quinta-feira, 24 de junho de 2010

" AQUELA CASA"



Faz-me mal ir àquela casa.
Eu, era eu, e a casa era a casa....Não estou portanto a falar de como eu vivia naquela casa.

Tinha um portão e uma cancela de madeira, em tabuinhas, estão a ver como é? A lembrar aquelas cercas do gado, no meu Alentejo.
Depois era branca, despretensiosa, simples mesmo, as janelas, de portadas verdes, eram emolduradas por amarelo ocre...também como nos campos do Sul....
Acho que tentei "carregar" para ali, o meu  pedaço de Portugal, ao construí-la assim. Sim, porque aquela casa foi saída do meu lápis! Do meu lápis misturado com o meu sonho, claro!

E tinha potes de barro, grandes, bem grandes, com plantas. Uns erectos, outros a espreguiçarem-se na relva e a deixarem sair por eles fora, as sardinheiras da minha mãe...

Depois, aquela casa tinha sempre flores, muitas flores, algumas árvores, arbustos e trepadeiras, cujas cores eu não escolhi ao acaso....
Não! Eu "pintei" aquele quadro, para que as cores do arco-íris estivessem sempre presentes.

A "casinha dos passarinhos" como eu dizia ao Óscar....(o Óscar, já sabem, era um gato meu, mais dono daquela casa que eu...da casa, e dos pinhais circundantes, porque ele não me ligava nenhuma, e quando lhe dava na gana, ia vasculhar os pinhais e os jardins por ali....)!
Não quero falar do Óscar, porque senão vou chorar....É a primeira imagem que tenho, hoje ainda, quando transponho o portão : o Óscar, deitado debaixo das hortenses à procura da fresca, nos Verões quentes...
Pássaros, apanhava, se pudesse, e vinha oferecermos, depois de "judiar" com os pobres....
Foi o primeiro "desertor" da casa....o Óscar!

Depois "desistiu" o Gaspar...Faltava-lhe falar, para ser tão humano como nós. Mas a minha mãe é que nunca desistiu de ter longas conversas com ele. E entendiam-se lindamente!
Ainda eu estava fora do jardim, e já o Gaspar exultava de alegria, no abanar do rabo, na correria maluca, na felicidade que transpirava, nos latidos, no ladrar no anunciar-me....

Hoje, aquela casa é um pouco "fantasma"....
Estive lá há dois dias....as buganvílias são "chuveiros" de flores de todas as cores, as azáleas, a glicínia, as sardinheiras da minha mãe, claro, os agapantos, as cinerárias, o alecrim, o rosmaninho, a lavanda....tudo quanto pôde se abriu à luz e ao calor deste sol abençoado....

A minha mãe varre religiosamente a tijoleira todos os dias; a minha mãe, como não tem o Gaspar e como tem quase noventa anos, garanto que falará então com as suas flores...
E a casa, é quase uma casa "fantasma"!...
Uma espécie de tumba, onde estão sepultadas, tantas e tantas memórias, boas e más...que não fecha nunca!...

Faz-me muito mal ir àquela casa!!...

Anamar

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