terça-feira, 30 de junho de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - Dia sem número



Mais um dia igual a todos os outros !
Rotinas instaladas numa realidade entediante.  Pairo por aqui.  Não vou dizer que vivo por aqui, porque este torpor cinzento que se abate sem novidade ou notícia, é fastidioso e cansativo.

Hoje não era dia de caminhada.  Nem sequer já a descida à mata, o encontro com o verde, o ar puro, a passarada e os raios de sol intrusivos pelo meio da ramagem, me animam.
Ando por aqui na mesmice de sempre.  Gastou-se  há muito, o "combustível" anímico dos primeiros tempos deste filme a preto e branco.  Hoje, cirando neste périplo demasiado gasto ... apática, distante e desinteressada.
Vou às compras porque devo ir às compras ... Automatizo os gestos, os rituais e os cuidados. De resto, arrasto-me, simplesmente ...
Oiço algumas notícias ... poucas.  Procuro os números, como quem confere a chave do euromilhões ou os bonecos da raspadinha.  Os mortos e os infectados, os que desesperam nos cuidados intensivos, em hospitais que já sabemos super-lotados.
Mas procuro os números sem emoção.  Sem emoção e quase já sem angústia.  Sem angústia e quase já sem medo !...
Indiferença !  Tudo isto se tornou indiferente de mais, para o potencial de coragem, de ânimo e de esperança que parecia termos ...

Oiço falar da América ( a antecâmara do horror ) ... oiço falar do Brasil ( a hecatombe que não gostaríamos de assistir ... ) ... e penso : como estará África ?  Continente de quem ninguém fala ... Países que parecem não interessar nada ... e se calhar não interessam mesmo, nesta distante realidade  de abundância e prosperidade, dos ditos pertencentes ao primeiro mundo !...
O silêncio que se "escuta" deve ser revelador de qualquer coisa ... qualquer coisa muito má, como uma maré negra que avança indomada, pelas praias da vida ...
Mas tudo é muito esquisito !  Eu sinto-me profundamente esquisita !
Tenho a postura do espectador que assiste comodamente da frisa, ao desenrolar de uma película,  que  por  pior  que  seja,  ele  sabe  que  é  só  uma  película  e  ele, um  actor  fora  da  trama !...
Apatia ...  O coração já nem acelera !
Quando as luzes acenderem e a sala se iluminar, tudo não passou de um filme ... e cá fora, espera-nos a normalidade da nossa vida "normal" ...

Sonhar ... talvez ainda nos reste.  Será ?
De preferência, que não seja um pesadelo que nos assombre as madrugadas ... e que a alvorada possa erguer-se límpida e luminosa ... como os dias de um Verão que nos assoma pelas varandas, pelas vidraças, nos céus claros e promissores ...

Tudo é efémero.  Tudo, menos o peso desta devastação mortal !
Tudo, menos a certeza do dia que amanhã vai nascer ... Tudo, menos a luz que se apaga logo ali, no fim desta linha indivisa, e que não nos deixa nem suspeitar o que está para além, no horizonte escuro de um túnel demasiado longo, misterioso e terrífico !...

O Outono não demora.  Como nada demora ... a não ser a espera ...
Notícias novas já vêm outra vez de lá, do oriente, onde tudo começa ... Novas infecções, ameaças de novas, ou outras ... ou a mesma pandemia, mascarada ...
Lá, de onde o sol nasce, onde tudo é delicado, é doce, é sensível ... lá, onde a sabedoria milenar inunda as almas e mostra ao Homem o valor e o poder regenerador da espiritualidade ... lá, onde os silêncios são recolhimento e purificação nos corações desapegados, humildes e em paz ... chega-nos a escuridão, chega-nos o ocaso profundo e a desesperança no renascer ...

Porquê ?!...

Até amanhã !  Fiquem bem, por favor !

Anamar

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