quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

" O MELHOR PRESENTE DE NATAL "


Estamos a dois dias do Natal.

Estamos a dois dias de qualquer coisa que neste particular ano 2020, não identificamos muito bem, nos soa a falso e até a contrafacção ! 😌😌
Vivemos, nesta rectinha final, sinais de angústia, de preocupação, de apreensão, de incertezas e receios.
Desejamos e não desejamos que esta época se esfume rapidamente, neste agridoce de um desconhecido que nos assusta, nos incomoda mais do que nos alegra ou preenche.  Desejamos que chegue e passe logo ... e tememos a "factura" a ter de pagar-se em termos do descontrole, obviamente expectável, da progressão da pandemia da Covid19, numa sociedade que abriu um parêntesis, p'ra não dizer que escancarou portões, nas regras de prevenção, nas restrições existentes, nas permissividades sociais aligeiradas.
Todos demasiado cansados, todos demasiado saturados, famílias e famílias feridas de morte, em mortes inesperadas e inaceitáveis ... dores latentes e jamais arquiváveis por partidas não assimiladas, não vivenciadas na realidade, em lutos incumpridos, por despedidas nunca consumadas ... têm-nos deixado numa debilidade emocional além de física, sem tamanho.  Têm-nos reduzido à fragilidade mais incontrolável e insanável que alguma vez sequer, pudemos  equacionar  nas  nossas  vidas  ter  que  vir  a  experimentar  um  dia !

Entretanto, o Natal, um período emocionalmente propício ao exacerbar das emoções, em que valores como os afectos, as saudades, a distância, a ausência, a solidão e o abandono, abrem o sangramento de feridas  crónicas  que  temos  contido a duras penas, dia após dia, mês após mês ... há demasiado tempo já, está aí, p'ra ser vivido, atravessado, resistido !
A capacidade resiliente individual, está presa por arames.
Cada dia é um teste  dessa mesma resistência.  Cada dia é uma prova de fogo sobre a capacidade do equilíbrio mental e psicológico de cada um de nós.  Cada dia é mais um exercício de testagem sobre até onde e quando, conseguiremos chegar minimamente incólumes ...
As famílias vão fingir encontrar-se numa cumplicidade emocional e afectiva, de distanciamentos sociais necessários e impostos.  Os olhos vão sorrir, chorar ou apenas olhar-se, atrás da máscara que não poderá ser esquecida.
O abraço não se dá.  Aquela vontade imperiosa e carente por um tão grande afastamento do toque, da pele, do sangue, num processo violento e contranatura, aperta-nos o coração e dilacera-nos a alma.
Olhamo-nos, talvez ... mas acredito ser de tristeza o sorriso tímido que os olhos denunciam, e a voz embargada desvenda ...
Precisamos mais de um carinho explícito do que de um bom prato de bacalhau.  Precisamos mais de um afago real, do que de uma taça bem recheada do nosso doce predilecto.  Precisamos mais de um colo disponível do que daquela taça de bom vinho tentando aquecer-nos a alma ...
Precisamos ...

E há luzes na mesma.  E há árvores e adornos que a duras penas saíram dos armários.
Porque a vontade é pouca.
Mas temos, apesar de tudo, um compromisso com a vida : a obrigação de a homenagear, de agradecê-la e de a preservarmos.
Estamos vivos.  E tantos, sem provavelmente o terem considerado, já não estão !
Rimos, choramos, sentimo-nos perdidos, cansados mais hoje que ontem ... mas com corações que batem, em uníssono ... com braços que se estreitam sem que ninguém o saiba, com bocas que se tocam apesar da distância, com a força do sonho a levar-nos para onde quisermos ir ... ainda que sem sairmos daqui !
E isso tudo é que vale !  E será isso tudo que terá que levar-nos adiante, num rumo certo, num caminho seguro, num trilho de esperança !

Ontem, a Teresa, nos seus três anos e meio, estreitou-me com a sua força de quase bebé ainda, encostou a cabeça no meu peito, enlaçou-me nos bracitos pequenos e frágeis que ainda não me contornam, e olhando-me docemente, beijou-me muitas vezes enquanto dizia com a expressão da paz e da tranquilidade que nos garante um porto seguro : "Avó, é tão bom estar aqui !  É a melhor coisa do mundo !"

E este, foi o melhor presente, do melhor Natal que já tive !...

Cuidem-se !  Feliz Natal !

Anamar

Sem comentários: