sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

"O CRIADOR E A OBRA"


Chegou-me à mão, via PC, um artigo que li, deitei fora, mas que recuperei depois, para voltar a ler, na medida em que fiquei a pensar nele.

O artigo é escrito por Guilherme de Melo, jornalista, que foi, durante quarenta anos amigo de Carlos Castro.

Não pensem que vou debruçar-me sobre o "caso mais mediático" da actualidade;
primeiro, porque já está gasto por demais, segundo, porque toda a gente opina, conheça ou não os meandros da questão, terceiro, porque não estou para me expor, a fazer juízos de valor sobre uma figura que teve tanto de polémica como de controversa, naquilo a que eu chamo de lixo no jornalismo português...

Aquilo que me fez reler o artigo com maior acuidade, foi uma faceta nele revelada, que dá que pensar, e que é mais frequente do que se supõe, no ser humano...

Guilherme de Melo procura traçar um retrato tão fiel quanto possível, do amigo da seguinte forma:

"O Carlos vivia o amor como um fantasista, um sonhador. As coisas eram como ele queria, não como na realidade eram. Sempre foi um "naif", uma pessoa de grande ingenuidade, uma criança grande. Quando amava, entregava-se completamente. Estava desfasado do seu tempo, vivia fora do tempo. Era um crédulo!" (sic)

Nunca tive nenhuma simpatia por Carlos Castro; não pelas suas opções sexuais. A esse nível, sou absolutamente despida de preconceitos e tabus, e respeito integralmente também essa liberdade dos cidadãos.
Mas este aspecto personalístico revelado pelo seu amigo de muitos anos, tocou-me particularmente.

À semelhança de Carlos Castro, há quem, narcisisticamente ame a "obra" de tal forma a realiza, que a corporiza, apagando com isso a realidade, (sobretudo se esta lhe for adversa), a conceba, a invente, nela acredite à medida das suas necessidades, e ingénua e piamente a torne "real", alimentando-se dela...

Normalmente são pessoas não pragmáticas, não com os pés assentes na terra, mas sim carentes, sensíveis, ingénuas, marcadas pela dureza da vida, que necessitam estar permanentemente num palco imaginário, fantasiados de uma felicidade que nunca tiveram, onde as possam aceitar,amar...acarinhar...

Como consequência tornam-se figuras obsessivas, possessivas e absorventes, pois não têm "endurance" para deixar "fugir" aquilo que "criaram" e em que acreditam.

Digamos que não são pessoas deste mundo;
Nesse sentido, e com este perfil, nada mais lógico que Carlos Castro estar ligado à ribalta, às lantejoulas e às plumas, da pseudo fama, do cor de rosa, do postiço, do sonhador...do fantástico!!!...

As sus vidas estão afastadas da realidade, e eles nem dão por isso, "negam" o contrário, recusam o que não corresponda à fantasia das suas cabeças; daí, sossobrarem, quando o chão lhes falta sob os pés e exultem quando acreditam que a sua "felicidade" foi atingida...

Apesar de como disse, não empatizar com a figura de Carlos Castro, nem pessoal, nem profissionalmente, rendo-me com muita complacência, quase alguma ternura, e curvo-me, apesar dos pesares, perante a memória daquela criança que nunca cresceu...

Anamar

2 comentários:

Anónimo disse...

Como é perigosamente tentador "criar" o outro.Fazêmo-lo quase sem dar por isso. Vai-se talhando a "obra", admirando com deslumbre o resultado..
Até que,o tempo, por vezes breve,rasga a tela, quebra o feitiço e o que fica é a dor do "artista" que quis iludir-se com a sua "arte".

SOL

anamar disse...

Olá SOL
Só agora vi o teu comentário. Nem sempre me lembro de voltar atrás e ver se tenho intervenções, que são sempre bem vindas.
Pois tal como dizes, este fenómeno do criador em relação à criação, que tolhe a objectividade e o distanciamento da análise, é alvo de análises de perfis psicológicos, sem dúvida desviantes....mas sempre, sempre, prejudiciais...
Um beijinho
Anamar