segunda-feira, 6 de julho de 2009

"DESCULPEM QUALQUER COISINHA"!...



Não ando com pedalada p'ra estas coisas...

Não ando nem com inspiração para escrever nada, porque, dá-me ideia, olho mas não vejo, ou seja, a bem dizer, ando um pouco "robotizada" no meio da multidão.
Não sei se é cansaço, desmotivação, descrer ou a remota sensação dentro de mim, que caracol, "eremita" ou avestruz, me serviriam na perfeição ser, para ficar "out" neste mundo de não valer a pena...

Talvez seja só cansaço mesmo, na recta final de mais um ano de trabalho a "esbaldar-se" em trabalhos em catadupa, cerca de um mês que me falta para as almejadas férias.

E por férias mesmo, me ocorreu escrever estas insípidas linhas que aqui deixo.
Podia chamar-lhes "as férias dos portugueses", "o sonho possível" ou "o pesadelo vivido"...qualquer coisa que há muito já não constatava ocorrer e que lembra o meu tempo de mocinha, nas primeiras idas à praia em autonomia paterna, inserida no grupo de amigos.

Ora bem...De que falo mesmo??

Neste sábado, ao regressar do pequeno almoço no Escudeiro, e porque a minha praceta é zona de interface de autocarros para os mais diversos destinos, deparei-me com um cenário que me é de facto familiar, mas de que já não dava conta há muitos anos.
Filas e filas de famílias inteiras, roupas reduzidas, chapéus ou bonés nas cabeças, sobretudo dos putos logo de manhã já ligados a "pilhas", chapéus de sol debaixo dos braços ou ao ombro do "chefe da orquestra", e geleiras nas mãos, certamente bem aviadas. Pelo menos, o ar derreado com que aqueles que as transportavam exibiam, assim o fazia supor...

Para além disso, o semblante afobado, a correria, a agitação e a "algarviada" que por ali se ouvia, deixavam adivinhar a ansiedade da chegada às areias, a pressa de mergulhar o pé na água fria ou o desespero da perda de mais uns raios de sol, até que os areais da Caparica, da Torre ou de Algés, fossem alcançados.

Os portugueses a fazerem as "férias da crise"...
Os portugueses a fazerem de conta que as Caraíbas, os Brasis ou as Maldivas estavam por ali, à mão de semear, no desenho que a imaginação lhes emprestava...
Os portugueses, sem "cheta" nos bolsos, depois de um ano de trabalho, a fazerem de conta que estão felizes com as férias de que os acharam merecedores...

Que importa que seja p'ra lá de tempo o itinerário de ida, e p'ra lá de tempo o itinerário de vinda (mais penoso ainda pelo esfalfanço, pelos escaldões na ânsia do "bronze", pelas criancinhas que já não regressam pelo seu pé e são jogadas nos ombros...)?!...
Que importa que o "bandulho" tenha sido cheio de sandwiches e mais sandwiches, croquetes, sumóis e trinaranjus, "bjecas" e uns iogurtezinhos...porque qualquer vitualha numa esplanada está p'las horas da morte?!...
Que importa que amanhã a odisseia recomece e que os dias se esvaiam rápido, anunciando o fim das "férias"...Que ao chegar a casa ainda se vá fazer a janta, mesmo que o corpo suplique cama?!...
...se este é o sonho que nos é permitido sonhar, se este é o luxo que nos é permitido usufruir, ou se este é o "pesadelo" que nos foi destinado, porque somos pobres, porque somos este povo acomodado e paciente, porque nascemos neste bairro económico, somos filhos desta turba que não sabe o que são remunerações milionárias, cúmulo de pensões chorudas, "offshores" ou coisas no género!!...

Menos mau que temos este sol, este céu azul, este marzão e esta costa pródiga...e deles ainda não nos cobram impostos!!...

Anamar

5 comentários:

Anónimo disse...

"Não ando nem com inspiração para escrever nada,..." Sinceramente...quanta inspiração, quanto talento.
Podia escrivinhar um longo texto acerca do serão que proporcionaste a mim e a outras 22 pessoas, teus pares, mas, fico-me com esta frase curta mas sincera: Muito obrigada por arranjares tempo e disponibilizares o teu talento para, durante breves minutos, nos transportares a um mundo tão real como imaginário, cheio de sabedoria e muita alegria.

beij
Maria Romã

anamar disse...

Maria Romã
Não tenho palavras depois do que li.
Obrigada, de coração...
Aquilo lá foi uma brincadeira para tornar o nosso serão ainda mais animado.
O importante mesmo, foi o que ali "passou" entre os colegas/amigos/companheiros...
Para descrever isso sim, não há palavras por mais eloquentes e sábias.
São "cordelinhos invisíveis de afecto", como diz a Lena, que por vezes pensamos não existirem...mas EXISTEM!!
Um enorme beijinho para ti
Anamar

Anónimo disse...

Olá Ana
A tua descrição descreve bem o absurdo que afinal é a completa normalidade.Nós reagimos como animais.Face a outputs externos, munimo-nos de geladeiras cheias de imaginação-bejecas,coca-colas-autocarros com muitas pessoas em pé,cheias de suor, mas que cheiram a praia.A bolas a rolar na areia, a crianças cheias de imaginação.
Fizeste-me lembrar O Albert Camus no livro "O estrangeiro".Como ele descreve as tardes de Verão em Oran e o cheiro a sal do cabelo da namorada na sua almofada.Fizeste-me também lembrar o Ary dos Santos quando no poema "A fotografia" falava das férias como itinerários de desespero.
No fim de contas, nesta versão de férias anti-gripe A, fica mais uma vez a escritora que és tu.

Um beijinho

Fernando

merryl disse...

Foi fantástica aquela noite de convívio. São dessses "pequenos" apontamentos que se vão construindo as lembranças que hão-de alimentar os nossos tempos futuros.
Beijinhos.

anamar disse...

Olá Merryl (?)
Foi, de facto foi muito bom...
É sempre um carregar do nosso "pacemaker" dos afectos, quando o ano se encerra e nos oferece coisas deste género. Serão certamente estes retalhinhos que nos adoçarão a alma um dia mais tarde...
Beijo
Anamar