segunda-feira, 31 de outubro de 2011

"COMIGO MESMA. ..."




No tempo dos Mp4, I-phone, I-pad e outras máquinas estanhas e infernais. .. comprei um Mp3 !!...

Brinquedo novo, "bicho" esquisito nas minhas mãos, tem sido uma emoção única, descobrir-lhe os segredos .... rsrsrs
Li as instruções, coisa rara nas mulheres, rezam as estatísticas, e pasme-se ... gravei uma colecção de talvez mais de duzentos temas musicais, escolhidos à minha medida, destinados a deleitar-me enquanto escrevo, enquanto estou pasmada a pensar apenas, mas sobretudo a deleitar-me na minha próxima ausência por terras do oriente.
Depois, os auscultores abafam o som ambiente, por vezes ruidoso, que leva  à dispersão; impedem que sejamos obrigados a "cuscar" as conversas, impedem que tenhamos que ouvir os assuntos intermináveis, de decibéis desconcertados, das comunicações alheias por telemóvel ...

Bom, entre os temas escolhidos está um, espectacular, já antigo, de Joe Dassin .... "L'été indien".

"L'été indien" é um tema romântico que aborda uma história de romance, de separação, de saudade, pintado com as cores do Outono.
Outono, que exactamente vivemos neste momento.

O Outono sempre se veste das mesmas cores, estou em crer que em todo o lado.
O sol que nos ilumina, fraco, tem contudo uma luminosidade inconfundível, absolutamente diversa da que nos é brindada pelo sol do Verão.
Os dias das praias, dos areais repletos, já foram.
Hoje as areias são reserva das gaivotas, que nelas fazem "dança de roda" em ritual de confraternização, conquista, lazer ...
As ondas mais crispadas que então, desfazem-se em rendas espreguiçadas na brisa que corre.
O sol adormece mais cedo envolvido em laranjas adocicados, no horizonte longínquo ...
As folhas são lançadas ao chão em rodopios imparáveis. Os verdes são mais verdes, os castanhos do recolhimento, os ocres e os vermelhos semeiam-se aqui e ali ...
O "silêncio" lá de fora impregna-se-nos no coração e na alma, enquanto o pensamento viaja, à nossa revelia e recua no tempo, dobra a curva da estrada  uma outra vez, e caminha no sentido retrógrado da marcha...
É então que os cheiros, as cores, os sons, a luz, trazem rostos, vozes, olhos, mãos, adormentados do caminho...da estrada que se fez ...

E é uma sensação de profunda melancolia, que embora  não nos traga lágrimas ao rosto, provoca um aperto no coração e um constrangimento doído na alma.

O tempo ... o tempo escoa-se na ampulheta do destino, injustamente, irreversivelmente ... tentando cantar-nos a canção de ninar que nos apazigue o sono ...

"'L'été indien" ... há uma eternidade ... há um século ... há apenas alguns anos ...

Anamar
                                             

sábado, 29 de outubro de 2011

"NUM GOLPE DE VENTO...."

As pessoas bebem por alguma razão;  as pessoas drogam-se por alguma razão..... Em suma, salvo situações de predisposição genética, as pessoas alienam-se por defesa, por medo, por cobardia...

Eu também não fujo aos parâmetros, nem sou excepção.
Dou por mim a preferir ignorar determinadas situações para não me angustiar mais com elas... dou por mim a não tomar conhecimento de outras, para não me desestabilizar ou até sofrer por antecipação.
É cobardia ?
É, seguramente ... mas é pelo menos mais "cómodo" psicologicamente, sobretudo quando a nossa intervenção não pode objectivamente alterar o rumo das coisas.

Tenho uma filha absolutamente imprevisível nas escolhas, nas posturas, nos trilhos.
Desde adolescente, quase desde miúda, se pautou pelo voluntarismo incontrolável, pelo radicalismo inconsequente, pelo desafio da "corrente", pela busca imparável de sempre novas situações, vivências, cores, de um qualquer arco-íris que acredita ter de existir na sua vida.

Essa minha filha é a réplica fiel do que eu seria se tivesse a idade dela, e não tendo vivido na minha geração.
Ela é uma espécie de vingadora da vida que não tive, da pessoa que não fui, talvez porque não fui capaz, não busquei, não apostei ... e ela fê-lo ... ela fá-lo todos os dias ...

A seguir a ela há já quem lhe comece a percorrer os caminhos, seguramente ... o tempo o dirá !...

Não lho digo, mas impressiono-me muitas vezes quando me confronto com as suas posturas, as quais sinto, eu deveria ser mais convincente a desincentivar, e não sou capaz ... porque ali, bem na minha frente, está a tal réplica de mim, no bom e no mau ...

Entre muitas outras coisas que faz, aposta em praticar um desporto radical no mar, que envolve sérios riscos, o "kitesurf".
Nunca quero saber quando vai até à costa, que mar está, que vento sopra ...
Os relatos que me faz, por vezes, de atribulações ou percalços que lhe aconteceram e que por "uma unha negra" a não atingiram, arrepiam-me ... mas nada posso objectivamente fazer.

Na semana passada, uma vez mais na costa com uma amiga, a praticar kitesurf num mar desaconselhado, com um vento desordenado, aconteceu o inevitável, a centímetros dela, miraculosamente não a ela.
Num golpe de vento traiçoeiro, a colega de desporto foi atirada violentamente para a areia, tendo de imediato entrado num coma profundo e dramaticamente imprevisível, irreversível até hoje.
E ali ficou uma jovem, jogada numa cama de hospital, paralisada em todo o lado esquerdo, sem acordar para a vida...

Não a conheço, mas obviamente penso ... "e se em vez dela, tivesse sido a minha filha, que estava exactamente no mesmo barco, pondo por vezes a vida em risco, em nome duma coisa que a fascina"??...

Essa questão levantou-me outra.
Outra que eu sei, outra que eu sinto, outra que talvez queira ignorar ... das tais que se calhar não quero equacionar muito, para não me magoar muito mais.
É uma questão que se coloca a muitos de nós, estou certa, e que nos mexe e remexe sem que o nosso imobilismo reaja e a consiga alterar !...
Prende-se com o transcurso "distraído" da vida, que nos "adormece", nos "anestesia", parece tirar-nos o tempo, a capacidade de reacção, nos instala um comodismo absurdo, que um dia, como água gelada a despencar do rochedo, nos cai em cima, sempre quando já não podemos reverter nada do que foi ...

Prende-se com o facto de nunca dizermos em tempo útil a quem amamos, o quanto amamos...

Prende-se com o facto de deixarmos de "ter tempo" para sentar no nosso colo, quem o precisa ...

Prende-se com o facto de endurecermos os ouvidos às palavras de quem quer, talvez, falar ...

Prende-se com o facto de nunca termos disponibilidade física ou de coração, para com os que têm o DIREITO de contar connosco...

Depois um dia ... quando o queremos fazer, já lá não estão !
Um dia quando "acordamos", não temos mais interlocutor !
Um dia quando terrificamente tomamos real consciência, já não vale a pena .... simplesmente porque um dia, no tal "golpe de vento", a vida os levou de nós !!!...

Anamar

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

"A GERAÇÃO DO MEU PAI...."

 Dia absolutamente surrealista....ou somos nós, de memória curta, que com a estiagem instalada neste ano, nos esquecemos como eram os dias de Inverno, ainda que seja um Inverno de "penetra" no Outono que vivemos...

Pois bem, um dia excelente, para quem pode,  se sentar calmamente na secretária a arrumar ideias, na cómoda a arrumar gavetas ou mesmo simplesmente a olhar o acastelado de nuvens persistentes, num céu que não parou de verter água, acintosamente sobre tudo e todos...

Dia propício ao deambular da minha gaivota, mas nem isso.... No céu nem vivalma...na terra, unicamente as almas vivas que não tinham outro remédio, e ainda assim, a correr muito, tentando apanhar a chuva distraída!!

É o não fazer nada ocioso de quem tem pouco para fazer e se pode permitir estes verdadeiros "luxos"! Afinal já somos da geração emergente, da "sexalescência".... (um destes dias explico melhor).... gente que está mais para adolescente do que para sexagenário...estão a ver a ideia???!!!... rsrsrs

Por isso, a modorra instalada também avança até aos miolos, e põe-os assim meio adormecidos, entorpecidos, sem vontade de se mexerem...Estou que nem a Rita que todo o dia não me largou a cama, a dormir em sessões contínuas.


Chegou-me às mãos num destes dias um texto, dos tais textos absolutamente geniais, pelo conteúdo, pelo desassombro, pela clareza.  É uma análise pertinente e interessante sobre a conjuntura do país de hoje, e do país que foi....vivido e sofrido por muitos de nós, e que pelo menos ainda não esquecemos.

Foi escrito pelo jurista Pedro Lomba e publicado no jornal o Expresso, há poucos dias. É sempre bom acordar consciências, abanar mentes....relembrar História.... a mais genuína e real, porque a vivida na pele por uma geração de homens com H maiúsculo!!!!

Uma geração traída

Público 2011-10-20  Pedro Lomba

O meu pai nasceu no dia 18 de Outubro de 1941. Acaba de fazer 70 anos, mais dez do que Cícero tinha quando escreveu De Senectute. Quando penso na geração dele e na idade dele, ocorre-me que não houve nada no século XX português que eles não tivessem visto. A geração do meu pai passou por tudo na rotina frenética destes 70 anos. Foi uma geração imensamente disponível, batalhadora, dividida, na ditadura e na democracia, na guerra e na paz, e hoje talvez continue a ser isso tudo, só que com mais amargura e desencanto.

Quando o meu pai nasceu em 1941, a Europa tinha mergulhado numa guerra planetária a que um Salazar de manhosa filigrana nos poupou. Por isso, e pela idade, talvez não se tenha dado conta lá na província minhota que, quatro anos depois, a contenda diabólica tinha acabado. Mas lembra-se certamente que na mesma província as famílias aprendiam cedo o racionamento. A Europa estava em guerra, o Minho também estava em guerra. Famílias grandes, gigantescas em comparação com um país onde em cada ano já são mais os mortos do que os nascidos, não tinham como educar os filhos senão à custa de sorte e improvisação.

O meu pai, na medida do possível, teve sorte. No Portugal dos anos 40 e 50 era preciso ter padrinhos mais abonados para estudar. Inteligente, bom aluno, foi o primeiro da sua família a pôr os pés na faculdade, porque o Estado Novo, embora expusesse a maioria ao analfabetismo, nunca fechou as portas do ensino aos mais capazes. Mas esse não era ainda o tempo das licenciaturas ao domingo, do fim do serviço militar e dos direitos humanos. Quando em 1961 Salazar exclamou Para Angola rapidamente e em força, o meu pai tinha 20 anos e foi.

A geração do meu pai foi a geração da guerra de África. Pessoas como o meu pai, provincianos, rurais, nada sabiam da política, não pensavam no Portugal multicontinental do regime. Mas estiveram disponíveis quando foram chamados para as comissões africanas, porque acreditavam em velharias como o dever e a sobrevivência. Fiéis ao passado, podem ter aprovado a Europa por estarem convencidos de que viveríamos melhor, mas nunca se tornaram europeístas parolos e deslumbrados.

Como quase toda a gente, a geração do meu pai fez a transição do campo para a cidade, a primeira geração a ocupar os subúrbios das cidades onde as casas eram comportáveis para quem ganhava a vida no Estado e que, entretanto, se encheram de comboios populosos e de adolescentes cuja única cultura é a que aprendem na televisão do big brother. A geração do meu pai resiste aos telemóveis e olha para a Internet com desconfiança. A geração do meu pai nunca comprou casa porque nunca teve dinheiro para isso, mas pode gabar-se de não ter contraído dívidas mastodônticas para os seus filhos e netos.

A geração do meu pai foi a geração que conheceu a fundo o provérbio chinês: não serás homem enquanto não conheceres a pobreza, o amor e a guerra. Uma geração que ainda encarou os filhos como filhos, não como "amigos", mantendo uma distância emocional que não conseguiu vencer. Uma geração que nunca foi a mais qualificada de sempre, que não fez carreiras em partidos políticos, que não teve "mundo", mas nunca perdeu o sentido das proporções. Uma geração sequestrada pelos grandes debates ideológicos do século. Esta foi a geração sem a qual não teria existido a democracia, uns porque lutaram por ela, outros porque foram a bússola de ordem e conservadorismo sem os quais nenhuma democracia prospera.

Pessoas como o meu pai tiveram "convicções". Tiveram acima de tudo bom senso. Tiveram acima de tudo vergonha. Conservadores nos costumes e crentes de que o Estado deve ajudar os mais desfavorecidos, foram eles os "pais" do serviço nacional de saúde. Hoje, contemplam com estranheza um mundo de patos-bravos e oportunistas sanguessugas. Mereciam mais das instituições que serviram. Mereciam melhor que um país de Armandos Varas e Dias Loureiros. Mereciam melhor do que um país falido.

(Com agradecimento ao António de Araújo pela inspiração.) Jurista

... e com o meu agradecimento a Pedro Lomba por tão brilhantes ensinamentos e o reavivar de memória das gerações do Portugal de hoje!...

Anamar

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

"... TALVEZ DEUS SAIBA !.... "



"Não sei o que vai acontecer .... talvez Deus saiba !!... " - CORNO DE ÁFRICA - MOGADÍSCIO

Esta, a afirmação doída de uma mulher somali, num hospital de campanha, com uma criança esfomeada e desnutrida, nos braços.
A seca, a fome, as guerras étnicas com o número de mortos e estropiados a crescer exponencialmente, trazem o Corno de África de novo ao Mundo...

No Corno de África, vivem onze milhões de pessoas, que dependem quase exclusivamente da ajuda humanitária  do exterior, para sobreviver, e esta não consegue ter capacidade de resposta para a situação.
Tudo é adverso nesta zona do planeta, onde uma em cada dez crianças está em risco de morrer.

O êxodo das populações, para o Quénia e Etiópia, não pára.
Por outro lado, no norte do Quénia ainda não choveu este ano. Uma grande parte do gado morreu devido à seca.
Os agricultores deslocaram o gado mais para norte, em busca de água..... nas aldeias, restaram mulheres, crianças e velhos, praticamente entregues aos seus destinos...

Este video que aponho no meu post, relata a história (uma entre muitas, tristemente... ) de Salima, uma jovem de dezanove anos a quem assassinaram barbaramente o filho, acabado de nascer, quando intentava a fuga do país, através do Golfo de Aden.

A história está tocantemente relatada em poesia, por Paolo Pablos Parigi, assente numa reportagem feita pelo jornalista Fausto Biloslavo e pela foto-repórter Alixandra Fazzina.

Lamento o vídeo não estar em Português. Apenas o encontrei em italiano, mas ainda assim, penso que dará para se perceber quase tudo.

Deixo-o sem demais comentários...
Ele fala só por si, e é a voz de um povo.... em chaga no planeta Terra!....

Anamar


Breve informação histórica sobre a origem  da Somália :



Somália (em somali: Soomaaliya; em árabe: الصومال, transl. aṣ-Ṣūmāl), oficialmente República da Somália e anteriormente conhecida como República Democrática da Somália, é um país localizado no Corno de África. Faz fronteira com o Djibuti no noroeste, Quênia no sudoeste, o Golfo de Aden com o Iémen a norte, o Oceano Índico a leste e com a Etiópia a oeste.
Na Antiguidade, a Somália foi um importante centro de comércio com o resto do mundo antigo. Seus marinheiros e mercadores eram os principais fornecedores de incenso, mirra e especiarias, os itens que foram considerados luxos valiosos para os antigos egípcios, fenícios, micênicos e babilônios com quem o povo Somali negociava.

De acordo com a maioria dos estudiosos, a Somália é também o local onde o antigo Reino de Punt estava localizado. Os antigos Punties eram uma nação de pessoas que tinham relações estreitas com o Egito faraônico durante os tempos do faraó Sahure e da rainha Hatshepsut. As estruturas piramidais, templos e casas antigas de alvenaria em torno da Somália acredita-se que datam deste período.

O nascimento do Islão no lado oposto da costa da Somália no Mar Vermelho, significou que os comerciantes somalis, marinheiros e expatriados que viviam na Península Arábica, gradualmente ficaram sob a influência da nova religião através dos seus parceiros comerciais convertidos muçulmanos árabes.
A cidade de Mogadíscio chegou a ser conhecida como a Cidade do Islão, e controlou o comércio de ouro do Leste Africano durante vários séculos.
Na Idade Média, vários poderosos impérios somali dominaram o comércio regional, incluindo o Estado de Ajuuraan, que era excelência em engenharia hidráulica e construção de fortalezas.
No final do século XIX, após o fim da Conferência de Berlim, impérios europeus partiram com seus exércitos para o Corno de África. As nuvens imperiais oscilando sobre a Somália alarmaram o líder dervixe Muhammad Abdullah Hassan, que se reuniu com soldados somali de todo o Corno de África e começou uma das mais longas guerras de resistência colonial.
A Somália nunca foi formalmente colonizada.
Repeliu com sucesso o Império Britânico por quatro vezes e obrigou-o a retirar-se para a região costeira. Após um quarto de século, mantendo os britânicos na baía,  foram finalmente derrotados em 1920, quando o Reino Unido usou pela primeira vez na África aviões que bombardearam a capital, Taleex.
Como resultado deste bombardeamento,  foi transformada  num protetorado da Grã-Bretanha.

A Itália enfrentou situação semelhante quando sofreu a mesma oposição dos exércitos de sultões somalis  e não adquiriu o controle total de partes da Somália moderna, até à era fascista, no fim de 1927.
Esta ocupação durou até 1941 e foi substituída por uma administração militar britânica.
O Norte da Somália continuaria a ser um protetorado e o sul da Somália tornou-se uma tutela. A União das duas regiões, em 1960, formou a República Democrática Somali.

Devido aos laços de longa data com o Mundo Árabe, a Somália foi aceite em 1974 como membro da Liga Árabe.
Para reforçar a sua relação com o resto do continente africano, a Somália  juntou-se a outras nações africanas, quando fundou a União Africana e começou a apoiar o ANC na África do Sul, contra o regime do apartheid, além dos os separatistas eritreus na Etiópia durante a Guerra de Independência da Eritreia.

Um país muçulmano, a Somália é um dos membros fundadores da Organização da Conferência Islâmica e é também um membro da ONU e MNA. Apesar do sofrimento constante de guerras civis e da instabilidade política, a Somália também conseguiu sustentar uma economia de livre mercado que, segundo a ONU, supera as de muitos outros países da África.
A Somália é conhecida por ser um dos países mais corruptos do mundo, apenas perdendo para Afeganistão, Mianmar, Sudão e Iraque.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

" ENTRE UMA BICA E UM CIGARRO" ........



Um destes dias, entre uma bica e um cigarro, um amigo querido que já não via há imenso tempo, lançou-me um repto, em que fiquei a matutar...

Penso que ele será meu leitor assíduo, embora comentador ocasional.
E também sei que foi numa atitude perfeitamente construtiva e amiga, que me disse assim:
"Deixe o seu blog, ou dê um cariz diferente ao seu espaço ! Se sente necessidade de escrever, faça-o sobre política, flores, casos do dia a dia, mas não sobre si.  O seu blog está a fazer-lhe mal . Como um labirinto de caminhos viciados que sempre a conduzem ao mesmo sítio, ele é um espaço quase de auto-comiseração, de masturbação psicológica, de "deitar e rolar" em tudo o que é negativo, ou menos positivo na sua existência, e está a tomar isso como um remédio amargo para a alma..."

Bom, dito desta ou de outra forma, assim o entendi, penso que correctamente.

Ora bem...

Desde sempre o meu espaço foi um espaço intimista, foi uma procura de mim própria através das letras, foi um extravasar de emoções felizes em dias felizes, tristes em dias menos bons.
Nunca se destinou propriamente a ninguém, nem se "auto-proclamou" varanda de grandes causas.
Nunca teve intuito de chamar atenções para que me dessem colo, nem a pretensão de chamar atenções para que masoquistamente, chorassem comigo nos dias mais tristes...

Não !!!....

Tão pouco teve a veleidade de achar que poderia objectivamente ser pedrada no charco em estruturas, em valores instituídos, em comportamentos ou atitudes...
Não !...
Apontei sempre o dedo, se algo mexeu comigo, independentemente de ter ou não eco desse lado, é verdade... apenas pela razão de que "mexeu comigo"...
Sempre a minha escrita depende de mim mesma, do meu "eu" interior... genuinamente....
Sempre pinto a realidade com as cores que vejo nesse momento.... a minha realidade.
Portanto, sempre é absolutamente subjectivo, porque traduz o bom ou o mau do que sinto...exactamente por ser isso que sinto nesse momento, sem maquilhagens ou molduras, com total independência e isenção...
Aliás, a mesma independência que tem, quem o lê, porque sempre tem ao seu alcance, o virar da página, o fechar, ou nem sequer o abrir!!...

Por isso, Filipe, você tem que perceber que sou incapaz de escrever "por encomenda".... Sou  incapaz de não me expor ali, de não me desnudar ali, de não me dar ali, independentemente de quem está do outro lado, sobretudo porque está "do outro lado"...

O meu espaço é também um espaço de dádiva, do que eu sou... Tem o valor que tem ( não o discuto nem o procuro ), liberta quantas e quantas vezes os meus fantasmas...
É um espaço de total liberdade, sem amarras ou limites, tal como eu sou, que nunca aceito horizontes que me tolham, "cangas" que me disciplinem, sujeições que me reprimam, ao mais ou menos ético....

Por isso, ao contrário da sua compreensão, permita-me aqui discordar de si, meu amigo...
Acho que o meu blog tem sido objectivamente ( sinto-o claramente ), um espaço de crescimento interior, de restruturação pessoal, de análise, maturação, que me tem conferido a capacidade de "ME" olhar de fora para dentro, de ME "abanar" de fora para dentro, de ME confrontar comigo mesma, afinal numa sociedade em que as pessoas se conhecem pouco, se disponibilizam pouco, se amam pouco...


Portanto, continuarei .... Respiro por aqui, amo por aqui .... vivo por aqui ....

Anamar

sábado, 15 de outubro de 2011

"NA CRISTA DA ONDA ! ... "


Engraçado hoje o meu dia.

Acordei com uma sensação indefinida, mas sentida, de paz, de dever cumprido.
Parece que na minha vida as coisas estão a entrar nos eixos. As peças do puzzle a encaixarem, o "labirinto" que sou eu mesma, a tornar-se estrada mais aberta e fácil de percorrer.
É verdade que os problemas prioritários parecem ter-se ultrapassado.
A situação da minha mãe, controlada, estabilizada, menos sobressaltante.
Sem dúvida, um dos principais factores a transmitir-me este sossego de alma.

Mas não só...

Acho que começo a conviver mais pacificamente comigo mesma, com a pessoa que eu sou, aceitando-me melhor, com mais maturidade e crescimento, assumindo em paz, as minhas imperfeições, incapacidades, omissões, na certeza de que tudo o que faço, ainda que errado, não pode ser por mim penalizado excessivamente.

Assim, encaro sem tantos constrangimentos o meu dia a dia, e quase posso dizer que estou feliz, embora pareça que eu tenho um estranho "convívio" com a palavra Felicidade, como se, só o pronunciá-la a afastasse de mim!...
Pareço acreditar poder ter ainda dias felizes e plenos na minha vida. O rancor e a mágoa do passado dissipam-se aos poucos, como o sol a romper o nevoeiro, descobrindo para lá, um céu brutalmente limpo e azul.

O facto de também não guardar ódios, raivas, azedumes pelo que passou, por quem passou, transmite-me um senso de generosidade, de magnanimidade, de maturidade... como dizia.
Sinto que sou Maior, porque o meu coração não alberga esses sentimentos Menores... Sinto que sou mais mulher, porque consegui ( penso ), enfrentar as marés adversas que a vida me aprontou.
Corroboro aquela frase feita, de que nada acontece por acaso, nada nas nossas vidas acontece gratuitamente.
Tudo tem um fim ou um objectivo, defendem os orientais, nem que seja por força de um sofrimento redentor.

Feliz comigo, feliz com os outros... obviamente!...

Tudo isto eu escrevi ontem.

Hoje, a esta mesma hora, no sítio do costume, no meu espírito passa uma nuvem que me pesa toneladas nas costas...
Como eu, certamente milhões de portugueses a sentirão, provavelmente, alguns até com maior acuidade que eu.
Passos Coelho veio ontem à televisão, anunciar as últimas medidas gravosas a tomar pelo governo, no sentido de tentar "salvar" Portugal...

Eu, que até me defendo, procurando, dentro do possível, ignorar notícias nos últimos tempos, enfiando cobardemente a cabeça na areia... reconheço... assisti na íntegra ao telejornal.
E se há muito, como todos, tenho andado fortemente preocupada quanto ao rumo deste país, ontem fiquei simplesmente "doente"!!...
Eram três horas desta madrugada e ainda não conciliara o sono.

A situação é de tal forma grave e complicada, que não sei mesmo se os paleativos ( porque acho que para além disso, de pouco mais se trata ) implementados por quem tenta gerir uma "casa" onde "não há pão"....surtirão algum resultado.
No máximo, manter-nos ainda vivos, a acordar todos os dias.... pouco mais !

O "clima" hoje vivido nas ruas, nos locais públicos, é de alarme, pânico, angústia, desespero...
Como sabemos, estes sentimentos não foram nem são bons conselheiros, na resolução de nenhuma dificuldade... apenas, não se vislumbrando nenhuma luz ao fundo do túnel, as pessoas, as famílias, sentem-se quais náufragos em plena tempestade, perdidos, sem esperança de ajuda ou resgate!...
Não é à toa, que tenho lido nos jornais, que a taxa de depressões e suicídios incidentes na população, subiu exponencialmente nos últimos tempos.
Os depoimentos sofridos, prestados por famílias que em situação desesperante, perderam toda a capacidade de garantir as necessidades básicas da vida....multiplicam-se...
Isto, já não referindo os idosos, sem grande poder reivindicativo, sem nenhuma possibilidade de reverter a situação, que mais e mais caem nas dificuldades, tantos no abandono, tantos na desistência!!!...

Bom, este é de facto o discurso que temos tendência a proferir...
Por certo, não o mais aconselhável ao momento !

Procuro ainda assim, encarar tudo isto o mais "low profile" possível, com a serenidade máxima que consigo, dizendo para mim própria que as cabeças devem manter-se calmas para que possam discernir com clareza, com a mínima perturbação possível.... tentando aguardar que as ondas alterosas passem, e o mar fique "flat".... se conseguirmos...
Uma mente perturbada não entende, não analisa, não é prudente, não se defende cabalmente... e a precipitação pode remeter-nos a caminhos sem volta!...

Aguardemos pois... face ao pico da maré, olhando de frente a onda desafiadora, bem ali à nossa frente, para que lhe possamos alcançar a crista sem danos acrescidos... e com ela, possamos de novo atingir o areal da paz !....

Anamar

terça-feira, 11 de outubro de 2011

"PROCURANDO OS MEUS TRILHOS..."


Constato que o sol anda mais baixo...

A esta hora, aqui na minha mesa do PC, bem frente à minha janela, como já sobejamente vos contei....não me bate nos olhos, nem me inunda, como há tempos atrás.
A minha janela é cúmplice com este casario, sem expressão nem graça, de uma terra atípica, triste, despersonalizada....sem alma!
Isto porque, são tantas as almas que aqui vêm só dormir e lhe voltam costas diariamente rumo a Lisboa, que sobram apenas os utentes desocupados, das pracetas da vida!

Não há espaços verdes, não há pormenores que alindem, não há raízes que prendam as pessoas.
Esta terra, é cada vez mais, uma terra de passagem!

A minha gaivota às vezes vinha....desafiar-me por aqui.
Agora, nem rasto. Acho que anda equivocada, pelas falésias de mares ainda serenos, a pensar que a época balnear está instalada.
Este pseudo-verão, ensandwichado no Outono, é o que faz!

Nós próprios levamos uns dias estranhos, como se vestíssemos uma fatiota que não é bem a nossa medida!

Eu estou numa de contar os dias.
Breve vou viajar, mulher que sou sem terra ou mundo. Vou outra vez tirar a respiração bem até ao fundo, vou outra vez lavar os olhos e a alma.
Ao contrário de Earl Grant no seu "The end" (que postei anteriormente), para mim, o fim duma viagem é já o começo de outra, como as ondas na praia que desenrolam noutras que se aproximam...
Diz ele que no fim dum caminho não há mais para onde ir.
Os meus caminhos, como leque ou concertina, vão abrindo, abrindo, abrindo.....e sempre surge uma vereda que me transporta mais além.

Seguramente não vou repetir o que vi, pela simples razão, que tudo é mutável a cada instante, e o que se viveu não é mais o que vai viver-se...
Mas a riqueza a armazenar na alma e no coração é por certo exponencial  ao entusiasmo que já me domina.

E conto os dias, neste tempo que parece ter abrandado a marcha, na recta final que me vai levar para os lados do sol nascente, que eu amo de paixão!

Aquilo lá, "fala" muito a minha língua...
Aquele desprendimento pelo material, pelo supérfluo, pelo  que nos é tão "imprescindível" por aqui, toca bem cá dentro, tange-nos no mais profundo de nós mesmos...faz-nos parar, faz-nos meditar, faz-nos reflectir!
A beleza que transpira pelo céu, pelo mar, pelo sol que nasce e  se põe em cerimónia fulgurante, os verdes e a cor dispersa  das flores, pelos cantos... a música que só perpassa nos nossos ouvidos, em tímbalos dolentes e harmoniosos, são vitamina para a mente, bênção para o espírito

Vem-se forçosamente um ser melhor, mais completo, mais purificado, das terras do oriente!

Anamar

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

"NEM SEMPRE...NEM NUNCA..."



O meu post de hoje é uma "transgressão" ao sentido habitualmente sério e carregado que imprimo aos meus escritos.

Hoje simplesmente ofereço-vos um tema musical velhinho, mas pelo qual me apaixonei.
Ao longo da tarde, enquanto fazia outras coisas, ouvi-o compulsivamente e não me cansei.

Ao fim destas sucessivas audições, não me fartei, e continuo a achá-lo lindo...

Se o acharem "foleiro".... deixem-me ser foleira, superior e indiferente aos comentários.

Afinal, o fim de qualquer coisa há-de ser sempre o princípio de outra, e é isso que tem que nortear a vida de todos nós.
O dia acaba e a noite começa, o sol põe-se e a lua nasce, o fim da viagem acorda-nos para a próxima, e a infelicidade terá no seu fim, uma felicidade a iluminar o nosso céu, de cores... como o arco-íris em dia de chuva!!....

Com o meu carinho... Earl Grant com o seu... "THE END"

Anamar

domingo, 2 de outubro de 2011

"ELEGER LISBOA"



Um domingo espectacular...
Um verdadeiro dia de Verão, daqueles que não tivemos no tempo certo. Decididamente, alguém se anda "a passar" ou a brincar connosco, nesta gestão maluca do tempo.

Quando o Zé Povinho pode ter férias, Julho ou Agosto, como sabemos, o tempo fez negaças, as águas marinhas desagradáveis, o vento desabrido.
Setembro começou, o pessoal regressou a duras penas ao trabalho, as criancinhas às aulas, retendo obviamente os pais ao domicílio de família, o lazer havia terminado e o bom tempo começado!

Hoje, sem programa planeado para fazer, sem cinema que me atraia (é um crime enfiarmo-nos numa sala às escuras, com tanto sol cá fora).... resolvi ir "espiolhar" outra faixa da nossa cidade que também é uma sala de visitas espectacular...
Belém e a sua Torre, o Padrão dos Descobrimentos, os Jerónimos com toda a sua "entourage" de verdes, as gaivotas prazenteiras em voos loucos e rasantes de felicidade, o sol a esbanjar-se sobre tudo, as velas que sulcavam o rio para cima e para baixo... e a coroar tudo isto, uma brisa abençoada que afagava os corpos transpirados... corria por ali, oferecendo um berço doce às gaivotas...

Já perceberam... fui até à orla do rio.
O Tejo de um azul intenso era um espelho, na "prata" reflectida pelas águas... e o céu não se fazia rogado a misturar os seus azuis, numa limpidez total, pela ausência de nuvens.

Gente descontraída e semi-despida, percorria em várias línguas, a zona, dando um "cheirinho a férias" de fazer inveja. As máquinas fotográficas e as câmaras de filmar não cansavam de arquivar nas suas entranhas, cantos e recantos desta nossa cidade.
Há uns anos atrás tive um amigo que era absolutamente fascinado por Lisboa. Amava-a de paixão... e sempre dizia que era a "mais linda cidade do Mundo".
Eu achava um exagero, achava que era coisa de quem não tinha padrões comparativos.... e sempre retorquia dizendo-lhe : isso é porque tu não conheces Budapeste, Praga, Viena, Estocolmo, Oslo, ou mesmo o Rio...

Hoje, volvidos alguns anos, eu própria sou uma enamorada por Lisboa e o seu ar preguiçoso e descontraído, com que nos acolhe e nos permite deambular sem sobressaltos ou preocupações.
Na verdade Lisboa é uma cidade particularmente bela....

....e hoje Lisboa veio a banhos nas águas do seu rio...   

Anamar

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

"LISBOA ESTAVA LINDA..."


Lisboa estava linda...
A Avenida da Liberdade nesta tarde de verão fora de época, convidava ao relaxamento, convidava ao "dolce farniente", convidava a ignorar os relógios.

Muitos estrangeiros, esplanadas cheias, o verde e as flores sabiamente distribuídos, tornavam aquele local aprazível, convidativo.
Afinal lá ao fundo, lá bem em baixo, o Tejo saudava-nos no seu azul turquesa, pejado de gaivotas, que ponteavam quais salpicos brancos, o azul do céu e do rio.
Por momentos até parecia que a crise fora apenas sonhada, parecia que o fardo que carregamos, por milagre sumira...

Tudo estava na mais perfeita harmonia, do castelo à Baixa, do Marquês ao rio.

Os seus olhos estavam ao nível dos calcanhares dos transeuntes.
Enrodilhada no chão, como podia, em trapos andrajosos e sujos, com o carapuço do que fora uma camisola, puxado a cobrir-lhe o rosto, estava aquela mulher.
À sua frente, o fundo recortado de uma garrafa de plástico, ansiava por recolher algumas moedas que teimavam em não cair.
Nas mãos, contra o peito, um pedaço de papelão contava a sua história....apelava aos corações para a sua desgraça.
Aquela mulher sem idade, já perdera a voz, já a cansara de tanto esmolar ingloriamente...já a fatigara por demais pela indiferença dos que a olhavam mas não a viam... dos que indiferentes arrepiavam caminho e seguiam apressados.

Era um rosto inerte, adormecido, que não estava sequer ali...
O olhar... esse não vi, embiocado no capuz que a cobria.
Aquela mulher era uma desistente, mais uma, na quadrícula social sufocante, que nos aperta mais e mais, todos os dias. Era um ser desesperançado, um ser sem sonhos, um ser sem identidade...

E as pessoas passavam, cruzavam-se, riam, falavam, alardeavam o privilégio de estarem vivos...
Acho que aquela mulher há muito que morrera, sem ninguém dar conta!...

Lisboa está pejada de mendigos...
Os bancos das alamedas que acolhem turistas cansados, acolhem mendigos sem tecto. As soleiras de edifícios classificados, são protecção para assomos de seres humanos...

Lisboa estava linda, nesta tarde de Verão fora de época... apenas maculada pela desgraça e infelicidade que a atormentavam.
Mais uma grande metrópole indiferente, distante, insensível já, às misérias que a povoam...

Anamar

sábado, 24 de setembro de 2011

"DEDO EM RISTE"

No meio do turbilhão de notícias preocupantes e desagradáveis com que os jornais nos presenteiam diariamente, e que infelizmente traduzem a realidade do país, europeia e mundial, fui um destes dias confrontada com uma que me arrepiou particularmente e que me arrepia até hoje...

Ocorreu há poucos dias, numa estação de comboio da linha de Cascais, Paço de Arcos ou outra.
Dois irmãos, 57 e 53 anos, jogaram-se para a frente duma composição, almejando assim encontrar paz para um sofrimento que não suportavam mais, segundo carta deixada e encontrada no bolso de uma das vítimas.

Ambos haviam tido uma vida normal, ao que parece, ele com uma profissão suponho que ligada à informática, ela, doméstica, a cuidar de uma mãe idosa, em cuja casa viviam.
A mãe faleceu e o direito ao arrendamento terá sido perdido.
Sem outros recursos, de um dia para o outro, encontraram-se a dividir com os sem-abrigo da cidade, os espaços da noite de Lisboa.

Não sei por quanto tempo por lá terão andado (a notícia não veicula) ;  nunca se encaixaram contudo, no puzzle de sofrimento, infelicidade, precariedade, dos que partilham esta "nódoa social"...
A tristeza, a desistência, a solidão, o cansaço, uma amargura crescente numa incapacidade de luta para reverter a situação, foi-se acentuando com o cair das forças de dia para dia, e de um dia para o outro, a sua luz ao "fundo do túnel", foi a frente de um comboio da linha...

Talvez eles tenham alcançado a paz, mas certamente a tiraram aos corações e às mentes que leram a notícia...
Notícia, como convém, divulgada em letras discretas, no interior do jornal, contra tantas outras, cabotinas, irrelevantes, que enchem as primeiras páginas de trivialidades quantas vezes insultuosas a um espírito minimamente clarividente e isento, de um qualquer cidadão...
Seguramente uma notícia que não é mais que um dedo em riste apontado à sociedade em geral, às estruturas sociais deste país, aos políticos, aos governantes...

Privilegiar uma política com preocupações sociais, foi também bandeira do governo de Pedro Passos Coelho, quando a realidade ainda era esperança...
Só que estas duas "testemunhas" silenciosas, não passam de pontas de um emaranhado de muitas outras, infelizmente exactamente iguais... de pessoas que padecem em silêncio (quantas vezes) dos mesmos males (apenas ainda têm alguma força para lutar), e representam  também a preocupação de todos nós na instabilidade que vivemos... e se "amanhã for eu"??  "E se, por toda uma sequência de circunstâncias infelizes, também eu, ou alguém dos meus, de um dia para o outro, ficar assim, com o Mundo desabado aos seus pés, sem chão para os pousar??"....

Temos sempre tendência a pessoalizar as nossas inseguranças e angústias...
O ser humano é egoísta por inerência, mas devíamos pensar e olhar bem de frente a "culpa" e a "vergonha" que temos obrigação de compartilhar numa situação como esta, para não fazermos de conta, comodamente, que não sabemos de nada ou nada podemos fazer...
São seres humanos, são pessoas, são gente nos limites da capacidade de resistência, ali, ao nosso lado, na cidade de Lisboa...

Vão dizer-me que continuo "naïve" ...  que situações como esta, tantas e tantas vezes encapotadas e até escondidas da sociedade por "vergonha", se repetem a cada esquina, e que é improvável que as consigamos resolver.
São os nossos "cancros sociais" e os cancros não têm cura!!...

Mas pelo menos não as aceitemos, rebelemo-nos contra elas, acusemo-las, denunciemo-las, confrontemos almas e corações, porque tem que os haver bem formados, em estruturas de resposta....: confrontemos o cinismo vergonhoso de uma comunicação social sem qualidade ou escrúpulos, que torna notícias de primeira página a vida privada de pessoas absolutamente irrelevantes, que explora , para vender mais, os meandros escabrosos e vergonhosos dos pseudo-vips deste pobre país, ou a "roupa suja" nada abonatória das politiquices de vão de escada... e esconde notícias incómodas e acusatórias embora profunda e magoadamente humanas...

Eles "retiraram-se" sem estardalhaço, pacata... silenciosamente...
Com eles carregaram o peso do Mundo em desespero, em dor, em sofrimento...

Nem eles sabem como puderam atormentar tanto, por aqui, certamente muita gente que por cá ficou....

Anamar

domingo, 18 de setembro de 2011

"DESAPRENDER DE ESCREVER??..."



Noto que não tenho escrito nada.
Este Agosto e Setembro idem, estão a ser de uma penúria de dar dó.

É verdade que também não tenho andado muito bem de saúde. É verdade que a situação da minha mãe me cria um clima de ansiedade expectante, que não favorece nem  concentração, menos ainda inspiração.
Parece que tenho algo em "equilíbrio", sempre no "tem-te não caias", que faz de cada dia um dia ansioso.
Dou por mim a dormir muito mal (tenho insónias persistentes, que só medicamentos dissipam), dou por mim a dar um salto da cama se o telefone toca e é de casa dela, o coração vem-me à boca e quase paro de respirar...

Bolas, esta situação é um pouco difícil de controlar, mais ainda de arrastar ao longo do tempo...

É um facto que ela é como uma criança desamparada que fosse largada no meio da rua, sujeita a todo o tipo de riscos...
É verdade que, como as pessoas me dizem, eu terei que por o coração ao largo e predispor-me para o que vier, porque afinal ela não obedece à mínima regra de prudência que eu determino, e continua a fazer exclusivamente o que quer.
Também não posso (apesar de já ter tentado em vão), retê-la em casa. É absolutamente impossível de conseguir, voluntariosa que é!

Portanto, estamos numa situação irresolúvel.
Acho que já ando a "bater" bem pior, e aí temos nós outro problema acrescido!

Neste "clima", escrever como, o quê e sobre o quê??...

Entretanto o Outono está a chegar...
Dentro de poucos dias está aí... O sol está já muito baixo, a temperatura desceu significativamente... não tarda as árvores começam a alaranjar, as folhas a tombar, os dias a encurtar...

Com a diminuição das horas de sol estão criadas as condições que favorecem o instalar das depressões, sobretudo para quem tem tendência a vivê-las, que é o meu caso.... e tem vagar para as viver... acrescentaria a minha filha, por achar (eu se calhar também acho) ser um "luxo" que não é "permitido a todos...

Efectivamente, se eu tivesse os tais "milhões" de coisas para fazer diariamente, como ela tem, se eu tivesse problemas de subsistência ou situações excessivamente complicadas a resolver (que felizmente não tenho), não teria "vagar" para "olhar" o amarelecer das folhas, não sentiria tão determinante assim, que o Outono chegue....simplesmente porque não teria disponibilidade para tais "frescuras"...
Tenho por isso até vergonha de colocar tudo isto aqui, numa altura em que o país está atolado em dificuldades reais, em que as pessoas estão submersas tentando "manter-se à tona", já não falando obviamente em reais problemas de saúde que também muitos enfrentam e eu felizmente não...

Bom, mas isto é um espaço também de introspecção, em que não posso sentir-me "censurada" no que escrevo, se corresponder à minha "verdade", mesmo que traduza uma mente , uma sensibilidade ou um coração doentes... ou então mais vale deixar-me estar quieta!!

Assim, neste domingo depois de um sábado igualmente sem "história", mas que não consegui "tornear" pela inércia habitual.... vou estando por aqui, melancolicamente, a apanhar o resto deste sol a despedir-se, por cima destes telhados duma cidade totalmente desinteressante, ouvindo de quando em vez os grasnidos da minha gaivota, que depois dos "banhos" de Verão, resolveu aparecer, anunciando que ainda sabe o caminho e que quando as borrascas do mar alto se fizerem sentir, voltará a chegar-se à minha janela, como hoje, em que simplesmente se deixa vogar ao sabor dum vento forte e desabrido...

Bem... contei-vos uma "estória" de domingo solitário, sem pés nem cabeça, que não vos acrescenta nada...
Desculpem... será que também estou a desaprender de escrever??!!...

Anamar

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

"LIBERDADE..."


Este post, juntamente com o de ontem, é uma nota de humor na escrita de dois homens de letras que não necessitam de referências : o brasileiro Mário Quintana e o nosso "mestre" Fernando Pessoa.

Sobre ele recuso alongar-me, sabendo nós que quem não tiver sequer uma ideia sobre a sua pessoa e a sua obra, seja iletrado, direi mesmo "analfabeto" formal.
Esta vertente satírica, de um humor fino e requintado é um novo lado de "ver" Pessoa, igualmente interessante.

Juntei os dois posts porque fundamentalmente ambos abordam o mesmo tema que tão bem conhecemos, mas apenas os génios sabem traduzir : as pequenas / grandes prevaricações a que o ser humano é "convidado" diariamente, e o gozo que dá infringi-las, desrespeitar as regras instituídas...

De uma forma geral o ser humano vive "espartilhado" pessoal, social, profissionalmente. Vive entre convenções, vive entre a "cruz e a caldeirinha", vive entre o politicamente correcto que lhe impingiram, e a "rebelião" interna que sente dentro de si.

Ao longo da vida foi vinculado duma forma geral, a regras, figurinos, parâmetros, entre o que pode e o que deve, entre o parece e o não parece bem, entre o social aceite pela "carneirada" e as ganas que sente em não fazê-lo...
"É certo ou errado", "pode-se ou não se pode", "deve-se ou não se deve"... e as barreiras, as baias e os muros levantam-se cada vez mais altos à nossa frente.

E lá seguimos, mais ou menos contrariados, constrangidos, irados às vezes, de "olho gordo" sobre o que desejaríamos ter liberdade de fazer e a coragem ou ausência dela, para o fazer!...

O "pudim" de Quintana, está aí a cada esquina a espreitar-nos, a piscar-nos os olhinhos ... até que um dia mesmo os menos corajosos dão o salto e dizem : "Que se lixe"!!!...

  "LIBERDADE"

Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa…
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças…
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
O mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca

                                                       Fernando Pessoa 
Anamar

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

"IRRESISTÍVEL ...."



Nome:
Mario Quintana
Nascimento:
30/07/1906
Natural:
Alegrete - RS
Morte:
05/05/1994 em Porto Alegre

Foi um poeta,contista, tradutor e jornalista gaúcho.
Mário Quintana não carece de apresentações. Todo o seu espólio é e sempre será um espanto!
A sua poesia é marcada pela simplicidade, pelo humor subtil e pelas pequenas surpresas, em poemas que muitas vezes não têm mais do que uma frase... "Sonhar é acordar-se por dentro", é tudo o que diz um deles. Precisa mais? 
                                                             Mario Quintana

                 "Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
                  Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
                  nem desconfia que se acha connosco desde o início
                  das eras. Pensa que está somente afogando problemas
                  dele, João da Silva... Ele está é bebendo a milenar
                  inquietação do mundo!" 
 
   Recebi de uma amiga o texto que vos passo e que achei "divino"  (obrigada Emília).
   Se o apreciarem como eu o apreciei, teremos prestado uma humilde homenagem, a mais um "monstro" das letras e a mais um livre pensador do nosso país irmão!...
Convosco, portanto, com o meu carinho.......também o HUMOR de Mário Quintana!


                                      eterno espanto


           "Em que estrela, amor, o teu riso estará cantando?" 


Pesquisei na Net e esta "doçura" de poema, parece não dever-se a Mário Quintana, mas a um poeta uruguaio, nascido em 1920,  Mário Benedetti.
Era um admirador canino de Quintana, ao ponto de lhe deixar bilhetes, livros e quindins na portaria do seu prédio, e é ainda assim, uma adaptação do mesmo.

P U D I M

Não há nada que me deixe mais frustrada
do que pedir Pudim de sobremesa,
contar os minutos até ele chegar
e aí ver o garçon colocar na minha frente
um pedacinho minúsculo do meu pudim preferido.
Um só.
 
Quanto mais sofisticado o restaurante,
menor a porção da sobremesa.
Aí a vontade que dá é de passar numa loja de conveniência,
comprar um pudim bem cremoso
e saborear em casa com direito a repetir quantas
vezes a gente quiser,
sem pensar em calorias, boas maneiras ou moderação.
 
O PUDIM é só um exemplo do que tem sido nosso cotidiano.
 
A vida anda cheia de meias porções,
de prazeres meia-boca,
de aventuras pela metade.
A gente sai pra jantar, mas come pouco.
 
Vai à festa de casamento, mas resiste aos bombons.
 
Conquista a chamada liberdade sexual,
mas tem que fingir que é difícil
(a imensa maioria das mulheres
continua com pavor de ser rotulada de 'fácil').
 
Adora tomar um banho demorado,
mas se contém p'ra não desperdiçar os recursos do planeta.
 
Quer beijar aquele cara 20 anos mais novo,
mas tem medo de fazer papel ridículo.
 
Tem vontade de ficar em casa vendo um DVD,
esparramada no sofá,
mas se obriga a ir malhar.
E por aí vai.
 
Tantos deveres, tanta preocupação em 'acertar',
tanto empenho em passar na vida sem pegar recuperação...
 
Aí a vida vai ficando sem tempero,
politicamente correta
e existencialmente sem-graça,
enquanto a gente vai ficando melancolicamente
sem tesão...
 
Às vezes dá vontade de fazer tudo 'errado'.
Deixar de lado a régua,
o compasso,
a bússola,
a balança
e os 10 mandamentos.
 
Ser ridícula, inadequada, incoerente
e não estar nem aí pro que dizem e o que pensam a nosso respeito.
Recusar prazeres incompletos e meias porções.
 
Até Santo Agostinho, que foi santo, uma vez se rebelou
e disse uma frase mais ou menos assim:
'Deus, dai-me continência e castidade, mas não agora'...
 
Nós, que não aspiramos à santidade e estamos aqui de passagem,
podemos (devemos?) desejar
vários pedaços de pudim,
bombons de muitos sabores,
vários beijos bem dados,
a água batendo sem pressa no corpo,
o coração saciado.
 
Um dia a gente cria juízo.
Um dia.
Não tem que ser agora.
 
Por isso, garçon, por favor, me traga:
um pudim inteiro
um sofá p'ra eu ver 10 episódios do 'Sexo e a Cidade',
uma caixa de trufas bem macias
e o Richard Gere, nu, embrulhado p'ra presente.
OK?
Não necessariamente nessa ordem.
 
Depois a gente vê como é que faz p'ra consertar o estrago.
“Há noites em que eu não posso dormir, de remorso por tudo o que eu
deixei de cometer.”
 
Mário Quintana
Anamar                            

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

EU, IGUAL A MIM PRÓPRIA ! ....


Agosto despediu-se com um dia típico de Outono, encerrando um Verão que não tivemos, afinal.
Chuva torrencial, céu cinza, apenas frio é que não está.
Lá estou eu a meter compulsivamente o tempo atmosférico no meio da minha escrita, quando afinal frente aos meus olhos desfila aquela frase de Pessoa, do restaurante de Geia, de outras eras... "Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol... ambos existem, cada um como é."
Também "oiço" o Fernando que foi mais um desertor da minha vida, a dizer que as cores com que me escrevo, sempre são as que a janela me deixa espreitar lá de fora, e que objectividade é coisa que por aqui não passa...

Que hei-de fazer? Disso já desisti!

É neste princípio de Setembro que sinto com clareza uma paragem de vida.
Estranhamente ao que muita gente pensa e até ao que eu própria pensava, o mês de Agosto é-me indiferente. Apesar de sentir a ausência da maior parte das pessoas, em férias por excelência, é uma ausência que no entanto promete, como vem a acontecer, um recomeço, um buliço, que irá iniciar-se, uma retoma de alguma coisa.
Mas chega Setembro ou melhor, entreabrem-se as "portas" de Setembro, e eu fico "pendurada", é essa a sensação exacta. Fico como uma fruta já mal presa no ramo, mas que não despenca definitivamente, e se calhar, devia, porque cá em baixo adquiriria um novo estatuto, que não aquele "chove não molha"...

Nestes dias, eu revivo o interiorizado anos e anos ( uma vida), do reinício, do despertar, de um misto de sol ainda que fraco,  com dias uns mais cinzentos que outros nas vidas.
No tempo das minhas filhas em idade escolar, eram os dias do reboliço de compra dos livros e restante material, do papel para os forrar (sim, porque então, os livros não eram usados sem estarem devidamente forrados), eram os dias de saber e fazer os horários para mais um ano... era uma movimentação acrescida.

Agora não.... Fica aquela coisa vazia e despida, desconfortável, fica o que foi e não é mais.
É muito estranho, é uma espécie de fato que ainda não está à minha medida!

Reparei agora que falei do Fernando, o Fernando que nunca conheci, mas que me era uma figura quase familiar através da minha filha, para quem ele foi sempre um amigão, e que deambulou por algumas páginas por mim escritas, e sumiu.
Eu sei que a vida dele é como a da maioria das pessoas... correm de manhã à noite, têm as suas  obrigações pessoais, familiares, profissionais... têm aquela vida corrida, dia após dia, e pronto... a vida vai seguindo a sua marcha!

O Fernando é só mais um. Aliás, ando numa fase extremamente sensível aos afastamentos que me acontecem pelo caminho.
Não se podem prender as pessoas, não se podem atar a nenhuma estaca de árvore, para as termos ali, e como os laços que as uniam a nós, eram provavelmente débeis e precários, elas seguiram, como aqueles conhecimentos sazonais, em que se trocam e-mails, telefones e se fazem catadupas de promessas e intenções para depois, daí a uns tempos, olharmos para aqueles números na agenda do telemóvel, associados a um nome que já não divisamos na neblina lá atrás... o destino é obviamente serem apagados...

Resta-nos quem, nesta "puta desta vida" (como diria o Ilesh quando também ele se sente desiludido e desencantado)???...
Resta-nos realmente a família mais longínqua, se não desertora já, por força das circunstâncias, os mais directos que estão sempre lá ... estar, estão, e sabemo-los, mas também só têm o tempo que o ganha-pão lhes deixa, e aqueles amigos (tão poucos, meu Deus!...) que podemos chamar assim,  que angariámos na "travessia", e que talvez por também já terem tempo sobrante, também o têm para nós ... às vezes! Mas quando o têm, pelo menos falam a nossa "língua", porque vêm lá muito de trás, caminhando ao nosso lado...

A Larissa, que mais que uma empregada é uma grande amiga, dizia-me ontem (nos muitos desabafos que trocamos, mercê dos anos que já nos "pertencemos," e de tudo quanto ela já viveu connosco na nossa família ), dizia-me, como pessoa culta, muito sensível e só que é, sentir-se cada vez mais desenraizada em Portugal, mais desenraizada por onde tem andado; mas acrescentava... "se eu regressar à Ucrânia, que é o seu ar, o seu chão, o seu útero... não tenho ninguém para me abrir aquela porta ... ninguém me espera já, afinal!"...

O Mundo é demasiado grande para a Larissa, o seu sofrimento fá-la sentir-se pertença de lugar nenhum... tantas estradas e encruzilhadas à sua frente, e o olhar da Larissa perde-se, se calhar, nas brumas daquela Ucrânia, quando a avó ainda a vestia de lacinhos, e a mimava...

Eu costumo dizer que há um sonho que tenho que tenho que realizar.
Quando a minha mãe já por cá não estiver, e eu portanto fizer muito pouca falta a quem quer que seja, vou por aí... vou procurar um poiso, vou procurar outro mundo, outras gentes, outro ar e outro céu ... Fundamentalmente, vou procurar...
Este projecto tem-me empolgado longamente, e como sabem, eu preciso  ter metas para que viva e sorria todos os dias. Criei-o portanto, e quase já o passava e repassava ao pormenor, como seria, como faria, como me sentiria, nesta aventura adolescente, descomprometida e solta.
Sem dúvida interessante, enriquecedora, gratificante...

De há uns dias a esta parte, não me perguntem porquê, pareço ter poisado duma viagem de balão, numa qualquer planície, donde toda a perspectiva do mundo se anulou.
Cheguei de um céu azul e lindo, dum céu que me dava lá do alto todo o mundo aos meus pés... e poisei...
E parece que o balão esvaziou e o céu escureceu, como este Agosto de hoje.... O  meu projecto fechou.
Não percebo porquê, mas de repente comecei a perceber que se calhar, eu apenas busco, faço tentativas desesperadas de encontrar talvez nem eu saiba o quê!
Sempre remendos de fora para dentro, para me coser os rasgões da alma, sempre na esperança de que talvez, esteja aqui, ou ali, ou além, a minha realização, a minha "cura"... e depois tudo é, provavelmente, infantil, imaturo, utópico...inconsistente...
E lá se foi o meu balão.... O pior é que não sei se terei força para voltar a pô-lo no ar ...

Eu, sempre igual a mim própria ....

Anamar