segunda-feira, 23 de setembro de 2019

" BEM CEDINHO, ELE CHEGOU !... "



Chegou o Outono.
Entrou às 8,50 h desta segunda-feira meio enfarruscada, exactamente com "cara de Outono" ...
O sábado foi um dia em que o cinzento do céu, escurecido por uma abóboda uniforme e totalmente fechada, desabou em chuva copiosa que não deu tréguas por todo o dia, como uma espécie de cartão de visita da estação que se anunciava.
Afinal, o Verão despediu-se com a chuva que não caía praticamente há largos meses.

Não há estação, que ao chegar, mais me mexa, que esta.  Talvez por ter nascido nela, talvez por ela ter uma envolvência que muito me fascina.  Ela traz consigo cores de recolhimento, cores de introspecção, cores de concha e de útero ...
Talvez por eu ser um pouco de tudo isto, talvez por eu ser mulher !

A chegada do equinócio de Outono fecha as portas à energia trepidante da estação que partiu.  Ele transmite-nos uma doçura e uma paz de aconchego, neste tempo sereno e silencioso.  É um período de balanço, queiramos ou não, que nos remete forçosamente às etapas da Vida.
É um período de reposição, de faxina, de adormecimento.  Toda a Natureza se prepara, atravessando-o, para os rigores do Inverno que virá.
Período de recolecção de tudo o que nos será imprescindível adiante, é época de armazenamento de energias, de pacificação do corpo e do espírito, e conciliação com o nosso eu interior.
Mas também é época de nostalgia, de melancolia ... é um estado de alma ... um tempo em declive suave ... cálido e gostoso ...

Deveremos saboreá-lo, tanto quanto a doçura das compotas que nos saltam das matas para as mãos sabedoras de quem lhes conhece os segredos.
É tempo de mães, avós e tias velhas ... de doceiras que sempre nos povoarão as memórias ... mesmo que já tenham partido ... mesmo que já dividam, do outro lado, um repasto lambareiro e apetecível ...
Sempre vamos recordar saudosamente, os cheiros lá de casa, o fervilhar da marmelada em confecção, os bagos das romãs, as cores flamejantes dos diospiros maduros ... o insubstituível aroma espalhado, das castanhas assadas, nas ruas e pracinhas ... embora a criança que fomos também não exista mais ...

As folhas derrubadas, atapetam os caminhos e pintam, como Van Gogh, toda a Natureza, em paletas quentes, de ocres, laranjas, vermelhos e castanhos ...  As aves migratórias também já foram, e esperamos voltar a ver as andorinhas, na próxima Primavera ...
A mansidão dos dias convida aos percursos cúmplices e sem pressas, pelos bosques, pelo arvoredo, pelo topo das arribas, com o mar em fundo.  Mar que breve  breve, se tornará alteroso e imperativo ...

E percebemos que já passou um ano mais, outra vez ...

E deixo-me inundar por uma paz silente e aconchegante.  Por todas as razões.  Pela lembrança, pela saudade, pela felicidade também ... pela partilha vivida, quando as famílias ainda eram o que eram, e quando ainda o eram ... sem ausências ou desistências ...
Nada esquece nas nossas vidas.  As memórias, boas ou más, são o repositório feliz, o património inestimável das nossas histórias.

Mas o Outono, estação em que nasci, não é o fim dessa história ...
Terá sempre, de facto, muito a ver comigo ... talvez demasiado !
É sonhador como eu,  silencioso como eu, intimista como eu ... com uma magia particular, embaladora e doce, apenas sua, e que mais nenhuma estação, ao longo do ano, é capaz de nos oferecer !...


Anamar

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