terça-feira, 7 de outubro de 2008

"RAINDROPS KEEP FALLING...ON MY HEART..."






Acordei hoje com a chuva a bater impiedosa na janela do meu quarto.

Arrebitei a orelha, os olhos sei que não abri, e como alguém que recusa, pensei : "aí está o Outono a sério a dar os primeiros sinais! O sol já emigrou por certo (assim me fazia adivinhar o escuro que penetrava pelas pequenas frinchas da persiana).
E aninhei-me como quem procura refúgio, mais e mais, no édredon.

A despedida objectiva do Verão sempre me deixa alguma nostalgia de fim de festa, que tende a acentuar-se progressivamente com o crescendo das nuvens no céu, com o cinzento desanimador e com a queda das primeiras águas.

Este ano, o Outono colheu-me ainda mais, de cores sazonais vestida por dentro e por fora.
Há em mim uma recusa imperativa de fecho de porta, de fecho de ciclo, de fecho de vida...como se uma despedida eu não pudesse ou quisesse fazer...

Sei que não dormi mais e fui divagando de pensamento em pensamento, de emoção em emoção, numa "viagem" interminável e incontida...porque o pensamento, afinal, é o que de mais seu o homem tem, em matéria de liberdade...
eu diria, a única "arma" de que dispõe, que melhor espelha a sua liberdade total.

E perguntei-me o porquê das "nuances" da Natureza sempre mexerem de uma forma ou de outra, com os meus estados de alma, que sempre caminham ao compasso dos dias, que sempre são permeáveis até ao seu âmago por todos os "presentes" que ela nos depõe em mãos??!!
Penso que associo inconscientemente o périplo das estações do ano, às "estações" das nossas vidas, e sendo assim, esta em que estamos é "devastadora"!...

Há pouco tempo atrás, jantei num restaurante que tinha inscrita na parede, uma sábia citação de Fernando Pessoa : "Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol. Ambos existem ; cada um como é..."

Em tese, estou com Pessoa...
De facto, um dia de chuva também tem a sua beleza própria, a sua magia, sobretudo se vivido e saboreado com o coração. Caso contrário, para mim é uma verdadeira "calamidade"...

Estou a brincar, claro, mas nunca consigo dissociar a chuva de tantas e tantas madrugadas de aulas, há séculos atrás, a caminho do liceu ou da Faculdade, em que o desconforto da noite cerrada ainda, o frio e cargas de água que despencavam dos céus indiferente e copiosamente, transformavam aqueles inícios de dia em verdadeiros "filmes de terror"...
A confusão àquela hora na gare da estação ou na fila do autocarro, era inenarrável e o vento sempre dava um jeito de (baralhando os famigerados chapéus de chuva que ficavam caóticos no "convívio" com os vizinhos mais próximos), fazer com que a chegada ao destino, fosse mais ainda, de um "stress" indescritível...
Essa chuva era de facto, abominável!...

Tenho para mim, que verdadeiramente, chuva gostosa é a que se ouve cair no parapeito da janela, numa manhã de domingo, sob um édredon aconchegante, na modorra doce de um sono "embalado"...relógio a desvendar as oito e um sem número de horas displicentes ainda para dormir...
Essa chuva, sim, é uma bênção dos céus...

Quando crianças, todos gostámos da chuva; era uma aventura e uma adrenalina crescente desafiá-la, deixar-nos empapar por ela, saltitar de poça em poça pelos buracos da calçada, à revelia dos olhares e ordens paternas.
É a época em que os "putos" se fazem esquecidos do chapéu, e o que dá gozo realmente é molharem-se de preferência que nem "pintos"...
Os espirros, a "goteira" do nariz e tudo o resto, são inerências que depois não interessam nada...
É uma chuva inconsequente e feliz!...

Em adolescentes, se estamos apaixonados então, a fantasia de um passeio desfrutado a dois, bem juntinhos, partilhando o mesmo abrigo, tem também uma emoção acrescida e diferente.
É como se ficássemos ainda mais incógnitos, ainda mais escondidos naquele "tecto" improvisado, em que o calor dos corpos, mais próximos que estão, flui livremente, em que as palavras ditas não são mais que sussurros, em que a cumplicidade se faz sentir.
É gostoso passear assim num parque deserto, de chão feito tapete de folhas douradas, com a aragem a percorrer-nos sem que sequer a sintamos, ou ouvir a melopeia dos pingos de água na vidraça dum carro parado frente ao mar...
Essa, é outra chuva...

"Outra chuva" ainda, experimentei-a e diria que me encharcou até à alma, numa tarde de calor sufocante, de um Agosto tropical em Negril - Jamaica...

Era então uma praia de areia branca e água turqueza translúcido, ornada a coqueiros e cheiros adocicados...lembro até hoje...
Era uma praia, que foi praia deserta logo que a chuva vigorosa e violadora começou a tombar dos castelos de nuvens negras, repentinamente avolumadas num céu que era azul, assim que a tempestade tropical se anunciou...
Foi uma chuva forte, grossa, devassante...breve... que chicoteou os corpos nus...mas os envolveu numa carícia doce dos trinta graus de temperatura...

E fiquei a recebê-la sobre mim, de olhos semi-cerrados, saboreando-a voluptuosamente, quase com lascívia, deixando-me possuir sem resistência...mansamente...

Essa, foi a chuva que não tem nome, porque não tem adjectivos com que a qualifique...
essa, não me molhou o corpo...inundou-me o coração!!...

Anamar

 
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9 comentários:

Anónimo disse...

thats amazing story.

Anónimo disse...

yeah! its much better,

Anónimo disse...

thats amazing story.

Anónimo disse...

im here because of few cents for you. just dropping by.

Anónimo disse...

haha.

Anónimo disse...

not bad.

anamar disse...

For all of you...thanks a lot!!!
Anamar
A kiss from PORTUGAL

Anónimo disse...

I loved your story! Very well written!
I agree with Fernando Pessoa: a rainy day could be so beautiful, than a sunshine day.
The rain helps deep thoughts and the reunion with us.
After all, if all days were sunhine days, nobody will give importance to it...
Kisses
Leninternatin.

anamar disse...

Leninternatin
Thanks for your sympathy.
I think you understand my language very well, and you know and appreciate Fernando Pessoa, like me.
A kiss to you from Portugal, and...see you latter...I'm sure!
Bye
Anamar