quinta-feira, 26 de julho de 2012

" DE NOVO ... "


Retomo aqui neste "canto", o psiquiatra  Pedro Afonso, de que coloquei um texto assaz interessante, há escassos dias.

Tive acesso a uma outra reflexão do mesmo profissional de saúde, sobre um tema que já abordei e explorei com alguma exaustão : As redes sociais na Net,  o papel que cada vez mais desempenham, e o espaço que ocupam  na vida dos cibernautas, de todas as idades e estratos sociais.

E porque é de facto um assunto que me mexe, e porque achei interessante a análise feita, que de algum modo corrobora a minha opinião a propósito ... deixo aqui o texto publicado pelo referido médico , para vosso conhecimento e reflexão.

Redes sociais não, obrigado


Pedro Afonso, Médico psiquiatra, Público,15-03-2010


Ninguém pode ficar indiferente ao enorme sucesso das redes sociais da Internet,
contando já com milhões de utilizadores. Mas que riscos e consequências estarão
ligadas a esta nova forma de relacionamento social virtual? Sem cair em
estereótipos, e em fundamentalismos redutores, julgo que há uma tendência neste
recente instrumento de relacionamento humano introduzido pela Internet.
Neste caso parece existir uma busca pela auto-valorização e uma necessidade
exibicionista de atenção e admiração. Esta última característica torna-se bem
visível pela forma como se arrecada "amigos", aos milhares, como se fossem
troféus de caça social. Portanto, na amizade, desvalorizou-se a qualidade para se
dar a primazia à quantidade, o que não é mais do que um reflexo da sociedade de
consumo nas relações sociais.
As relações sociais virtuais da Internet são bastante diferentes das relações sociais
reais. Alimentam-se fantasias e cada um mostra aquilo que tem de melhor: a
beleza, o êxito, as férias fantásticas, os momentos de felicidade, etc. Habitualmente
o indivíduo promove-se na rede social como uma pessoa de sucesso, expondo as
suas vitórias e ocultando propositadamente os seus fracassos. É nesta imensa
revista cor-de-rosa, irreal e fantasiosa, que as pessoas se relacionam umas com as
outras, evitando as regras da verdadeira rede social, bem mais complexa e difícil.
Seja como for, parece não existirem dúvidas de que se criou um certo consumismo
social, sem esforço, e acessível a alguns toques no teclado do computador. Porém,
as redes sociais da Internet, no sentido em que são redes virtuais e menos
complexas, podem surgir como uma forma de resistência à aquisição de uma
verdadeira aprendizagem social, promovendo a regressão e a imaturidade.
A amizade criada no mundo real demora tempo a consolidar-se e passa por
diversas provas que nada têm a ver com as pseudo-amizades do mundo virtual. Por
essa razão, nenhum relacionamento através do computador substituiu a
experiência da presença humana: a troca de olhares, a expressão facial, os gestos,
o tom de voz, etc.
As redes sociais favorecem o empobrecimento do relacionamento social - criandose
novas formas de solidão - porque as relações pessoais reais são mais ricas e
profundas.
Não se pode discutir as redes sociais da Internet sem falar em segurança. Por
diversas vezes, as polícias têm alertado para os perigos de se divulgarem
informações pessoais na rede. Por exemplo, uma vez colocada uma fotografia
pessoal na rede social, ela poderá ficar na Internet para sempre, perdendo-se por
completo o seu controlo. Curiosamente, este fenómeno reflecte um paradoxo.
Numa altura em que se investe cada vez mais em segurança, através da
videovigilância, alarmes, etc., na Internet as pessoas expõem-se cada vez mais,
abrindo as portas da sua vida privada, sem reflectir nos perigos que isso
representa.
Importa sublinhar que as redes sociais reflectem o que há de melhor e pior na
natureza humana, com a diferença de possibilitar aos indivíduos perturbados
psiquicamente - que existem em largo número em todas as sociedades - actuarem
facilmente dissimulados, diminuindo a possibilidade de serem detectados. As redes
sociais tornam-se assim uma ferramenta útil para as mais vis maquinações. Um
magnífico caldo de cultura para que várias mentes perigosas possam florescer e
movimentar-se facilmente na cobardia do anonimato, encorajados pela diminuição
dos vários mecanismos de prevenção e segurança de que a sociedade dispõe.
Espantosamente, milhões de pessoas passam cada vez mais tempo nesse mundo
virtual agarrados obsessivamente ao computador. Este é um sinal preocupante de
desumanização da nossa sociedade uma vez que esta emigração maciça para o
mundo virtual pode revelar-se como um início de psicose colectiva: como esta
realidade não é conveniente, as pessoas refugiam-se noutra imaginária.
O crescimento vertiginoso das redes sociais demonstra que o Homem, outrora
sonhador, com ideias e valores, está a capitular. Desistiu de lutar por uma
sociedade melhor, cedeu ao facilitismo, e renunciou viver neste mundo. Por tudo
isto, adaptando um slogan antigo, talvez valesse a pena dizer: redes sociais não,
obrigado.

Anamar

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