos, como se a escutasse de um búzio perdido na praia ...

Por aqui ... bom, por aqui, gosto de sentir o dia clarear.  Gosto de começar a ouvir a passarada na árvore das minhas traseiras, iniciando a labuta de mais um dia.
Gosto daquela cor pálida do céu, entre o azul, o róseo, e o indefinido negrume da noite, que começa a ceder ao romper da madrugada.
E gosto de aspirar profundamente o ar, fresco a essa hora.  Que é leve, que é puro ainda.
Gosto de me abeirar da janela, perscrutar  o silêncio lá fora, sentir a ausência de gente, de movimento, de ruído ... perceber, ainda adormecido, o peso do betão.

E sentir a miragem da liberdade, aqui, onde o fardo  dos dias me sufoca, onde o ar me falta, e onde apenas o sono é retemperador de alguma, pouca  força.
Porque neste momento sinto-me a adoecer a passos largos.   Percebo-me à beira de um abismo que não distingo bem.
Só sei que é fundo, escuro, e que o não consigo evitar ...

Anamar

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