terça-feira, 20 de outubro de 2009

"TALVEZ LOUCURA !"





Um dia estúpido de cinzento indefinido, "nem carne nem peixe" como eu costumo dizer.
Dia pesado, cabeça pesada, coração pesado...em suma, estou numa fossa que só visto, numa neura de doer!...

Vesti-me de manga curta, acreditando que punha Verão pintado cá dentro.
Na rua está frio, está um Outono finalmente declarado, já de cara destapada.
Não tenho aulas hoje...isso seria suficiente para me dar uma alma nova. Não...Inventei de ir à escola a pretexto de...nada. Fui e vim, nem meia hora levei...moro perto do liceu.
Procuro não sei o quê...pareço um autómato no meio de todos e de ninguém. Queria ver, falar com gente...mas não estou com paciência para as pessoas.
Pareço o Variações..."só estou bem aonde não estou..."
Depressão...não gosto da palavra, banaliza o que a gente sente...é a doença dos que parece não terem mais que inventar...
Mas eu conheço-a de há muito, de sempre...deito-me com ela, levanto-me com ela...Insatisfeita, doentiamente insatisfeita, inquieta, muito cansada cá por dentro...não por fora...
Cansada de doer, de pesar mesmo...quilos nas costas...

"Falta do que fazer"...diz um amigo meu que não tem tempo para nada disto...tem que sobreviver...
Deve ter razão...seguramente tem razão, não tem tempo para pensar...bom para ele...
Eu??...Fazer o quê??!!...

Vou tomar café daqui a pouco com um amigo, conhecido, aluno de há anos, bastantes anos mesmo.
Na altura tinha-me sido diagnosticado um linfoma. Linfoma, de operação, de quimio, de radioterapia...linfoma de eu deitar contas aos dias e pensar como iria ocupar os que me coubessem ainda...
Ele soube sempre as palavras para me dizer, o sorriso para me dar, aquela força que certos seres têm, que a gente não sabe donde vem, mas jorra lá de dentro e transforma-se em luz.

É... ele teve sempre luz para me iluminar o caminho que parecia muito, muito escuro na altura.
Pois hoje, ele tem um cancro de pulmão, muito adiantado já, os dois pulmões afectados. E aquele homem saudável, super positivo, a ver na vida, que sempre lhe foi madrasta, um manancial de convicções positivas, para quem as não tinha e as não tem, continuando com o mesmo sorriso, as mesmas palavras, a mesma luz.

E eu sem saber o que dizer; totalmente inapta, incapaz, inerte, apagada de luz e de força, porque desacreditada em convicções e esperanças...

No sábado, outro amigo deu-me a mesma notícia em relação a si próprio...E eu, a única coisa que consegui fazer, foi deixar correr as lágrimas pela cara abaixo, de raiva, por injustiça, por ódio...
De resto, a mesma inabilidade...

O que se diz a alguém, em cima de quem, o Mundo acabou de ruir?
Onde se vende o dicionário das palavras certas para essas horas erradas??

Tenho de perguntar urgentemente à Catarina. Ela trabalha nos paleativos, vive com a vida ( a esfumar-se ) e a morte a achegar-se...todos os dias...para todas as pessoas, de todas as idades, fé e convicções.
O que será que ela diz...ou será que não diz...nada...porque eu, só sei fazer isso...dizer...nada!...

O dia com o cinzento das nuvens a adensar-se no céu, está perfeitamente angustiante.
Ontem eu dizia, ao deparar-me com gente que sacudia tapetes, que estendia roupa, que a passava a ferro junto às janelas, que deixava fugir para o exterior o cheiro da cebolada da janta...eu dizia : "Que raio de vida é isto? O que há para contar nestas vidinhas, mais cinzentas que o acastelado do céu neste momento?"...

Um domingo, seguido de uma segunda feira, porta aberta a mais uma semana, semana a demarcar o aproximar do fim de mais um mês, de mais um ano, tudo em papel químico...

Vontade de fugir deste betão que me sufoca, destas caras que enjoo, destes sítios que vomito!
Vontade de cortar com todos os grilhões e amarras, corrente ou algema...e ir por aí, não sei por onde, mas ter direito a conhecer todas as "divisões" deste sítio que habito, deste micro-planeta à dimensão do asteróide do Principezinho!...

Chamem-me infantil...imatura...tonta...parva...utópica...estou-me nas tintas!
Chamem-me "dondoca", inconsequente, a que não cresceu mentalmente ou a que não conseguiu crescer...a super-protegida, a oca ou a vazia...não quero saber!...

Eu devo ser, de facto, tudo isso, mas a verdade é que isto tudo é muito pequeno para ser chamado de VIDA, isto tudo é pouco demais para constituir a história da existência de alguém, isto é um nada perto de um tudo que eu ainda ambicionava viver.

Mas realmente, eu tenho vergonha ao descrever todas estas desconexas ideias e sentires; eu tenho vergonha por parecer achar-me mais que muitos, mais que todos, ao debitar esta sequência de enormidades, eu tenho pudor de me dar ares de privilegiada, a troco de nada, a "rainha da cocada preta" (como dizem os brasileiros), por parecer reconhecer-me direitos idiotas, ter sonhos incoerentes e vontades visionárias...

Podia ser...mas de facto, não é!
Acho mesmo que é loucura, ou tão só, uma incapacidade inultrapassável de me "instalar" por aqui....

Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Olá Anamar

Sentimo-nos impotentes perante as circunstâncias da vida...o que fazer? Infelizmente também partilho contigo alguns pensamentos, algumas situações...

Beij

Maria Romã

anamar disse...

Sabes...cada vez me acho mais desenquadrada neste "espaço"...por isso serei eu quem não está bem...se é assim exactamente que eu sinto, mas sinto mesmo!! Então só posso ser doida...não consigo seguir a corrente de "normalidade" das pessoas comuns, ditas normais...
Desculpa o desabafo
Beijinho
Anamar