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domingo, 27 de setembro de 2015

" SONHO "



Partiste e foste sombra outra vez,
além ... onde o vento faz a curva ...
Deixaste a minha vida mergulhada
neste charco tenebroso de água turva ...

Serviste-me o licor, frutas e mel,
do festim que do sonho é alimento ...
Em cálices de cicuta e de indiferença,
fizeste órfão de ti, meu sentimento !

E o tempo que vai e que volta, nas voltas da gente,
ignora a dor fria e vazia desta solidão
Amei-te  acima do certo, do tudo e do nada,
ficou-me a saudade e a dor, no meu coração !

E os dias que chegam e partem no Inverno da vida,
não sabem, nem sonham razões deste meu sofrer ...
Caminham comigo, a meu lado, numa despedida
e estarão comigo p'ra sempre, enquanto eu viver !...

E o sonho que foste e que já não és mais,
escureceu o meu dia, tirou-me o alento ...
Foi maré de praia vazia ... de areias desertas ...
Foi folha arrastada no mundo, em dia de vento ...

Foi sol que desceu no ocaso, lá longe ...
Foi batalha  perdida antes de começar ...
Amei-te acima do certo, do tudo e do nada ...
O meu crime e castigo, foi apenas sonhar !!!...

Anamar

domingo, 13 de setembro de 2015

" QUIMERA "


A minha mãe pediu-me um colar
e em cada conta do mesmo, estava um sonho de sonhar ...
Pediu-me uns brincos também ...
Neles se guardavam histórias,
e pingavam as memórias,
que a sua vida contém...

Foram lendas, foram esperanças,
Foram contos e lembranças
que p'lo seu rosto, passaram ...
Sorriu ao espelho outra vez,
e num milagre que se fez,
as mãos que tremem, pararam ...

Todas as cores  e matizes
lembrando dias felizes
no seu rosto a afoguear,
devolveram-lhe a candura,
despertaram-lhe a doçura,
quando lhe dei o colar !...

E em cada sonho sonhado,
feito um rosário desfiado,
por momentos, renasceu ...
A menina, hoje velhinha
com a cabeça bem branquinha
de novo,  sonhos teceu ...

E o seu silêncio profundo
que continha  a dor do mundo,
tinha  a imensidão do mar ...
Mas ...
Olhou ao espelho e sorriu,
adormeceu e "partiu" ...
quando lhe dei o colar !...

Anamar

sábado, 22 de agosto de 2015

" OCASO "





Aproveita este minuto
porque o depois, é depois ...
e o que passou, já não é ...
Logo, a flor vai  dar fruto
E o fruto morre no pé ...

Respira o ar do agora ...
Quando acordares, já é tarde
Mal nasce, o sol pousou...
Tudo passa e não demora
Quando vires, chegou a hora
O caminho já cansou !...

Prende bem juntinho a ti,
cada ilusão que tiveres,
cada sonho e cada crer ...
Colhe braçadas de esperança,
Ramos de cada lembrança ...
Tudo isso, foi viver !

E esgota todo o momento,
como sendo o derradeiro,
aquele que queres guardar ...
Um dia, ao virares a esquina,
a mulher, ontem menina,
não tem mais o que sonhar !...

Anamar

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

" PORQUÊ ? "



Nunca me ofereceste um búzio ...
Vi isso agora, que vasculhei outra vez a gaveta das memórias ...

Por que será que eu colecciono memórias ?!  Devo estar a envelhecer !
Os velhos é que recuam no tempo, e vivem disso.  Os velhos é que obscurecem o presente que já não amam, e buscam aconchego no passado.
Nele, deambulam para a frente e para trás, e não o largam mais ...

Tenho conchas e seixos de todas as praias ... Tenho mesmo areia e corais.
Tenho até estrelas, que já haviam desistido de viver no mar ...
Mas não tenho um búzio !  Não, dado por ti !...

Já sei ... tiveste medo que ele me contasse segredos que querias invioláveis ... que me trouxesse notícias de outros oceanos ... me deixasse ouvir de novo, as confissões que me fizeste então, quando as falésias, os limos e as algas eram nossos, quando jogávamos à bola, no meio dos rochedos ...
Ou quando perdíamos simplesmente o olhar, no voo preguiçoso das gaivotas ...

Os búzios são indiscretos.  Contam sempre tudo.
Mesmo no pino do Verão, põem-nos a escutar o bater alteroso das ondas em dias de borrasca, quando o Inverno é agreste e impiedoso.
Basta chegá-los ao ouvido e escutar.  Saber escutar ... porque está lá tudo : os queixumes do mar que açoita a orla das praias distantes, o sopro do vento que embrulha a espuma e a joga em rendas entretecidas na rebentação ...
Está lá tudo !
E se escutarmos bem, os grasnidos das gaivotas, dos albatrozes, das andorinhas do mar e das fragatas ... também  lá  estão,  como  numa  fita  de  gravação.  Sempre,  de  noite  e  de  dia !...

Quem os tem, nunca está só.
Eles trazem as saudades de longe.  Lembranças dos mares do sul.
Lá, onde o calor é tórrido, lá onde os cheiros doces e os silêncios sábios nos tactuam a pele ... e o cruzeiro do sul governa o rebanho luminoso que pastoreia no escuro, bem escuro, do firmamento ...
Lá, onde o caminho é tão longo, quanto a liberdade do sonho ...

Mas tu nunca me ofereceste um búzio ... Vi agora.

Tenho as rosas e as madressilvas, tenho as pinhas e as flores sem nome ... tenho até as margaridas silvestres, já desfolhadas.
Tenho os caminhos e as sombras, e os muros, de pedras plantadas a esmo ...
Tenho os pores de sol e as amoras dos carreiros.  Os canaviais e todas as histórias infinitas que contavas ...
E a mata e o pinhal ... E o tempo todo do mundo, que eu achava que nunca se acabaria ...

Mas que tonta !
Não há nada que mais rápido se esgote, que este tempo já sem tempo ... porque o cansaço se abateu ...

Tenho tudo !
Tudo o que me povoava, naqueles dias soltos e leves.
Foi ontem.
E já passou uma eternidade !...

Pronto, vou ter que fechar outra vez a gaveta das memórias.
Vou ter que me conformar ... Não tem mais jeito !...
Aqui, de tão longe, afinal não posso mesmo ouvir o mar !...

Tu nunca me ofereceste um búzio !!!...

Anamar

domingo, 26 de julho de 2015

" DEVANEIOS "




Aqui donde estou, eu vejo o mar ...

Vejo-o, sempre que fecho os olhos.  Vejo-o, sempre que olho o céu aqui por cima.
Depois, caminho mais além, derrubo as serras, os montes, afasto a cortina do arvoredo cerrado, e de repente, lá está ele ... no fim daquela encosta sobranceira .
Está calmo ou agitado, conforme o olho.  Não começa, nem acaba nunca.  É de mil tons. Tem as cores do arco-íris ... mais todas aquelas que ainda não inventaram !...

A mata de pinheiro manso termina no topo da falésia, a vegetação rasteira, de solo arenoso, forra a rocha agreste por ali abaixo.
As flores silvestres, que não pedem para nascer, pintalgam aqui e além, com tufos coloridos.
As amoras bravas adocicam os viajantes, e o sol aquece, envolve e embala ...

E está tudo lá, que eu sei.  Nos mesmos sítios.
Os muros com  as pedras empoleiradas, os caminhos tímidos e o verde matizado.
As gargalhadas e as palavras que por lá esqueci ...

Por que não posso eu ver o mar, daqui ... ora essa ?!
Eu sei que os meus olhos já não enxergam direito.  Eu sei que os contornos nítidos, já só são coisa da minha mente e do meu coração ...
Tudo, porque o tempo anda a brincar comigo !
Mas o meu querer manda no sonho.  E eu sonho sempre que quero.

Basta que cerre os olhos, ou que olhe o céu aqui por cima ...

E  também  invento  gaivotas ...  E  oiço-as  nos  voos  planos  que  fazem,  bailando  na  aragem ...
E sorvo o cheiro intenso da maresia, porque essa, eu transporto no bolso da alma, na caixinha dos segredos.
E escuto, nítido, o vai-vem das marés que nunca cansam, que nunca dormem, mesmo quando os Homens repousam no cólo das mães .
Sou salpicada pela espuma que rendilha a beira do mar ...
Abro a porta à brisa da tarde, e deixo-a ir, solta e leve, bênção e paz de corações atormentados ...
Como eu, ela vai sempre mais além.  Como eu, ela rompe distâncias, busca caminhos, procura destinos.
Não há correntes que a prendam.  Não há prisões que a amarrem.  Não há cansaços que a demovam ...
Ela vai sempre mais além !...

Eu quero dormir no mar! 
Tem que ser o mar, o meu berço de eternidade ... Onde mais ?!
A  minha  terra  tem  mares  de trigo, a minha mente tem mares de sonhos, o meu sonho tem mares de infinito !...

Um dia, eu quero dormir no mar !!!...

Anamar

sábado, 25 de abril de 2015

" OUTRO ABRIL " - 41 anos depois ...





Azul Abril, de céu, de mar
Verde de esperança 
de navegar
Sonhos de sangue
cravos vermelhos
Força de um povo ...
Novos e velhos
no meio da rua,
solta a canção,
senha, memória
e coração ...

Na madrugada que se fez dia,
asas de fogo
Abril abria ...
Um barco à vela,
céu p'ra voar
sem termos medo de naufragar ..
Abril abriu
nossa verdade,
sabermos certa, a liberdade ...
E a fé nascida num Homem novo,
foi voz de Abril
grito de um povo a recusar a servidão ...
Abril chegou, e disse NÃO !...

E hoje, Abril,
esqueceste as notas,
esqueceste a letra do teu poema, que era canção ?!
Calaste as vozes
Cansaste a esperança,
Perdeste o norte, feito criança ?!...
Esqueceste o rumo
Perdeste o chão ?!...

Que te fizeram ?
Eras azul, de céu, de mar ...
Não vais deixar-te amordaçar !...
Por ti ... já fomos ...
Contigo iremos ...
Tua promessa, tudo o que temos ...
Acorda, Abril
Firma a raíz
Dá fruto e flor, neste país ...
Deixa-me o sonho...
Olha o teu povo ...
Que nasça em ti
um ABRIL novo !!!

Anamar

quarta-feira, 1 de abril de 2015

" DO AMOR E OUTRAS COISAS ... "







"Havia um sonho.  Havia uma
esperança.  Havia.  Havia.
Mas o sonho também cansa
e a esperança está vazia.
Havia um sonho e uma esperança
Pois havia. "
                             Joaquim Pessoa



Do amor só sei o que me contaram,
da vida, o que me ensinaram,
e de mim, já pouco sei !...
Os sonhos nunca são como disseram,
as esperanças já não são como se esperam ...
E dos dias ... já cansei !

Havia um sonho que poisava à cabeceira,
um sonho bom, que deitava à minha beira,
que vinha à noite, e comigo amanhecia ...
Era azul como a luz da alvorada,
tinha o perfume de uma mulher desenhada,
deixada só, numa cama ainda vazia !

E era um corpo que sonhava a Primavera,
p'ra florir ...
Corpo de ir, e não de espera,
feito rio que não tem muros e busca o mar ...
Era um ímpeto, um sufoco, um grito fundo,
era um lamento, foi um riso, ou só um esgar ...
Era pássaro velejando em céu profundo,
era barco sem amarras pelo mundo,
sem ter medos ... ou temor de naufragar ...

Foi luz de estrelas, foi centelha,
foi crer, foi querer,  e farol ...
Foi a força de um chamado e de um queixume
Foi fogueira acesa, sem ter lume ...
Morreu no frio do Inverno, sem ter sol !...

E o sonho que ficou na cabeceira,
como a ave que poisou na macieira,
foi só sonho ... não passou de uma quimera !
Era azul como a luz da alvorada,
vinha doce e embalava a madrugada,
mas partiu ... como parte a Primavera !!!...

Anamar

sábado, 21 de março de 2015

" DIA MUNDIAL DA POESIA "





Poesia é uma forma de dizer as coisas ...
é uma arquitectura,
uma construção ...
É coração e é ternura ...
É pôr azul e rodopios,
no céu, nos rios ...
Malabarismo, logro, magia
equilibrismo, sonho, utopia ...
Poesia é fazer breve o que é doído
É rir, dizendo o que é sofrido ...
É arlequim, polichinelo,
fada, duende ...
É tornar belo ... seguir em frente
pelo caminho mais tortuoso ...
sentir no mar , mesmo alteroso,
um berço doce, quente e profundo ...
É,  da "viagem" fazer poemas,
tornar enormes, coisas pequenas ...
partir no vento, escolhendo o rumo ...
Poesia é deitar co'a Primavera,
e é pendurar na janela,
arco-íris, luas, sóis e alvoradas
É pintar o céu com estrelas,
voar na cauda dos cometas,
p'ra acordar as madrugadas !
É viver uma quimera ...
Poesia também é espera,
e sabê-lo ... Que ilusão !
O poeta é um fingidor,
transforma o ódio no amor
com que nos ergue do chão !...

Anamar

terça-feira, 12 de agosto de 2014

" CANSAÇO "



Sabes, eu ainda me importo !
Mas não me perguntes por que me importo,
se eu não quero importar-me ...
O que importa que estejas por aí,
eu esteja por aqui,
se já me esqueci das pontes e das estradas ?!
O que importa que cheguem as horas,
aquelas horas tão conhecidas,
se eu já não tenho relógio que as conte
nem coração que as adivinhe ?!...
Eu quero lá saber do que foi,
se foi isso mesmo ... só FOI ...
uma andorinha fora da Primavera,
um sol serôdio num dia de Outono,
uma esperança que morreu, antes de crescer no pé !...
Estou vazia ...
Esqueci os caminhos sonhados
daquela casa que só eu inventei
Com veredas de sebes,
roseiras bravas e madressilvas cheirosas ...
com cucos e gaivotas no céu ...
porque a canção do mar se ouve perto...
Mas o frio da estação que aí vem, já se anuncia
e ficará até ao fim ...
Porque é o frio do Inverno que sobe
pelos troncos envoltos em musgos,
e que amarinha os rochedos,
perdidos na bruma da serra ...
e vai tolhendo os ossos e a mente ...
e só pára no coração ... quando ele também pára junto ...
Sabes, eu ainda me importo !...
Não me perguntes por que me importo ...
É tão triste que eu me importe,
se não devo já importar-me !!!

Anamar

quinta-feira, 24 de abril de 2014

" OS CAMINHOS DE ABRIL ... "



Eis que Abril chegara,
e de repente
uma luz se acendeu na escuridão
O povo acordou, e foi em frente
dizer basta à miséria e à servidão !
Abril abriu em nós fogachos raros,
que nem sequer sabíamos existir,
abriu sonhos, abriu esperança, abriu sorrisos,
e uma indomável força a explodir ...
Abril deu aos rostos  a alegria
em que o nosso sonho confiou,
a alvorada acordou um novo dia,
que em indízível  fé nos inundou !...
Abril  trouxe às gentes, a criança
que na alma embalava um sonho puro ...
Uma criança com um cravo na espingarda,
um menino envolvido numa farda,
homem-gigante, um herói de outro futuro !...




E hoje, quarenta anos estão volvidos ...
O caminho de Abril  foi perdido
às mãos de quem o não viveu então ...
Portugal de joelhos e sofrido,
humilhado, em desespero e vendido,
chora o cravo que murchou no coração !...
Abril adormeceu, ou o mataram ...
profanaram, destruiram, e calaram
seus ideais, os seus valores ... sua razão ...
O povo volta à rua indignado,
e mesmo já sem fé e destroçado,
é um povo que resiste e que diz  "não" !!!...
Prenderam-nos o sonho, e algemam a vontade
Amordaçam-nos a esperança e também a liberdade ...
Tentam de tudo p'ra lhe dar um fim ...
Num estertor cansado de agonia,
vamos reaver a utopia,
e sonhar Abril, ainda assim ...
Porque Abril foi um brinde do destino
que a sorte generosa, ao meu, ditou ...
Poder tê-lo vivido, um privilégio ...
da minha geração, um sortilégio ...
É sem dúvida outra gente,
aquela que por Abril passou !!!...


                                  25  DE  ABRIL  SEMPRE !!!


Anamar

sábado, 8 de fevereiro de 2014

" TU DORMIRÁS ... "



Meu amor, um dia destes vou sair pé ante pé,
naquele sussurro de andar, que não acorda ninguém,
naquele caminhar sobre nuvens de algodão ...

Aqui dentro, já não dá !
Há demasiado frio e escuridão, e eu tenho medo do escuro.
Lá fora chove, mas eu faço de conta que é Verão,
Até porque as gaivotas brincam nos céus bem à minha frente,
Os narcisos, as mimosas e as cantarinas já se enfeitaram por aí ...
Faço de conta que te tenho,
brinco de rebolarmos na erva fresca,
ou de apanhar carrapetas, nos carrasquinhos do monte ...
e cogumelos acabadinhos de acordar ...
Brinco de ter uma lareira que me aqueça a alma ...
ou então espero pela Primavera,
porque aí, sim,
já posso seguir nas asas de uma borboleta,
ou debaixo da asa de um pintarroxo !

Seja como for, eu prometo sair pé ante pé,
para que não fiques órfão dos meus braços,
saudoso do meu colo,
despido da minha pele,
amputado da minha nudez ...

Também podemos brincar de faz-de-conta ...
Eu faço de conta que acredito no amanhã,
faço de conta que não oiço a tempestade aqui no meu peito,
(abafada que é, pelo rugido do mar,
nessa savana, de algas, búzios e conchas ...)
Eu faço de conta que ainda te espero ...
mas isto, só porque quem nada espera, está morto e não sabe !...
Faço de conta que não estou louca,
já que distribuo gargalhadas, que voejam por sobre a copa das árvores ...
fazem eco nas clareiras sombrias,
e assustam as aves nocturnas !
Vou esquecer que já te esqueci,
quando esquecer que estou a brincar ...

Meu amor, promete que não me chamas,
porque os teus braços já não chegam p'ra me aninhar,
os teus beijos eram  papoilas dos campos do meu Alentejo ... e murcharam ...
e o teu calor gastou-se, abrindo as corolas das madressilvas ...

Até porque tu dormirás ...
e eu prometo sair nos bicos dos pés !...

   

Anamar

sábado, 16 de novembro de 2013

" SAUDADE "



Ando a escrever pouco, ando a sonhar pouco, ando a viver pouco demais ... ando a sentir a saudade que me atormenta ...

Saudade do sonho, saudade do amor, saudade até da dor que o amor deixa cá dentro ...

Ando a sorrir pouco, a acreditar  pouco, a não olhar o sol a pôr-se, com aquela saudade doce que ele nos traz, de outros pôres-de-sol ...

Não contemplo mais a lua, lugar de encontro de todos os olhos, de todos os amantes do Mundo ...

Não danço mais na chuva, a aspergir-me com a sua carícia ... Não escuto mais o mar, que levou para longe a minha canção ...

O vento que passa, não me acaricia como outrora ... Também ele não me reconhece mais ...

Deixei de saber cheirar o aroma das flores, o cheiro da terra molhada, depois de uma chuva abençoada ...

Não me enterneço mais, com os caracóis louros de uma cabeça de criança ...

... perdi-me de mim, e sofro já com a  saudade de não me encontrar por aí, pelas esquinas da Vida !...



Deixo-vos um dos "magos" da sensibilidade e da escrita ... o sempre imortal  Pablo Neruda.

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,

é não ver o futuro que nos convida...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.
 
(Pablo Neruda)

domingo, 29 de setembro de 2013

" DEMASIADO TARDE "



É tarde ...

Cada vez é mais tarde.  O Outono já chegou, e não tarda que o tempo de partir, nos visite.
Os dias azuis já foram.  O sol vem a correr, com pressa, e nem o pássaro já canta, no castanheiro junto à nossa janela

Sabes, custo a lembrar como era o tempo do riso ... o tempo em que eu colhia esperança nas ramadas das madressilvas, pelas veredas

Até  a voz do mar, que deixava algodão doce no areal agora deserto, ficou severa e tenebrosa.
Açoita-me a alma, em vez de me acariciar o corpo

E tu, perdeste o caminho de casa, esqueceste as minhas estradas, os montes e os vales ... não bebes mais nas minhas fontes
A minha nudez oferecida pelas madrugadas, vive solteira na margem deste rio ... e queima ... ainda queima !

Mas fica cada vez mais tarde ...

Um destes dias, quando acordarmos, um de nós foi indo ... ao cantar do galo, no dealbar do novo dia ...

Ter-nos-emos perdido, meu amor !

Anamar

terça-feira, 24 de setembro de 2013

" SONHO "



         " SONHO "


Quero partir contigo, amor,
Soltar âncora, abrir velas,
Pelas ruas e travessas,
pelas pracinhas ... sem pressas,
pelos becos e vielas

Quero olhar contigo, amor,
os craveiros pelas sacadas,
co'as sardinheiras floridas
e com os gatos ronceiros,
poetas das madrugadas ...
ver as roupas coloridas
largadas pelos estendais ...
Quero ouvir contigo, amor,
os canários das gaiolas,
desgarrando p'los quintais !...

Quero dar-te a mão e seguir
junto ao rio, em passo lento ...
quero embarcar na canoa,
quero contigo ver Lisboa,
prender no cabelo, o vento !

Contigo andar pela serra,
quero beber o cheiro da terra,
embriagar-me de sol ...
Deitar-te amor, no meu leito,
beijar-te bem ao meu jeito ...
olhar a luz do farol
a varrer a penedia,
até que a noite seja dia
e desperte a claridade ...
P'ra enfim, dormires no meu peito,
num amor mais que perfeito,
sem ter pressa, nem idade !

Quero dar-te o meu corpo, amor ...
porque a alma já levaste ...
Já que são a minha sina,
que eles sejam mote e rima,
dos versos que semeaste !...

Quero dar-te o riso e o abraço,
o meu colo, o ombro e o passo
lado a lado com o teu ...
Quero andar contigo a estrada,
naufragar nesta enseada,
Quero ser "nós" ... e não ser "eu" !!!...

Anamar

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

" HAVERÁ UM TEMPO ... "



Alguém escreveu :  " Hoje voltou a aparecer uma folha de nespereira no meu quintal.  Não foi o Mirtilo, mas podia ser ...  - Mirtilo, o "gato ecológico",  que já me deixou "


Porque os afectos sempre nos deixam  folhas de nespereira no nosso quintal ...


      "HAVERÁ UM  TEMPO ... "


Haverá um tempo ...
a vida é feita de tempos
em que as horas lembram coisas,
em que os dias lembram sonhos,
em que os sorrisos nos rostos
se acendem, já só tristonhos,
porque morrem de saudade,
da ausência de vontade
de viverem sem sentido ...
Como um barco em alto mar,
vejo o sol a naufragar,
por de mim, já teres partido ...

E os dias ficarão longos ...
a noite nunca termina ...
Nesse tempo, ao acordar,
quando me erguer e olhar,
só verei a nablina
a descer lenta ... da serra,
trazendo-me os cheiros da terra
e o salgado da maresia ...
Porque tu és monte e mar,
fizeste-me acreditar
que o mundo me pertencia !...

Haverá também um tempo,
que o vento forte, ao soprar
vai trazer notícias tuas ...
sopra do lado do mar,
onde adormecem as luas ...
E quando a porta bater,
cansada da ventania,
a rosa morre no pé,
quando a noite vira o dia ...
E já só fica a lembrança,
naquele som pela sala,
naquela sombra que passa,
naquela dor que se cala ...
na garganta que emudece
os soluços, que se escapam,
no arrepio que estremece,
no abraço que apetece,
e que os dedos não agarram !!!...

Haverá um tempo, então,
em que as rosas que trouxeste,
morreram  na minha mão,
quando a gaivota voou
e levou-me o coração !...
Corri lesta ao roseiral,
p'ra outra rosa colher ...
Perdi-te na luz da lua ...
Não sei já, como é ser tua ...
Nada mais pude fazer !!!...

Anamar

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

" CINCO LETRAS APENAS "



 Hoje, sem nenhuma vontade de escrever, sem nenhuma inspiração, sem nenhuma razão válida para o fazer, e relendo Eugénio de Andrade, o "poeta triste" como lhe chamo, pelas palavras de quem, sinto tão bem passarem as minhas ... escolhi este poema, de que gosto particularmente ...

Talvez já o tenha trazido a este espaço.  Não sei !
Talvez  já  tenha  achado, que  ele  representava  sabiamente  um  instante,  uma  etapa,  um  timing da  minha  vida ...

Afinal, as vidas são feitas de despedidas ...
A cada momento dizemos adeus a alguém, alguma coisa, algum  lugar,  algum sentimento ... ou tão só, a palavras ditas que ficaram  para  trás ... ou  mais  ainda,  à  pessoa  que  somos, e  deixamos  de  ser,  por  cada  frémito  de respiração ...

                        ADEUS

"Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus."


Eugénio de Andrade, in “Poesia e Prosa”


Anamar

sábado, 10 de agosto de 2013

" NAÏVE " ( Os agapantos )



Os agapantos da serra, murcharam no meu jardim,
como morreu o amor que pensavas ter por mim ...

Os agapantos traziam o canto livre das aves,
traziam a paz  do monte, nas singelas flores lilazes ...

Acabaram por morrer, como tudo nesta vida ...
Só eu, vou levar comigo nessa hora de partida,
os meus sonhos de menina, os meus sonhos de mulher ...
O meu jardim ficou triste,
já nem mesmo sei se existe ...
não mais me sorri, sequer !...

A serra guardou consigo, tudo o que nela inventei ...
onde julguei ser feliz,
aquilo que o vento diz,
e em que eu acreditei ...
Ela conhece os segredos que guardei no coração ...
Guardei-os mal guardados  ... eram sonhos só sonhados...
E os agapantos morreram, como morreu a paixão ...

Por que os não regaste, amor ?!
Não lhes deste de beber ?!
Por que não lhes deste a esperança, que os faria renascer ??!!

Olho p'ra eles e penso, que não  quero  viver assim ...
Os agapantos da serra, morreram no meu jardim !...

Os agapantos partiram ... Apenas, não percebi,
que te levavam com eles,
que te roubavam de mim ...
Que partias sem olhar, que dobraste aquela estrada ...

Os agapantos se foram ...
e, amor ... fiquei sem nada !!!...



Anamar

quarta-feira, 31 de julho de 2013

" SE ... "



Se me esqueceres ...

Quero que saibas uma coisa,
das mil, que tinha p'ra te contar ...
de outras mil que não disse,
mas sabes adivinhar ...
Tu que vives por aí,
e esses são caminhos nossos,
jamais vais poder fugir,
ignorar ou fingir ...
Porque o mar, no areal,
repete a mesma canção,
e faz-te sentir no peito,
o pulsar do coração
quando me aninhava em ti,
repousava no teu cólo ...
E as gaivotas vão dizer,
pelos rochedos perdidos,
o calor do meu desejo,
o sussurro dos gemidos ...

As flores pelas arribas,
ou  as  espalhadas nos montes,
sempre vão contar segredos,
que ecoam nos horizontes,
e que são a nossa história ...
Juntos,  ainda os sonhámos ...
e era simples, afinal,
aquilo que desejámos ...

A serra sempre irá lembrar ...
quando o sol já partir,
e a fogueira sobre o mar
chama as aves a dormir,
quando a brisa aquietar,
quando a mimosa florir ...
quando os cheiros de doce e sal
se misturam pelas tardes,
e as sombras lá no pinhal
abrem alcovas no chão,
onde os desenhos dos corpos
para sempre, ficarão ...

Se me esqueceres ...
uma só coisa te peço :
Por tudo o que já vivi ...
diz-me amor, que não entendo,
por que razão não me esqueço
que eu também já te esqueci ??!!...

Anamar

segunda-feira, 29 de julho de 2013

" METADES "



Metade de mim é sonho,
Outra metade é sofrer ...
Eu sou feita de metades
com sabor a eternidades,
e não sei  o que é Viver ...

Tenho outra metade ainda,
( porque eu tenho as que eu quiser ... )
que entre desespero e dor,
entre a paixão e o amor,
não se decide, sequer !

Balançam entre a Vida e a Morte,
todas as minhas metades ...
E o tempo que chega, vai ...
sem que  eu  mesma diga um ai ,
leva consigo as saudades ...

Saudades da que já fui,
Saudades do que vivi,
Saudades de quem amei,
de todos a quem me dei,
Loucas saudades de ti  !...

E o Verão vai indo embora,
já vejo chegar a hora de tombar a escuridão ...
A noite não tem luar,
no meu corpo, a navegar,
correm rios de solidão !...

Vê se juntas as metades,
Vê se me constróis inteira ...
Vê se encontras  quem eu era,
antes que eu canse da espera,
e parta ...  queira ou não queira !!!


Anamar

quinta-feira, 25 de abril de 2013

" SEMPRE 25 DE ABRIL " !



Uma semente ficou
na floreira do jardim
Continua a dar-me cravos,
e molhinhos de alecrim ...
São cravos do nosso sonho
sonhado naquele dia,
são sinais de um homem novo,
são a vontade de um povo,
foram um rumo, e um guia !

E os sonhos que Abril abriu
pelas madrugadas fora,
foram paridos na dor,
foram vividos no amor,
estão vivos até agora !
Nas algemas da desgraça
ninguém mais nos vai  prender,
enquanto o coração sonhar,
tiver fé, e acreditar
na força do nosso crer !

São cravos que a alvorada
entregou na nossa mão,
rostos erguidos de gente
com coragem, resistente,
e que sabe dizer  NÃO !...

E por isso, Portugal
que acordaste à claridade,
não adormeças teu chão !
Vem p'ra rua, vem dançar,
faz ouvir a tua voz ...
Lança ao vento a liberdade,
acorda toda a cidade,
como o eco de um trovão !!!

Anamar