terça-feira, 8 de maio de 2018

" DEVIA SER PROIBIDO ... "


                                                                               


Quando começamos a fazer balanços, é complicado.
Ontem, ao fim do dia, a despedida de mais uma colega de profissão, amiga também, exactamente da minha idade.
Muitos, fomos apanhados de surpresa pela notícia.  Doença prolongada, de que poucos sabiam ela padecer, não havia contudo, muito tempo.
A mesma capela mortuária onde há três semanas me despedi da minha mãe , só que esta mulher tinha menos trinta anos que a minha mãe ...

Aquela coisa de sempre : o reencontro de rostos que já não se viam há tempo, porque os aposentados, erradamente deixam de se encontrar.  Parece não haver vagar, não caber no calendário, não terem espaço numa agenda que deveria ser, obviamente liberta.  Mas não !
Nestas circunstâncias rumamos todos, fazemo-nos presentes, como se nos tivéssemos separado ontem.
São as flores, o aperto na alma, a penalização no olhar e no coração, as palavras de conforto aos familiares ... os momentos de recolhimento frente à serenidade de quem parecia apenas dormir.
E depois, depois ficamos a falar uns com os outros, como se em intervalo na sala dos professores, estivéssemos.
Lembramos coisas, recordamos pessoas, fazemos estatística dos que já nos antecederam ( e foram já tantos ! ), sabemos de outros tantos que ameaçam estar na calha ... Terá sido o amianto que toda a vida nos cobriu, sobre os pavilhões ?  Havia de se fazer um levantamento do número dos que já partiram ... reféns da maldita doença ...
Falamos dos filhos .  Tem-los cá ?  Porque muitos, mas mesmo muitos, os têm em países estrangeiros, na busca de segurança e futuro mais digno.
Até porque, ao longo da vida permutámos os nossos filhos com os dos colegas, no ofício do magistério.  Frequentaram a mesma escola, a nossa escola.  Conhecíamo-los bem.
Pergunta-se pelos netos.  Mostram-se fotos, vídeos ...  Oh, tão fofinha !  Parecida com a mãe.  Dá-lhe um beijinho.  Sempre foi uma aluna impecável e trabalhadora ...

E regressamos a casa.  Mais pobres.  Mais tristes ...
O vento cá fora, desabrido apesar de Primavera, ainda nos desconforta mais.  O coração apertado, contrito.
Nem a piada de recurso daquele colega que anunciava ter resolvido não comparecer mais aos funerais dos colegas, como protesto por eles também não comparecerem ao seu próprio, nos amenizou o estado de espírito !

E quando nos despedimos, sempre a mesma frase repetida : até à próxima.  Que não seja pelo mesmo motivo !...

É assim a vida !
Dizia a minha mãe : " na cadeia e no hospital é que se reconhecem os amigos ! "
Eu acrescentaria ... e na partida também !...

Amanhã haverá sol.  O céu estará azul, os pássaros irão cantar.
Será Primavera mesmo, em toda a sua exuberância.  O verde, as flores, toda a Natureza estará pujante e plena.  Haverá risos, será leve a vida !...

Por isso, devia ser proibido morrer-se !...

Anamar

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