quinta-feira, 7 de junho de 2012

" DIVAGAÇÃO "


Um domingo mais, de Inverno de "penetra", quase num Verão pelo calendário.
Tudo a desoras, tudo desencontrado, tudo às avessas.
O Mundo às avessas, a Vida às avessas ... as pessoas a fazerem o que não querem, a viverem o que não querem, a sonharem o que não têm.

Mas os sonhos são isso, não?
Os sonhos são exactamente o que se inventa, o que se desenha em écrans inexistentes, próprios para verdades inexistentes.
Os sonhos são fantasminhas que atordoam as noites, mas também atordoam os dias. E os dias são difíceis de partilhar com fantasmas, já que nas noites os nossos olhos estão fechados, e consequentemente a alma também, mas nos dias as pupilas deixam passar muito mais luz, e sempre teimamos em estar dispertos ...
E depois, os dias são compridos ...  Os dias valem duas noites pelo menos, e o fôlego falta, pois são verdadeiras montanhas a escalar.

E a soma dos dias faz semanas, e estas, meses ... e estes, anos ... e os anos, vidas.
E ao contrário dos dias, as vidas passam num instante e são cheias de contradições.  Zombam connosco.  Brincam de "baralhar e voltar a dar", e quando julgamos que já dominamos aquele jogo, é tudo mentira ... não conhecemos merda de jogo nenhum.

Sempre somos aprendizes desta história.
Sempre somos aprendizes de marionetas.
As marionetas são mexidas por cordéis entre dedos habilidosos.  Mas as marionetas são simplesmente mexidas.  Como bonecos, não têm vontades.
Têm vida, pela aleatoriedade da vontade de quem com eles brinca.
Ganham vidas de fingir, e fingimos que temos vidas !

E arrancamos gargalhadas em dias de sol.  Apenas ... o sol não brilha muito, porque agora parece ser Inverno outra vez.
E há o mar, aquele berço de ninar que sempre embala para cá e para lá ...
Mas o mar agora está muito longe, e só serve de berço a cinzas.  Mas para isso é preciso dormir em paz.  E quem tem pesadelos ainda não dorme em paz !

E há a serra, há as mimosas, as madressilvas, as margaridas silvestres, as tâmaras maduras ... ou há simplesmente o ruído das marés a bater nas rochas sonolentas, ou o grasnido das gaivotas e das andorinhas do mar aproveitadoras do vento distraído.

E depois o céu insiste em ficar cinzento, que é aquela cor que é e não é ... e que é muito pior que ficar negro ... e claro, muito pior que ficar azul límpido e trasparente, porque isso só acontece em dias em que a Vida brinca de Vida e não de Morte.  E esses, não são muitos ... aliás, são raros !...

As montanhas desenham limites que parecem limites, mas não são !
As montanhas são as portas do céu que se abrem em leque, ou em corolas de malmequeres a desfolharem o bem e o mal me quer ; ou ainda como pedras de dominós que se derrubam, com a facilidade de castelos de cartas a empurrarem-se ... ou farrapos de nuvens que deslancham, como claras em castelo ...
Mesmo assim, as montanhas são absolutamente fiéis, porque são perenes e verdadeiras.  Precisam milénios para fugirem e se esconderem de nós.  E nós não temos milénios para as ver ir !!!...
Por isso, os condores as habitam, os falcões as amam, as águias as buscam.
Pelas suas janelas corre a aragem fresca, e o Mundo espreita.
Quem atravessa as suas portas esbarra na liberdade do outro lado, e sufoca-se com a paz e o desprendimento.

O arco-íris, que é aquele trampolim com que os diabinhos se divertem, sempre surge quando as lágrimas se misturam com sorrisos.
E costuma aparecer lá por detrás das montanhas, quando o coração resolve adormecer no mar, e o céu pega fogo ...
É a hora em que a lua cheia acaba de se enfeitar, e decide vir ao salão de baile, escutar as óperas de Mozart, que tocam só para nós !
Os corais explodem então em mil cores esfuziantes, as anémonas sacodem vaidosas as "plumas" de pavão, e as conchas e os búzios vêm até à praia espreguiçar-se ...
Nos  templos, as  ladainhas  rodopiam nas abóbadas, sobem aos pináculos, passam  muito para lá dos torreões, violam os vitrais,  entontecem  nas rosáceas ... e  os salmos e os "glorificat" ecoam até  aos infinitos ...

Lá ... onde os sóis nascem e se põem, indiferentes !!!...



Anamar

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