domingo, 20 de janeiro de 2013

" FILOSOFIA DE GATO "



Esta noite não preguei olho.
A partir da meia-noite, desencadeou-se um temporal absolutamente assustador, de chuva, mas sobretudo de ventos fortíssimos, cuja previsão pusera o País quase todo, em alerta.
Quando ouvi a notícia informativa, não valorizei.  Entendi que seria um mau tempo, como volta e meia acontece.
Mas não !
Ainda não ouvi notícias, mas as rajadas de vento, conseguiram deixar-me em pânico, o que nunca tinha acontecido, desde que vivo no meu sétimo andar de uma praceta larga e franca, também aos ventos.
Toda a noite e por toda a manhã fustigaram e fustigam, com uma força que quase nos impede de andar na rua, seguramente com velocidades cilónicas.
 Na minha casa, as portas apesar de fechadas, batiam ininterruptamente, os estores também, e a chuva açoitava violentamente as vidraças.

Os gatos estavam completamente desorientados e inquietos.
A Rita passou parte da noite na minha cama, embora não com a tranquilidade habitual, até porque a temperatura desceu acentuadamente, mas o Jonas cá fora, na cozinha e na entrada, só fazia asneiras.

Entretanto eu, absolutamente só, atemorizei-me descontroladamente.
Tenho a sala principal, projectada à frente, com uma varanda de vinte metros quadrados, que em obras passadas, foi absorvida por ela, numa arquitectura com uma estrutura de alumínio, tecto ondulado, vidros, estores, tecto falso em madeira, por dentro ... enfim, uma varanda totalmente dissimulada.
Ou seja, essa minha sala que tem uma frente de oito metros, constitui toda a fachada da minha fracção.
Desde sempre, embora tenha sido uma obra meticulosamente feita na altura, e já lá vão muitos anos, não deixou de constituir uma zona de fragilidade da casa, porque se por um azar do destino, aquela estrutura é arrancada, a minha casa fica totalmente esventrada, ou seja, fico sem casa !
E isso, esta noite, com a força do vento que soprou e que aliás continua a soprar, era passível de ter acontecido, se o temporal, para sorte minha, não castigasse exactamente a parte oposta da casa, as traseiras.

Nos terraços cá de baixo, ou seja, muitos andares abaixo do meu, vagueia há muito, um gatinho preto de que já  frequentemente falei ... o "meu" Farrusco do fiambre, como o apelidei ... também já sabem.
Não há acesso a esses terraços, não sei se alguém lhe disponibiliza alguma comida.
A escassa protecção que existe, advém das abas das clarabóias do Continente, que fica por debaixo, e que se espalham pelo terraço.
Vejo-o com frequência, "coladinho" a essas estruturas, a proteger-se das condições atmosféricas adversas, quase sempre, sem sucesso !

Os animais vivem bem menos que os humanos, e a vida dos animais soltos por aí, entregues à sua sorte, é efectivamente dramática.
Os felinos têm contudo, uma filosofia de vida, espantosa.
São pacientes, pachorrentos, esperam, esperam muito, não entendo bem o que esperam, mas esperam ...
Enfrentam condições climatéricas e pessoais de sobrevivência, que não se imaginam ... ao limite ...
Vivem expostos à intempérie, dia e noite, não se alimentam muitas vezes, não têm água outras tantas, passam noites de um gelo absoluto, sem um abrigo de protecção, contraem doenças incapacitantes e morrem, muitas vezes morrem, sem uma reclamação !...
É assim ... Chegaram, cumpriram a programação, e partem !

Não sei se somos nós, os humanos, alguns humanos, que lhes atribuímos sentimentos, formas de reagir e de "pensar", enquadradas no nosso próprio figurino.
E se calhar, afinal, não é nada disso. Eles não são exactamente os "bibellots" que criamos nas nossas casas, com comida no prato, água constantemente fresca, camas fofinhas ou dormindo mesmo na nossa, com saco de água quente, ou aquecimento nas dependências onde se instalam.
Esses são os animais que nós artificializámos já ...
E até os castramos, para que acalmem, e tenham condições de vida não perturbadoras para nós, em apartamento !

A pantera da savana, o leopardo, o tigre, a chita, o leão e todos os felinos, no seu habitat natural, nascem e vivem de acordo com o seu perfil genético.
Sobrevivem, resistem ou não, de acordo com a selecção imposta pelo destino.
Buscam alimento para comer, deslocam-se muitas vezes distâncias absurdas, com todos os riscos inerentes, para beber ;  se sofrem ferimentos não têm tratamento, parem os filhos sozinhos, alimentam-nos e protegem-nos, escondem-nos dos predadores, quando ainda não se defendem nem são autónomos ... e morrem, finalmente morrem ...

Os felinos das savanas e das estepes, também são pachorrentos, pacientes, também dormem muito, e não se angustiam porque a vida só lhes concede, teoricamente aquele período para existirem.
As leoas caçam ... é assim !...
Os machos alfa são destituídos, depois de glórias de reinado, pelos mais novos ( e deprime-nos, a nós, ver um leão, limitado pela doença e pela velhice ).
Marcam território e avisam : "Aqui mandamos nós " !...
Estabelecem hierarquias ( que são respeitadas ), prioridades e regras ... inteligentemente ... e inteligentemente, deixam apenas a vida correr, por cada hoje que passa !
Não se questionam, não se amarguram, não sabem que há Tempo, há calendário, há viver, amar e morrer ...
Sentem, sabem e vivem a liberdade, que o Homem em toda a sua sabedoria, não conhece !...
A sua vida primária, selvagem, natural, como tudo o que pertence, harmoniosamente, no seu estado puro, à Natureza, está brilhantemente arquitectada, não é questionável ...
É simplesmente assim !!!... É pacificamente assim !!!...

Tenho para mim, que os animais que mais sofrem, são os que vivem junto do Homem, subtraídos ao seu ambiente de origem ... os  que  vivem  nas  cidades, expostos  a  todo  o  tipo  de  carências,  perigos  e agressões ...
São animais "acoados", acossados no meio de edifícios que os não protegem, no meio de trânsito que os agride ou os mata, no meio de gente que muitas vezes os escorraça, e lhes periga a vida.
As suas defesas são parcas, têm a água da chuva ou das sarjetas quando há, têm os contentores do lixo ou os restos, muitas vezes deteriorados já, que algumas pessoas lhes dão, ou que simplesmente abandonam pelo chão ...

Esses sim, são os animais mais injustamente entregues à sua sina, e à mão muitas vezes carrasca do ser humano ...
Serão por isso, seguramente, os mais sofredores de todos.

Entre esses, está o "meu" Farrusco do fiambre, tenho a certeza !!!...

Anamar 

3 comentários:

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