sexta-feira, 31 de agosto de 2018

" DESÍGNIO CUMPRIDO ..."




E Agosto finou-se com temperaturas imperativas de que não devemos esquecer ser ainda Verão.
Apesar de na passada semana os dias haverem refrescado, o que nos aliviou dos mais de 40º C dos últimos tempos, voltámos de novo a ler trinta e muitos, nos termómetros.

É verdade, que na generalidade os locais costeiros já cerraram as portadas das suas casas de veraneio.  É verdade, que as escolas inauguram o próximo ano lectivo oficialmente, já nesta próxima segunda feira ... mas o lisboeta foi em força por o pezinho de molho, queimando assim, talvez os últimos cartuchos de 2018.
Isto, na verdadeira acepção do tradicionalismo do conceito de férias a sério, como desde sempre se gozaram.
Os meses ditos fortes do Verão, terminaram e Setembro já traz consigo um cheirinho à próxima estação.  Tudo em velocidade de cruzeiro ... como é a passagem do tempo nas nossas vidas !...

Lisboa, pejada de turistas, a rebentar pelas costuras ou a deitar pelo "ladrão" ... como preferirmos, é  desde hoje, uma cidade mais pobre
E sei de quem sentiria um desgosto a sério, por causa disso mesmo.
A quase centenária Pastelaria Suiça, localizada na Praça D.Pedro IV, o nosso Rossio, encerrou em definitivo as suas portas, terminando um ciclo de vida que não foi possível salvar, iniciado em 1922.

Foi um "ex-libri" da cidade, como sabemos.  Foi um ícone incontornável, geração após geração, ao longo das décadas.

O meu pai enquanto viveu, adoptou este espaço, afectivamente.
Poderíamos dizer que era figura "residente" do mesmo.
Todos os dias lá ia tomar a sua sopa, o folhado, o esquimó, o chocolate quente, o café ...
Todos os dias, mal franqueava a entrada, já no balcão se pedia familiarmente : "Sai uma canja para o sr. Coelho !..."
Dia após dia, mês após mês ... ano, depois de ano ...

O meu pai morreu com noventa anos e manteve até muito perto da sua partida, a qualidade de vida que lhe permitia ainda, quase diariamente, por lá passar.
Nascido em 1902, era um homem da cidade, onde detinha um Armazém de Ferragens. Era um cosmopolita, com Lisboa no coração.
Lá me comprava os mimos que eu adorava :  iguarias de chocolate, as amêndoas de licor se Páscoa era, fiambre especialmente cortado bem fino, quando ainda não era um género comum nas lojas, os esquimós, bolo com chocolate e chantilly que me levavam água à boca, miolo de pinhão a peso, caixinhas com línguas de veado especialmente queimadinhas ... e muito mais.

Após o seu passamento, algum tempo depois, fui com a minha mãe tomar um chá à Suiça.
Alguns empregados, reconhecendo-me, inquiriram sobre o que era feito do sr. Coelho, já que há muito deixara de frequentar o estabelecimento.
Sorri e disse-lhes perante os seus ares incrédulos e espantados : " O meu pai faleceu !  E já agora ... o meu pai não se chamava Coelho !"

Esse segredo duma vida, nunca ele havia contado !!!...  Por que o faria ???!!!



Anamar

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