terça-feira, 25 de março de 2014

COM "PHOTOSHOP" DE VIDA ...



A velhice e as suas inerências, as suas limitações a nível físico e psicológico, a nível mental, ou simplesmente apenas a nível do aspecto que o "invólucro" exterior de cada um, exibe ... são devastadoras !

Eu  sei  que  isto,  é  mais  coisa  de  mulher,  mercê  da  exigência  que  esta  carrega  em  si,  como  símbolo  sexual que sempre ocupou e ocupa, na sociedade machista em que ainda vivemos.
Sei que para os homens, a beleza ou o desvanecer desta, as rugas, a gordura, o embranquecer do cabelo, não incomodam tanto, não angustiam, não são tão determinantes ... Os arquétipos sociais, são bem mais permissivos para eles .
Aceitam pacificamente o seu declínio, como óbvio e natural.
Por  outro  lado,   afecta-os  sim,  a  incapacitância   ou    a  quebra   de  vigor  físico , muscular  ou   sexual ( porque isso coloca em causa o seu perfil de macho dominante ), ou mesmo mental ( porque coloca em causa, o seu protagonismo enquanto líder, na célula social em que se inserem ) ...

Para mim, a velhice é um drama, já aqui o afirmei vezes sem conta.
A perda de todo o tipo de faculdades que me reconhecia há anos atrás, ou actualmente mesmo, incomoda-me, magoa-me, entristece-me, amargura-me ... atormenta-me ... aterroriza-me !
É uma causa perdida, eu sei, porque tudo o que tem a mão do tempo por detrás, é uma balança desequilibrada, é um jogo de cartas viciadas ...
E eu sinto o seu avanço, como uma medusa a estender tentáculos, que nada nem ninguém sustem !

Às vezes penso que esta raiva incontida, que não me leva rigorosamente a nada, obviamente advem de me sentir defraudada em termos de vivências, na minha vida passada.
Acho que, mercê da educação que recebi, da época em que vivi, de uma má administração, também por incapacidade minha, da vida ( certamente por inépcia e falta de inteligência ), não a conduzi de maneira a sentir-me plena,  hoje, tranquila e em paz, volvido o transcurso dos anos.
Creio que pulei etapas, sem as viver plenamente, creio que não esgotei até à exaustão, todas as experiências que me foram devidas, creio que me deixei condicionar excessivamente, por arquétipos sociais, por valores morais, por educação obsoleta e limitativa, contra os quais talvez me devesse ter rebelado, questionado, reagido ... face a condicionalismos que me abafaram, castraram e limitaram o percurso, contra os quais, hoje me insurjo.

Acho que me deixei embolar, desde demasiado cedo, num novelo crescente de exigências, responsabilidades, expectativas condicionantes  ( familiares, sociais, afectivas e outras ),  tendo embora um interior  pouco  submisso,  pouco  subjugável,  intranquilo  e  em  permanente  dialéctica  comigo,  e  com  os outros ...

E pronto, desemboquei num ser controverso, em  conflito  permanente, com um azedume persistente e idiotamente insatisfeito, contra alguma coisa, com um tamanho desajustado ao meu, alguma coisa que olha para o ser insignificante que eu sou, e sorri, num verdadeiro desafio  de forças, de  David contra Golias ...
Eu ... contra o avanço implacável, imparável e frenético dos tempos !!!

Bom, isto tudo, porque ontem assisti na televisão, a um programa sobre mulheres, de várias faixas etárias, que me fez reflectir.
Mulheres que envelhecem, dizia-se, "com classe e inteligência" ...
Mulheres belas em qualquer idade, mulheres em paz, equilibradas, na assunção plena das marcas inerentes à idade que já têm,  aos 47, 57 e 74 anos ...
Mulheres, que "sem truques ou batota", dizia-se também, esbanjavam beleza, irradiavam claridade, ostentavam conforto interior, equilíbrio  e alegria !...

Ex-modelo e empresária de sucesso, as duas primeiras ... A terceira, não sei ...

Não é difícil imaginar-se, o nível sócio-económico das personalidades entrevistadas.
Aliás, a reportagem mostrava-o claramente.  Casa "provocadoramente" sumptuosa ( Cascais / Sintra ... verde e mar ... ),  estatuto bem classe alta, luxo e requinte, a transbordarem  em todo o aparato que rodeava a reportagem ...  Tudo muito "clean", muito "asséptico", muito "adequado" ...

Neste contexto, talvez seja fácil, aceitar-se como uma mais valia, a sabedoria, a maturidade, a ausência de sobressaltos, que  cada  dia  acrescenta  a  estas  vidas ... no  acesso  a  uma  velhice, seguramente  cinco estrelas !...
Talvez seja fácil imaginar-se, que se não há dinheiro a contar, se não há noites mal dormidas com preocupações acrescidas, se não há desemprego por perto, se não há prestações a serem vencidas e sem se ter como, se não há angústias condicionantes sobre o futuro do futuro ( e o futuro pode ser logo, o dia seguinte ... ), talvez não seja difícil imaginar-se, dizia, que estas mulheres, possam de facto olhar o espelho e encararem o dia de amanhã, calmamente, orgulhosamente, sem perturbações, perplexidades e raivas ... mas com uma plenitude gratificante, com um colorido ainda promissor, de cores não empalidecidas... em suma, com expectativas valorizáveis e preenchedoras, dos respectivos egos.

"Assim, também eu !... " - diria o outro.  Qual o real mérito ?  Mulheres de sucesso, até na forma pragmática de encararem  a vida ...  a "custo zero" ???!!!...

Só que ... não são seguramente paradigmas de nada, estes exemplos. Não representam, nem se podem rever seguramente, em mulher nenhuma  REAL, neste país real em que vivemos  ...
Não são representantes, nem longinquamente, da mulher comum que nos cruza o caminho ...
Em suma ... de nenhuma mulher à séria, sem "photoshop" de vida !!!...


Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Estimada Anamar,
Penso ser um erro, nesta terra, vive-se muito da imagem, verifique ate o governo premeia com carros de topo os ignorantes que pedem facturas.
Concordo consigo na sua analise, verifico mais uma vez que e uma pessoas sensata e merecedora do premio que lhe foi atribuido pelos seus pares dos blogues.
Continue por favor, e sempre um prazer ler o que escreve.Zeferino

anamar disse...

Pois Zeferino, obrigada pelas palavras simpáticas.
Contudo fala-me em algo que não conheço: "prémio atribuído "...
Não sei a que se refere. De qualquer forma, não estou preocupada.

Um abraço

Anamar