sexta-feira, 30 de agosto de 2019

" VOANDO COM O PENSAMENTO ... "



O meu humor mudou.  É estranho, nem sei bem porquê, mas acho que é a nostalgia que sempre se apodera  de  mim, nesta chegada do Outono que já espreita.
O Verão foi perfeitamente atípico em termos atmosféricos, embora pareça preverem-se temperaturas muito elevadas, agora que Setembro se aproxima.

Só que esta sensação de encerramento de qualquer coisa, deixa-me sempre meio ensimesmada e escurecida por dentro.  E Setembro, queiramos ou não, fecha a porta às chamadas "férias grandes" e inicia um período laborioso, o início das aulas e com ele a mexida da miudagem, a mexida dos pais, as escolas a reabrirem-se outra vez, o azul a partir e o cinzento da nova estação a chegar...
E totalmente à minha revelia, eu tenho e acho que terei até morrer, este esquisito relógio biológico dentro de mim ...

O início dos anos, para mim e talvez para muita gente, era exactamente este recomeço, esta azáfama, como se de uma epifania se tratasse, ritmicamente .
E pronto, da noite para o dia claudico no humor, que também se acinzenta.
Tenho andado animada, como se o " frou frou" que se começa a sentir, também me pertencesse.
Mas não.  Já há algum razoável tempo que não.
Neste timming da vida, é agora a vez da minha primogénita se preocupar, e não será pouco, com um a entrar na faculdade, outra no décimo ano e o caçula no oitavo ...  Uma razoável dor de cabeça, convenhamos !...
Eu estou nos bastidores apenas, assistindo de longe e sabendo aquilo que querem contar-me.

E por isso fico com esta sensação de "desemprego" ... Tudo à minha volta se agita, e as minhas rotinas, mais coisa menos coisa mantêm-se !
É engraçado, porque quando estamos no activo, reclamamos, suspiramos pelos fins de semana, feriados e férias, e a aposentação então, será o culminar do "paraíso" !!!...
Aí, temos a convicção que chegados lá, tudo o que existe na lista de espera do tempo que não temos, final e seguramente irá concretizar-se ...
Leremos muito, conviveremos mais de perto com os colegas que também sonham com isso, passearemos muito mais, iremos a cinemas, museus, exposições ... e sobretudo poderemos usufruir de tudo isso sem o maldito relógio nos contabilizar o tempo despendido, como se estivéssemos a ser perdulários ...
Os malfadados testes em rimas e rimas para corrigir deixarão de existir, as aulas sempre para preparar, nem que tenhamos leccionado quarenta anos ou mais ... também não, as reuniões intermináveis e quase sempre uma "seca" pela ineficácia, menos ainda ...
Enfim, será altura de saborear com todos os condimentos, e sem afobações ou culpas, o estatuto ganho merecidamente, claro, com o trabalho, a dedicação e o esforço quantas e quantas vezes roubado à nossa vida privada, de uma carreira longa e vivida plenamente ...

Engano.  Rotundo engano ! Pura ilusão !
Agora que as horas deixaram de ser "horas", agora que a pressa deu lugar à disponibilidade, agora que a agitação deu lugar à tranquilidade e à paz de quem não tem rigores de horários a cumprir ... agora que acontece tudo isso que sonháramos lá atrás, falta tempo, falta ocasião, falta vontade e parece que ainda deveríamos correr mais do que antes, se de facto quiséssemos cumprir e honrar o tão almejado calendário ...

E este "fenómeno" que me acontece, juro-vos, é relatado igualmente, sem falhar uma vírgula, com a maioria das pessoas que se encontram nesta circunstância.
E por isso, sempre é motivo de riso, perplexidade e no fim, complacência e aceitação, quando nos encontramos.
E lá dizemos, com ar penitente : " a ver se passamos a encontrarmo-nos mais, para não ser só naqueles lugares e em circunstâncias dramáticas que cada vez mais, infelizmente nos ocorrem ... a despedida de colegas e amigos de uma vida !"...

De facto, boas intenções sobram.  Nesses momentos equacionamos a importância e a efemeridade da vida.  Lembramos o caminho percorrido e perguntamo-nos quanto mais teremos para percorrer ...
E juramos, juramos mesmo que dali em diante, tudo será diferente ...
Porque até temos saudades reais uns dos outros, bolas !  Porque até teríamos coisas p'ra contar, assuntos para dialogar, partilhas de momentos vividos, uns mais, outros menos felizes ... Porque até teríamos histórias, fotografias, novidades para dividir ...

Teríamos, sim.  Teríamos tudo isso !...
E depois ???   Bom, depois tudo retoma o seu ritmo do dia a dia, e o tudo desfaz-se em nada ou pouca coisa, esmagados pela imbecilidade e insensibilidade do tempo que trucida, que desfaz sonhos e que transforma as cores dos futuros de cada um de nós ... nos cinzentos que o Outono nos trará !!!

De facto, o ser humano é obra !!!...

Anamar

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