terça-feira, 21 de dezembro de 2010

"A VIDA"

Desde as três às seis e meia que não preguei olho.
Fui vendo as três e meia, as quatro e meia....as seis e meia, no mostrador luminoso do relógio da cabeceira da cama...
Sentia-me demasiado agitada para conciliar o sono, e consegui passar a insónia à Rita, que bem queria sossegar junto a mim, mas que muda de lado cada vez que me viro na cama (ainda não percebeu que os meus braços e pernas não são exactamente aquele "material" contorcionista de gato...

Como sabem ( e nisto acho que todos somos iguais), quanto mais corremos atrás do sono, no ímpeto de ainda o alcançar na próxima curva, mais ele nos faz negaças e se afasta, deixando crescer todo o tipo de conjecturas, pensamentos, dúvidas, angústias...que, por ser noite, tendem a agigantar-se....e fica tudo estragado.

Comecei inevitavelmente por pensar no "carrossel" que é a minha vida actual, na montanha russa do sobe e desce, com a adrenalina a fazer picos como a tensão arterial dum semi moribundo....
Comecei a pensar, que o "à roda à roda" do carrocel, inebria, entontece, anestesia, e na necessidade que eu provavelmente tenho de me anestesiar, como quando se toma um copo a mais para passar a meta da simples "boa disposição", um pouco mais para lá...



Depois do carrossel, imaginem que revivi, da minha infância, o tempo dos "robertos" (quem se não lembra deles??....) e daquele imaginário feliz e solto, quando por detrás do lençol preso entre dois paus, aparecia invariavelmente o bode expiatório da questão (o fantoche que estava ali para apanhar pancadaria), o polícia, obviamente destinado a instalar a moral e os bons costumes, que de cacetete em punho, distribuía a eito a pancadaria na cachimónia de madeira do desgraçado, o qual eu não tenho a certeza se saberia porque apanhava...e o touro....porque invariavelmente, a actuação dos robertos sempre terminava em tourada.....
A voz era em falsete, o enredo, digamos não muito perceptível, mas bastava o som estridente do cacete na cabeça mal amanhada do "desinfeliz"....para que fossem arrancadas gargalhadas e apupos da pequenada.

Os mais velhos, por vezes traziam de casa um banquinho para se sentarem, na praça da aldeia ou da vila, para assistitem à "função", porque o reumático já não se compadecia muito, e as "cruzes" começavam a dar sinal.

E pensei: "Como na vida.....
O que está ali para distinguir o certo do errado, indiscriminada e aleatoriamente, restabelecendo o convencionado como correcto.....e vá de dar cacetada no indefeso; o indefeso que não sabe porque tal destino o persegue....e o touro, se bem me lembro, que leva tudo à frente, encerrando a alegria da pequenada e estimulando a contribuição dos presentes, para quem, aquelas marionetas constituíam dia de festa na aldeia, quebrando a rotina de dias de trabalho arrastados, sempre iguais, e cuja receita minorava a miséria daqueles saltimbancos....porque tudo aquilo era mesmo uma verdadeira miséria!!....

Desculpem....isto hoje saíu em linguagem um pouco codificada. Por vezes é preciso. Cabe a cada um, se tiver pachorra, desfazer estes puzzles que eu construo!!!

Anamar

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