Este texto não é meu.
Achei-o contudo digno de divulgação, reflexão, muita, muita análise séria.
Ele constata infeliz e objectivamente, a realidade que vivemos nos tempos que correm ... Mas ele também, e sobretudo, obriga-nos a colocar a mão na consciência, obriga-nos a olharmo-nos de frente e sopesarmos séria e honestamente as nossas responsabilidades, omissões, irresponsabilidades tantas vezes, como pais, filhos, professores ... concidadãos, deste espaço que dividimos e se chama sociedade colectiva, num espaço ainda maior que se chama Terra !
Agradeço a quem me fez chegar este artigo ao conhecimento.
Bem-haja!
Achei-o contudo digno de divulgação, reflexão, muita, muita análise séria.
Ele constata infeliz e objectivamente, a realidade que vivemos nos tempos que correm ... Mas ele também, e sobretudo, obriga-nos a colocar a mão na consciência, obriga-nos a olharmo-nos de frente e sopesarmos séria e honestamente as nossas responsabilidades, omissões, irresponsabilidades tantas vezes, como pais, filhos, professores ... concidadãos, deste espaço que dividimos e se chama sociedade colectiva, num espaço ainda maior que se chama Terra !
Agradeço a quem me fez chegar este artigo ao conhecimento.
Bem-haja!
A trapeira do Job
José António Barreiros, advogado
"Isto que eu vou dizer vai parecer ridículo a muita gente.
Mas
houve um tempo em que as pessoas se lembravam, ainda, da época da
infância, da primeira caneta de tinta-permanente, da primeira bicicleta,
da idade adulta,
das vezes em que se comia fora, do primeiro frigorífico e do primeiro
televisor, do primeiro rádio, de quando tinham ido ao estrangeiro.
Houve
um tempo em que, nos lares, se aproveitava para a refeição seguinte o
sobejante da refeição anterior, em que, com ovos mexidos e a carne ou
peixe restante, se fazia "roupa velha". Tempos em que as camisas iam a
mudar o colarinho e os punhos do avesso, assim como os casacos, e se
tingia a roupa usada, tempos em que se punham meias-solas com
protectores. Tempos em que ao mudar-se de sala se apagava a luz, tempos
em que se guardava o "fatinho de ver a Deus e à sua Joana".
E
não era só no Portugal da mesquinhez salazarista. Na Inglaterra dos
Lordes, na França dos Luíses, a regra era esta. Em 1945 passava-se fome
na Europa, a guerra matara milhões e arrasara tudo quanto a selvajaria
humana pode arrasar.
Houve
tempos em que se produzia o que se comia e se exportava. Em que o País
tinha uma frota de marinha mercante, fábricas, vinhas,
searas.
Veio
depois o admirável mundo novo do crédito. Os novos pais tinham como
filhos uns pivetes tiranos, exigindo malcriadamente o último modelo de
mil e um gadgets e seus consumíveis, porque os filhos dos outros
também tinham. Pais que se enforcavam por carrões de brutal cilindrada
para os encravarem no lodo do trânsito e mostrarem que tinham aquela
extensão motorizada da sua potência genital. Passou a ser tempo de gente
em que era questão de pedigree viver no condomínio fechado, e sobretudo dizê-lo, em que luxuosas revistas instigavam em couché os feios a serem bonitos, à conta de spas e de marcas, assim se visse a etiqueta, em que a beautiful people era o símbolo de status, como a língua nos cães
para a sua raça.
Foram anos em que o Campo se tornou num imenso ressort de Turismo de Habitação, as cidades uma festa permanente, entre o coktail party e a rave. Houve quem pensasse até que um dia os Serviços seriam o único emprego futuro ou com futuro.
O
país que produzia o que comíamos ficou para os labregos dos pais e
primos parolos, de quem os citadinos se envergonhavam, salvo quando
regressavam à cidade dos fins de semana com a mala do carro atulhada do
que não lhes custara a cavar e às vezes nem obrigado.
O
país que produzia o que se podia transaccionar, esse, ficou com o
operariado da ferrugem, empacotados como gado em dormitórios, e que os
víamos chegar mortos de sono logo à hora de acordarem, as casas
verdadeiras bombas-relógio de raiva contida, descarregada nos cônjuges,
nos filhos, na idiotização que a TV tornou negócio.
Sob
o oásis dos edifícios em vidro, miragem de cristal, vivia o mundo
subterrâneo de quantos aguentaram isto enquanto puderam, a sub-gente. Os
intelectuais burgueses teorizavam, ganzados de alucinação, que o
conceito de classes sociais tinha desaparecido. A teoria geral dos
sistemas supunha que o real era apenas uma noção, a teoria da informação
substituía os cavalos-força da maquinaria pelos megabytes de RAM
da computação universal. Um dia os computadores tudo fariam, o
Ser-Humano tornava-se um acidente no barro de um oleiro velho e
tresloucado que, caído do Céu, morrera pregado a dois paus, e que
julgava chamar-se Deus, confundindo-se com o seu filho e mais uma
trinitária pomba.
Às
tantas, os da cidade começaram a notar que não havia portugueses a
servir à mesa, porque estávamos a importar brasileiros, que não havia
portugueses nas obras, porque estávamos a importar negros e eslavos.
A
chegada das lojas-dos-trezentos já era alarme de que se estava a viver
de pexisbeque, mas a folia continuava. A essas sucedeu a vaga das lojas
chinesas, porque já só havia para comprar
«balato». Mas o festim prosseguia e à sexta-feira as filas de trânsito
em Lisboa eram o caos e até ao dia quinze os táxis não tinham mãos a
medir.
Fora
disto, os ricos, os muito ricos, viram chegar os novos ricos. O ganhão
alentejano viu sumir o velho latifundário absentista pelo novo turista
absentista com o mesmo monte mais a piscina e seus amigos, intelectuais,
claro, e sempre pela reforma agrária, e vai um uísque de malte, sempre
ao lado do povo, e já leu o New Yorker?
A
agiotagem financeira, essa, ululava. Viviam do tempo, exploravam o
tempo, do tempo que só ao tal Deus pertencia, mas, esse, Nietzsche
encontrara-o morto em Auschwitz. Veio o crédito ao consumo, a
Conta-Ordenado, veio tudo quanto pudesse ser o ter sem pagar. Porque
nenhum Banco quer que lhe devolvam o capital mutuado, quer é esticar ao
máximo o lucro que esse capital rende.
Aguilhoando pela publicidade enganosa os bois que somos nós todos, os Bancos instigavam à compra, ao leasing, ao
renting, ao seja como for desde que tenha e já, ao cartão, ao descoberto-autorizado.
Tudo
quanto era vedeta deu a cara, sendo actor, as pernas, sendo
futebolista, ou o que vocês sabem, sendo o que vocês adivinham, para
aconselhar-nos a ir àquele Balcão bancário buscar dinheiro, vendermo-nos
ao dinheiro, enforcarmo-nos na figueira infernal do dinheiro. Satanás
ria. O Inferno começava na terra.
Claro
que os da política do poder, que vivem no pau de sebo perpétuo do fazer
arrear, puxando-os pelos fundilhos, quantos treparam para o poder,
querem a canalha contente. E o circo do consumo, a palhaçada do crédito
servia-os. Com isso comprávamos os plasmas mamutes onde eles vendiam à
noite propaganda governamental e, nos intervalos, imbelicidades e
telefofocadas, que entre a oligofrenia e a debilidade mental a diferença
é nula. E, contentes, cretinamente contentinhos, os portugueses tinham
como tema de conversa a telenovela da noite, o jogo de futebol do dia e
da noite e os comentários políticos dos "analistas" que poupavam os
nossos miolos de pensarem, pensando por nós.
Estamos nisto.
Este fim-de-semana a Grécia pode cair. Com ela a Europa.
Que
interessa? O Império Romano já caiu também e o mundo não acabou. Nessa
altura, em Bizâncio, discutia-se o sexo dos anjos. Talvez
porque Deus se tivesse distraído com a questão teológica, talvez porque
o Diabo tenha ganho aos dados a alma do pobre Job na sua trapeira. O
Job que somos grande parte de nós."
Anamar
Anamar
4 comentários:
Olá,
Este seu aigo, quer manifestar-lhe a sua admiração pelo texto que publicou.
Na verdade o mesmo retrata na minha opinião algo que as novas gerações nunca sentiram.
Por esse facto, quero render-lhe a minha homenagem por divulgar o texto de um Advogado (José António Barreiros) que é um grande Senhor e curiosamente com obra publicada sobre esponagem em Portugal durante a 2ª Guerra Mundial, a visão critica de uma Sociedade é algo que a minha Amiga, faz com frequencia neste seu Blog e por isso aprecio devidamente o que vai publicando.
Quero calrificar e corrigir os erros ortografia:
aigo=amigo;esponagem=espionagem
clarificar digo
Obrigada pelo seu comentário.
Este meu modesto espaço também tem preocupações culturais, informativas e divulgadoras de tudo o que acho, pertinente e enriquecedor.
Anamar
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