quarta-feira, 27 de maio de 2015

" SUSPENSA ENTRE DOIS MUNDOS "




Mais uma semana em meio.  O real tempo do tempo, está "perdido" para mim.
Neste momento é como se eu estivesse suspensa no vácuo, à espera de qualquer coisa ... uma bússola, um norte apenas, uma estrada com sentido, um campo com horizonte que o signifique ...

Estou no meio de sonos, mergulhada em pesadelos, com o cansaço atroz de "noite não dormida".
Convivo demasiado perto com a vida e com a morte.  Anseio as duas.  Não sei escolher !
Convivo demasiado perto com o "apodrecimento" de um ser vivo, ainda vivo ...

As asas da morte esvoaçam, esvoaçam por aqui.  Sinto claramente o seu roçagar, pelas madrugadas escuras ....
Povoam os dias, mas povoam muito mais as noites.  São o urubu no galho da árvore lá na savana, olhando a presa.  E esperando.  Esperando a sua vez de descer.
Aterrorizam, profanam, empesteiam o ar, tornam-no irrespirável.
Esvoaçam, esvoaçam.  Apenas, ainda não pousaram !
Até os gatos a sentem.  Obviamente que os gatos a sentiriam ...

Convivo demasiado perto, com a crueza do abandono do corpo por parte do comando cerebral.
E assisto impotente, ao esfiapar de uma vida que já o não é.
É desesperador encarar o presente !  É mais desesperador ainda, projectá-lo para o futuro.
Porque aquele corpo que está naquela cama, já não é o da minha mãe.  É o meu.  Será o meu, um dia ...
Aqueles olhos sem luz, são o apagar dos meus, um dia ...
Aquele rosto sem expressão, perdido num espaço que já não conhece nem identifica, vai muito além do dela ...
É o meu, é o de todos os velhos perdidos no infinito ...

Por que recusa a "ponte" que lhe estendemos ?!
Por que recusa a amarra que lhe deitamos ?!
Por que não quer ver a luz do dia para além das cortinas, perceber o sol imenso, atrevidamente glorioso, lá fora ?!
Por que nega olhar o azul provocador  do céu, parecendo querer confundir o dia e a noite, para que ambos, misturados, formassem o lusco-fusco em que mergulha ?!
Por que já não sabe que as flores engrinaldam os jardins, adoçam o ar com o perfume inebriante, e esbanjam as cores, todas as cores, nos muros, nas janelas, nas ramadas, nos arbustos que amarinham as paredes ?!
Logo ela, que vivia de as olhar, de as plantar, de as regar ... de as acarinhar ?!
Por que rejeita a música, os sons ... e apenas o silêncio a conforta ?!
Por que parece despedir-se a cada instante ?!
Por que tem sempre uma mão perdida no ar, sem orientação definida, como o braço do náufrago fora de água, ou o adeus do viajante, na amurada do navio ?!

Porquê ???

E quando o dia cai e o sol ameaça dormir, este meu tempo sem tempo, afinal vai esgotando o tempo, e a vida vai andando, o cansaço chega p'ra ficar ... as forças vão partindo !

As semanas passam, os meses correm, e atrás deles, os anos !

A inevitabilidade deste caminhar ... A escorrência deste rumo imparável ...
O ontem tão perto do hoje!...  O hoje tão perto do amanhã !!!...

Anamar

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