sábado, 11 de abril de 2009

"INEVITAVELMENTE...PÁSCOA"



Não era bem este o tema que conceptualizara abordar esta madrugada.
Logo o farei noutro dia...

Acontece que há pouco, numa localidade aqui bem perto de mim, me deparei inesperadamente com algo que me transportou obrigatoriamente ao tema "Páscoa" uma vez mais, e à minha meninice: a procissão do "Enterro do Senhor".
Foi algo inesperado, porque creio, ser inusitado e quase inexistente já, este tipo de eventos na grande cidade...ou pelo menos, tão incaracterística ela se tornou, que nem damos por eles.

Este ano a Páscoa veio com a Primavera já começada há dias...e embora tenhamos acreditado que ela estava definitivamente instalada, bem nos enganámos, ao sermos confrontados de novo, com temperaturas quase gélidas, com neve em profusão nas terras altas, e com parte do país em alerta amarelo, devido aos fortes nevões, uma vez mais...

Que a Primavera há muito se anunciava, era bem verdade. O tempo fortemente ensolarado, as temperaturas mais do que amenas, a quase ausência de chuvas, os verdes a despontar nos campos e o brotar em pujança dos coloridos das flores que já espreitam por todo o lado desbragadamente, lembram que a renovação está aí a fazer-se, felizmente à revelia das nossas vontades e determinações.
Os brotos ainda fechados, brevemente darão cascatas coloridas, os cheiros dos campos e jardins começam a surpreender-nos e a fazerem-nos sorrir uma vez mais.

Os frios deverão ir embora, a luz de um sol claro e radioso voltará a dar brilho, calor e tonalidades revigorantes a tudo; os corpos "acordam" da letargia imobilista do Inverno, as espécies iniciam os rituais de fecundidade (os trinados, o pipilar, o arrulhar dos pássaros confundem-se com sons de cumplicidade dos humanos), porque... afinal tudo recomeça, a hibernação completou-se, os "degelos" da alma iniciam-se e os fluxos de esperança, de fé, de energia, aquecem-nos o coração...

Sim, porque ainda que a "invernia" tenha sido escura e tenebrosa, sempre acreditamos no ciclo da vida, em qualquer coisa nova, em qualquer milagre que se irá operar, em qualquer renascimento ou ressurreição...só porque a Primavera voltou uma vez mais...
Isso, se somos jovens, menos jovens, ou bem "maduros"...
Sempre nos deixamos contagiar por essa bendita "doença"...

"Páscoa", do hebraico "Pessach" - passagem, é a mais importante festa da cristandade.
A Páscoa entre os cristãos, celebra a ressurreição de Cristo, a Sua vitória sobre a morte depois da cricificação (cerca de 33anos d.C).
Páscoa deriva então do nome hebraico da festa judaica comum às celebrações pagãs (passagem do Inverno para a Primavera) e judaicas (comemoração da libertação e fuga do povo judeu escravizado, do Egipto para a Terra Prometida).
Os termos "Easter" (Ishtar) e "Ostern" (em inglês e alemão respectivamente), parecem não ter qualquer relação etimológica com o "Pessach". Relacionam-se estes termos com Eostremonat (nome de um antigo mês germânico), ou com Eostre, deusa germânica relacionada com a Primavera e homenageada no referido mês (segundo um historiador inglês do sé. VII).

Alguns historiadores sugerem que muitos dos actuais símbolos ligados à Páscoa (especialmente os ovos de chocolate, ovos coloridos ou os coelhinhos da Páscoa), são exactamente resquícios culturais da festividade da Primavera, em honra de Eostre, assimilados depois pelas celebrações cristãs, após a cristianização dos pagãos germânicos.
Contudo, sabe-se que já os persas, romanos, judeus e arménios, tinham o hábito de oferecer e receber ovos coloridos, por esta época.
No equinócio da primavera, ocorria o ritual de se pintarem e decorarem ovos (símbolos da fertilidade) e esconderem-se e enterrarem-se nos campos.
Este ritual foi adaptado e assimilado pela Igreja Católica, no princípio do primeiro milénio depois de Cristo...e assim surgiram os "ovos de Páscoa".

O hábito de dar ovos de verdade, vem da tradição pagã e o de trocar ovos de chocolate, surgiu em França. Antes disso e muito remotamente, usavam-se ovos de galinha para celebrar a data.

Na Ucrânia, séculos antes da era cristã, já se trocavam também ovos pintados, com motivos alusivos à natureza, em celebração da chegada da Primavera.
Os chineses e os povos mediterrânicos também os ofereciam, como comemoração da estação do ano. Eram meros presentes, simbolizavam o início da vida e não se destinavam a ser consumidos.
A tradição perpetuou-se durante a Idade Média, entre os povos pagãos da Europa.
Celebravam Ostera, deusa da Primavera, simbolizada por uma mulher que segurava um ovo na mão, enquanto contemplava um coelho (símbolo da fertilidade), que saltitava alegremente à sua volta.

Os cristãos apropriaram-se também da imagem do ovo, para festejar a Páscoa. Pintavam-se os ovos (de galinha, gansa ou codorna), com motivos religiosos, tais como Jesus ou Maria.

Na Páscoa, na Inglaterra (séc. X), os ovos tornaram-se ainda mais sofisticados. O rei Eduardo I presenteava a realeza e os seus súbditos, com ovos banhados a ouro ou decorados com pedras preciosas.

Cerca de oitocentos anos depois, já no séc. XVIII, confeiteiros franceses tiveram a ideia, de pela primeira vez, fazerem ovos em chocolate (iguaria conhecida apenas dois séculos antes na Europa, trazida da recém-descoberta América, onde era considerada sagrada, pelos Maias e Astecas).

Por sua vez, a imagem do coelho surgiu associada à "criação", por ser um animal de fecundidade notória, como se sabe.

Na Rússia dos Czares, a Páscoa era também uma data muito especial; todos se beijavam e festejavam a ressurreição de Cristo, a nova vida que surgia, o renascer da esperança.
O povo trocava entre si ovos pintados, como saudação.
A família real e os nobres da corte, davam-se ovos de ouro e prata, decorados com esmalte e pedras preciosas.

Em 1884, o Czar Alexandre III encomendou ao joalheiro oficial da Corte Imperial russa, Fabergé, um ovo, como presente para a sua esposa, a Imperatriz Maria Feodorovna, contendo uma surpresa, ao critério do joalheiro. Esse primeiro ovo representava uma galinha pondo uma safira. O sucesso na Corte foi estrondoso e assim se iniciou a tradição dos ovos de Fabergé.
A cada ano, o Czar encomendava um novo ovo na Páscoa, para oferecer à Czarina e Fabergé concebia-o com total e incomparável criatividade e arte.

Com a morte do Imperador, seu filho, Nicolau II, prosseguiu a tradição, encomendando por ano dois ovos, um para sua mãe e outro para a sua esposa, Alexandra.
O ovo anual constituía sempre uma enorme surpresa para a família imperial e para toda a corte.
Alguns celebravam temas íntimos da família, outros honravam eventos importantes do Estado; todos eram pequenos, delicados, graciosos, com minúcia...preciosos!
O ovo da coroação (1897), com diamantes, rubis, platina, ouro e cristal de rocha, tinha dentro a réplica da carruagem que transportara a Czarina Alexandra, pelas ruas de Moscovo, aquando das festividades da coroação de Nicolau II.

Por serem exclusivos e caprichosamente elaborados, estes ovos tornaram-se peças valiosíssimas. Com cerca de 13 cm, cada ovo levava o ano inteiro a ser confeccionado, desde o desenho original, o corte, lapidação das pedras e todos os detalhes. Tudo feito em rigoroso e absoluto sigilo.
Produziram-se ao todo, cinquenta e seis obras-primas, entre 1885 e 1917.
Com a Revolução Russa em 1917, o tesouro foi confiscado pelos bolcheviques e disperso.
Hoje não se conhece o paradeiro de todos os ovos de Fabergé, feitos para a família imperial. Até 1998, haviam sido localizados 44 destes exemplares.
Em 2002, notícias internacionais davam conta que um ovo imperial fora arrematado num leilão da Christie's por 9,6 milhões de dólares...

E pronto, já me alonguei que chegasse.

Esperando que troquem entre vós muitos ovos desta Páscoa, florida por uma Primavera que em perfeita comunhão, resolveu inundar de cheiros, cores e alegria estes nossos dias, resta-me desejar-vos uma vez mais...

BOA PÁSCOA
OSTERN (alemão)
BAZKO (basco)
PASKHA (búlgaro)
PASQUA (catalão)
PASCUA (espanhol)
PÂQUES (francês)
EASTER (inglês)
PASKA (islandês)
CÁISG (irlandês)
PASQUA (italiano)
PASKHA (russo)......................etc, etc...

OVOS DE FABERGÉ:

































Anamar

sábado, 4 de abril de 2009

"CÂNTICO NEGRO"


José Régio 1901 - 1969

Nesta madrugada de silêncios, de solidão, de ausências, em que a vida parece que ficou toda lá fora, para lá desta redoma, refúgio, útero, que são as quatro paredes "protectoras" do meu quarto, a minha única e última ligação ao Mundo, parece ser este computador, objecto virtual que tenta criar para mim, uma realidade ficcionada, falsa, mentirosa, inexistente, obviamente virtual também.

Porque, virtual é tudo o que eu imagino que a vida seria e não é...
Porque virtuais eram as pessoas que inventei na minha cabeça, e não são...
Virtual era a paz que imaginei alcançar, a sabedoria que julguei adquirir, as realizações que me pareceram atingíveis, os sonhos que acreditei poderem não ser virtuais...e esses sim, eram na realidade virtuais mesmo...

Não sei se sou utópica, se não aprendi a viver, se estou doente na alma e no corpo, se estou exausta e me sinto sem forças para chegar à praia ali tão perto...não sei!!
"Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Eu tenho a minha Loucura ! A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou"...

Como diz José Régio neste Cântico Negro que aqui vos deixo..."Não sei por onde vou, não sei para onde vou...
- Sei que não vou por aí!!"

Um amigo (obrigada Filipe), fez o favor de me enviar este maravilhoso poema, grito no escuro, de alguém que tomo como um "outsider" assumido, alguém marginalizado de parâmetros instituídos, alguém que refuta o estereotipado...José Régio.

Como declamadora do poema escolhi Bethânia, para mim, incontestada referência como mulher, como "diseuse", como uma fortaleza, um "animal" de palco.
Bethânia é, da cabeça aos pés, um "amontoado" de nervos e músculos, que à flor da pele transpiram autenticidade, beleza, sensibilidade, garra, força e alma, capazes de pegarem o Mundo pelos cornos.
É neste misto força-fragilidade, suavidade num vozeirão que nos arrepia, que aquela cabeça provocadoramente erguida se impõe, e deixa jorrar o vulcão de sentimentos, com que vive o sentimento de cada frase que declama ou canta...

E por tudo isto, estando a noite lá fora bem negra, estando a vida aqui dentro mais negra ainda...fica o "Cântico Negro" de José Régio...para se beber até à exaustão...

Que ao menos se salve Maria Bethânia!!...



Anamar

quinta-feira, 2 de abril de 2009

"A VIDA E AS SOMBRAS"



O sol pôs-se há pouco, lá longe, por detrás da torre incaracterística da igreja deste amontoado de casario, que só não me sufoca, porque, também ele fica lá longe e não atinge a altura do meu sétimo andar.

O sol pôs-se num clarão entre o ouro e o laranja, nesta quinta feira sem história, por falta de história nestes dias de pausa escolar.
Era uma "fogueira" no céu já pálido, deste fim de dia, quase já lusco-fusco.
Era uma "explosão" de amarelo-ouro, e o ouro-amarelo do sol, transportou-me à aguarela pincelada por quem sabe, de uma beira de estrada, ou de uma encosta embrulhada nas mimosas em flor, deste início de Primavera, nestes Abris que nunca nos defraudam.

E pensei em duas coisas que se associam, neste esgar destemperado de ideias:

Lembrei, como ao longo dos anos lutei em vão, para deter uma mimosa, uma só chegaria, em quaisquer três palmos de terra que então eram meus.
"A mimosa é uma "praga", a mimosa liquida toda a água dos terrenos onde vive...a mimosa "mata" outras espécies"...

E dessa forma, passei a parar muitas e muitas vezes em bermas de estrada, para colher braçadas de flores, de mimosas que não são de ninguém, para sorver até ao coração (que é a minha tela disponível para desenhar sonhos), o aroma inigualável da generosa natureza, para me "esbaldar" até ficar prenhe, daquele "mar" dourado, que homem nenhum ousou copiar.

A segunda coisa em que pensei, prende-se exactamente com esta tão auspiciosa quanto vazia solidão, gerada nestes fins de tarde, nestes luscos-fuscos que me impregnam a alma duma melancolia mansa, com que não sei lidar...

O sol a descer, aquele azul-violeta pálido a instalar-se, a minha gaivota a apagar a silhueta esfíngica, procurando guarida noutras paragens... até que a escuridão começa a baixar... eu sentada frente a uma janela (que até parece ter grades), deixam-me assim... vazia, incapaz, desairosa, inerte...
Como será então daqui a algum (já não muito) tempo, quando os dias terminarem sempre e só, em penumbra letal, com os telhados a desaparecerem no fechar do céu??!!...

A propósito de lusco-fusco, deixo aqui um texto ficcionado na madrugada passada, (eu, que parece que estou "entupida" de palavras e que ultimamente não consigo soltar a torrente, e apenas escrevo banalidades como estas)...

"O lusco-fusco é a varanda da noite e a noite a ante-câmara da madrugada...
Essa, então, a mansarda dos sonhos, onde vagueio com braçadas de sardinheiras por entre os dedos.
A gaivota que plana leva-me até lá, onde de nada se vive...ou de nada se morre...
Ao lusco-fusco as toupeiras têm olhos...Eu corro até ti, olho-te...somos dois estranhos já...
Quero dar-te uma flor, mas já as fui perdendo no voo alvoroçado...
Julguei que viveria...
mas por nada se morre...ao lusco-fusco!"


Anamar

segunda-feira, 30 de março de 2009

"AS MINHAS PÁSCOAS"

 


      NOTA:  APERCEBI-ME QUE ESTE POST, ESCRITO A 30 DE MARÇO DE 2009 NÃO FOI PUBLICADO, PENSO QUE POR DISTRACÇÃO.  SENDO ASSIM, E AINDA QUE FORA DE ORDEM, MUITO FORA DE ORDEM MESMO, AQUI VAI, UM POUCO DESINSERIDO....


«Ladainha dos póstumos Natais»

«Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito»


David Mourão-Ferreira, in "Cancioneiro de Natal"

David assaltou-me o espírito e perturbou-me a paz..."Porque há-de vir uma Páscoa e será a primeira em que terei de novo o Nada a sós comigo..."

As minhas Páscoas, que já se diluem pelas curvas das estradas lá para trás, passam por Alentejo, onde há dois resistentes apenas, da ampulheta dos tempos; passam por casa de avós de paredes roliças, chão de tijoleira, mesa a perder de vista (para albergar os tantos que então éramos)...casa alienada, em que a porta, as janelas e o portão incólumes, nos reavivam a mente ao relembrar tudo o que estava por detrás e não está mais...

As minhas Páscoas passavam por ovos, amêndoas, merendeiras, bolos de folha, queijadas, folares em forma de "pintainhos" para a pequenada, numa azáfama de alegria espalhada pela chegada dos ausentes, pela Primavera anunciada, pelo reencontro da célula familiar...

As minhas Páscoas, passavam por vestimenta nova na missa da ressurreição, pelo recolhimento sepulcral e fúnebre, na procissão escura e carregada do "Enterro", pela luz, pela cor, pela ingenuidade carregada nas braçadas de flores dos querubins, que com asinhas e coroinhas, ladeavam os andores engrinaldados de glicínias e flor da Páscoa...no Domingo.
Passavam pela Banda Filarmónica, a rigor, pelas ruas da vila, pelas melhores colchas de seda e damasco dependuradas das janelas, pelos cânticos dos cordões humanos que pedindo ou agradecendo, deixavam consumir uma após uma, as velas de cera, no atapetado de pétalas do empedrado, entre cânticos e louvores...

As minhas Páscoas eram uma avó de lenço na cabeça, e avental em torno da cintura (vestida de negro contrastante com a alvura dos cabelos, presos desde sempre, em carrapito), com um regaço generoso e farto, capaz de ser ninho de todos os netos que a rodeavam; eram uma tia-avó solteirona, com alma de criança entre a criançada... eram pais, eram tios, eram primos...era o ensopado de borrego, os pezinhos, cabrito assado ou favas em profusão de coentrada, num ritual inalterável ano após ano, geração após geração, vida após vida...

As minhas Páscoas hoje, são de figuras pardas, bonequinhos de caixa de música que estacaram lá muito longe, como se lhes tivesse falhado a corda, imobilizados pelo decurso dos tempos, cheirando ao rosmaninho, à esteva ou ao alecrim, que aromatiza os campos nestes tempos de "Ramos", em fim de Quaresma...

As minhas Páscoas foram...as minhas Páscoas pouco são...as minhas Páscoas um dia deixarão de ser...

Tal como David Mourão Ferreira..."Há-de vir uma Páscoa e será a primeira em que se veja à mesa o meu lugar vazio"...

Anamar

quinta-feira, 26 de março de 2009

"AQUELE PITOSPORO..."




«Reparou que o pitosporo estava de novo em flor. Brevemente viriam aquelas noites de Fevereiro em que a brisa lhe traria o aroma inebriante a flor de laranjeira.
É verdade, era de novo quase Primavera...outra vez...mais um ano!...

Fevereiro amanhecera com dias lindos, com dias "gloriosos", de um céu azul transparente e com um sol luminoso e aconchegante. O sol sempre lhe dava que pensar, ou melhor, a ausência deste...sem ele, não poderia viver, sequer vegetar...;
o ciclo biológico repetia-se, a renovação da vida voltava a dar-se, o milagre do recomeço eclodia, sempre espectacular, sempre abismal!...
E o tempo a escoar-se na ampulheta da vida, do destino, e os dias "lá dentro" sempre tão escuros (contrastando com o prodígio da luz no exterior à sua volta...), sempre fastidiosamente iguais.
"Isto está cada vez pior..." pensou...»


A minha praceta tinha um pitosporo, uma palmeira residente há uma vida, e algumas outra árvores...Não muito frondosas, é certo, mas tinha!
Isto foi antes de terem "inventado" um parque subterrâneo, para obviar algumas dificuldades de estacionamento e garantirem (dois em um), votos a multiplicarem-se nas urnas, numas Autárquicas quaisquer. O habitual, claro.

Isto remonta ao tempo em que eu sempre vinha a pé, fossem que horas fossem, do liceu para casa (ainda não tinha sido assaltada).

E era sempre assim...Numa qualquer noite, quando a Primavera ainda só se anunciava, quando a brisa ténue inundava a praceta deserta àquela hora, o pitosporo, promissor nas suas grinaldas de pequenas flores brancas, inebriantes no perfume de flor de laranjeira, de "supetão", "obrigava-me" a parar, a contemplar, a sorver despudoradamente aquele perfume inebriante.

E quase sempre as lágrimas me afloravam os olhos...
Era uma emoção estranha, um misto de surpresa, de gratidão, de encantamento, como se fosse a primeira vez que me dera conta do "milagre"...concluindo nostálgica, que mais um ano passara...

O pitosporo já cá não está, a palmeira velhinha também não...
Arrancaram, sem dó nem piedade, os "ex-libris" da minha praceta...
Nesse dia chorei. Senti-me amputada. Pus no papel o pequeno texto de data incerta, com que iniciei este post, e numa casa que eu tive, num jardim que foi meu, plantei um pitosporo...
Esse, ainda lá está!...

Era meia noite dada, a escola já estava difusa de luzes, deserta de gentes.
Saímos juntas, eu, uma colega e uma aluna com quem ela conversava.
Numa pausa, diz-me a jovem :"Mais um dia, não é verdade"?
Eu silenciei segundos e disse-lhe: "Ou menos um dia...depende da óptica..."
Ela sorriu, como que interiorizando o que eu verbalizara, e disse-me:"Para a senhora talvez menos um, para mim talvez mais um"!
Novamente silenciei mais alguns segundos...Sorri, olhei para ela e respondi-lhe: "Não, menos um dia, tanto para si, como para mim...Desde o dia em que nascemos, que entrámos em contagem decrescente. Começámos a morrer nesse dia!"...

A minha colega, que se tinha afastado um pouco, chegou então. A aluna deve ter pensado para com os seus botões: "Há malucos para tudo!!!..."

E não sabe ela da história do pitosporo!!!...

Anamar

sexta-feira, 20 de março de 2009

"A VIDA TEM DESTAS COISAS..."

Ando por demais cansada...
Mas não é de forma nenhuma aquele cansaço que nos faz ansiar por uma cama perto, desejar "apagar", nem que por escassos dez minutos, ou dizer: "que se lixe o pó! Hoje já não mexo uma palha!"...

Não...
O meu cansaço é aquele cansaço que se traduz por desânimo, desinteresse, falta de vontade até de sorver o sol desta Primavera antecipada, falta de alegria para pular da cama, arregaçar as mangas já com um sorriso no rosto...
Este cansaço que me empurra para uma posição fetal entre lençóis, suspirando que o alarme do despertador se esqueça de me lembrar as horas, é aquilo que vulgarmente os médicos, os cidadãos comuns (que nem carecem ser letrados), chamam de um estado depressivo...

A nomenclatura não me interessa particularmente, mas efectivamente penso que engrosso exactamente o estado de espírito cinzento, cada vez mais cinzento, de, se calhar dois terços deste nosso Portugal.

Sou professora, já o referi muitas vezes, quando ainda me sentia "Padeira de Aljubarrota" no meu meio profissional, quando ainda exultava com o que fazia e não arrastava grilhões aos pés, quando ainda me sentia "farol" para tantos e tantos...
Hoje, falar do "tanto" que me vai levar, a talvez pela primeira vez na vida, me saber uma desistente...dá-me engulhos, causa-me náuseas...

Sou mãe, quase já só em regime de "part time" (filhas com idades e vidas de autonomias), de quem estou, reconheço, excessivamente desvinculada, em termos de vida, nunca de coração...

Sou filha única, de uma mãe em recta final... lúcida, muito lúcida, e por isso, amarga, revoltada, sentindo-se ainda com lugar cativo, por direito.
Uma mulher que recusa ser "obrigada" a fazer malas e partir, pelo menos enquanto houver dos "seus", por aí a crescer, a fazerem-se gente...

Tenho netos que amo, e sou profundamente omissa com eles.
Sou relapsa, ausente. Estou a perdê-los um bocadinho todos os dias.
Não teço os laços que o sangue só, não consegue tecer se o coração lhe falta...
Eu sei disso, e isso é uma ferida aberta que não sára...

Sou amiga de amigas que o são na verdade, e que só continuam a pé firme, porque são daquelas com letra maiúscula...

Finalmente, sou uma mulher visceralmente só, sem ser capaz de o ser...; pseudo- independente na maior dependência afectiva dum sorriso, dum olhar, de uma atenção; "fortalhaça", pragmática, segura...com a maior falta de auto-confiança e auto-estima...; um "bluff", em suma...; "um saco roto de afecto"...foi-me um dia diagnosticado por alguém sabedor...quando na verdade já esgotei os meus "créditos afectivos" para com a vida...

Não aceito o passar dos dias, não aceito o chegar das limitações, revolto-me com os problemas de saúde que desfilam, tenho raiva a todo o "percurso" que me ultrapassou, sem que eu soubesse ou pudesse fazer nada!

Enfim, sou como um dia disse a brincar que escrevessem na minha lápide: "uma mulher que viveu profundamente infeliz..."
Brincava (porque eu nem sequer vou ter lápide, já que a escolha é outra), mas não brincava na frase...seguramente.

Como se vê,tenho um perfil quase desumano e monstruoso, para um mix sem rumo, para um novelo que de tão emaranhado se lhe não vislumbra ponta, para uma negritude tão absoluta, que me trai às vezes e me fragiliza e desnuda...

Hoje, na aula da turma que "salvará" o meu último ano lectivo, aqueles sete alunos, dos dezoito aos cinquenta anos, que falam mal a "linguagem" da Física e da Química (no esforço de mais uma noite na escola, depois de mais um dia de trabalhos e responsabilidades)... aqueles sete alunos,que muito mais que discípulos, são ombro, ouvidos, companheiros, amigos, quase filhos ou irmãos...sei lá...encheram um pouquinho o "meu saco roto", fizeram-me crer outra vez gratificante esta profissão de pastora de almas também, aqueceram o que pressentiram estar gelado por dentro, sopraram-me palavras de amparo e coragem, "secaram-me" as lágrimas teimosas, "desenovelaram-me" o nó que não descia... e mostraram-me que talvez amanhã, haja sol outra vez!...

Anamar

quarta-feira, 18 de março de 2009

"QUANDO OS PESSEGUEIROS VOLTAREM..."



A minha praceta ganhou vida outra vez...
O sol chegou; com ele os cheiros a Primaveras anunciadas; com ele, flores, algumas, muitas, a revestir os galhos dos projectos de árvores, que nem por isso deixam de ser Natureza, Terra, Vida...

A D.Madalena, mais só que na Primavera passada, já tomou, logo após o almoço, lugar, ombro a ombro com tantas outras D.Madalenas da vida, que queimam horas sobre horas, silêncios sobre silêncios, memórias sobre memórias nos bancos daquela praceta.
Acredito, pelas expressões de rostos apáticos, que a "luz" se vai apagando, e até aquele fôlego nunca esgotado, por cada ano que desce no calendário, vai esmorecendo, vai deixando de valer a pena, naquele linguajar meio de surdos que por ali se estabelece.
A D.Madalena anda bem mais devagarzinho (já deu p'ra perceber); os olhinhos perspicazes de garça real, ficaram mais pequeninos ainda, lá no fundo daqueles "fundos de garrafa" em cada olho...mas parece que embaciaram, ao ritmo da decrepitude acentuada.
A vozinha de falsete mantém-se, mas os tempos de silêncio já se lhe sobrepõem. Em contrapartida, o olhar "esqueceu-se" num qualquer lugar que eu não descubro, na praceta...

E há pássaros que se desafiam em trinados de promissores acasalamentos; e há crianças que correm e brincam e rebolam em alegria de vida, nos retalhos de relva verde; e há flores rosa, bem rosa, galho acima, galho abaixo, a lembrar que chegou o calor violador; e há jovens, "bué" de jovens, desafiadores, a desfilar uma juventude provocadora...injustamente a "vender" sonhos, creres, alegrias esfuziantes, pelo meio daquele filme de 8 milímetros...

E eu a ver, do meu sétimo andar, aquela galeria de casa de repouso, ao ar livre; a observar o grotesco daquele antes e depois, a analisar a deprimência a que somos reduzidos (talvez não se dê por isso...não sei ) pelo ciclo imparável que nos corrói de mansinho, que nos trucida com meiguice, anquilosando-nos os neurónios, atrofiando-nos a visão, fazendo com que só oiçamos o pouco que garanta a integração, AINDA, no meio que nos rodeia...dia após dia, sem revolta, sem mágoa, com uma indiferença e um distanciamento misericordiosos...

Como será na próxima Primavera???
As flores cor de rosa voltarão a revestir com pujança os braços que abraçam a praceta...mas quantos lugares vazios já foram ocupados pelo mais próximo da "fila"??!!...

Apenas o sol não nos faltará, os pombos também não...mas também para mim, como para todos nós que vamos seguindo em "fileira ordenada", o rosa dos pessegueiros vai-se tornando mais e mais, um retrato a sépia nas nossas vidas...

Anamar

sábado, 14 de março de 2009

"PRINCÍPIO E FIM"

Definitivamente a minha cabeça anda totalmente conflituada.
De há uns tempos a esta parte, parece que o "meu" planeta se virou do avesso, se misturaram alhos com bugalhos, nada é conexo, não se encontram linhas de coerência, lógica... em suma, é tal e qual como quando procuramos algo numa gaveta que esteja totalmente desarrumada...ou melhor, é tal e qual como quando se abre essa tal gaveta, se mexe e remexe e nem se sabe bem o que se anda a procurar...
É o chamado "caos".

Assim eu ando, assim anda o meu estado de espírito, uma inércia crescente a instalar-se, uma inabilidade gritante para gerir isto, uma falta de vontade que me ultrapassa e se estende a quem me rodeia, ilhando-me de tudo e todos, tornando-me num caracol cobardemente escondido na casca.
Estou parda, baça, sem entusiasmo, sem horizonte, apagada, sem projectos.
E sem projectos, sejam lá quais forem, o ser humano não vive, eu acho.
Só me apetece dormir, abençoada anestesia para este desgraçado estado de vida...

Nem escrever, escape de tantos dias "invernosos" na alma, ou alegria de tantos outros "ensolarados" no coração!...

Bom..."pari" um texto vai p'ra mais de quinze dias...um texto sobre nada em especial, apenas algo em que pensei nesse momento e que versa alguma coisa que me assola recorrentemente.
Provavelmente não tem nenhum tipo de interesse, a não ser, se calhar, o levar a confrontar-me de novo com a conclusão de que não tenho os "parafusos" totalmente no lugar(coisa que sei há muito..)
Mesmo assim, aqui vai, independentemente de quem me ler, corroborar exactamente o que acabo de afirmar...



"Odeio despedidas; odeio fechar de portas; odeio terminar livros, porque me incomoda a sensação da viragem irreversível da última página.
No fim de qualquer sessão de cinema, se o filme tiver sido importante para mim, é vulgar permanecer ainda sentada como que anestesiada, na semi-obscuridade da sala, sentindo a nostalgia estranha de uma história acabada de contar.

Tudo isso me sabe a "morte"; tudo isso me anuncia fim; tudo isso me lembra aquele sol que jamais repete o mesmo ocaso, aquela folha que o Outono arrebatou do galho ao chão e do chão ao nada...
Vivo sempre obcecada com o irrepetível, com o definitivo, com o que é, mas jamais será...

Tudo muda, tudo avança, tudo "caminha" adiante, e tudo isto parece estúpido de óbvio. Claro, toda a gente, se pensar dois segundos a propósito, sabe da impermanência das coisas, sabe da impossibilidade de pôr a cassete em "pausa", quanto mais fazer o seu "rewind"...

No entanto dou por mim, sempre, mas sempre (o que me deixa um gosto de amargo na boca e de desconforto no coração), quando visito um local de não muito previsível repetência, a, antes de fechar a porta e sair, percorrer demoradamente todas as divisões, olhar cada canto e recanto que partilhou comigo história durante algum tempo, fixar, como se pudesse fixar mesmo, determinados e insignificantes pormenores, num "close-up" que jamais se apagasse.

É vulgar reter as cores, a luz, os sons, os cheiros (como se dessa forma, os arquivasse numa qualquer Torre do Tombo da minha memória), e é vulgar sentir um aperto no peito, enquanto digo convictamente só de mim para mim: "aqui já não voltarei mais..." (como se me estivesse anunciando uma despedida);

É uma espécie de convicção meio absurda, pois que afinal, sabemos lá nós que voltas a vida nos dá, que peripécias ainda nos prepara, sabemos lá nós, se e por que razão, não poderemos efectivamente ali voltar??!!...
Mas é uma sensação estranha e incómoda, na verdade, a que me invade, contra toda a lógica racional que me impinjo ao mesmo tempo.

E ali, naqueles escassos e fugidios momentos, experimento de facto, claramente, a insignificância, a irrelevância, o efémero, o nada que é a vida de cada ser humano, face à infinitude e à perenidade da VIDA, este gigante meio abstracto, meio irreconhecível, esta roda dentada, de engrenagem que nos domina, este "buldozer" que nos toca adiante sem que possamos esboçar sequer um gesto de reclamação ou de assombro...
Aquilo que ali passa, na minha cabeça, é um virar de página, é um fechar de porta, é uma despedida, é um fim de livro ou filme...é um epílogo de estória...

E fico mínima, quase invisível e transparente face à intemporalidade dos rochedos espalhados a esmo, face aos líquenes e musgos indiferentes (que sempre ali estiveram, estão e estarão), face à música dos pássaros ou ao cântico dos riachos insensíveis, por entre as penedias... simplesmente porque esses, não terão por certo, a noção de princípio ou fim!..."

Anamar

sábado, 28 de fevereiro de 2009

A "MÃE" QUE NUNCA NOS FALHA...



Sábado de cinzas mesmo, no rescaldo deste Carnaval que partiu.

Dizia ontem no meu pequeno texto, que nunca me senti enquadrada em tais comemorações, para além de que, estou muito mais "quaresmal" de espírito, que outra coisa.
O semblante do tempo atmosférico também se pôs a propósito, e uma dormência interior tomou conta de mim.
Fiz planos de visitar família, fiz planos de visitar amigos...e tudo redundou numa inércia entediante, que me remeteu a uma hibernação e letargia moles, frente ao cinzento da minha janela, frente a um casario descaracterístico de dar dó,com uns borrifos de chuva a salpicarem-me os vidros...frente a duas ou três gaivotas que me fazem negaças, na liberdade do seu planar lá fora.

Por aqui estou, num período da minha vida que está tal e qual como o colorido desta tarde de sábado...
Os meus gatos dormem uma profunda sesta, que diariamente por esta hora não perdoam, e eu, se levasse à letra a minha vontade, ia "pedir arrego" ao édredon ali atrás...

Ando, como aquela concha que a onda traz e leva, traz e leva até à praia, por cada maré...
Não sei bem por que vivo, para que vivo, por que acordo e me levanto, se é p'ra me deitar e dormir outra vez depois de uns pares de horas...enfim, pareço aqueles bonecos que vão rodando, rodando, até a corda se acabar...e a sensação mais nítida que experimento, é vazio, um vazio desconfortável, cansativo, atroz...

Bom, mas a "driblar" os três dias de pausa laboral da semana passada, tentei fugir de dias que iam mascarar-se de qualquer outra coisa, de certeza não genuína (como são todas as máscaras), que iam travestir-se de expectativas de sonho, que iam esconder atrás da mascarilha, o infortúnio do palhaço pobre...
E fui, em busca sobretudo de paz, de silêncio, de útero...




A Estrela deu-me cólo, com um manto branco que me aqueceu...
O sol privilegiou-me com uma presença fiel de amigo que não falha, e o azul das tintas lá "de cima", completou um bouquet, com a beleza das urzes, das giestas, dos rosmaninhos, alecrins e zimbros que já se espreguiçam nas encostas mais ensolaradas.
O frio gélido só vinha à noite, para que o crepitar da lareira a arder, o laranja das chamas bruxuleantes, ou o cheiro da carqueja no ar, inundassem aquela sala de pedra e madeira, de um silêncio audível, repouso da alma, viajante para o espírito, artesão de sonhos, de desejos, de ilusões...

E foi como se um manto providencial me envolvesse e embalasse, como se os chocalhos das ovelhas ecoando no silêncio, fossem música para os meus ouvidos, o marulhar dos córregos ou cachoeiras, serra abaixo, fossem árias duma orquestra em total acerto de timbres, e as avé-marias sempre tocadas hora a hora na torre sineira daquela aldeiazinha perdida em nenhures, fossem as vitaminas que o meu espírito cansado e se calhar doente ou em desacerto comigo mesmo, precisava como tónico de sobrevivência!!...



Anamar

"QUANDO A VIDA AINDA É UM ETERNO CARNAVAL"


Um Carnaval mais que se foi...felizmente!

Desde menina, nunca foi época que se me "quadrasse"; eu, que tento resistir a tudo aquilo que socialmente o calendário determina, imaginem agora, ter de me divertir, ter de rir, ter de "macaquear", ter de fazer de conta que estou incontidamente feliz...só porque o famigerado Fevereiro, normalmente indica que é Entrudo!!

Em pequena, era aquela coisa chata de ter que me mascarar como mandava o "figurino" da época, de espanhola, de camponesa, e penso que de nada mais, por serem estes os disfarces que a minha madrinha detinha, e ela era a única fonte providenciadora dos ditos.
Pertencendo a uma família abastada, a mãe fizera-lhe estas indumentárias a preceito, no tempo em que, nestas famílias , vinha semanalmente a casa uma costureira.

Alugarem-se fatos, como depois se vulgarizou, ainda não era costume, e de qualquer modo, o dinheiro que havia, também não era para estes desperdícios.
Assim, apanhei um enjoo de sevilhana e de camponesa, o que me tornava drasticamente mais fastidiosa, a quadra.
Depois, havia também aquela timidez terrível, que sempre me levou a desejar que ninguém desse por mim; e nesses dias, ser eu a forçar a atenção dos demais...era "dose"!!...
Por isso, as "cinzas" da 4ª feira, eram um alívio para o "coração", da menina das tranças que então eu era.

Anos mais tarde, com filhas a "invencionar" fatiotas e cabeleiras, penteados e maquilhagens, quer incentivadas pela escola, quer saídas daquelas "mentes brilhantes"...o "terror" lá voltava de novo...
Maquilhar, desmaquilhar, pentear com palha de aço e tudo (na esperança de que a "peineta" de sevilhana se aguentasse naquele "pelo de rato" dos seis, sete anos...) uma tremenda chatice!...

As mesmas reclamações, por os fatos da madrinha velha, com cheiro a naftalina, darem à luz...sempre os mesmos, claro, se bem lembro, com a nova hipótese de "fada"...
Os corsos também sempre os mesmos, os "gigantones" e "cabeçudos" cada vez mais apalermados (nas rábulas cansadas de repetidas), as pseudo-brincadeiras cada vez mais estúpidas, as portuguesinhas de trazer por casa a acreditarem-se cariocas em Sapucaí (no "descascanço" e no saracotear da "bunda boa", que acreditavam ter, pelo menos nos três milagrosos dias, em lugar do rabiosque de sempre...)
Enfim, a lixarada dos papelinhos e das serpentinas, as "línguas das sogras" nos nossos tímpanos, a água inconveniente das bisnagas, toda aquela "poluição" visual e sonora, numa ausência de graça ou piada confrangedora, simplesmente porque graça e piada, são coisas que nem por "alma da santa" se conseguem, se não saírem espontâneamente de dentro para fora, mesmo dos mais foliões!!...



Depois disto, para mim, o Carnaval implodiu no calendário...

Hoje, pasmo ao ver os pequeninos (vivendo paredes meias com as lojas dos chinocas, sortudos que são), a mascararem-se das figuras mais impensáveis do imaginário infantil, diferentes todos os Carnavais, sem a naftalina do baú da madrinha velha a empestear os narizes, desinibidos e brincalhões ainda, nos seus dois, quatro e sete anos...felizes que só eles...acreditando se calhar, que a Vida lhes será sempre um eterno Carnaval!!...



Anamar

sábado, 14 de fevereiro de 2009

"DIZEM QUE O AMOR É LINDO..."



O dia do amor...

Como se o amor fosse à hora, ao dia, ao mês!...
Como se existisse por determinação, como se fizesse parte do racional, como se obedecesse a uma lógica qualquer, como se acontecesse quando, e se, um homem quisesse...

O amor de "hoje" é aquele inventado por quem não tem mais nada que fazer, do que inventar datas, pretextos, motivos para consumismos a propósito.
Flores que se vendem aos quilos, cartões com frases que se calhar não são nada daquilo que se sente, mas que dão um jeitão para quem não é muito versátil nas letras, prendas mais abonadas exactamente para os que são abonados de algibeira.

Mas amor mesmo, aquele amor que nos faz sentir adolescentes quando os "entas" já vão por aí fora, aquele amor que nos faz rir ou chorar verdadeiramente de nada em especial, aquele que nos torna veementemente crentes num qualquer futuro, aquele que não nos inibe de dar ou receber um beijo cinéfilo no meio de uma rua apinhada (só porque nem vemos ninguém e menos ainda nos borrifamos que entendam ou não aquele "acesso" chamado de felicidade...) esse amor, que será de facto, um sentimento puro, genuíno, desarmado...esse amor que é um verdadeiro "estado de graça", padece quase sempre por efémero, acaba quase sempre por sucumbir à inevitável e atroz rotina do tempo, acaba quase sempre por nos desencantar com o desgaste da vida e pela dificuldade da determinante renovação.
O ser humano é exigente, e perenidades "ad eternum", de afectos sem beliscaduras, são quase uma miragem...

E como é fácil hoje em dia (eu pasmaria verdadeiramente, se acreditasse, ao ler circunstancialmente a propósito), as pessoas viverem em permanente estado de paixão!...

As figuras "cor de rosa" do nosso país tão cinzento, não se cansam de andar no troca e destroca (como quem substitui a escova de dentes), sempre e permanentemente apaixonadas!!
Parecem sair absolutamente incólumes, nunca "carregam" o fácies ao mundo, nunca perdem o gosto por um bom evento, uma boa viagem, uma boa maré para relançar as "redes"...perfeitamente "na maior"!!
Enfim, passa a sensação de uma profusa "oferta", em que a dificuldade está sempre e só, na escolha...
E todos ficam também, sempre e só, amigos como dantes, como num agradável serão de cartas, em que se baralha e volta a dar!

Ninguém parece sofrer nesta época do descartável, ninguém se deprime (afinal a vida são dois dias...), ninguém adoece da alma...porque, queiramos ou não, haverá um 14 de Fevereiro por cada ano, e as personagens podem sempre mudar, num cenário que se traveste na maior parte dos casos, de um "faz de conta", o que torna o filme sempre diferente, nada entediante e altamente emocionante pela adrenalina...
Ainda por cima é quase Carnaval!!...

Bom, eu sou do antigamente...
"Cresci" no BI, mas continuo irredutível, inelutável e "desgraçadamente" "teenager" no coração, na alma, nos creres e na recusa desta era de corações de "plástico"...

Fazer o quê?!...

Penso que foi Saramago que disse: "Não se morre por amor, mas não se vive sem amor..." - creio que sim, embora às vezes pense que não...mas, ainda assim, é essa "fé" que me faz levantar todos os dias!!...

Seja como for, no dia "das rosas vermelhas", e para verem como eu sou uma "romântica" sem remédio, ofereço-vos esta brincadeirinha, para que possamos concluir que...AFINAL O AMOR É LINDO!!... E LOUCO... (isso eu já sabia há muito!!!...)



Anamar

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

"UM SUBLIME ACTO DE AMOR"



Eluana, teve finalmente direito a descansar...

Mais uma hipocrisia da humanidade (eu, pelo menos vejo desta forma).
Eluana, acidentada há dezassete anos e em vida vegetativa, artificialmente mantida por máquinas, "lutou" através de seus pais, para que lhe fosse concedido o direito ao descanso e à paz.

Quem, mais do que os pais, quererá manter um filho vivo??...
Quem, apenas em desespero total, pedirá que as máquinas sejam desligadas e o filho abandonado finalmente ao seu destino traçado há muito??...
Quem o faria, se não tivesse perdido toda a esperança, de ver esse filho com um sopro que fosse, de vida??...

O direito à vida, ao seu corpo, ao seu espírito, ao seu destino, do meu ponto de vista, é um direito intransmissível, inalienável...
Quem somos, o "invólucro" que carregamos, o futuro que queremos ou já não queremos, deveria ser apenas um direito que apenas a nós dissesse respeito.
É um sofisma , uma hipocrisia social, que legislação feita por homens, de acordo com morais ou falsas morais, ao sabor de princípios de cada estado, determine unilateralmente do destino de cada indivíduo.

É injusto que numa interferência hipócrita, atrevida, de acordo com princípios balofos religiosos, muito mais que éticos e sociais, a Igreja Católica se arrogue o direito e se calhar o dever, de se imiscuir na decisão sobre a morte assistida de um ser humano que já o não é...
Isto, porque não é de todo viver, alguém que não comunica, não reage, não se exprime, não raciocina, não se relaciona e não pode sequer usar o seu livre arbítrio para opinar sobre si próprio e sobre o que desejaria para si...

Há conflitos éticos?? É possível!
Óbvio que nenhum médico, que jurou salvar vidas, contribuirá de ânimo leve para as cercear.
Mas a questão é exactamente essa: VIDA!!
E VIDA não é certamente aquilo que Eluana e quem lha deu, vivenciaram ao longo de um pesadelo de dezassete anos...

Querê-lo-ia para mim, estou certa, ou para alguém que eu amasse muito... porque ter o discernimento, a coragem, a serenidade e a paz para desistir desse alguém, ter a abnegação e a generosidade de deixar partir para sempre esse pedaço nosso, é sem dúvida um sublime e incomensurável acto de amor!!...



Anamar

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

"O SER HUMANO É ESTRANHO..."

O ser humano é estranho...

Reflecti uma vez mais sobre isto, ao deparar-me no jornal da manhã, com uma notícia sobre a localização de uma jovem cujo desaparecimento remontava há largos meses...

Fora encontrada em Paris, onde vivia com o namorado, estava de boa saúde, levava uma vida normal...apenas não dera nunca notícias sobre si própria, apesar de certamente se saber procurada.
Os pais, pessoas humildes do norte do nosso país, entrevistados para o citado jornal, mostravam-se muito felizes, porque para eles o "pesadelo" acabara.
Foi então que a mãe da jovem soltou a seguinte frase que me esbugalhou os olhos: "Não acredito que a minha filha tenha fugido de livre vontade"...

Bom, esta afirmação fez-me matutar sobre a posição de muitos pais, face aos comportamentos e posturas dos filhos ao longo da vida.
Por que razão, ainda que claramente a leitura de um determinado comportamento menos abonatório, seja por demais óbvio e não deixe dúvidas para os demais, sempre os pais têm tendência a não encarar a realidade, tentando ilibá-la ou escamoteá-la, com justificativas?

Será porque inconscientemente auto-assumem parte da responsabilidade como sendo sua??

Será porque nunca se apercebem que aqueles filhos que efectivamente geraram e educaram e que falham como qualquer ser humano, cortaram há muito o cordão umbilical, cresceram, tornaram-se autónomos e têm direito aos seus próprios erros, como pessoas independentes??

Será que sentem indirectamente que são eles os "julgados", através das atitudes dos seus descendentes, como se tivessem sido ineficientes na formação, incapazes na transmissão de valores, imperfeitos no exemplo dado??

Será que sempre os pais querem projectar nos filhos aquilo que eles próprios não conseguiram ser, de preferência que alcancem aquilo que lhes foi inalcançável??

Depreendo que se calhar, tudo isto talvez tenha um fundamento biológico.
Razão biológica que embota o razoável, o inteligente, o correcto...

Eu própria, que tendo uma mediana formação integral (como pessoa, como profissional, como cidadã), ou seja, não sendo propriamente alguém atávico, que não tenha tido acesso à cultura (com o consequente acréscimo de responsabilidades), cometo "erros de palmatória" racionalmente inadmissíveis.

Enquanto criança e adolescente, filha que fui de uma família de classe média, vivendo do trabalho e sem demais proventos, sempre fui responsabilizada desde cedo, por todos os meus actos; sempre me foi exigido o cumprimento do que me era atribuído, apenas por vezes desproporcionalmente ao razoável.
Fui das melhores alunas do liceu que frequentava, recebi prémios por isso mesmo, não me era "permitido" claudicar ou ter pequenos insucessos ou desvios, se calhar aceitáveis face à pouca idade que então tinha.

Inevitavelmente, por cada avaliação escolar que recebia, a pergunta sacramental da minha mãe, era, antes de tudo:"E as outras notas, como foram"?...

Lembro até hoje, um teste de Ciências Naturais, talvez no meu primeiro ou segundo ano do liceu (correspondentes ao quinto ou sexto anos actuais), que recebi com a classificação de Bom e que, como habitualmente, dei para que a minha mãe assinasse.
Olhou-o com uma cara de decepção, e desagradada atirou o teste para cima da mesa com tal violência, que o mesmo despencou no chão.
Senti uma mágoa e uma injustiça tão grandes, que a sua nitidez perdura, tanto tempo decorrido já...
A imagem dessa tarde está-me nítida nos olhos, acho que no coração e na alma...
"Vejo" o local, o gesto..."oiço" as palavras...

Pois bem...anos e anos depois, mãe que sou de filhas muito capazes, escolarmente irrepreensíveis, brilhantes quase...dei por mim, ao longo das suas vidas escolares, a ter posturas idênticas às daquela mãe, semi-analfabeta, a quem talvez não pudesse nem devesse ser exigido mais.

E olhando para trás, faço a minha "mea culpa", com uma carga de vergonha, por efectivamente não ter conseguido, quantas e quantas vezes, racionalizar, distanciar-me, ser inteligente, ser responsável, ser mãe com capacidade para ver, analisar, perceber e ajudar as pessoas que pus no Mundo (imperfeitas como qualquer ser humano), a conviverem com os seus insucessos, as suas derrotas ou desvios, as suas dificuldades; não sabendo aceitá-las quantas e quantas vezes, como indivíduos autonomizados e não me culpabilizando ou envergonhando, por não serem como eu "inventei", não me punindo por não serem muito melhores que o que eu fui capaz de ser...simplesmente porque são como são, pessoas, gente, responsáveis únicas pelos caminhos que trilham...

Ufa!!...Efectivamente, o ser humano é realmente estranho!!...

Anamar

sábado, 31 de janeiro de 2009

"ATÉ QUANDO??..."

Há que tempos que por aqui me não perdia...
Pasmo mesmo como foi possível passar tanto tempo sem escrever!
O facto, é que me ando a sentir "amorfa" por dentro, amorfa de sentimentos, demasiado "flat" para o que gosto de me encontrar, cinzenta como o tempo, como as gentes, como o País.

Depois, também dei em achar perfeitamente irrelevante tudo o que debito. De facto, aquilo que normalmente me traz às letras, são sentires, convulsões emocionais, estados de alma, bons ou maus...E coisas irrelevantes, penso, não têm muito "espaço" no atropelo de vida que tentamos viver diariamente.

Profissionalmente, aliás como socialmente também, tudo corre descolorido, ou melhor, num adensamento de cores escuras, "penumbrentas", fantasmagóricas, tenebrosas...diria.

As pessoas que me cruzam na rua, trazem rostos carregados, pré-diluvianos ou pós-funerários, como queiram.
Não vejo expressões leves, não vejo nada que não traduza "carga", preocupação, cansaço, desânimo...se calhar, desespero.
As perspectivas são tão cinzentas, quanto este tempo de quase Quaresma;
O cinzentão do céu e a chuva impiedosa de um Inverno "à séria", como já não víamos há anos, estendem-se como tentáculos de um polvo gigante, até à alma dos felizes ou infelizes mortais, estendem-se até ao âmago, apertando gargantas, sufocando a esperança, imobilizando as vontades, entorpecendo espíritos, adormecendo a alegria.

Lisboa recepcionou-me hoje assim, exactamente assim, com uma abóbada plúmbea, desde o Castelo até à Baixa, com transeuntes apressados e chapéus de chuva ensarilhados, com folhas mortas tombadas no chão encharcado e árvores despidas e esquálidas bamboleando ao sabor da aragem desabrida.
Lisboa estava triste, ou talvez fosse eu que o estava...

Não há telejornal que não mostre um Mundo a desabar, não há jornal que não prenuncie ou fale de desgraças (as maiores e mais absurdas desgraças), não há notícias que não espalhem preocupação, que não alertem para futuros exponencialmente incertos, que não espelhem reacções de desespero de seres acossados.

De repente, parece que neste planeta, o Homem está refém, refém de uma maldição adivinhada; parece que neste planeta já não existem dez centímetros de terra, onde se possa respirar, onde se possa ter fé, ter paz...onde se possa ter gosto por viver!

O ser humano parece ter baixado os braços; sente-se o cansaço, o "dar de ombros", a desmotivação, a falta de peito para a luta, o conformismo, simplesmente porque o acreditar está de rastos.

Começa a ser indiferente que determinados valores primordiais estejam a tornar-se inexistentes, começa a ser irrelevante que objectivos, sonhos, metas e comportamentos que norteavam o ser humano, estejam desvalorizados, postos em causa...
Começam a ficar-nos "invisíveis" sofrimentos, dores, atrocidades, aberrações, como se estivessem a anos-luz de nós...talvez por defesa, talvez por "carapaça"...

Isto é sintomático, penso.

Esta quase "tolerância", por falta de força, é uma doença civilizacional crónica que se instalou; esta conivência irracional e irresponsável que já vamos manifestando, é um vírus que corrói lenta e subtilmente até à morte, esta letargia de alma e coração que nos "despe" de humanidade, é um cancro irreversível que nos atordoa, nos tolhe, que nos amputa e nos aniquila.

Até quando??...

A minha e única gaivota destas paragens, anda-me por aqui frente à janela, recortando-se no infinito cinzento de borrasca, aproveitando os altos e baixos da aragem que corre, planando, de asas esticadas...

Não sei porquê...apeteceu-me ouvir imperiosamente "Edelweiss" da "minha" "Música no coração" de criança...



Anamar

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

"FELIZMENTE HÁ LUAR ..."


Levantei-me de madrugada.
Saí do quarto e de repente, o meu corredor estava "aceso"...

Pensei: "Querem ver que o alemão está mesmo a pegar-me de jeito e deixei o radiador ligado aos gatos??!!"

Mas assegurei-me que não. Tudo estava nos conformes...apenas, "ela" estava lá...

Não sei as horas que eram.
Normalmente tenho a mania da precisão.
Sinto-me estranhamente "confortável" quando posso afirmar: "eram cinco e vinte e cinco"..."eram três e trinta e três quando fechei a luz p'ra dormir"...etc, etc.
Que se há-de fazer?!...
Contudo, esta madrugada deambulei às escuras.

Conjecturava eu, ir e vir, enganando o frio gélido destes últimos dias (com a Europa a tiritar e a Rússia a fechar a torneirinha do gás), e enganando também a insónia, que sempre tem tendência a apanhar-me "desprevenida".
Por isso fui às escuras, de olhos o mais fechado possível, dentro daqueles limites razoáveis, claro.
Normalmente vou, por forma a perscrutar o caminho e a não encalhar no Óscar (que deve ter "bichos carpinteiros"), e sempre aparece para me complicar os passos, a qualquer hora.

Só que esta madrugada, "ela" trocou-me as voltas.
Aquilo "tudo de luz" que me punha a casa em "iluminação de festa", fez-me ir "cuscar" até à vidraça da janela.

Fiquei extasiada e contemplativa, e logo me ocorreu um textozinho lido e relido nos longínquos anos da escola primária: "Luar de Janeiro não tem parceiro"..."Luar de Agosto ao lavrador dá no rosto"..."Não há luar como o de Janeiro, nem amor como o primeiro"...

"Cá está!", pensei, deitando-"lhe" aquele olhar que uma mulher deita a outra, na minúcia da análise da toilette..."Razão tinha a Rita!"...(a minha gata que não é gata, mas que é gato - um dia, eu explico), que esta noite demorou a acomodar-se para dormir, em miados lânguidos e púdicos...Sim, que a Rita não é nenhuma vadia e é uma "gata" que "sabe estar"...

e pensei: "Janeiro, o mês dos gatos...Puxa, mas também, como se pode dormir assim?!... O que vale é que está um frio de rachar!!..."

Moral da história: aconteceu-me esta madrugada, o que já não me acontecia há muito: são seis da manhã (agora já vi as horas); o sono foi "às urtigas" em definitivo; tive de buscar papel e lápis em carácter de urgência, a fim de escrever todo este chorrilho de insanidades (para alívio da "comichão cerebral"); não sei se não apanhei um resfriado; constatei que estou cheia de fome, e que ainda havia de ir comer a última fatia de bolo-rei para aquietar o estômago (mas tenho frio, para essa incursão à cozinha); de certeza vou virar "croquete no pão ralado", até que o sono me volte a fechar a "persiana"...

Mas, enfim...depois de tudo isto, pelo menos...felizmente há luar!!...



Anamar

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

"NUMA NESGA DE TERRA"

Já reflecti vezes sem conta, já me revoltei outras tantas, já fiquei estupefacta, incrédula, horrorizada...

Já não me constitui novidade (nem a mim nem a ninguém),infelizmente. E a memória nem precisa ser curta, porque essas, estas memórias, duram há tempo e tempo, na nossa História, poluem duma forma hedionda a realidade dos nossos dias, nos jornais, nas revistas, nas rádios, nas televisões...

Não tem princípio e parece, não terá fim.
É uma "teia" urdida com tantos, mas tantos fios, que não há ponta por onde comece a desenvencilhar-se.

São "ironias" históricas, são "cegueiras" megalómanas, são fundamentalismos e intolerâncias sem tamanho.
São verdades e mentiras, são razões falaciosas em jeito de justificações, são disputas entre forças e realidades assimétricas, são atropelos, são arbitrariedades...são CRIMES!!!

Não vale a pena alongar-me mais...Já tudo foi dito...ou talvez não se tenha dito verdadeiramente NADA a propósito...

É uma monstruosidade inominável, é mais uma "nódoa" civilizacional, é uma VERGONHA no apregoado século do humanismo(?), é um nome...é "uma nesga de terra" com muitos donos...é GAZA!!...




Será que o Homem pode ainda SONHAR??!!...



Anamar

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009