domingo, 22 de julho de 2012

O MUNDO DOS " MORTOS-VIVOS "


 Julho outra vez !...

Já aqui referi ser um mês muito marcante para mim.
Dentro de uma semana fará vinte anos que o meu pai partiu, fará três que o Óscar também me deixou.
Não estou a por em paralelo obviamente as duas perdas ; mas pelo facto do Óscar ter sido meu companheiro de cerca de quinze anos, e por me ter sido oferecido para colmatar a primeira grande perda da minha vida ( tão mal fiquei ), o Óscar, como seguramente qualquer animal que eu tenha ou tenha tido, transformou-se em mais um membro familiar.
Por isso, a sua ausência é sentida por mim, profundamente, até hoje.
O mês de Julho, no meu espírito, está associado a um mês de perdas, a um mês em que a Vida já me defraudou de muitas maneiras.

A nossa existência sempre está irremediavelmente ligada a perdas.
Não há como não !...
Os caminhos que percorremos, foram desenhados para que na viagem fossem sendo deixados em desvios, em sombras de árvores, ou mesmo em esquinas, os nossos pertences, os nossos anigos, os nossos amores.
É inevitável que assim seja, e consequentemente nos nossos percursos, sem apelo nem agravo, coleccionamos "mortos-mortos", mas também coleccionamos "mortos-vivos" ...
Estes, são aqueles que "contra natura", por desígnio de destinos, vamos abandonando ou nos vão abandonando, pela estrada.

Ambos são processos muito destrutivos, muito dolorosos, muito traumatizantes.
São processos que sempre nos amputam, que sempre carregam consigo pedaços de nós, que sempre nos empobrecem, que sempre nos deixam órfãos ...
Depois de uma perda ou de um abandono, nunca mais ficamos os mesmos, nunca mais seremos a pessoa inteira que éramos ;  isto, porque quem passa por nós, deixa, mas também leva boa parte de nós mesmos.

Os "mortos-mortos", como lhes chamei, são aqueles que por razões da inevitabilidade da vida, se vão, nos deixam, contra vontade, seguramente contra vontade, mercê da impotência que nos transmite o que não pode ser nunca,  mutável ou irreversível.
Tudo se soluciona, excepto a morte ... diz-se.
E este abandono, aquele desespero, aquela solidão, aquele sofrimento, aquela incapacidade mortificante, que sentimos quando acompanhamos alguém na sua última viagem, mata-nos ...

Mas percebemos que o inimigo que tivémos à frente, era o único contra o qual não podemos, não pudémos lutar.
Não existem armas para ele ...
Nem a súplica, nem a esperança, nem a fé, nem sequer a revolta, a raiva, o senso de injustiça  às vezes ... nem sequer o AMOR ...
Esse, que move montanhas, também dizem, é inútil perante o determinado.
E por isso, resta-nos o quê ? Abrir os braços, que entretanto já perderam as forças, e deixar ir em paz, aquele ser, como que arrastado numa corrente em que o segurámos enquanto deu, enquanto pudémos ... e esperar que o tempo, o tal milagreiro das causas impossíveis, aplaque, colmate, abata a dor, à medida que a terra também abate, lá no campo santo, ou à medida que o vento leve à terra de novo, o pó que afinal sempre fomos ...

Depois, nas nossas vidas existem os "mortos-vivos", como dizia.
Esses são perdas absolutamente desesperantes de gerir, mais ainda de aceitar.
Eu diria que esses abandonos são de uma agressividade incomparavelmente maior, que a causada pelos acontecimentos inevitáveis dos destinos.
Esses são "mortos" que morrem a conta-gotas, nunca morrem de uma só vez, às vezes simplesmente NUNCA morrem mesmo ...
Para esses, o luto é eterno ;  não há terra, não há vento, não há argumentação que nos ampare a alma, nos acaricie o coração ... porque afinal esses "mortos" estão mortos, estando vivos, bem vivos ...  mais perto, mais longe, mas vivos!

Essas partidas, esses abandonos que provocamos ou nos provocam, matam ...  esses matam mesmo, porque nos sangram até nos exaurirmos, e são uma chaga que NUNCA sara, uma ferida que nunca cicatriza.
E são-no, porque invariavelmente são provocados unilateralmente, por razões por vezes incompreensíveis, para as quais sempre achamos que haveria solução, que não precisariam ( feito "almas penadas" ), passarem a assombrar-nos a existência.
Esses são os amigos, os amores, as paixões, os afectos todos, que nos foram ficando pelos caminhos, e de que tivémos que nos distanciar, olhando sempre para trás, até dobrar a última volta de estrada ...
Esses são os desencontros, as incompreensões, as razões às vezes inexplicáveis ...
Mas sempre "abandonos" que consideramos injustos, doídos, devastadores, que nos maltratam, que nos secam, que nos destroem, que nos aniquilam ...
E para esses pareceria haver outra solução ou saída ... sempre nos parece poder haver ...

Mas não !
São "mortos" que se "recusam" a ir, cujo luto, por isso mesmo, é interminável ;  e mesmo quando pensamos que já estamos a "aliviá-lo", como se diz no Alentejo ... é mentira !
Se olharmos a preceito e com honestidade para dentro de nós próprios, lá estão os seus "fantasminhas" a povoarem-nos dias e noites, a "atazanarem-nos" a propósito de tudo e de nada ... de uma música, de uma palavra, de um momento, de uma flor, de uma pedra ... sei lá !...
Continuam grudados em nós ... e doem, doem horrores, e não há analgésico que lhes valha ...
Fazer o quê ?
Como lutar contra o que parece uma ironia de mau gosto do destino, se nem sequer "livro de reclamações" existe ??!!...

Esses só somem, se os fizermos passar de "mortos-vivos" a "mortos-mortos", nos nossos corações, no nosso ser ... no nosso espírito.
Mas esse é um processo tão difícil, tão complicado, tão independente do racional e da vontade, do lógico e do objectivo, que penamos, penamos, enquanto que a nossa alma entra em escuridão adensante, que parece não ter fim ou solução, e que tirando-nos a vontade de lhes sobreviver, nos inculca uma vontade de desistência ( tal o cansaço e exaustão ), que somos mesmo nós próprios, que queremos tornar-nos "mortos-mortos" !!!...

Anamar

6 comentários:

Anónimo disse...

Permita-me que lhe diga:
Pensamento Positivo Sempre.
Pois o Mundo é como uma bola colorida nas mãos de uma criança.
Poema do seu amigo Antonio Gedeão.

anamar disse...

Frases feitas esgotam a eficácia...

Não sei muito bem é o que é que farei se pensar positivamente, e as adversidades persistirem...

Será que me convenço mesmo que as adversidades até poderão deixar de o ser???!!!

Não creio!...

Um abraço

Anamar

Anónimo disse...

Minha cara amiga,
Tem que ter uma ferramenta que a ajude a ultrapassar as adversidades, por isso "Pensamento Positivo" poderá ajudá-la.
Lembre-se para muitos o copo está meio cheio, para outros meio vazio é uma questão filosófica interessante mas concreta. Na verdade dos factos muitos recorrem a antidepressivos e a psiquiatras, outros a bruxas e coisas semelhantes. Até existe e esta receita para mim é maravilhosa, quem vá para os Trópicos meditar. Assim, desde que o remedio funcione, que mais se pode ambicionar na vida ?

anamar disse...

Que mais????

Pois... ficar nos trópicos para o resto da vida....rsrsr

Para mim acho que seria remédio santo, porque quanto ao resto...panaceias que refere e outras..."quem torto nasce, tarde ou nunca se endireita"....certo?

Obrigada e boa noite

Anamar

Anónimo disse...

Minha Amiga,
Está vendo? afinal concorda comigo.
Será que tambem não me quer convidar para ir para os Trópicos?
Constou-me que faz parte dos seus sonhos comprar uma casa de madeira debaixo dos coqueiros mesmo junto à linha de agua, algures num paraiso tropical.
Será que estou errado?
Espero que ultrapasse os seus "fantasmas" em breve.
Uma boa noite

anamar disse...

De facto, uma casa muito simples frente ao mar, com o silêncio, os pássaros, os coqueiros e o calor sempre presente, um sonho que acalento.
Boa música, papel para escrever, livros para ler, uma rede entre dois troncos....e paz, muita paz!!!

Acho que os "fantasmas" nesse paraíso não entrariam...

Comigo levaria/levo sempre todos os que me são caros.

Um abraço

Anamar