domingo, 16 de março de 2014

" QUANDO AS MAGNÓLIAS FLORESCEM "



No Porto, as magnólias já voltaram ... lê-se em relatos locais.  Anunciam a Primavera, dizem .
Primeiro, as brancas ... depois as rosa, mais claras ou  mais intensas, florescem, quando os primeiros raios de sol, de um tempo que precisa convencer, se anunciam.
O Inverno ainda não abdicou por completo, percebe-se nas entrelinhas das neblinas, ou das nuvens esparsas, que de repente se impõem, num céu anteriormente azul.
Mas já não tem  a convincência de há semanas atrás.
Também, este ano, brincou e judiou, impiedoso, mostrando bem quem mandava por aqui ...
O que é facto, é que o ameno das temperaturas já nos envolve, e o sol irreverente, leva-nos a deitar a cabeça de fora  como os caracóis, dos muros de pedra sobre pedra, lá nas encostas.

Não me ocorre, que em Lisboa haja avenidas, adornadas de magnólias.
Não me ocorre, que os seus cálices, abertos ao céu, parecendo esperar que alguém poderoso, neles pingue um qualquer licor afrodisíaco, por aqui ornem praças ou ruas.

Em Lisboa, temos os jacarandás, que são igualmente espectaculares, e que formam abóbadas de lágrimas roxas.  Apenas, noutra época do ano ...
As suas flores têm também uma beleza ímpar, mas creio que são desprovidas de aroma, ao contrário das magnólias que nos inebriam pela beleza, cheiro e aristocracia ...  Sim, porque a majestade das magnólias, encerra uma sobranceria de distinção ... confere-lhe uma categoria de flor incomum !

Tive uma única magnólia, na minha vida, num jardim do passado.
E ainda assim, não passou de uma incipiente juventude, enquanto eu pude admirá-la .  Três, quatro cálices desabrochados ... já era uma festa.
Era rosa, entre o rosa e o lilás. Delicada !!!...
Hoje, não sei se essa magnólia alargou braços, ganhou corpo, se tornou mulher parideira de cálices apontando o firmamento ...
Não sei ... não mais a vi !

Se eu tivesse um pedaço de campo, neste Março promitente de Primavera, hoje perder-me-ia pelos seus carreiros e veredas ;  saltitaria de pedra em pedra, saborearia a doçura deste sol pouco ousado, dançaria nesta brisa, para cá e para lá ... ou só para lá, porque ela transporta-nos  mais e mais, além.
Recuar não é próprio desta aragem.  Recuar tem a ver com os ventos de temporal, redemoinhantes, dos Invernos agrestes, que sempre esbarram connosco.
E deixaria que os cheiros das verduras e flores silvestres, que pintalgam a paisagem, me envolvessem e me acariciassem ... solta, solta por aí, como as aves que também são livres, e não carecem de autorização para chamar o mundo, de seu !

Mas não !
Estou e continuo no betão.  Tenho como paisagem, colmeias de morte, de solidão e indiferença.
Prédios com olhos que não riem.  Varandas, que nem uma flor geram.  Pássaros que não poisam, porque não há onde.  Nesgas de azul, onde o horizonte ainda permite retalhos de sol, em fuga pelos meandros das sombras agigantadas, que os "monstros" que desafiam os céus, projectam !
Riachos que só gorgolejam nos meus ouvidos.
Zumbidos de abelhas, que apenas povoam a minha imaginação e a minha vontade indomada, de sonhadora inveterada ...

Que  saudades  duma  cancela  ao  fundo  do  caminho,  por  onde  o  roseiral   voluntarioso,  assomasse !...
Que saudades de deixar o cabelo em desalinho !... Que saudades de lançar um xaile pelas costas, de aninhar no seio, a primeira flor que a beira da estrada me oferecesse ... e poder ir por aí, com os pés descalços na erva fresca ... sem rumo e sem destino !!!...
Que saudades da liberdade no espírito, da harmonia e da paz no coração ... da plenitude bebida na simplicidade das coisas !...


Anamar

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