Rotinas instaladas numa realidade entediante. Pairo por aqui. Não vou dizer que vivo por aqui, porque este torpor cinzento que se abate sem novidade ou notícia, é fastidioso e cansativo.
Hoje não era dia de caminhada. Nem sequer já a descida à mata, o encontro com o verde, o ar puro, a passarada e os raios de sol intrusivos pelo meio da ramagem, me animam.
Ando por aqui na mesmice de sempre. Gastou-se há muito, o "combustível" anímico dos primeiros tempos deste filme a preto e branco. Hoje, cirando neste périplo demasiado gasto ... apática, distante e desinteressada.
Vou às compras porque devo ir às compras ... Automatizo os gestos, os rituais e os cuidados. De resto, arrasto-me, simplesmente ...
Oiço algumas notícias ... poucas. Procuro os números, como quem confere a chave do euromilhões ou os bonecos da raspadinha. Os mortos e os infectados, os que desesperam nos cuidados intensivos, em hospitais que já sabemos super-lotados.
Mas procuro os números sem emoção. Sem emoção e quase já sem angústia. Sem angústia e quase já sem medo !...
Indiferença ! Tudo isto se tornou indiferente de mais, para o potencial de coragem, de ânimo e de esperança que parecia termos ...
Oiço falar da América ( a antecâmara do horror ) ... oiço falar do Brasil ( a hecatombe que não gostaríamos de assistir ... ) ... e penso : como estará África ? Continente de quem ninguém fala ... Países que parecem não interessar nada ... e se calhar não interessam mesmo, nesta distante realidade de abundância e prosperidade, dos ditos pertencentes ao primeiro mundo !...
O silêncio que se "escuta" deve ser revelador de qualquer coisa ... qualquer coisa muito má, como uma maré negra que avança indomada, pelas praias da vida ...
Mas tudo é muito esquisito ! Eu sinto-me profundamente esquisita !
Tenho a postura do espectador que assiste comodamente da frisa, ao desenrolar de uma película, que por pior que seja, ele sabe que é só uma película e ele, um actor fora da trama !...
Apatia ... O coração já nem acelera !
Quando as luzes acenderem e a sala se iluminar, tudo não passou de um filme ... e cá fora, espera-nos a normalidade da nossa vida "normal" ...
Sonhar ... talvez ainda nos reste. Será ?
De preferência, que não seja um pesadelo que nos assombre as madrugadas ... e que a alvorada possa erguer-se límpida e luminosa ... como os dias de um Verão que nos assoma pelas varandas, pelas vidraças, nos céus claros e promissores ...
Tudo é efémero. Tudo, menos o peso desta devastação mortal !
Tudo, menos a certeza do dia que amanhã vai nascer ... Tudo, menos a luz que se apaga logo ali, no fim desta linha indivisa, e que não nos deixa nem suspeitar o que está para além, no horizonte escuro de um túnel demasiado longo, misterioso e terrífico !...
O Outono não demora. Como nada demora ... a não ser a espera ...
Notícias novas já vêm outra vez de lá, do oriente, onde tudo começa ... Novas infecções, ameaças de novas, ou outras ... ou a mesma pandemia, mascarada ...
Lá, de onde o sol nasce, onde tudo é delicado, é doce, é sensível ... lá, onde a sabedoria milenar inunda as almas e mostra ao Homem o valor e o poder regenerador da espiritualidade ... lá, onde os silêncios são recolhimento e purificação nos corações desapegados, humildes e em paz ... chega-nos a escuridão, chega-nos o ocaso profundo e a desesperança no renascer ...
Porquê ?!...
Até amanhã ! Fiquem bem, por favor !
Anamar
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