sexta-feira, 13 de agosto de 2021

" O MEU MUNDO DE PERNAS PARA O AR "

 



Estou a superar-me nos meus recordes.  Contudo, pela negativa, infelizmente !
Verifico que desde o dia 11 do passado mês de Julho, não escrevo nada.  Verifico que nesse mês escrevi dois posts apenas e que em Junho, um único.
Verifico que se hoje me não "obrigasse" a vir aqui dedilhar duas linhas, passaria tranquilamente mais um dia, sem que o fizesse.
Verifico também que ultrapassei já com alguma expressão, as cem mil entradas de leitores a este blogue, sem que sequer tivesse dado por isso, eu que sempre sinalizei com júbilo e satisfação pessoal, a passagem de cada dezena de milhar.  Com alegria, mas também com reconhecimento e gratidão por poder sinalizá-la ...
Verifico que escolhi como foto do mês e também do post de hoje, uma imagem que talvez fale por mil palavras, tendo-a legendado com uma frase que só por si já diz tudo : " o meu mundo de pernas para o ar "...

Na verdade, não sei se será justo epitetar desta forma a vida que detenho e vivo hoje em dia.  Objectivamente, não consigo descodificar a origem do mau estar que preenche os meus dias, a insatisfação, o cansaço e o desinteresse por tudo o que me cerca.  Analisando globalmente a realidade que atravesso, não encontraria motivos reais, palpáveis, concretos ... daqueles de tirar o sono, daqueles de nos porem o coração à boca, de nos puxarem as lágrimas, de nos levarem a arrancar cabelos, ou a desistir de prosseguir.  Efectivamente não vivo preocupações excessivas, dúvidas ou ansiedades esmagadoras, mágoas ou desgostos profundos com nada... 
Tenho saúde, ou julgo tê-la, dentro daqueles parâmetros rotineiros  de aferição da mesma.  Os meus, filhas e netos, também não me inspiram preocupação acrescida nessa área.  Financeiramente não vivo com sustos, angústias ou apertos exorbitantes.  Ao contrário, posso dizer viver uma vida com algum equilíbrio nesse campo, sem larguezas, mas também sem "roer as unhas", como "soi dizer-se".  
Acabei, inclusive, de chegar há poucos dias de uma viagem de uma semana às sempre maravilhosas ilhas açorianas, àquelas onde nunca tinha ido, Terceira, Faial e Pico, cumprindo assim um itinerário possível no âmbito das viagens, em panorama Covid.

A maioria, ou grande parte da população portuguesa não pode dar-se a esse "luxo", já que com todas as dificuldades sociais experimentadas, com um futuro de incerteza e dúvida a todos os níveis, em consequência da pandemia, a qual lançou o mundo para futuros negros, tem que encarar em termos de prioridade e quase exclusividade, o garante da subsistência diária, sua e dos seus, infelizmente num contexto pouco mais amplo do que o de mera sobrevivência.
Pois paradoxalmente, nem estes dias conseguiram tirar-me deste torpor, e darem-me mais ânimo ou positividade em relação à vida ...
E como eu, afinal, adoro viajar !  Como me sentia solta, leve, feliz, livre e com um entusiasmo renovado, sempre que há anos atrás realizava uma viagem !...

Neste momento a minha existência está parada. Pareço ancorada e fundeada num mar de distância, em águas de não valer a pena, como se o vento que me enfunava as velas tivesse sucumbido a uma volta de tempo ...
Tenho dentro de mim uma apatia, um desinteresse, um desinvestimento em relação a tudo o que me cerca. Parece que o sangue deixou de correr e o coração cessou de me pulsar dentro do peito.  Parece que experimento a sensação estranha de já nada valer a pena.  Nada que justifique empenhamento, mão de obra, sonho ... 
A sensação estranha de sala de espera de não sei que esperar. A sensação de efemeridade temporal e curteza de caminho ... Consequentemente, a sensação estranha de já só viver a prazo, no cumprimento de calendário e não mais !

Sei que tenho um feitio difícil e uma maneira de ser muito particular e complicada.  Sei que em recorrência sou deprimida e profundamente depressiva.  Mas sei que neste momento, psicologicamente preciso de ajuda médica. Não estou a conseguir endireitar-me de nenhuma forma.
Nada me anima ou estimula. A caminhada é feita com um esforço exasperante.  Ontem a Teresa passou a tarde comigo, a trabalho da mãe.  Pois foi um cansaço diabólico, e no entanto os seus quatro anos de criança cordata, simpática, fantástica e nada chata, com toda a meiguice do mundo sempre pronta a distribuir-ma, deveriam resultar em encantamento e compensação para os meus dias ...
Mas não ! 
Parei de sonhar. E quando um Homem já não tem sonhos, objectivos ou metas, não tem por que lutar, não tem o que realizar, e à sua frente só enxerga uma estrada pedregosa, escura e desinteressante !  Desnecessária !  Um vazio cruel assola-lhe a alma ...

Como eu adoraria voltar a trepar a um arco-íris de esperança, vontade e luz !...



Anamar

domingo, 11 de julho de 2021

" UM INSUSTENTÁVEL JOGO DE XADRÊS "


O xadrês das variantes vai-se fazendo... a Alpha ( inglesa ), a Delta ( indiana ), mas também a Beta e a Gama sem que suspeitássemos que o fossem da África do Sul e de Manaus respectivamente, no que julgo ser uma preocupação de branqueamento da conotação da estirpe com nenhum país em especial.  
Agora irrompe a Lambda que, oriunda do Perú, afinal já grassa desde 2020 na América do Sul.

Estirpes agressivas, com resistências significativas às vacinas, ao que parece, assustam pela alta capacidade de transmissibilidade e por isso rapidez na disseminação, no que já é um alastrar objectivo em todo o país.
Apesar do recuo a confinamentos mais severos, à manutenção exigente das medidas profilácticas de protecção individual com a exigência da continuação do uso das máscaras e do respeito pelo distanciamento social, é aterrador perceber-se quanto de lotaria também tem tudo isto, quanto de moeda ao ar existe também em cada dia da nossa realidade, a aleatoriedade que persiste, quando ainda que julgando cumprir escrupulosamente todas as regras, e desconhecendo como e onde, as pessoas aparecem infectadas.
O única e relevante factor positivo, é o facto da vacinação ter sido implementada a todo o vapor, o que se reflecte efectivamente, no número baixo de óbitos, que apesar do número explosivo das infecções diárias, tal facto não se traduz depois, no número de mortos, felizmente.

Entretanto quase não vejo notícias.  Estou total e absolutamente saturada, indiferente mesmo à repetição dos assuntos, às opiniões contraditórias, ás "novidades" que a comunicação social fareja sem critério, para vender.
Tenho andado particularmente cansada, exausta mesmo, sem que aperceba um nexo de causalidade objectivo entre causas e consequências.  A vida ultimamente tem-me presenteado com alguns desagradáveis acontecimentos, mormente no domínio familiar, com preocupações acrescidas que o são mais ainda, por insanáveis ou irresolúveis dentro da minha esfera possível de actuação ou intervenção.
E quando percebemos que temos gente nossa a sofrer por incapacidade decisora perante situações que se  arrastam  e  deterioram,  e  que  nada  podemos  fazer ... é  um  desespero  total !
E quando percebemos que pomos filhos no mundo que ganharam asas, mas cujos voos escolhidos não são assertivos ou felizes, sem que lhes possamos atapetar o caminho ou adoçar o amargo da alma, é como se nos rasgássemos por dentro !

Retomei a caminhada pela mata na tentativa de normalizar, de alguma forma, as minhas rotinas diárias.  mas faço-o com dificuldade e penosamente.
Depois, tudo emperra neste país.  Nada se alcança duma forma simples e sem demais e desnecessários  desgastes.  A função pública é um entrave permanente à simplificação das questões, mesmo as mais óbvias e as mais simples de resolver, mesmo as que se prendem nem sequer à interpretação, mas à leitura directa da lei e sua consequente aplicabilidade.  Não, tudo é tirado a ferros, tudo implica gastos desnecessários e prejuízo ao erário público, por teimosia, burrice ou inépcia de um atávico manga de alpaca que tivemos o azar de nos aparecer pela frente e que teima em "mostrar serviço" ao superior hierárquico, sem perceber que o seu pequeno poder ( que julga conferir-lhe uma digna e legítima supremacia ), não passa afinal, de uma "sabujice" triste e lamentável, bem patenteadora duma ignorância e ineficácia, sem perceber que ela desnuda sim, uma incompetência sem tamanho e uma puxa-saquice lamentável e nada mais. 
E consequentemente, além de termos de dispender dinheiro para recorrer a estruturas capazes de nos ajudarem a desbloquear as situações, enervamo-nos, desgastamo-nos, perdemos infinito tempo, horas de tranquilidade e mesmo de sono !
Exaurimo-nos sem proveito ou necessidade !

E pronto, assim vai a nossa vida.  

Hoje, este meu escrito foi mais um desabafo, um lavar de alma que outra coisa.  Um alívio de coração, nada mais.
O xadrês dos dias continua a jogar-se, numa balança desequilibrada de poder, nunca se sabendo afinal em cada momento, quem é o vencedor e quem é o perdedor ...

Anamar

terça-feira, 6 de julho de 2021

" VIDAS ..."



Escrevo ao som de Fausto Papetti.  Temas imortais, relaxantes, com a fantástica capacidade de me  apaziguarem a alma e o coração.
"Herdei" este CD, muitos outros, livros, roupas.  Herdei de alguém que conheci pouco, com quem privei um número de vezes que seguramente se contariam pelos dedos das duas mãos.  Herdei, duma casa a desfazer-se, quando talvez não fosse ainda previsível vir a sê-lo.
É uma sensação doída, a que experimento.  A sensação estranha de estar a usufruir indevidamente de algo que me não era legítimo usufruir, como se estivesse a invadir a privacidade de outrém, as sensações de outrém, as suas emoções e os seus sonhos ... a sua história, enfim ...  
Afinal, tenho para mim que cada pertence nosso, com ou nenhum valor material, sempre é uma parcela do nosso eu, nele depositado.  Sempre é um pedaço de história, um pedaço de vida ... um momento, um instante, um sonho concretizado, um gosto realizado.
Ali estará sempre um pouco de nós próprios.

O desfazer duma casa é um processo contra-natura, como o desfazer dum ninho é um adeus àqueles que nele habitaram depois do construírem.  É um bater de porta, um fechar de janelas, um apagar de luzes.
É uma agressão sem tamanho, sobretudo se quem tem que a desfazer, está emocional e afectivamente ligada a ela, se de alguma forma a ela pertence ou pertenceu, se teve também a sua existência com ela interligada.
É doloroso, é destruidor, é mortal !

Lembro vagamente o desfazer da casa dos meus avós, após a partida da minha avó, seis anos depois do meu avô. Já lá vão mais de cinquenta anos.
Eu era então uma adolescente ainda, e naturalmente, não estava directamente envolvida nessa tarefa. Ela cabia aos filhos, a minha mãe e os meus tios.  Mas até hoje, quando regresso àquele Alentejo que já é já só de silêncios e solidão, aquele nó que me estrangula a garganta, e aquele aperto no peito que me atormenta a respiração, sobem e fazem-se presentes e sentidos.  Fico estática, perscruto as janelas já não minhas, deixo o olhar perambular lentamente, descendo da chaminé ao portão, por cada divisão do que era, por cada memória do que foi ... 
E volto a rever o poço de água fresca no quintal, com as rochas ornadas de avencas, volto a rever as galinhas e os pintos ciscando no terreiro e até as andorinhas nos voos rasantes nos beirais.  Até me volto a ver, a mim, menina de bibes e bonecas, mais tarde jovem de corpo fresco apetecendo os primeiros amores ...

Depois foi o desfazer da casa de Évora, onde vivi mais de dez anos.  Casa que se manteve estranhamente fechada e desabitada após a nossa saída rumo à capital.  
E de novo, as sensações e as emoções de desconforto e tristeza me invadem, quando a olho, como em romagem obrigatória, sempre que volto à cidade.
Também aí "repasso" a mente e o olhar perdido, por cada divisão, por cada objecto, por cada móvel.  E com eles, vêm o meu pai e a minha mãe, vêm as vivências recuadas dos anos escolares ainda despreocupados e leves ...
E uma vontade imensa de bater naquele número quarenta, naquela porta fechada esperando que ma abram, uma vontade imensa de subir a escada, desvendar o corredor, percorrer as divisões, olhar a chaminé de tijolo, em frente, onde a esta hora as cegonhas já haviam nidificado, ano após ano, todos os anos para alegria da menina que eu era ... me empurra em vão, sem que contudo eu saia do outro lado da rua ... porque tudo aquilo afinal ficou lá e não é mais meu, nunca mais será meu.  Porque o tempo já passou, porque os dias se fizeram e porque o destino se escreve, irreversivelmente, dia após dia.

A casa da Beira Alta foi "encerrada" na minha vida, anos mais tarde.  Por razões pessoais e familiares, foi chão que deixou de me pertencer.
Essa foi a casa dos verdes anos das minhas filhas, a casa dos dias ociosos das férias, o campo em volta, o rio ao fundo, a figueira de "pingo mel" guloso e irresistível ... a casa dos jogos de cartas em horas intermináveis, na mesa de pedra sob a tileira de copa farta. Casa de jogos, de correrias, de bicicletas, de gargalhadas, de espigas de milho roubadas nos milheirais vizinhos e assadas na fogueira ...

A casa da Verdizela, comparativamente mais recente e estreada em 93, também deixou de estar nas minhas mãos, embora permaneça na família em boas mãos também.  Hoje, a minha neta de quatro anos que não conheceu mais nenhuma, chama-lhe por direito "a sua casa" ...
Nunca lhe contaram ainda, que por ali paira o dedo da avó, o desenho da avó, muitos dos sonhos da avó.
Uma casa estudada ao pormenor, do interior ao jardim, foi decorada canto a canto e cresceu com a ternura e o desvelo com que se cria um filho.
Nela e no seu conforto, a minha mãe deu o último suspiro ... ela que lá vivera os últimos anos da vida, com uma ligação profunda de coração a todo aquele espaço, na preocupação de perpetuar a minha pegada por ali.
Mas a "casa", aquela que foi a minha, também já não existe, obviamente ...

Finalmente, a casa que mais me doeu a desfazer, a casa cuja porta mais me doeu a encerrar, aquela a que não gosto de passar ou mesmo de olhar, foi a casa dos meus pais, de quase toda a vida, por mais de cinquenta anos.
A ela cheguei ainda não tinha treze anos, e dela me desliguei com bem mais de sessenta.
Filha única que fui, coube-me exclusivamente a dor do desmanchar desse ninho, com o destino do recheio material, o alienar dos pertences, o violar dos recantos ... a disseminação das coisas impossíveis já de guardar ... 
Porque as memórias, essas vieram comigo, imortais que são, não ocupam espaço.  Guardá-las-ei nos arquivos do coração e da alma para todo o sempre !

Hoje, olhando para trás, vejo que a minha vida foi atravessada por dobrar de esquinas, viragens de ruas, desfolhar de páginas, encerrar de portas ... se calhar, como a vida de toda a gente, afinal.  
Mas, porque dolorosos normalmente são esses acontecimentos, pelo que eles representam no desencavar das memórias, no rewind dos percursos, no devassar das existências, eles representam um fim inglório e injusto para qualquer ser humano.  
Olho sem querer olhar, vejo sem querer ver, a minha casa de hoje, as minhas coisas cujo valor, para mim, é cada vez mais religiosamente considerado como uma extensão da pessoa que eu sou, da história que eu vou vivendo, dos sonhos que eu vou arquitectando, das flores e das pedras que me atravessaram o caminho e que guardei, todas elas sem enjeitar nenhuma.
Sei que o sol continuará a inundá-la sempre que na torre da igreja derem as quatro badaladas, sei que a luz da lua a incendiará, quando cheia, a devassar sem pudor ou contenção ... como agora, como sempre ... Sei que as divisões continuarão habitadas por mim, que por ali andarei a olhar os livros, os móveis, as molduras pejadas de rostos, que por ali andarei escutando os sons do silêncio, sorrindo ao Jonas, ao Chico, ao Óscar e à Rita que hão-de passear-se comigo do quarto à sala, do hoje ao ontem, numa história de eternidade resgatada.

E a porta também se cerrará.  Dessa feita, não serei eu a fazê-lo ...😢😢😢

Anamar

quinta-feira, 3 de junho de 2021

" O QUE RESTA ... "


Não escrevo nada ... nem em quantidade nem em qualidade !

Olho a página em branco à minha frente, e nada, não consigo parir uma ideia, um tema, um assunto que me motive, e que, abanando os neurónios me gratificasse com qualquer coisinha que pudesse animar-me.  Nada ... absolutamente nada !
Espremida a mioleira, não desencavo uma só coisa que justifique o esforço ainda sensível nos olhos recém-operados.
A minha crise existencial neste momento, o espírito deprimido que me assola, o cansaço e o desinteresse generalizado que me pressinto em relação a tudo e a todos, levam-me a crer estar em estrada sem retorno, estar estrangulada por nó de marinhagem, estar nas areias sem horizonte, sem bússola ou norte.
Não descortino incentivos para retomar caminho, não descubro razões para ir além, não pressinto forças para virar a página da vida onde estacionei ...
Começar os dias é tão só uma espécie de destino a cumprir-se, não mais,  um caderno de encargos que apesar de tudo tenho que honrar.  Automatizo as rotinas, pois é a única forma de não alienar algumas, e renego todo e qualquer esforço para preencher este imenso e pesado vazio que se agiganta diante de mim.
E no entanto, ele sufoca-me e mata-me gradualmente.
Não consigo tornar o hoje diferente do que foi o ontem, não consigo conceber um amanhã mais aliciante e preenchedor do que está a ser o hoje.  Vivo a mesmice dia após dia, todos os dias !...

Estou a viver a "pós-depressão" traumática de um estado de calamidade emocional arrastado há tempo de mais.  Uma anormal experiência de vida que teve a capacidade de virar o ser humano do direito para o avesso, o mérito de retirar a energia, a alegria, e até a emoção de vivermos a vida colorida, como o deverá ser. 
Estou  a viver  um  estado  letárgico  e amórfico  capaz  de embotar sensações, emoções, interesses, vontades e sonhos.
Estou a sobreviver amputada da expressão dos afectos.  Seca, árida, áspera e vazia.
Estou num ponto de não retorno. Sinto-me sem capacidade de reversão de tudo isto, porque não sinto em mim nem vontade nem fôlego para empreender novos caminhos.  
Vivo uma espécie de desaposta, dormência ou auto-abandono.  
Arrasto os dias e encolho-os, em detrimento das noites, essas, intencionalmente longas e cultuadas ... momentos abençoados de apagão na mente e no coração ...
Não vivo ... resisto apenas !!!

Não sei o que fazer, como fazer, atolada num pântano fétido, entontada no vaivém da montanha russa atordoante que são estes dias enjoados, sem horizonte à vista !

Perdoem o vazamento, perdoem a escorrência das palavras ... mas às vezes, no meio da solidão e do silêncio, são elas que restam ... pouco mais !

Anamar

sexta-feira, 28 de maio de 2021

" DAS TREVAS À LUZ "



" Das trevas à luz ", literalmente falando...

"Troquei" de olhos, ou melhor, até parece que troquei !
No passado dia cinco, intervencionei a catarata e a miopia no olho direito e três semanas depois, submeti o esquerdo à mesma situação.  Tinha miopia desde a adolescência, usei lentes de contacto mais de trinta anos, pois sempre abominei o uso de óculos, até que por intolerância às mesmas, acabei por não ter alternativa.
Com o avanço dos anos, todas estas situações são de absoluta normalidade, e deitando mão de actualizações sucessivas de graduação, lá fui andando, até ao momento em que, frente à televisão instalada pouco mais longe do que os pés da cama, comecei a ter uma desfocagem acentuada das imagens.  Uma espécie de cortina parecia opacizar-me a visão direita.  
As legendas, se brancas sobre fundo claro, inviabilizavam a sua leitura, as fotografias tiradas, depois de visualizadas no computador, acabavam revelando que o que eu julgara focado e perfeito, não o era ... e a qualidade de vida mostrou-se claramente insatisfatória.

Se a passagem do tempo me assusta, me entristece e me revolta, sentir-me objectivamente limitada pelo mesmo, mata-me por dentro.

Procurado um oftalmologista referenciado, revelou-se necessário implementar todo o processo de intervenção cirúrgica às cataratas. 
A minha mãe já o fora a um dos olhos, e hoje lamento não lhe ter proporcionado a realização da sua vontade de o ser ao outro, conforme o verbalizava algumas vezes.  Não o fiz estupidamente, pois tendo ficado praticamente imobilizada, restringida a uma cadeira de rodas, entendi não dever submetê-la a mais uma operação, atendendo à idade que já tinha.
Hoje e agora, a partir da experiência que acabo de vivenciar, penso tanto na injustiça que cometi e da qual tanto me penitencio !... 😥😥😥

Assim, iniciei todos os exames necessários para ser operada já em Fevereiro de 2020  (o que veio a gorar-se ),  já que a Covid19 chegou e jogou todos os planos das pessoas por água abaixo.
O medo que então se vivia, o receio da exposição ao risco no período em que ainda pouco se conhecia sobre a pandemia, sua transmissibilidade, contágio e propagação, as sucessivas quarentenas a que o país se submeteu, todo o figurino de vida que passámos a viver, inviabilizaram totalmente o percurso normal das existências.
Os médicos deixaram de operar, excepto em situações graves e inadiáveis, os hospitais e todo o pessoal de saúde com ela relacionado foi mobilizado, bem assim todos os espaços físicos a nível público e privado foram reclamados a disponibilizarem-se, como áreas de Covid.
Tudo ficou portanto, suspenso.

Agora, mais de um ano depois, e com alguma normalidade relativa nas nossas vidas, retomei o processo interrompido, inevitavelmente agravado pelo tempo entretanto transcorrido.
Felizmente tudo se tem processado dentro do previsível, as intervenções foram bem sucedidas e a recuperação está a fazer-se satisfatoriamente.

Como uma máquina perfeita que é, o nosso organismo vem habilitado com muitas e variadas valências, desempenha muitas e variadas funções, está apetrechado para responder a muitas e variadas exigências. 
Mas também, como todas as máquinas, sofre o desgaste dos tempos, as vicissitudes do desempenho, as falhas inerentes a um trabalho exaustivo, inimaginavelmente complicado.
Vamos percebendo que, mesmo nas situações de grande sucesso, tudo é efectivamente relativo, e os "prazos de validade" inapelavelmente sempre são anunciados e se aproximam.
Nesse contexto, acredito que o sentido da visão seja talvez um dos elegíveis, como prioritários no percurso do ser humano, pois embora não seja vital, confere-lhe uma qualidade de vida que eu diria aproximar-se do domínio do miraculoso.
Tal como em tudo, o Homem só valoriza quando perde... 

Alcançar a luz que talvez já não me lembrasse bem como era, abrir os olhos e rever com nitidez, precisão,  clareza, acuidade de definição, tudo o que me cerca ... poder extasiar-me com a magnanimidade das cores, o fascínio da paleta que pinta a nossa realidade ... ter o privilégio de me sentir mergulhada numa perfeição e numa harmonia que não se descrevem e são algo místico, irrepetível e  único ... sentir-me verdadeiramente abençoada pela Vida, pelo Destino e pelo Universo, por poder ser protagonistas desse fantástico regresso à CLARIDADE ... foi, sem sombra de dúvida, um dos presentes mais fantásticos e incríveis, que pude receber na minha vida !!!

Anamar

sexta-feira, 21 de maio de 2021

" NÃO SEI ! "

 


Não escrevo, não saio, não convivo ... não tenho nenhum tipo de paciência nem com as coisas nem com as pessoas.  Agasto-me, encurto conversas ... evito, se der.
Deixei de poder fazer a caminhada, que sempre funcionava como um escape, um momento de lazer e um recarregar de "baterias", à conta das intervenções cirúrgicas aos olhos, com o consequente desequilíbrio e desajuste da visão.
Com chuva ou com sol, refilando ou não, elas constituíam uma justificativa para dar um mínimo de sentido ao meu dia.  Eram uma fuga às quatro paredes que me sufocam, e um contacto com a natureza renovadora, equilibrante e potenciadora da saúde física e mental.
Agora, e ainda vai demorar algum tempo, a reposição dessa rotina continua interrompida.

Entretanto, sinto-me péssima neste momento.  Tenho uma clara noção de que, agora sim, o meu frágil equilíbrio emocional que se foi esfiapando ao longo de infinitos e intermináveis meses duma vida absolutamente anormal e estranha, a que temos sido relegados mercê da Covid e das sucessivas restrições e quarentenas a que fomos submetidos, está irreversivelmente danificado.
Não sinto em mim nenhuma capacidade de reacção, de ânimo, de força, de energia para lhe reverter o estado e o percurso... para o reconverter.
Os dias sucedem-se iguais. Com mais sol ou mais chuva, com mais Primavera ou Inverno, os horizontes repetem-se, e a sensação de estar atolada num lodo que me suga e não desprende, avoluma-se com eles.
Tenho em mim uma tristeza sentida, uma solidão que dói, um desânimo que me devasta.

Penso muito na morte, na partida, como se ela se anunciasse numa esquina contígua.  É um pensamento recorrente que domina os meus dias, como se apenas me coubesse esperá-la, e não houvesse já nada mais a vivenciar por aqui. Como se, sonhos, projectos, concretizações, ideais fundamentais para nortear a nossa existência, não coubessem já nos trilhos destinados, não fizessem já sentido no figurino de vida a viver. 
Como dizia uma amiga, parecendo estar a vivenciar e a sentir algo semelhante ... "vivo para morrer !..." ( não sei se consigo ser clara nesta afirmação )

Há alguns anos atrás, eu tinha focos, interesses, acreditava em futuros, fossem lá eles o que fossem.  Mas criava-os, desenhava-os, entusiasmava-me com eles.  Sentia valer a pena apostar em metas, colocava etapas na vida, fasquias a atingir - agora isto, depois aquilo - razões que dessem sentido ao caminhar.
Agora, estou absolutamente esvaziada de vontades, de interesses, de energia ou creres.  Só um cansaço mórbido me domina e isso tem um nome ... eu sei !

Bulho comigo mesma, digo-me que isto não é viver ... mas, onde encontro em mim o ânimo para sacudir as penas e voar outra vez ?!

Desvalorizo as "receitas" pedagógicas que generosamente me dão.  Não tenho paciência p'ra frases feitas, pensamentos de "plástico", teorias de auto-ajuda que me aconselham.  Não me fazem sentido !
Escombros ... escombros é uma espécie do que está a sobrar de mim ... simplesmente !

Depois penalizo-me, e se racionalizo, acho-me de facto frivolamente tonta. Futilmente sensível.
Porquê esta visualização da vida ?!  Porquê esta abordagem imatura da realidade ?!  Porquê esta exigência absurda da existência ?!
O mundo não gira à minha volta!  Os problemas reais e objectivos que dominam e angustiam milhões e milhões de pessoas, não me atormentam.  Tenho o que comer, tenho o que vestir, tenho um tecto sob que me proteger, tenho saúde, tenho uma família minimamente estruturada e a viver com as dificuldades normais que perturbam, grosso modo, toda a gente. Não mais.  Tenho resolvidas folgadamente as questões  triviais que atormentam violentamente, tantas faixas da sociedade.  Tenho uma terra, tenho um país, sou pertença de valores e lugares que me garantem nichos de conforto. Tenho segurança.  Mais ou menos, tenho certezas no dia a dia.
Não preciso de fazer uma trouxa e palmilhar mares e destinos ignotos, para assegurar os meus, na busca tão só de um amanhã ...  Não vivo sob o ribombar de bombas, estilhaços de balas, sirenes, gritos e lágrimas, em meio de vivos e mortos ... confrontando todo o tipo de ameaças, violência e atrocidades gratuitas ... sabendo que adormeço e nunca sabendo se desperto no dia seguinte ...
Vivo na Europa, garante só por si, de dignidade, princípios, respeito e protecção, e não em nenhum país sub-mundista, numa América Latina, numa Índia ou países miseráveis do oriente.

Então, se é assim, por que vivo nesta infelicidade atroz ?!
Por que não vivo, e diria que apenas vegeto ?!
Por que são apenas vários os tons de cinzento que pincelam as cores dos meus dias ?

Não sei ! Apenas o cansaço é palpável, apenas o nevoeiro cerra os meus horizontes, apenas a desesperança e uma apatia que me tolhe, domina a minha existência !
Mais ... não sei !!!

Anamar

sexta-feira, 14 de maio de 2021

" E JÁ FORAM TANTOS !... "



Vermos partir os nossos ascendentes é um processo doloroso, violento, mas que vivenciamos com alguma naturalidade, eu diria.  A vida prepara-nos para isso mesmo, forja-nos uma aceitação e confere-nos um olhar quase pacífico face á inevitabilidade.

É certo que nos debatemos, que sentimos em nós alguma injustiça, que nos rebelamos, como se alguém pudesse conter o percurso inevitável de todo o ser humano !...
Mas acabamos por apaziguar o espírito, dizemo-nos que essa separação será só até um "destes dias", que todos afinal, começamos a morrer um pouco desde o instante em que pousamos o pé na vida, e que o destino de todo o ser vivo é esse mesmo.  
O que difere, é o tempo que genericamente é distribuído a cada espécie, a sua robustez física, e claro, algum inexpectável acidente de percurso.
Assim, se tudo ocorrer dentro do teoricamente previsível, se nada precipitar o desfecho final e o mesmo ocorrer já em idades provectas, consolamo-nos dizendo que aquela avó ou avô, tio ou mesmo mãe e pai, acabaram tendo uma vida plena e que o seu caminho aqui na Terra, afinal foi de bom tamanho e usufruído generosamente.
E depois, sempre acrescentamos para nós mesmos, que essa despedida sê-lo-á apenas por algum tempo, já que "qualquer dia", talvez mais breve do que o suposto, voltaremos a encontrar-nos !...

Acho que é uma defesa que buscamos para aliviar um pouco a dor da alma que sentimos.  É uma espécie de mitigação e refrigério que nos damos, para que a continuação da nossa caminhada não seja tão penosa e insuportável, em meio da orfandade terrível que se nos abate.
Quem aceita a continuidade da vida além da morte, noutra dimensão e noutro contexto, quem encara como coisa assumida que, estando atentos aos sinais, perceberemos que aqueles seres de luz não se afastam totalmente dos terráqueos que por aqui ficaram, acaba minorando a rudeza do percurso, acaba aligeirando a dureza da existência, e prodigaliza um amparo e um conforto para os corações, que desta forma se sentem mais aconchegados em cada provação do destino.
E assim vamos, talvez inocentemente, caminhando !

Não interessa!
Afinal é como escudarmo-nos numa entidade superior, é como protegermo-nos nos braços de um qualquer deus, ou como aquietarmo-nos no cólo de uma qualquer santa ou virgem em que acreditemos.
Afinal, tudo não vai além, simplesmente, da convicção pessoal e não mais.  Tudo depende apenas da nossa capacidade de Fé ... independentemente do objecto dessa nossa Fé !

Mas, afasto-me daquilo que me ocupou a mente no início deste meu escrito ...

Ontem, faleceu mais uma colega.  Daquelas de toda a vida, nos trinta e muitos anos que leccionei na mesma escola.
As pessoas cruzam as suas vidas com as nossas, partilham os seus caminhos com os que trilhamos, dividem experiências, preocupações, alegrias, cumplicidades ... ao longo dos tempos ...
As pessoas trocaram aprendizagens, vivências, ensinamentos ... demo-nos afecto e carinho também ...
E depois, não bastando o trilho de afastamento que a vida nos acaba impondo, as pessoas vão partindo.

E porque sempre as lembramos como foram, como eram então ... porque continuamos também a imaginar-nos como fomos, como éramos então ... vivenciamos uma realidade fictícia da não passagem do tempo, e consequentemente, a despedida dos colegas e amigos surpreende-nos violentamente como um processo quase "contranatura", como não natural, como abusivo ... como uma pirraça malfeitora do decurso impiedoso das nossas existências !

E se os nossos ascendentes nos deixam com uma dor "calculada", digamos ... a partida daqueles que geracionalmente estão aqui ao mesmo tempo que nós, entreabre-nos repentinamente, quase inesperadamente, uma nesga do futuro que talvez não quiséssemos equacionar.  Mostram-nos, com dura clareza, que afinal nós também, já colocados na "calha", aguardamos a nossa vez, talvez mais próxima do que consciencializamos, pensamento esse que sempre quisemos afastar ! 
E têm partido muitos ! Têm partido tantos !... E têm-nos deixado cada vez mais pobres, mais órfãos, mais sozinhos !

Desta feita, Vitória, que o caminho te seja leve, que a paz te inunde e que as bênçãos em que acreditaste te bafejem e te assistam !
Eu, lembrarei sempre o teu ar decidido, lúcido, resoluto, pragmático e bem disposto !
Descansa em paz !

Anamar

quinta-feira, 13 de maio de 2021

" SONHO CUMPRIDO ! "



Afinal, mãe, em que é que ficamos ??

Havia dito que não queria morrer antes do seu Sporting ser campeão ...
Que nas suas orações tentava sempre sensibilizar a Nossa Sra.de Ao pé da Cruz, para dar uma mãozinha, ano após ano ( e foram muitos ), por forma a que as bolas acertassem em balizas adversárias que pareciam teimosamente estreitar-se, por cada jogada ... 
Tudo isto na mais descarada promiscuidade nunca vista, entre futebol e religião ! 😏😏😏
Havia dito que o enguiço era de tal ordem, que para não o agravar, agoirando o resultado, não veria jogos, nem ouviria relatos ... já que o sofrimento era devastador.  Ligava o rádio no início das partidas, conferia a constituição da equipa, e encerrava. Dez minutos antes do intervalo, meio a medo, meio em angústia, reabria e conferia a matemática do placard.  Repetia-se o filme na segunda parte e novamente dez minutos antes do apito final, era chamada à realidade.  
Das duas uma, ou o marcador nos era favorável ( folgadamente favorável, deve dizer-se ), e usufruía então a felicidade de uma vitória quase garantida até ao apito final, ou ( muito comum ), as coisas não haviam corrido de feição, e a tristeza não lhe permitia continuar a padecer por mais tempo, e retirava o pio ao rádio.
"Será para a próxima !  Eles coitados, até jogaram bem ... mas têm muitos jogadores lesionados, sabes ?!"
E eu irritada com tanta complacência e tanta capacidade de aceitação e justificação ... "Bolas, ganham rios de dinheiro para isto !..."
E lá vinha mais um desfiar de "acidentes" e incompreensões do árbitro, faltas mal marcadas, favores, penáltis indevidos, mais um azar perseguidor ... fazer o quê?!
Nessa noite, aposto que as orações eram reforçadas !...😁😁
Certo certo, é que na manhã seguinte, e infalivelmente em todas as outras, pelas sete, a "Bola Branca" na Renascença, era religiosamente escutada, e todo o historial e debates dos jogos, eram escalpelizados.

E depois, na ponta da língua, eram as histórias das transferências, das chicotadas psicológicas, com os treinadores a dançarem na corda bamba, eram as dispensas, eram os jogadores no banco, por castigos ... era a pontuação no calendário dos campeonatos, das taças e jogos internacionais ...
Era o caderninho feito à mão, jornada a jornada, dos jogos que iriam ocorrer, e ao lado, a seriação pontual de todos os clubes.  Até ao Natal a coisa ia ... depois é que eram elas ...
E tudo sofrido  e levado a sério, a camisola também suada !...

A história já vinha de trás, muito de trás, eu diria que quase de nascença. Afinal, ser "leão" não é p'ra qualquer um. Requer características muito próprias, de fé, sacrifício, perseverança, resiliência e muito amor ao clube.
Numa casa de cinco filhos, lá no Alentejo profundo, em que a única nota dissonante era um pai benfiquista ferrenho no meio de um verde que já nascia com todos, o coração e a mente eram forjados no sonho da vitória. Mesmo sendo mulher, eu sei que o apego ao acreditar, a garra naquela mística que não se explica, nunca apagou a chama ...

Mãe, lembra-se quando íamos as duas aos jogos do Lusitano de Évora, em domingos em que o nosso clube o visitava ??  Íamos só as duas, porque o pai a fizera sócia do clube da casa. Ele, que nunca gostou de futebol, sabia que a mãe o tinha nas veias.  Bancada de sócios, e os meus sete, oito anos permitiam que mesmo dali eu festejasse os "nossos" golos. Eu era uma criança afinal, já a mãe tinha que comportar-se !😁😁

Anos que foram passando, histórias que eram contadas, os cinco violinos e tantos nomes míticos da história sportinguista nas mais variadas modalidades, que já eu também dominava, como se as tivesse vivido...  
Depois, a agenda com os autógrafos dos pupilos de Augusto Inácio e dele próprio, num período mais próspero, quando a sua neta a levou, já com oitenta anos feitos, a assistir a um treino da equipa, foi mais uma peça do espólio guardado religiosamente, até ao fim ... herança dos bisnetos ...
E aos noventa, uma visita circunstanciada ao Museu do Sporting, uma subida ao topo de Alvalade com direito a fotografia sobre o relvado, no que foi um presente inesquecível ... o melhor que lhe podiam ter dado !!
Em suma, toda uma vida de devoção, partilhando com denodo os êxitos e os fracassos, os sonhos e os objectivos ... as alegrias e as aflições ... tudo muito a sério, matriarca que era  duma família onde já se nascia "verde" !

Afinal, mãe, em que é que ficamos ??
Tinham sido só mais três anos de espera ... Acho que se a mãe soubesse, teria mesmo esperado ... 
Não lhe deram essa alegria !
Quando partiu, levou o seu clube no coração, e junto ao rosto o cachecol que sempre a acompanhou !

Somos CAMPEÕES, mãe ... 
Alvalade ontem, era uma nuvem verde, duma esperança que se tornou realidade.  A festa fez-se, os fogos subiram no céu escuro, os cânticos ecoaram por essa Lisboa fora.
Afinal todos sabemos porque foi impossível ficar em casa !... 

E como estaria transbordante de felicidade se o tivesse presenciado !...

Anamar

sábado, 24 de abril de 2021

" BREVE RADIOGRAFIA "


Um dia cinzentão com cara copiada da minha, e da minha vida.
A "Lola", mais uma tempestade das invencionices da meteorologia, parece atravessar o país.
Por aqui, de tempestade nem bem o cheiro, pois além do céu de cenho carregado com a abóboda uniforme e borrascosa, nem chuva nem vento, nem ameaços ! 

Tempestade, a bem dizer, despenca diariamente aqui no meu prédio, desde as nove da manhã, até perto das seis tarde, com as famigeradas obras a decorrerem dois andares abaixo do meu. 
Casa vendida depois do falecimento da proprietária, nossa condómina para mais de quarenta anos, abre-nos uma nesguinha do que serão também, inevitavelmente, os destinos da nossa história, passados que forem os tempos ...
Não quero pensar muito nisso. Afinal, espero que quando tudo venha a acontecer, previsivelmente eu já cá não esteja.
Gostaria de partir aqui mesmo da minha casa, casa onde entrei, por estreia da fracção, no dia 1 de Junho de 1974.  Casa de alegrias, de desgostos, de sonhos, de realizações, de desânimos experimentados ... casa de silêncios, agora. Porque já o foi de risos, de gritarias inconsequentes da miudagem, de emoções, confraternizações e comemorações, como sempre acontece em todas as famílias ainda estruturadas, como a minha o foi, até há já largos tempos atrás.

Esta solidão que divido hoje com os meus gatos, encaminha o meu pensamento para becos tão escuros quanto o dia, para estradas tão sem sentido e destino, quantos os que tem um caminheiro no deserto, sem bússola ou estrela ...

O desconfinamento pandémico abriu, e caminha-se para um possível levantamento do estado de emergência no fim do mês.
Abriram os cafés, deixando de servir exclusivamente ao postigo, abriu a restauração com condicionalismos penalizantes ainda, espectáculos, cinemas, teatros, museus, exposições e outros eventos culturais descerraram portas, os ensinos secundário e superior retomaram.
Contudo, sinto em mim a magnitude do estrago infligido pelos tempos.  Foi-se-me embora o medo, ou melhor, foi-se-me embora o susto, o pavor, o desnorte que no princípio me deixou barata tonta.  Interiorizei a doença, agreguei no meu ADN a existência da mesma e a necessidade de com ela conviver com alguma "normalidade" possível.  
Fui vacinada sem grande convicção. Mas fui. Não que isso tivesse sido um acréscimo de tranquilidade significativo, no meu espírito ... só que ---

Só que hoje sou formalmente uma pessoa diferente, sou uma pessoa amargurada, torturada por esta avalanche de acontecimentos que nos submergiram, cansaram e tiraram a disponibilidade emocional.
Sou o pássaro a quem abriram a gaiola mas a quem não apetece saltar, sair, voltar para o verde e o azul lá fora.  Sou a ave que vive triste, sem se atrever outra vez ao infinito ... porque perdeu a vontade e o gosto.    
Nada é igual, nada está igual.  As pessoas envelheceram de cansaço e desânimo.  Vejo isso nos espelhos ... vejo isso nos rostos com que me cruzo.  Não serei excepção.  
Já poderia dar alguns curtos voos ... já poderia ir além do limiar da porta, do fim da estrada, p'ra lá do horizonte ... Mas a força anímica, o empenhamento na aposta, a energia para o arranque ... onde estão ??  Não os encontro dentro de mim !
Esse imobilismo é que me assusta, esse amorfismo é que me atormenta, essa aparente indiferença é que me incomoda ... essa angústia é que me mata !  Afinal, são sinais de morte e não de vida.  São manifestações de um tédio patológico, de um desinteresse doentio, de uma tristeza insalubre !
Não sei, não vislumbro como reaprender os passos, como reconhecer o caminho, como reinventar o sonho !
Que precisarei fazer para me reencontrar ??

Anamar

terça-feira, 13 de abril de 2021

" SÓ TEMPO ..."

 

11 de  Abril de 1921 -  11 de Abril de 2021

A estranheza de nos sentirmos nada, ou melhor, de nos sentirmos apenas aquele grão de poeira da terra onde se volta, onde sempre se volta um dia ... aquela sensação de pequenez, de insignificância, da indiferença de um mundo que continua impassível, igual a si mesmo, que nos desconhece e nos ignora, apesar de estarmos de partida ...voltei a experimentar.
Voltei a experimentar estes sentimentos de perfeição, fora de nós, imperfeitos que somos no todo que nos forma !
Voltei a experimentá-los, no meu regresso à Aguda, àquele pórtico simbólico de passagem entre o cá e o lá, entre esta e a outra dimensão ... derradeiro destino.  
Afinal, havia que pôr em repouso, "ad eternum", os restos físicos do meu irmão, circunscrevendo um pouco mais, o círculo de sangue e afectos, do que resta duma família que se uniu, nas raízes daqueles arbustos, prova de vida, de ressurreição e continuidade.

As falésias adormentadas, silenciosamente místicas, maravilhosamente adornadas nesta Primavera em desponte, atestam em eternidade que o Tempo é apenas uma estrada que segue adiante sem horizonte que o limite !
A brisa que soprava, o céu translúcido, azul e luminoso, o mar que marulha incessante e dolente numa melopeia embaladora ... as gaivotas que cortam mansamente o firmamento ... e o silêncio ( não me canso de nele me perder ), repetem na minha alma que é ali, tem que ser ali, sem nenhuma dúvida ou omissão, que terei que me quedar também, um dia !
Aquele chão chama-me, aquele verde rasteiro, pertença dos rochedos alcantilados, apela-me e sussurra-me que  só ali, poderei ter paz.  A paz da liberdade, a paz da pertença à terra donde vim e para onde estarei indo !
Aquele zimbro despontado e perene, a doçura da certeza da continuidade, no morrer e renascer por cada estação que começa, não se explica, apenas se sente e nos trepa no sangue borbulhante das veias.
Ali moram todos e não mora ninguém. Porque ali, é lugar apenas de memórias ...

Hoje, domingo de um Abril, mês icónico no meu calendário dos afectos ... hoje, dia 11, a minha mãe completaria um século de vida, na contagem indiferente e fria dos Homens.  Partiu há três.  
Há três, que num dia com o mesmo rosto do hoje, luminoso e claro, num céu salpicado também ele, de novelos brancos viajantes, foi embora.
Eu sei e sinto que ela continua por aqui, e apenas se cansou de arrastar por mais tempo o precário invólucro que lhe destinaram.  Não que ela quisesse ir, não que ela não sonhasse em ir vendo os destinos dos seus que por aqui se cumpriam ... Apenas, o cansaço, aquele cansaço que nos tolhe o passo e a mente, a empurrou adiante.
Assim, tomou o trilho, abriu o caminho e foi apenas, antecipando-se ( como em dia de festa "adiantava" os preparativos para a chegada dos outros ), aguardar pelos que hão-de ir ...

Hoje, mãe, no dia em que nasceste e morreste, no dia em que fechaste absoluta e totalmente o ciclo da tua existência, reserva aí o lugar, prepara o reencontro, guarda o abraço ... porque tudo não é mais do que uma questão de Tempo !...

Anamar

domingo, 28 de março de 2021

" O PESO DO SILÊNCIO "


Um dia destes desaprendo de falar. 

É domingo, é um dia dos finais de Março, é um dia dos finais do primeiro trimestre de 2021, o que configura um quarto do ano em "lockdown" ... também ele ...
A Primavera começou quando e como devia, os dias sorriem radiosos, o céu azulou, cristalino e límpido.  As temperaturas são aconchegantes, as flores e os pássaros cumprem calendário na perfeição, voam livres e soltos, cantam em afinação total, e as flores, essas abrem as corolas num milagre que se renova de dia para dia.  
Eu, continuo por aqui.
Sentada atrás da vidraça, banhada por este sol de final de tarde, escuto o silêncio de uma cidade em adormecimento.  Aqui, os gatos dormem, um na espreita dos últimos raios que se atrevem a entrar, o outro, aos meus pés, sobre a carpete.
Não falam, os meus gatos ... e sê-lo-ia bom !

Excepto quando refilo com o despautério de disparates feitos, excepto quando refilo com o alheamento que me toma em relação a tudo, e vocifero contra mim mesma, os sons desta casa são apenas "não sons".
Parece um lugar tumular, parece a antecâmara de um lugar sem vida, um lugar de silêncios e imobilidade.
Ao longo dos dias, totalmente ritualizados, os movimentos, os gestos, os hábitos repetem-se copiados integralmente.   E todos eles se acompanham de silêncio, um profundo e pesado silêncio !

Acho que à medida que o tempo avança neste figurino de vida, vou sendo moldada mais e mais no sentido desse isolamento.  Vou sendo redefinida mais e mais para a indiferença, a insensibilidade, a falta de gosto e de vontade.
Vou-me encarquilhando e virando para dentro. 
Estou mais para avesso que para direito.  
Estou mais pra concha que para mar aberto. 
Desaprendo de falar, mas também desaprendo de sentir e irmano-me mais  com uma pedra, que com uma árvore ... 
Endureço-me como ela, tolda-se-me a vista e embotam-se-me os sentires.  
Esboroa-se-me o querer e o valer a pena. 
A natureza é bênção que me pinga aos poucos, quando caminho.  As plantas e os bichos ainda me emocionam ... e o céu pertinho e o mar adivinhado, mas sempre vizinho no meu coração, transportam-me a tempos, para tudo o que foi e não é mais ...
A fadiga assola-me.  A fadiga de alma e um desgosto profundo por me ver amputada, como um pássaro de asas cortadas.
Não gosto de me ver num espelho, e não gosto que me vejam aqueles que me viram, quando os dias eram outros, quando os anos eram mentirosos promissores ... e quando a vida se fazia parecendo que ainda se podia tudo !

Hoje, resta-me a solidão.  A solidão e o peso do silêncio, meu companheiro de travesseiro desde os nasceres da lua, até o sol a empurrar para além do horizonte.
Resta-me o silêncio pesado e sufocante e desaprendo de falar ... e desaprendo de sentir ...

Anamar

terça-feira, 23 de março de 2021

" A SEGURANÇA DOS TEMPOS IDOS ..."

 


Quando as galinhas tinham dentes, os cães se chamavam "Leões" ou  "Pilotos" e os gatos "Tarecos", já eu andava por aqui.

Isto poderia ser o início de uma linda história infantil ...

Era quando o "coelhinho ia com o Pai Natal e o palhaço, no combóio, ao circo " e o  Topo Gigio chegava de mansinho e corria com o pessoal para a caminha, com promessas de "amanhã voltarem a ver a tv como você" ...
Mas isso foi antes, bem antes.
O monstro das bolachas, o sapo Cocas, a Miss Piggy, o Egas e o Becas ou o Poupas Amarelo, o Professor Baltazar ... a Pipi das Meias Altas, o Vitinho, ou mesmo o Sítio do Pica-pau Amarelo com a maternal D.Benta e a Narizinho mais a sua boneca-gente Emília, enterneciam os pequenos ... e não só !...
Companheiros de tantas refeições distraídas ... forma certeira de lá ir mais uma colher de papa ...

Mas muito mais antes ainda, o Skippy e o Flipper ou mesmo a Lassie e as suas aventuras de cadela quase humana, colavam-me ao écran ... 
Tempos em que, a Família Cartwrigth avançava écran adentro, nos seus garbosos alazões, com promessas de mais histórias e aventuras dos quatro irmãos e o pai, ao som do tema musical que ninguém da minha geração, de certeza esqueceu ...
A Casa na Pradaria, a Família Robinson ... o Dallas, tempos depois ... 
Muito depois do Professor Vitorino Nemésio, com a sua voz nasalada,  nos falar de cultura e desse mundo, onde se dizia já, velho... Isto, depois de, enquanto se  lembrasse,  nos falar sobre a sua terra, os Açores, e do mau tempo naquele canal, entre Pico e Faial, num emblemático romance vivido na segunda década do século XX ...

Lia-se muito então.  Os Cinco, os Sete, Os desastres da Sofia,  As Meninas Exemplares, Céu Aberto, Em pleno Azul, Grichka e o seu urso ... as aventuras de Tom Sawyer e Hucleberry Finn integravam, entre outros, o meu imaginário.  
Depois da história avançar, seria a vez da  panóplia de escolha se alargar ainda mais, e a colecção da Disney ( com todos os conhecidos e imortais clássicos ), da Anita, da Patrícia, da Carlota, da Lilybeth, a banda desenhada com o Donald, o Patinhas, o escuteiro Mirim, o Pateta, o Cebolinha e os Irmãos Metralha entre outros, fariam as delícias da geração pré- electrónica.

Anthimio de Azevedo trazia-nos sacramentalmente, o tempo, esse, o que a meteorologia nos ofereceria no dia seguinte ... sem demais preocupações, porque os Verões eram mesmo Verões, os Invernos eram mesmo Invernos, e afinal, quase sempre o resultado saía furado.
Sousa Veloso também se ouvia e via, prazerosamente ... Tudo o que nos remetia para o meio rural e nos transportava às origens, integrava o interesse de muitos.
O Festival da Canção, era um "acontecimento" muito, muito especial e desejado ... Obrigava à reserva de disponibilidade total, jantar terminado, silêncio respeitado na sala ...
Não era difícil, porque as solicitações então, eram poucas.  A vida corria pacata e sem demais afobações, e as votações no final sempre nos deixavam a curiosidade espicaçada.  
Depois, era aquela coisa de destino ... os últimos lugares na Eurovisão sempre nos assaltavam a sorte !

E tudo nos chegava através daquela caixa mágica, daquele inestético  "trambolho", pousado na prateleira da estante.  Caixa onde tudo corria entre o branco, o preto e o cinzento.  Onde Isabel Wolmar sorria, com presença sóbria.  Sorria, e sorria para o meu pai, que garantia ( acenando-lhe ), que "aquela menina se estava a rir para ele" !

O Natal trazia-nos "obrigatoriamente" a "Música no Coração", em que a Família Von Trapp nos emocionava  e nos enternecia sempre, com a intensidade de uma primeira vez, mesmo que desfrutássemos do filme pela quarta ou quinta ...
O Doutor Jivago, havia de ser outro marco na sétima arte, que nos gratificava o espírito ! 
Também o visualizei uma meia dúzia de vezes, perdendo-me na beleza das imagens, na emoção da história, no emaravilhamento do imortal Tema de Lara ... e nos rostos fantásticos e expressivos de Omar Sharif, Julie Christie e Geraldine Chaplin.
O Natal também nos trazia as imagens doídas de histórias, emoções e relatos de saudade e mágoa ... mas também de esperança.  Esperança por um fim que algum dia chegaria ...
"Adeus, até ao meu regresso"... era inevitavelmente o epílogo das saudações familiares trazidas lá de tão longe, de uma África a ferro e fogo ... sangrante e esfacelada ...

A Páscoa chegava e  Ben-Hur, Quo Vadis, Os dez Mandamentos, A paixão de Cristo  
preenchiam-me as tardes ociosas de férias começadas. Filmes longos, rendiam, na desocupação do tempo ocioso de dias sem obrigações.
E apesar de, de ano para ano reincidirem, era como se os víssemos pela primeira vez.
Páscoa era também amêndoas de licor em formas e cores sugestivas.  Parece que ainda as saboreio !
Páscoa era família presente, eram campos verdes do Alentejo, eram rituais ancestrais a repetirem-se ...
Era aquela segurança e paz que nos aquecia a alma e nos fazia sorrir no coração ...
Páscoa também viria a ser a Beira, com visita pascal, com mais campos verdes, com bicicletas, chanfana, bolo doce ... Desta feita com as "pestinhas" a tiracolo ...

Bom ... não sei por que hoje acordei assim, nostálgica, mansa por dentro, saudosa ... com olho molhado.
Não sei por que um arrebatamento de saudades de tudo e todos, me tomou até à fímbria do meu ser.
Ou talvez saiba ...
Ontem a Teresa, nos seus três anos, sentada nas minhas pernas, esmiuçava-me a fisionomia.  Tocava com as mãos pequeninas ... as minhas mãos grandes e pregueadas, tentando esclarecer o que via.  Dizia-me, na sua inocência infantil : "Avó, tens as mãos assim, porque já és velhinha.  Mas não te preocupes, porque depois vais para a lua. "
Perguntei-lhe o porquê da lua, imaginando eu que me caberia uma estrelinha, nas tantas que no firmamento escuro, já têm rosto e nome ...
"Porque a lua é maior, tem mais luz ... e lá, está a Bi !"
Pronto, percebi e logo ali aceitei a coisa, pois eu sei que não poderei vir a ficar em melhor companhia !...




Anamar

domingo, 7 de março de 2021

" E NÃO MAIS ... "

 


As pessoas partem ...
E depois fica aquela coisa injusta e incompreensível, de tudo ficar exactamente na mesma.  O mundo passa tão igualmente bem, connosco ou sem nós.
O sol brilha, até mais do que em dias borrascosos, mais adequados à morte ... Os pássaros voam e deixam-se escutar com a mesma alegria de sempre ... As flores espanejam a beleza do seu exuberante colorido, adornando os caminhos, enfeitando os arbustos, emoldurando a paisagem ...
O vento sopra, em brisa ou irado.  O mar é igual e diferente, hoje, amanhã, sempre ... e vai continuar antes e depois de nós, a açoitar as falésias ... a beijar os rochedos ... porque é e será sempre assim !
E as pessoas repetem o que fazem todos os dias, com a indiferença do areal que ignora o grão de areia arrastado pela maré.  Um grão a mais ou a menos, que diferença faz ?!  Tudo continuará exactamente como antes.
Se amanhã tiver que chover, choverá.  Se a Primavera estiver p'ra chegar depois de amanhã ... chegará, com toda a certeza do mundo !
O nosso espaço permanecerá imutável.  A cadeira continuará no mesmo sítio ... só que agora, vazia !
Os sons de casa também são rigorosamente os mesmos, porque já o eram há muitos, muitos anos !
E tudo perdurará depois de nós.  
Este xailinho que me protege as costas, já protegia as da minha mãe, faz tempo.  Este xailinho de lã tricotada, foi-o por umas mãos que já partiram há mais de quarenta anos.  Ele continua por aqui, e pode mesmo proteger a minha neta, depois de eu partir ... Que importância tem isso ?
Haverá um tempo em que alguém o lembra.  Findo esse tempo, ninguém mais o lembrará ...
As coisas vivem enquanto alguém as lembrar e nelas falar ... Só !... E a memória do Homem é demasiado curta !

As pessoas partem ...
E o vazio que fica hoje, ficará só durante um tempo.  Porque o tempo se encarregará de o preencher .
A história lembrada hoje, será esquecida.  É só mesmo uma "questão de tempo" ... como se diz.
E o tempo é aquela entidade abstracta que inventámos, só para espalhar marcos incómodos na nossa estrada.  O tempo não serve rigorosamente para mais nada, além de nos angustiar, de nos confrontar com a sua finitude e com a nossa aproximação gradual ao chamado limite desse mesmo tempo ... o fim da nossa existência por aqui !
Ontem, ainda éramos.  Hoje, não somos mais.  
A  voz, a gargalhada que ainda parece escutarmos, o timbre que conhecíamos, o rosto e a expressão familiar aos nossos dias, vão-se esbatendo ... como uma fotografia a sépia, com o correr da vida.
Haverá um tempo em que alguém perguntará quem era aquela imagem naquele retrato ?  De quem eram aquelas palavras, largadas num dia feliz, numa folha de papel, num cartão de Natal ?  A quem pertenceu aquele livro que já pontuou a cabeceira de uma cama ... há eternidades ?
E se calhar, já ninguém o saberá responder, tal a irrelevância da questão.

As pessoas partem, e só vão continuando por aqui, enquanto houver um  que seja, que as lembre ... não mais.
Enquanto houver alguém que diga "era simpático, era meio doido ... apaixonado pela vida ... era insuportável, era doce, costumava dizer ... sempre dizia ... lembram, quando entrava ? ... era amigo ... generoso, sonhador, era alto, sentava-se sempre ali ... não estão a ver ?... "   
 ... enquanto  houver alguém que ainda diga ... nós continuamos a pairar por aqui !
Enquanto houver uma lágrima que escorra por nós ... enquanto  houver quem lembre uma data, quem recorde um momento, quem cite uma frase, quem desencave uma memória ... nós continuamos por aqui.
Enquanto houver ... e não mais !

Hoje foi um dia cristalino, de sol claro e luminoso .  Hoje devia ter sido proibido morrer ... mas as pessoas partem !...

Anamar

sexta-feira, 5 de março de 2021

" LABIRINTO "

 


Tenho uma sensação remota de estar a percorrer um labirinto tipo "pescadinha de rabo na boca", em que retomo o ponto de partida.  Uma espécie de círculo vicioso de que não consigo libertar-me saindo dele, por mais voltas e voltas que dê.
Só me faz lembrar aqueles sonhos, às vezes recorrentes, que nos deixam extenuados e dos quais acordamos com uma angústia sem tamanho ... Parece que caminhamos, caminhamos  até à exaustão, sem conseguirmos sair do mesmo lugar ...

Já ontem referi no post que publiquei, que o meu grau de saturação, de cansaço e de consequente irritabilidade, está a atingir o pico dos picos.
Neste momento, quando os valores fornecidos diariamente sobre a panorâmica da pandemia, pareciam animar-nos um pouco, pela descida de todos os parâmetros de avaliação ( número de novas infecções, número de óbitos e número de pacientes em cuidados intensivos ) ... quando parecia podermos respirar um pouco mais folgadamente quanto às expectativas futuras ... quando parecia abrir-se, com a Primavera, um futuro mais radiante, solarengo e esperançoso ... eis que as notícias escutadas ontem, nos dão conta da possibilidade do surgimento duma quarta onda pandémica, tão grave quanto a vivida em Janeiro passado, mercê da disseminação das estirpes invasoras, resultado das mutações constantes sofridas pelo vírus.
Em Portugal, neste momento, a variante inglesa, caracterizada por uma transmissão mais fácil e por isso mais rápida, já apresenta uma percentagem de perto de sessenta por cento dos casos das novas infecções.
A variante do Brasil, conhecida pela variante de Manaus, tristemente identificada pelo estrago que operou nessa zona da Amazónia, altamente contagiosa e mortífera, também já está no nosso país ...
As vacinas, entretanto estão a ser reajustadas, tanto quanto possível, às mutações sofridas pelo vírus que sempre "corre" à frente, e não garantem uma eficácia tão absoluta quanto o estimado inicialmente, em condições ditas "normais" para o Sars Cov2.
No continente Europeu, centro e leste, a situação parece estar a complicar de novo, com o número de infectados a subir exponencialmente, obrigando a novos confinamentos mais rigorosos, nos países dessas longitudes ...
E entretanto também, não demora que Portugal inicie o seu desconfinamento, a manterem-se as tendências verificadas actualmente ... o que sinceramente vos digo, me parece mais mau que bom !

Apesar de eu e a maioria das pessoas não podermos mais com tudo isto, apesar da resiliência já ter ido para o espaço, da paciência se ter esgotado,  da saturação, cansaço e desinteresse por tudo, traduzida por uma apatia crescente, estar a adoecer-nos ... apesar de não concordar com muitas das medidas assumidas superiormente pelas autoridades políticas e sanitárias, apesar de sempre acharmos que isto e aquilo não foi adequado ... pergunto ... quem faria melhor e quem não faria melhor, se pudesse ou soubesse ?
Porque todos sofremos o desespero das dificuldades a todos os níveis, consequências das decisões assumidas ! Isso, é inevitável !
E haverá alguém, aqui ou por esse mundo fora, que possua uma bola de cristal, ou tenha acesso às informações / previsões de um qualquer oráculo, que premonitoriamente pudesse ter dado uma mãozinha a quem, em cima dos acontecimentos, para o bem e para o mal, foi obrigado a decidir sobre tudo ???
É sempre muito fácil sermos "advogados do diabo".  Somos sempre lestos em atirar pedradas, e previsões depois do jogo, também todos somos autoridades iluminadas para o fazer.
O difícil, difícil, é antecipar jogadas, é conseguir prever com assertividade o percurso da história ... é, com poucos dados, sermos capazes de congeminar a jogada adequada em cada momento, em tempo record ... porque também aqui, a antecipação, acarreta dividendos !

Sou honesta : não me filio em nenhuma corrente partidária, tenho uma antipatia visceral e nojo mesmo, infelizmente pela quase generalidade dos políticos, embora não ignore que cada escolha, decisão  ou rumo seguido por nós, nas nossas vidas diárias, são actos políticos.
Mas juro-vos que não quereria estar na pele de nenhum deles, neste timing da História.  
Não gostaria de sofrer o desgaste, a exaustão, a precariedade de descanso, todo o ónus, enfim, de terem que dar diariamente, hora a hora, momento a momento, o peito às balas, sabendo desde logo que NUNCA se pautarão pelas opiniões de todos. Agradar a "gregos e troianos" é, como sabemos, impossível !

Os tempos que vivemos são uma vicissitude dramática e imprevisível que nos aconteceu.  
Lê-se que, indirectamente, o Homem tem uma quota de responsabilidade nela.  A forma como o planeta tem vindo a ser tratado pela Humanidade, a existência de vírus que se transmitem de espécies animais selvagens para os humanos, a existência de gelos perpétuos nas zonas polares que, derretendo devido às alterações climáticas,  puseram  a descoberto espécies que estavam totalmente protegidas há milhares de anos e que são potenciais portadoras de micro organismos desencadeadores de possíveis / futuras outras pandemias, são apenas alguns exemplos do que refiro.

Sobre este vírus, a sua constituição, a sua capacidade de propagação, resistência, mutação, potência letal sobre o Homem, entre outros aspectos ... pouco se conhecia e de tudo se tem estudado e exaustivamente descodificado, ao longo de um ano.  
Mundialmente, de oriente a ocidente e de norte a sul, eu diria que o campo científico apostou as fichas todas no conhecimento gradualmente mais aprofundado deste nano-organismo, as suas implicações e consequências para todos nós ... 
Mas o que é um ano, temporalmente falando, neste tipo de estudo ?!  Milagres não existem, e como cientificamente se sabe, o conhecimento avança sempre, cautelosamente, titubeantemente, por experimentação baseada na tentativa de erro e acerto, de avanços e recuos, sendo que a teoria de hoje pode amanhã ser substituída por uma outra verdade.
Por tudo isso, ainda assim, muito se apostou, muitas metas se alcançaram e muito se clarificou já, em toda esta intrincada matéria, numa corrida de maratona contra o tempo.  
Porque o tempo representa vidas humanas a serem poupadas !

Depois, nesta verdadeira guerra de muitas batalhas, a vertente económica dos países está totalmente afectada.  A economia está de rastos, com os países fechados.  Portugal não é excepção.   Desde a restauração, ao turismo, expoentes máximos da nossa economia, tudo parece submerso num tsunami avassalador.  O desemprego é catastrófico, as exportações caíram, o pequeno negócio de lojas de rua, não sendo de bens essenciais, também paralisou, assim como muitos outros ramos de comércio e indústria.
As dificuldades sentidas pela maioria das famílias são abissais, e a fome e a miséria estão por aí ...
Que o digam os Bancos de Apoio alimentar e as Instituições oficiais ou não governamentais mesmo, que desceram ao terreno, a fim de tentarem minimizar os dramas diários que se vivem ...

Tudo isto sem um fim à vista.  Tudo isto sem se vislumbrar uma real e consistente melhoria.  Tudo isto num desafio individual e social de resistência, de coragem, de manutenção da sanidade mental e de alguma confiança, esperança e fé nos tempos vindouros ... se ainda o conseguirmos !!!

Anamar

quinta-feira, 4 de março de 2021

" MEMÓRIAS ... "


Hoje acordei "fora do ar" ... explico : acordei desenquadrada, não situada, às pressas, como se qualquer coisa urgente estivesse por resolver, vá-se lá saber onde.  Acordei irritada, aquela irritação cáustica que sentimos, aliada a uma impaciência corrosiva que experimentamos quando tropeçamos nas próprias pernas ... nem p'ra frente, nem p'ra trás, nada nos sai das mãos !!  Estou portanto insuportável, sem mais folga p'ra aturar o mundo e a vida ... sem mais margem p'ra me suportar até a mim ... ou sobretudo a mim ! 

O dia está exactamente como eu, cinzento, nem carne nem peixe, amodorrado, sonolento, fechado p'ra balanço !
Fora anunciado um dia de chuva, da grossa, numa percentagem meteorológica que não deixava dúvidas.  Hoje e amanhã choveriam "canivetes", como "soi dizer-se".  E eu gosto.  Gosto que chova, e muito, quando sou obrigada a ter por horizonte o que diariamente tenho, igualzinho, frente à minha janela. Quando as raízes que entretanto cresceram e me colam a esta bendita cadeira neste bendito sítio, me cortam as asas, que à minha revelia sempre me projectam lá p'ra longe, p'ra qualquer lugar que não aqui !
Mas até o tempo atmosférico ou quem o "lê", já está apanhado do clima ... é furo atrás de furo ! Chuva, nem uma gota !
E a minha fasquia de paciência e tolerância p'ra tudo, atingiu o limite suportável !

Como dizia uma daquelas brincadeiras que circulam na net e que acabam por nos chegar às mãos, intitulada  "Balanço de um ano de covid": Não tive Covid, mas tive efeitos secundários : sono à tarde, alergia aos canais de informação, perda de vocabulário ( exemplo : "horizonte", "viagem", "projecto", "restaurante" ),  mais três quilos, pantufas gastas, overdose de "zoom" ... tendinite no braço do rato ...
assim estou mais ou menos eu!  
Acrescentaria : súbitos ímpetos de bater em alguém, sobretudo quando esbarro em incompetência, má educação, irresponsabilidade ou parvoíce. Não esquecer que estou em tolerância zero, a quase tudo !
Pareço aquele bicho enjaulado, do zoológico ... ( agora, bem que os entendo ... ).  É vulgar verem-se os grandes felinos, limitados a um espaço muito pouco natural dia após dia, caminhando impacientemente de muro a muro, p'ra frente e para trás, sempre em percurso igual, tempo indefinido.  Ou dormindo, dormindo muito ... aliás como os meus gatos ... como os gatos de toda a gente, acho eu ... que padecem de tristeza e neurastenia !...

Nada se desbloqueia diariamente.  Esbarra-se em portas fechadas, sistematicamente.
Aguardo a intervenção cirúrgica às cataratas ... nada !  Em confinamento, o médico não opera. 
Aguardo que os cabeleireiros reabram... o cabelo reclama !
Aguardo que o homem que viria colocar estendais da roupa novos, compareça.  Também não !
Aguardo que o técnico que viria consertar a máquina de lavar loiça, que "ficou de vir", venha ... Nada !
Aguardo a reabertura da loja do Cidadão p'ra entrega de documentos ... 
E mais que não lembro !  
A sensação de inutilidade, a sensação pantanosa que nos vai sugando o espírito, a falta de vontade e de disposição, são avassaladoras e progressivas.

Ontem era noticiada, por parte de médicos especialistas, a preocupação crescente sobre o avolumar de casos depressivos com contornos psiquiátricos muito graves, em crianças e jovens, fruto dos distúrbios provocados pela vida absolutamente anormal que vivemos, há tempo excessivo.  
Sem horizonte ou fim à vista definido, sem perspectivas, com projectos e sonhos adiados, com a amputação do convívio, da partilha e dos afectos, com um sedentarismo imposto, em confinamento frente a écrans de monitores, horas a fio, e em que a esperança que se acende dia após dia, é empurrada adiante e tudo continua igual ... esta geração, a já chamada "geração do álcool-gel" - ficará inevitavelmente marcada para o resto das suas vidas, com sequelas ainda não estimáveis nem mensuráveis, neste momento.

Nós, os da faixa etária descendente, com uma já longa experiência de vida, com uma resiliência consequente e inevitavelmente maior, com uma visão obviamente mais alargada sobre os percalços e os tropeções com que a vida é useira e vezeira em brindar-nos, com "calo" forjado pelos tempos, pelas desesperanças tantas vezes, pelas dificuldades e pelos desgostos que já enfrentámos ...
nós, que já não sentimos as cócegas imperiosas na sola dos pés que nos obrigam à estrada, nem os frissons ou sobressaltos nos corações de grandes e sonhadas emoções ...
nós, como dizia o meu pai, que já "não corremos a foguetes"... até porque o fôlego da juventude se diluíu com os anos ...
e por tudo isso ... nós que nos sentimos roubados, esportulados e fragilizados pela clara noção de que estamos na verdade a viver tempos "não vividos", estamos na verdade a perder tempo, o "último" tempo das nossas estradas ...
ainda assim ... 
nós ... eu ... sentei-me hoje frente à minha "vitrina das viagens" como lhe chamo, o móvel que mais amo em todo o meu espólio de vida.  É um repositório com centenas de pequenos objectos que fui coleccionando ao longo do tempo, trazidos dos diferentes lugares até onde viajei, ou constituindo recordações trazidas por amigas ou filhas, também de lugares por elas visitados.
São objectos normalmente artesanais que contam histórias sobre tantos países de todo o mundo, das suas gentes e costumes, e que fui guardando religiosamente.  
Eles falam de tempos felizes, de momentos inesquecíveis, de acontecimentos memoráveis.
Alguns, já não tenho certeza absoluta de onde vieram ... mas não importa.  Olhá-los, perder-me a contemplá-los, é um exercício de fuga, de liberdade, de sonho.  É a fruição, outra vez, desses dias, desses anos ... desse tempo!
A minha história também passa pela deles, a minha memória cruza vivências, gentes, cores, cheiros, sabores, que em algum dia eu experienciei !  Não importa o tempo que já passou.  Não importa se as pessoas já não integram a minha história hoje, aqui e agora ... 
Importa apenas que eu as VIVI ... e só sente saudades quem algum dia viveu !!!...

Anamar

quarta-feira, 3 de março de 2021

" UM TEMPO P'RA RESPIRAR "

 


Estamos num período de alguma acalmia no desenrolar da pandemia.
É um tempo de respiro, um tempo dos corações baterem menos acelerados, do medo que nos povoa, amansar.
Verdade seja que, eu sinto, mas penso que é um pouco generalizado este sentimento, estar a ganhar uma evidente habituação, uma insensibilização e mesmo quase uma adaptação ao dia a dia que vivemos.
Acho que ganhámos uma certa "endurance" face a uma realidade sobre a qual conhecemos hoje, bem mais do que há um ano atrás.  Estamos a ganhar um certo "modus faciende", uma certa postura mais tranquila, na convivência com o vírus que integra as nossas vidas e que faz parte do quotidiano do país e do mundo.
Por outro lado, um certo "know-how" na forma como o encaramos, sem as fobias ou mesmo as histerias colectivas em que compreensivelmente todos caímos no transacto ano de 2020, ajudam-nos diariamente a procurar alguma "normalização" no formato completamente anormal que as nossas vidas detêm.

De facto, há exactamente um ano, dia 3 de Março registou-se o primeiro caso positivo da Covid, em Lisboa, enquanto que na véspera, dia 2 portanto, se haviam registado os primeiros dois casos, que ocorreram no norte do país, tendo os pacientes dado entrada no Hospital de Sto. António do Porto. 
Tratou-se de um médico, recém-chegado dos Alpes italianos, após uma semana de lazer numa estância de ski, quando o norte de Itália, zona da Lombardia, já estava a "ferro e fogo", como tristemente nos lembramos.  Milão ou Bérgamo foram locais que jamais esqueceremos ...

Hoje em dia, mercê do décimo segundo estado de emergência decretado há quinze dias, com um confinamento rígido e musculado, escolas fechadas, e um país praticamente encerrado à excepção dos "serviços mínimos", digamos assim, os números quer de novos infectados diariamente, quer dos óbitos e de pacientes nos serviços de intensivos, caíram generosamente, o que lançou uma lufada de ar fresco sobre o Serviço Nacional de Saúde, que no passado trágico mês de Janeiro, entrou praticamente em ruptura, colapsando ao limite dos limites algumas unidades hospitalares e serviços.
Inventou-se, reinventou-se, adaptaram-se espaços, criaram-se enfermarias em qualquer lugar onde isso foi possível, por readaptação de valências, e chamou-se a intervenção mais alargada dos privados e bem assim das estruturas de saúde das forças armadas.
Claro que houve patologias preteridas, claro que houve intervenções programadas suspensas ou adiadas ... mas houve que priorizar o estancamento do alastrar descontrolado da pandemia ! 
Entretanto, a inoculação das vacinas alarga-se na sociedade, e parece proteger com alguma eficácia, quem já as começou a tomar.  Estamos contudo, ainda muito longe do desejável e até do inicialmente previsto, já que a sua disponibilização tem sofrido, por toda a Europa, atrasos muito consideráveis por parte das farmacêuticas que não cumpriram os compromissos assumidos na sua distribuição e consequentemente, os timings acordados na Comunidade.

Ainda assim, de tudo isto, houve resultados visíveis, embora não possamos ignorar que até ao dia de hoje, se contabilizam lamentavelmente, mais de dezasseis mil perdas de vidas !

Não me alongo mais.  Estamos todos fartos de estatísticas, estamos todos saturados das grades desta prisão que nos cingem à mesma realidade  todos os dias, dia após dia.
Estamos todos ansiosos e aguardamos com  preocupação, a reabertura do país que, embora faseada, poderá trazer-nos algumas surpresas.
Este sol e tempo primaveril que começam a despontar, retiram a prudência, chamam para a rua e empurram as pessoas, sequiosas de liberdade, a tentarem infringir  regras fundamentais de protecção individual e colectiva, o que poderá novamente reverter a situação, com custos gravosos para todos nós !
Precisamos, como do pão para a boca, que a insensatez, o egoísmo e a irresponsabilidade não nos retirem de novo o "oxigénio" de que tanto precisamos para viver !!!

Anamar